Capítulo 12 parte1
Heloísa
Um novo momento do meu passado me veio à mente. A idade exata do ocorrido era incerta, mas eu sabia que era parte da minha adolescência.
Eu cobria os meus braços arranhados numa camisa de flanela xadrez ao mesmo tempo em que tentava acompanhar os passos apressados de meu pai. Recordei que, por algum motivo, ele estava bastante desapontado comigo.
O local eram um aeroporto. Já tínhamos despachado as bagagens, passado no detector de metais e estávamos rumo ao nosso portão de embarque.
Avistei tio Soren e Hans. Lembro que me perguntei o porquê de meu primo estar presente naquela viagem. Senti a necessidade de cobrir ainda mais os braços, depois tentei esconder parte do meu rosto com mechas do meu cabelo e ajustei o boné em minha cabeça.
Quando estávamos nos aproximando deles, vi um Hans mais jovem, menos musculoso e com um corte de cabelo maior, que caía em sua testa. Nossos olhares se cruzaram, mas rapidamente cortei a nossa conexão. Não queria que ele me visse naquele estado.
Ao me ver, tio Soren me perguntou o que tinha acontecido comigo. Antes que eu pudesse responder, meu pai se manifestou dizendo que briguei na escola e que por sorte não fui expulsa. Mas estava suspensa por alguns dias. Ele falava tão abertamente sobre os meus erros, que a única forma de me proteger da vergonha foi abraçar o meu próprio corpo e olhar para o chão.
– Isso acontece. – disse meu tio, num sotaque bastante carregado. – Você puxou a mim. Nunca levei desaforo para a casa.
Ele tentou brincar e me abraçou de lado com o intuito de deixar o clima mais leve. Meu tio era uma pessoa extremamente calma. Essa característica era bem-vinda naquele momento. Sorri constrangida, sem querer falar nada.
Não me recordei qual era o nosso destino. Mas ao entrar na aeronave, apoiei a cabeça no encosto do meu assento e escondi ainda mais o meu rosto. Eu estava triste sim, mas o sentimento maior era o de revolta.
Chegamos numa cidade grande, bastante urbana, com praia e muito sol. Até que tentei ficar com minha camisa flanelada, mas o mormaço era tão sufocante que tive de amarrá-la em volta da cintura. Olhei para os arranhões, alguns grossos e em carne viva. Ao reviver essa situação, fiquei ainda mais confusa por não saber como aquelas feridas foram parar ali. Na verdade, havia muitas coisas confusas e sem respostas nessa lembrança, e uma delas era o motivo de estarmos naquele lugar.
Sentada no sofá da recepção do hotel, eu aguardava meu pai e meu tio terminarem de fazer o check-in. Foi quando ouvi a voz de Hans me tirar da introspecção:
– Quem te fez isso?
– Não te interessa. – falei com malcriação e saí de perto. Por alguma razão ainda incerta, eu estava com raiva dele.
Quando cheguei em meu quarto, percebi que era conjugado com o quarto do meu primo. Imediatamente tranquei a minha porta. Eu não queria a companhia de ninguém e por incrível que pareça, muito menos a de Hans.
Meu pai ligou para o meu quarto dizendo o horário em que sairíamos para o jantar. Falei que não queria sair e ele respeitou minha vontade.
Me sentia febril. Pensei que tomar um banho ajudaria a baixar a temperatura do meu corpo. Abri minha mala, peguei um conjunto de short e camiseta para dormir e fui para o banheiro. Tirei a roupa com cuidado, pois meu corpo estava dolorido. Minha pele arrepiou de frio ao entrar em contato com o ar.
– Meu Deus, estou horrível! – murmurei ao ver no espelho o hematoma roxo perto do olho esquerdo.
Após o banho, eu ainda me sentia fraca. Resolvi tomar um analgésico e me deitar na cama.
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Acordei com leves batidas na porta. Eu não sabia quanto tempo eu tinha dormido, mas percebi que já era noite. As batidas continuaram e, então, percebi que vinham da porta conjugada.
Hans.
Desejei estar longe dele. Fiquei calada sentindo frio debaixo das cobertas. Talvez ele desistisse de me procurar. Mas o que aconteceu foi o contrário.
– Abre essa porta, Heloísa! – ele falou alto e claro. – Sei que está me ouvido! Vamos, menina! Abre logo!
Eu não queria fazer o que ele pedia. Eu me sentia frágil em todos os todos os sentidos e essa impotência me causava vergonha.
– Anda logo, Heloísa!
– Não. Me deixa em paz. – resmunguei, me sentando na cama com dificuldade.
– Você sabe que não vou te deixar em paz.
– Por quê? Isso não é algo difícil de fazer. É só viver sua vida e me esquecer! – levantei e estremeci de frio.
