28° verso
Seu dia estava uma bagunça tremenda. Quando chegou no trabalho, a loja de vinil estava toda do avesso. Jaebeom tinha inventado de trocar toda a mercadoria por uma nova, guardando os discos que estavam tendo pouca saída e mandando o seo reorganizar toda a vitrina com os dvds mais antigos e valiosos. Aquilo durou o dia todo, changbin organizou tudo junto com o mais velho, arrastou caixas e mais caixas do depósito até o meio do piso surrado da loja, guardou e recolocou vinis e dvds nas prateleiras, trocando até os painéis que ficavam no vidro de entrada do local. À tarde, o moreno estava exausto.
Como forma de agradecer o baixinho pela ajuda, jaebeom pagou seu almoço e lá mesmo no chão da loja junto com jornal velho rasgado e dvds empilhados, os dois almoçaram. Changbin estava tão cansado que até pensou considerar pedir para ir para casa mais cedo, mas o mais velho ainda tinha planos para o restante do dia. Mesmo quando o maior foi embora, changbin ficou responsável em limpar toda a sujeira e fechar a loja. Ainda tinha mais um monte de coisa para fazer.
Em dois dias seria o casamento dos seus amigos e seungmin insistiu para que eles comprassem um terno decente para o menor. Changbin tinha um, mas o kim nem mesmo o deixou argumentar, o obrigando a ir comprar um novo por sua conta. Quando saiu do grande estabelecimento que era o shopping local, correu pela chuva que encharcava as ruas até o automóvel do ruivo, entrando de uma vez no banco do passageiro para se esconder do temporal que caia por dois dias seguidos. Changbin ficou realmente surpreso pelo tanto de chuva que surgiu em pleno verão.
- pra onde vamos, gracinha? - indagou sorrindo para o mais novo. Seungmin apenas revirou os olhos e riu nasalmente, tirando o carro da vaga.
- está com fome? - o rapaz de roupa molhada assentiu. - primeiro iremos comprar o terno e depois vamos parar em algum lugar pra comer.
- você tá estranho.
- você que é estranho.
- às vezes eu não te suporto, sabia? - empurrou de leve a cabeça do garoto, o fazendo rir enquanto tirava uma das mãos do volante para arrumar os fios rubros bagunçados.
- e eu não te suporto o tempo todo.
- quando vai assumir que me ama, hein? - esfregou o rosto no ombro do ruivo, para irritá-lo. Seungmin grunhiu de desagrado e empurrou o seo para o lado usando o cotovelo, este não conseguiu evitar sua risada por ver a cara de nojo do garoto. Ele odiava aquilo, e changbin amava provocá-lo.
- você é tão chato, como a gente virou amigo mesmo?
- você que ficava me perseguindo. - ele encostou no assento, tirando o celular do bolso para responder as mensagens de chan que chegavam em montes pelo aparelho. - eu tava lá vivenciando a minha depressão e você ficava invadindo a minha casa igual um louco. Quase liguei pra polícia uma vez, mas sou um cara muito legal pra fazer isso com você.
- você é tão ingrato às vezes. - changbin lhe mostrou a língua. - e infantil. Quantos anos você tem mesmo? Quase trinta e age como uma criança de dois anos.
- ja disse que é vinte e oito, não trinta, para de aumentar a minha idade! - esbravejou, dando um soco de leve no braço do Kim. - nem parece que você tem vinte e seis, tão velho quanto eu.
- cala a boca vai.
A primeira parada que eles fizeram foi numa loja especializada em ternos, tal qual o ruivo comprou seu terno de casamento e o de hyunjin. Demoraram cerca de trinta minutos para achar algo do agrado do seo, vasculharam entre cabides e provadores, changbin nunca tinha experimentado tanta roupa como naquele dia. No fim, ambos amigos entraram em consenso por um terno de coloração escura, o paletó tinha ficado perfeito no torso do mais velho, fora a calça que moldou bem suas coxas e ali mesmo compraram um sapato social para fechar o combo. O moreno já imaginava o calor horrível que passaria com aquilo, apesar da festa ser à noite.
Como prometido pelo maior, a dupla saiu de lá diretamente para uma lanchonete. Changbin observava a rua preenchida de pessoas e seus guarda-chuvas, cada uma mais apressada que a outra. Imaginou se um dia ficaria daquele jeito, tão atarefado com o trabalho que não teria tempo para si mesmo ou sua vida pessoal. Tinha medo do que poderia se tornar em alguns anos, ainda era muito quebrado e não tinha tantos planos, só queria viver sua vida da forma mais confortável possível e longe de problemas. Continuar trabalhando para jaebeom parecia um bom plano, tinha medo de se arriscar em algo novo apesar de querer muito. Pensando agora, seu maior medo mesmo era decepcionar a si mesmo e as pessoas ao seu redor, sabia que não recebia mais nenhuma pressão psicológica sobre seu futuro, mas ele mesmo fazia aquilo. Queria fazer muito, porém não conseguia. Aquilo era apavorante e desesperador.
