22° verso
Desceu em frente ao prédio uma vez que hyunjin e seungmin iriam guardar o carro na garagem, poderia ter ir por dentro com eles mas ponderou que chegaria mais rápido que eles se descesse logo ali, já que realmente não se aguentava de sono. Cumprimentou o porteiro que ficava a noite, um rapaz com menos de vinte e seis anos, cabelos negros, olhos miúdos e corpo musculoso, muito diferente do senhor de idade que cuidava do prédio pelo período da manhã. Enquanto esperava o elevador chegar, escutou vozes altas vindas da entrada do prédio. Sentia que conhecia uma delas.
Por pura curiosidade, decidiu ver quem estava causando tamanha confusão àquela hora da noite. Se espantando ao ver o porteiro novo barrando a entrada de Felix. O que ele está fazendo aqui? Changbin estava travado no lugar. O Lee estava pálido e com os olhos fundos, seus cabelos ruivos bagunçados e suas roupas amassadas, mesmo a metros de distância podia sentir o cheiro forte de álcool transbordar do seu corpo. Yongbok parecia desorientado e perdido, mas ainda bradava que precisava entrar no prédio. Que precisava falar com changbin.
Assim que seus olhos encontraram com os do seo, ele parecia ter se desesperado mais ainda. Changbin recuou com medo, odiava lidar com pessoas bêbadas e era claro como um rio cristalino que o australiano estava completamente cego pelo álcool em suas veias.
— é ele! Eu preciso falar com ele! Me deixe entrar! — ficou ainda mais assombrado pelo tom grave que sua voz se tornou ao gritar com o porteiro, que parecia não ter um pingo de medo do que estava acontecendo, como se já estivesse acostumado com aquele tipo de situação.
— desculpe, mas não posso deixá-lo entrar nessas condições. — ele se manteve imóvel em frente ao grande portão, o rapaz era maior que o estrangeiro e mais corpulento, parecendo uma grande muralha, às vezes impedindo até mesmo changbin de ver o que acontecia de longe.
Visto que apenas ficar ali parado acabaria causando mais confusão, changbin tomou um suspiro de coragem e saiu do prédio, indo em direção ao porteiro e Felix.
— deixe ele entrar, por favor. — sua voz era baixa, amedrontada, mesmo que tentasse parecer confiante. O porteiro o olhou de soslaio, changbin se sentiu minúsculo diante do homem. — é comigo com quem ele quer falar, então deixe ele entrar logo.
Mesmo receoso, o porteiro saiu da frente, deixando que Felix quase caísse por perder o equilíbrio. Changbin segurou o lee, seu corpo fedia a bebida e ele parecia fraco, anêmico. O arrastou para dentro do prédio sem antes proferir muitas desculpas ao rapaz pela confusão que o australiano causou, se movendo com dificuldade com o ruivo ao seu lado.
Estava sem dúvidas nervoso com aquilo tudo, Felix grunhia palavras desconexas, misturando os idiomas, mas changbin reconheceu palavras como "me desculpa" entre seus resmungos solucentos. Saiu do elevador e puxou o australiano até seu apartamento, não queria que ele entrasse em sua casa, na verdade, apenas estava ajudando-o agora pelo mínimo de empatia que sentia por ele. Abriu a porta e o empurrou para dentro sem delicadeza, não estava mais com paciência para aguentar toda aquele cena que o ruivo criou, estava cansado e com sono, então não tardou em deixá-lo todo desajeitado pelo sofá e sua expressão ser tomada por um semblante sério e impaciente.
— você vai me dizer o que você quer e vai embora. — Felix ergueu os olhos nublados até o rosto do moreno. Nunca tinha visto changbin tão inexpressivo. — seja breve.
— me desculpa… naquele dia… eu… só me deixa explicar, eu não queria ter dito tudo aquilo com você. — sua voz estava falha e logo seus olhos se encheram, uma cachoeira descia entre os cantos e corriam por suas bochechas vermelhas pela bebida. Ele chorava, tão forte que seu corpo esguio e magro estremecia. — te ver com aqueles caras doeu tanto, eu não sabia o que pensar. Você estava sorrindo, mas não era pra mim. Aquele cara tava te tocando, te abraçando com tanta possessividade que eu não aguentei. Eu não quis dizer tudo aquilo, por favor, acredite em mim.