– Preciso ver esses machucados. Estou preocupado. – sua voz soou um pouco mais calma. Mas ao invés de me alegrar com sua atenção, eu me enraiveci.
– Não sou seu estágio de medicina. – falei entredentes me aproximando da porta que nos separava. – Não sou seu maldito caso de estudo. Me diga, Hans, por que eu abriria a porta? Você disse várias vezes que não me ama! Principalmente da última vez, você foi bastante claro quanto a isso...
– Não confunda as coisas, menina. Quando você fala desse jeito, fica parecendo uma maluca! – ele me interrompeu. – Quantas vezes preciso falar que somos primos? Você é como se fosse minha irmã.
– Não somos irmãos! – gritei diante da porta. – Não somos nem mesmo primos de sangue!
– Heloísa, pare de desviar do assunto e me deixa entrar.
- Não! – falei com firmeza. O calafrio e a dor física se misturavam com diversos sentimentos desconhecidos.
– Abre agora! – sua voz ficou mais alta e ele começou a bater na madeira com força. – Você sabe muito bem que vou entrar de qualquer jeito!
A porta tremia com as batidas que ficavam cada vez mais fortes. Mas o que me fez ceder a insistência de Hans, foi ouvir sua voz num tom muito mais severo e ameaçador.
– Se você não abrir agora, eu vou jogar essa porta no chão!
Então, com muita cautela, destranquei sem girar a maçaneta. Imediatamente ele abriu a porta e me olhou da cabeça aos pés. O rosto vermelho e sua testa franzida mostravam o quanto estava nervoso.
– Senta na cama. – falou baixo e taxativo.
Respirei fundo e acatei a sua ordem. Hans acendeu a luz do abajur e se aproximou. Numa de suas mãos estava um tubo de pomada. Ele realmente estava preocupado com minhas feridas a ponto de comprar algo que as sanasse. Tal constatação encheu meus olhos de lágrimas. Eu não queria e não deveria chorar. Eu não me lembrava o motivo pelo qual eu me recusava a demonstrar tamanha vulnerabilidade. Talvez fosse o orgulho ferido pela rejeição do amor que eu oferecia a ele.
Ao agachar na minha frente, ele passou a pomada em meus joelhos esfolados. Depois se levantou e fez o mesmo com os arranhões espalhados por meus braços e pescoço. Analisou com cuidado o roxo que estava próximo do meu olho esquerdo. Com suas mãos em meu rosto ele enxugou algumas lágrimas que conseguiram escapulir.
– Como não vou te amar? Olha só as coisas que você vive fazendo por mim. – falei exatamente o que meu coração sentia.
Meu primo agiu como se não tivesse me ouvido. Continuou em silêncio por alguns instantes, mas depois perguntou:
– Tem outra parte do seu corpo precisa de pomada?
Neguei com a cabeça e desviei o olhar de seu rosto. Era esmagador demais ele não levar a sério o amor que eu sentia.
Hans soltou meu rosto. Um braço segurou as minhas costas e o outro passou debaixo das minhas pernas. Então, com agilidade, me carregou e começou a andar.
– O que você está fazendo? – perguntei assustada.
– Você não vai ficar sozinha. Vai dormir comigo. – falou sem demonstrar nenhuma alteração na voz. – Só não confunda as coisas aí na sua cabeça.
Ele me colocou com cuidado na cama, depois se deitou do meu lado e nos cobriu. Manteve o abajur do seu lado acesso. Foi então que me lembrei de um detalhe: Ele odiava dormir na completa escuridão. Eu não sabia o porquê.
Fechei os olhos, mas levei um tempo para pegar no sono. Quando ele pensou que eu já estava dormindo, ouvi ele perguntar baixinho:
– O que eu faço com você, menina?
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Quando a segunda lembrança terminou, percebi que os questionamentos aumentaram. Eu queria saber com detalhes o que tinha acontecido antes e o que aconteceu depois.
Peguei meu telefone, pronta para pedir ajuda. Mas desisti ao me lembrar que não via Hans desde o dia anterior, quando nos desentendemos dentro de seu carro. Ele não voltou para minha casa como havia combinado. Passei a noite de sexta-feira na esperança de receber pelo menos um telefonema que explicasse a sua ausência. Contudo, eu tinha noção do quanto as coisas estavam cansativas para meu primo. Não era fácil cuidar de uma pessoa amnésica, ainda mais se tratando de alguém como eu, que falava e agia sem pensar.
Respirei fundo tentando resolver meus conflitos internos sozinha. Em parte, consegui prosseguir e me distrair até o sábado acabar.
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Olá pessoal,
Sabe por que postei só um pouquinho desse capítulo? Porque quero mais comentários, rsrsrs. Então comentem e votem galera!
Até dia 21/08.
Naty
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