Quando ele e seungmin sentaram em alguma das mesas espalhadas pelo salão da lanchonete, a dupla pediu o que parecia do seu agrado no cardápio e novamente ficaram sozinhos quando o garçom saiu. O Kim parecia estranho, changbin observava bem a forma como ele enroscava os dedos e parecia tenso, seus ombros encolhidos era o sinal nítido que tinha algo errado. Changbin ficou tenso também de repente, lembrou o que tinha acontecido a três dias atrás, a reação estranha de hyunjin com sua presença, como ele parecia fragilizado por alguma coisa, e agora seungmin parecia querer contar algo.
Changbin esperou até que seus pedidos viessem para não ter nenhuma intromissão, e então pigarreou para chamar atenção do garoto.
- você sabe que eu odeio que me escondam as coisas. - sabia que aquela não era a melhor abordagem, mas estava ficando nervoso com a tensão do ruivo. Seungmin arregalou levemente os olhos e abaixou a cabeça.
Eles ficaram em silêncio, o som da chuva ocupava todo o barulho ao redor, nem mesmo o pouco falatório no local podia quebrar aquela barreira enorme que preenchia os arredores dele. Seungmin ergueu o rosto, parecendo abatido, ele colocou as mãos em cima da mesa e mirou em changbin toda sua atenção. O moreno sentiu seu coração fraquejar, errando o compasso, um arrepio horrível correndo por todos seus ossos.
- eu e hyunjin vamos nos mudar. - ele disse de uma vez. Pelos próximos vinte segundos changbin ficou atônito, sem conseguir raciocinar direito. - vamos fechar o bar e...
- vocês vão fechar o bar? - ele indagou surpreso.
- bom, sim, hm, é isso. A gente vai se mudar pra outra cidade, então o bar ficaria fechado de qualquer forma.
Se sentia letárgico, seu corpo ardia, e sua respiração havia ficado presa dentro da garganta. Queria vomitar de repente, seu paladar ficando aguçado e amargo. Changbin não soube o que dizer, eles iriam se mudar para outra cidade e ele ainda continuaria no mesmo lugar, parado e sem destino. Seus únicos amigos iriam embora. Achou que precisava falar algo, mas quando abriu a boca, somente pareceu mais patético ficar ali, ele comprimiu os lábios e abaixou a cabeça.
- nós não vamos sumir, hyung, só queremos começar uma nova vida em um lugar diferente.
- eu entendo.
- e isso não significa que você ficará sozinho, você pode ir morar com a gente, seria legal, você sabe que o hyunjin não ia se incomodar. - ele tentou pegar na mão do seo, mas changbin arrastou elas até o colo, se mantendo impassivo. - changbin, olha pra mim. - pediu com as sobrancelhas franzidas e um tom calmo que não o pertencia.
- eu disse que entendo. - exprimiu ruidosamente, mesmo que sem querer. - vocês vão se casar, é totalmente compreensível que queiram se mudar e iniciar uma nova vida, e eu não tenho nada a ver com isso. Sou apenas um amigo próximo, por que eu deveria ficar incomodado com isso? - falou aquilo mais para si mesmo do que para seungmin, tentando se convencer que aquele aperto no peito não era bem vindo.
- não seja idiota, você não é só um amigo próximo, eu te vejo como um irmão mais velho.
- certo, não tem porque criar toda essa cena por tão pouco. Desculpa, mas eu perdi o apetite. - changbin ficou de pé, e sem dar brechas para seungmin persuadi-lo a voltar à mesa, ele ligeiramente saiu da lanchonete.
Levou um leve choque térmico pela chuva que caiu contra seu corpo como pedras, ele olhou para os lados antes de sair disparado pelo temporal, sem saber para onde deveria ir. Estava tão frustrado consigo mesmo. Quis gritar, chorar, espernear e por fim pedir desculpa a seungmin. Ainda era tão egoísta e insensível. Sempre colocando sua dor em cima dos outros, suas preocupações e suas angústias. Quando parou de correr e esbarrar nos outros, não soube dizer exatamente onde estava. A chuva embaçava seus olhos e deixava sua roupa grudenta e pesada, ele correu para achar um lugar para estiar, mesmo que estivesse ensopado dos pés a cabeça.
Se tivesse ficado com o kim na lanchonete, acabaria falando mais do que deveria, e magoaria o garoto. Porque ele ainda era o mesmo SpearB egoísta que desconta sua frustração nos outros. E tinha medo de nunca mudar.
Percebeu que tinha esquecido o celular na lanchonete com seungmin, então não teria como pedir para alguém ir buscá-lo, ele correu os olhos pelo local, era uma rua deserta com duas saídas, o asfalto molhado tinha um cheiro bom, mas changbin não tinha tempo para aquilo. Havia casas e lojas emaranhadas, sem sinal de vegetação, ele percebeu uma lojinha simpática que parecia vender diversas coisas. O moreno olhou ao redor antes de ir lá dando passos longos, chamando o dono batendo palmas e quando este apareceu, ele pediu por um maço de cigarros que estava pendurado junto com alguns isqueiros.