Pelos primeiros minutos, changbin se manteve calado, deixando que ele chorasse sem ao menos se mostrar empático. Era simplesmente impossível sentir dó de alguém que havia machucado seus sentimentos, era alguém compreensivo, mas tinha coisas que o moreno não tolerava. O tratamento que recebeu de Felix naquela noite e suas palavras estavam marcadas em sua pele como brasa: seu olhar frio e seu jeito imprudente. Era tudo demais para receber perdão. Não odiava Felix, mas não queria vê-lo tão cedo.
— você quer ser desculpado pra conseguir se sentir melhor? — indagou após um longo tempo em silêncio, sua voz rouca e fria, tão ríspida quanto o vento que entrava pelos cantos das janelas que zumbiam.
— eu quero que você fique comigo. — changbin soltou um riso soprado, descrente.
— isso nunca vai acontecer. Nem antes de toda a merda que você fez nem agora. Eu não me importo pela culpa que você esteja carregando por ter sido um arrombado comigo, eu confiei tanto em você, felix, mais do que deveria. Eu te via como um dos meus melhores amigos, mas nada pra você é o suficiente.
— tente ser amigo da pessoa que ama, e experimente vê-lo sendo arrancado de seus braços por dois idiotas que de qualidade só tem o rosto bonito e a riqueza que possuem!
— você está ouvindo suas palavras!? — gritou de volta, tão irritado que sua testa estava franzida e sua mandíbula trincada. — eu realmente admiro sua autoconfiança, mas não diga coisas que você não sabe! Você não me ama, você não sabe nem a profundidade que essa palavra carrega. Caso realmente gostasse tanto assim de mim, estaria feliz que consegui me resolver com as pessoas por quem sempre fui apaixonado!— bradou rente ao rosto do Lee, suas unhas curtas fincadas na palma, ambos punhos fechados com tanta força que temia que viesse a sangrar. — eu sei que metade disso é culpa minha, fui idiota em deixar que a gente se envolvesse tão intimamente, mas porra, o tanto de vez que eu disse que só conseguia te ver como meu amigo e me diz, quantas vezes você disse que estava tudo bem e que entendia!? Eu não entendo que merda aconteceu com você e nem quem te deu toda essa esperança de que quando você voltasse da Austrália ficaríamos juntos, mas isso não vai acontecer!
— eu te amo, changbin! — ficou de pé, ficando cada vez mais fora de si. Changbin deu um passo para trás, sua panturrilha encostando na mesa de centro. Lembrou-se que ele estava bêbado e ficou temeroso por quão irritado o rosto do australiano estava. — eu simplesmente não posso aceitar isso! — felix agarrou seus ombros, apertando com tanta força que chegou a machucar. — eu não… eu não posso deixar que você fique com eles! Não, não, não, é impossível!
— você tá me machucando! — tentou empurrá-lo para longe, mas ele parecia estar fincado no chão como uma velha árvore.
Subitamente, ele avançou contra seu rosto, os lábios ásperos contra os seus, esmagando a sua boca sem a mínima delicadeza. Changbin entrou em desespero, socando o tronco do ruivo e tentando chutar suas partes íntimas na tentativa de obter liberdade do aperto forte que suas mãos davam, mas nada estava sendo útil. Quando ele separou os lábios, um fio asqueroso de saliva ligava ambas bocas. Changbin viu sua oportunidade naquele momento. Moveu os ombros bruscamente para trás, soltando-se dos apertos dolorosos, seu punho foi manchado pelo sangue que jorrou do lábio cortado de Felix, este cambaleou, quase caindo inconsciente pelo forte soco que recebera na região da mandíbula. Mas ele se manteve de pé, e quando seus olhos felinos caíram sobre changbin, sua raiva havia se tornado descomunal.
Novamente ele o agarrou, o corpo pequeno porém mais trabalhado do seo tentou manter o equilíbrio, estava quase sendo jogado em cima da mesa de centro feita de vidro, temia cair de costas ali. Fincou os pés no chão e mais um soco foi desferido, acertando bem no estômago do Lee que gritou pela dor, aproveitando a inclinação em seu torso, o moreno segurou nos fios ruivos e ergueu seu joelho com força, acertando bem em sua caixa torácica, arrancando-lhe o ar dos pulmões. Felix caiu rente a seus pés, de joelhos, seus braços segurando seu torso dolorido e sua visão turva, seu sangue manchava o piso.