O homem que o atendeu parecia preocupado com sua situação, indagando diversas vezes se ele estava perdido ou passava por alguma dificuldade. Changbin apenas riu amargamente e negou, pagando pelo maço com o dinheiro ensopado, e saindo depressa dali, voltando até o ponto de ônibus que estava sendo seu abrigo temporário. Não tinha a menor noção de que horas passaria algum transporte para levá-lo em casa.
Suas mãos tremiam quando acendeu o cigarro usando o isqueiro que o vendedor lhe deu de bom grato, aproveitando a primeira tragada como se aquilo pudesse absorver toda a dor que estava sentindo. Sentou na calçada com os respingos da chuva caindo perto do seu sapato e a caixa do cigarro sobre o colo, tomando cuidado para não molhar. Assim que terminou o primeiro cigarro, ele acendeu outro, e assim continuou até seus dedos estivessem ardendo pelo calor que os abrangia.
(...)
Quando chegou em seu apartamento, não tinha a menor noção de tempo, apenas sabia que estava para amanhecer. Por sorte um ônibus passou e o deixou em um lugar perto do prédio onde morava, sendo esta a única coisa boa que tinha acontecido em seu dia até o momento atual. Não ficou nem um pouco surpreso quando a silhueta do kim se sobrepôs sobre seu corpo. Ele estava de pé em frente ao seu sofá, o rosto dele parecia abatido e ele ainda usava a mesma roupa de mais cedo, dando a entender que estava esperando o seo há muito tempo.
Changbin nem mesmo olhou para seungmin, deixou seus sapatos e o par de meias na entrada, jogando as chaves em cima da mesa de centro, pretendia tomar um banho quente e dormir, sua cabeça estava pesada e sentia que podia desmaiar a qualquer momento. Quando tentou passar até o corredor, o ruivo se colocou na sua frente, impedindo que ele desse mais um passo sem ter que erguer o rosto para falar consigo, mas o moreno estava muito cansado para aguentar mais uma discussão. No entanto, seungmin parecia decidido a saber onde ele esteve pelas últimas cinco horas.
- vai ficar me ignorando desse jeito? - indagou sonoramente. Changbin apenas o empurrou de leve para o lado sem intenção de machucá-lo e andou cambaleante até seu destino. - changbin, você tá fedendo a cigarro, onde caralho você tava!? Eu tô aqui te esperando a horas! Será que dá pra você ter um pouco de bom senso e me responder!?
- vai pra sua casa. - se virou para ele, seus olhos pareciam frios na perspectiva de seungmin, este que recuou um passo. Ele parecia o changbin de três anos atrás. - agradeço sua preocupação, mas eu tô bem, e o que eu faço ou deixo de fazer não é da sua conta.
- eu vou ignorar toda essa merda que você tá falando porque sei que você tá de cabeça quente.
- faça o que quiser.
- toma um banho quente pra não pegar um resfriado. Comprei remédio de gripe e pra dor, tá em cima da mesa da cozinha. Vou te deixar sozinho. - changbin apenas entrou no banheiro e fechou a porta, deixando a voz de seungmin abafada para trás. - seu celular tá na sala! - ele gritou, e depois tudo foi tomado pelo silêncio.
Estava sozinho.
Ali mesmo ele tirou a roupa e a deixou pesada sobre o piso, andando meio tonto até o chuveiro. A primeira queda d'água sobre seu corpo abaixou sua pressão, e quase resultou em um desmaio, mas conseguiu se manter lúcido e de pé, deixando que a água quente levasse embora o sentimento de enfraquecimento, despertando aos poucos sua mente nublada. Ele se enrolou na toalha e marchou até o quarto, vestindo um conjunto de moletom preto que tinha ganhado de presente, um casaco grande que escondia suas mãos mais que o necessário e uma calça macia e soltinha. Sentia seu nariz entupido depois do banho, então tratou de tomar o remédio que seungmin tinha deixado, se sentindo um completo estúpido por ter falado daquele jeito com o garoto. Antes que fosse para o quarto, pegou seu celular pela sala, deixando para checar as mensagens ou ligações quando amanhecesse e estivesse com um humor mais tolerável.
A última coisa que queria era ser um imbecil com jisung ou chan, sua cota de decepção no dia já estava no limite.
Ele se jogou na cama, o gosto da nicotina ainda em seu paladar apesar de todas as vezes que escovou os dentes, sentia no final da sua língua e entre as bochechas, seus dedos queimados foram tratados com curativos que ele mesmo colocou. Os remédios começaram a fazer efeito e seu corpo se tornou mole novamente, se aconchegou melhor na cama tentando se esquecer tudo que tinha acontecido.
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