Arrastou o australiano pelo cabelo com força pela sala, pouco ligando para o quão deplorável havia se tornado sua face pelos socos antes desferidos. Jogou o maior no corredor dos apartamentos, o som do seu corpo se chocando contra a parede em frente a porta de changbin fez seungmin e hyunjin saíram de casa desorientados, seus semblantes sonolentos indicava que eles acabaram de acordar de um sono leve. O casal encarou a cena de Felix caído no chão com filetes de sangue escorrendo por diversos cortes em seu rosto e changbin prestes a desabar, aparentando estar exausto, ofegante e raivoso.
— vá embora! — gritou o moreno, alto e estridente. Os outros dois moradores dos apartamentos em frente ao seu não estavam, changbin sabia disso já que eles sempre saiam tarde da noite nos fins de semana e só voltavam pela manhã.
Atordoado, hyunjin foi erguer o Lee para levá-lo para o térreo, longe de changbin e das mãos pesadas de seungmin que estava ameaçando ir para cima do australiano mesmo que não tivesse ouvido nenhuma explicação para aquilo tudo: changbin não socaria alguém sem motivos, então o Kim deduziu que a culpa era do sujeito jogado no chão como um saco de batatas.
Mesmo coberto por uma fúria sem tamanho, suas pernas tremiam, changbin estava lutando agora para ficar em frente a Felix sem cair de joelhos. Quis chorar, mas se mostrar fraco agora não era uma opção, seu rosto se manteve inexpressivo, coberto de ira e desprezo.
Hyunjin que estava tentando lhe prestar um pouco de empatia ao levantá-lo foi empurrado pelas mãos sujas de sangue de yongbok. Não queria a ajuda dele. Se colocou de pé sozinho e de forma asquerosa cuspiu o fluído vermelho que escorria por sua boca, limpando o nariz que sangrava provavelmente quebrado na camisa que usava. Ele lançou um último olhar furioso para changbin, que se manteve de peito estufado e queixo erguido, nem um sinal de fraquejo, com ar de quem lhe encheria de socos novamente se pudesse. Mesmo desprezando a atitude do Lee, o rapaz de fios rosados o seguiu até o elevador, precisava explicar aqueles hematomas ao porteiro, sabia que o seo não conseguiria dizer nada assim que Felix sumisse de sua visão.
E assim aconteceu, o australiano desapareceu dentro do elevador e o seo caiu, seus joelhos sendo machucados pelo impacto, naquele momento deixou que as lágrimas caíssem como gotas de chuva por sua camisa manchada pelo sangue de felix que continha um odor forte de ferro. Esfregou a boca com o punho sujo com tanta força que nem percebeu que apenas estava se machucando mais, seungmin se ajoelhou e o abraçou com força, trazendo o corpo trêmulo para dentro de seus braços longos. Changbin não podia ouvir seu próprio choro angustiante e também não ouviu o de seungmin, que foi comovido pelas lágrimas do mais velho, o consolando mesmo que não tivesse o que dizer no momento.
Não quis ir para a residência do jovem casal, então em sua sala, lhe foi entregue um copo de água com açúcar, hyunjin fizera para os dois, seungmin ainda tremia ao seu lado pelo choro recente, embaixo dos seus olhos estavam vermelhos e seu nariz rosado. O moreno nunca viu o kim parecendo tão indefeso como naquele momento, queria consolá-lo, dizer que estava tudo bem, mas nem mesmo conseguia controlar o sentimento de repulsa que sentia ao ser tocado mesmo que sem querer por um dos dois. Queria se livrar daquele sentimento ruim. Queria esquecer do que aconteceu.
— tem certeza que não quer ir dormir na nossa casa, hyung? — hyunjin indagou, trazendo o corpo quente de seungmin para perto do seu, confortando o de fios flamejantes com um abraço desajeitado.
— eu quero ficar sozinho um pouco, por favor. — preferia as palavras pausadamente.
Acatando seu pedido, o jovem casal o deixou. Seungmin não conseguia falar, simplesmente sua voz faltava naquele instante, quis espernear e puxar o seo para sua moradia mesmo que ele não quisesse, mas não conseguia, sua força tinha sido tirada do seu corpo temporariamente. Se deixou levar pelas mãos cálidas do seu futuro marido, abandonando o apartamento do seo.
Alguns minutos se passaram e changbin se manteve imóvel no sofá, seus olhos vagavam entre o sangue seco no chão e suas roupas que adquiriram cheiro de álcool. No automático, o rapaz se moveu até ao banheiro, tirou suas roupas e as deixou jogadas pelo cômodo arejado e frio, a água gelada acalmando seus nervos e de novo se permitiu chorar, suas lágrimas salgadas se misturando a água que caia por seus ombros e cabelo. De olhos fechados gritou estridente dentro do banheiro abafado, sua voz ecoando pelo cômodo e desaparecendo como vento.
Saiu do banheiro cerca de vinte minutos depois, sua pele ardia e estava vermelha, esfregou tanto seu corpo imaginando que somente aquilo seria capaz de tirar o sentimento de repudia, deixando marcas para todos os lados. Escovou os dentes incansáveis vezes, sua gengiva sendo também machucada no processo. Se vestiu com roupas confortáveis, mas ainda se sentia incomodado com seu próprio corpo. Se ajeitou entre as cobertas e virou-se na direção oposta do sol que nascia preguiçosamente do lado exterior. Escutou o barulho do seu celular tocando, esticando o braço até a cômoda ao lado da cama onde o aparelho estava para pegar, ponderando por longos segundos se deveria atender a chamada de christopher.
No último toque, atendeu, se mantendo em silêncio.
— neném? — changbin despencou, como uma pedra que caia livremente de cima de uma montanha. Tentou abafar seu choro com a manga do casaco grosso que vestia, mas era inevitável. Sentiu-se abraçado por um sentimento de vazio que preencheu todo seu peito. Não queria chorar, mas não conseguia parar as lágrimas que pincelavam seu travesseiro e fazia trilhas por suas bochechas. — changbin? Por que você tá chorando? Fala alguma coisa, tô ficando preocupado. — não era uma exigência, mas sua voz estava alta, mesmo que tentasse soar ameno.
— hyung, eu tô com medo. — se sentia uma criança novamente, assustada e frágil. Não queria ficar sozinho, todo seu corpo estava dolorido.
— do que? O que aconteceu?
— o Felix me seguiu até em casa, deixei que ele subisse comigo para abafar a confusão que estava causando. Ele… a gente discutiu… eu bati nele, chan. Ele me tocou, me beijou. Eu me sinto tão sujo. Mesmo tomando banho isso não passa, eu não quero me sentir assim. — esfregava os olhos para parar de chorar, sua voz embargada pelo choro dolorido. Temia que o Bang o culpasse por aquilo, afinal, foi ele quem permitiu que o Lee subisse até seu apartamento. — me desculpa. — suplicou piedosamente, como se devesse um longo pedido de desculpa a ele e a jisung. — é tudo culpa minha, me desculpa.
— pare de se desculpar, isso não é sua culpa! — seu tom era agudo, mas não de raiva, como se controlasse alguma coisa dentro do peito que não pudesse expor naquele momento. Changbin se mantinha em prantos. — não é sua culpa, binnie, não é. É culpa daquele cara. Você não fez nada de errado e nem eu e nem jisung precisamos te perdoar de algo. Escute, tem alguma forma de entrarmos no seu prédio sem precisar passar pelo porteiro?
— acho que pela garagem. — disse baixo, acalmando-se.
— ótimo, estamos saindo daqui agora. Só preciso acordar jisung.
— você não…
— changbin, apenas desça para nós buscar, certo? Não pense em nada e nem faça nada além disso até chegarmos.
— tudo bem.
— vou ligar quando estiver chegando. Eu te amo, pequeno, daqui a pouco vamos estar aí.
— eu também te amo.
A ligação foi encerrada, seu choro involuntariamente cessou, mesmo que os rastros de suas lágrimas ainda estivessem por todo travesseiro e por suas bochechas. Se encolheu dentro das cobertas, sabia que o caminho era longo, gastaria em média uma hora e meia para christopher e jisung chegar. Era quatro da madrugada, mesmo tão cedo, o sol dava seus primeiros suspiros. Changbin desejou que tudo aquilo não tivesse passado de um sonho lúcido, mas infelizmente não era.
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