Capítulo 43: De volta ao lar
Kaylessa comia o restante dos biscoitos com um semblante calmo. Para ela, contar o seu passado não passava de uma mera recapitulação dos fatos, sem envolver sentimentalismo. Mesmo tomando os remédios e sendo supervisionada de perto pelos professores, ainda tinha oscilações de humor e a falta de emoções, em algumas situações, era comum. Fora as pessoas da sua equipe, todos a evitavam com medo de ver a elfa surtar e causar um massacre em plena aula. Porém, somente Ivy sabia que o gatilho da amiga para a sua violência era sacar as katanas.
As meninas conversavam com mais naturalidade minutos depois de ouvir toda a história da albina, porém Ririchiyo continuava em silêncio com um semblante pensativo. Ela sentiu um incômodo no peito ao saber tudo que Kaylessa passou, percebendo que precisava enfrentá-la mais uma vez para se fortalecer como guerreira.
— Vamos lutar.
A frase da shinigami ecoa interrompendo a conversa. Houka quase deixa cair a xícara enquanto Megumi piscava rapidamente os olhos confusa. Ivy sorria de forma sutil, levantando-se e focando em sua amiga que estava encolhida assustada.
— Kay, será bom você lutar.
— M-Mas e a hora do chá?
— Já está para acabar. — dizia conferindo a hora no seu relógio de bolso. — E acredito que será divertido.
A elfa raramente ia contra Ivy, pois a obedecia cegamente. Então, acenou positivamente com a cabeça seguindo Ririchiyo em direção à arena. Trifus e Kaito optaram por permanecer no refeitório enquanto as demais seguem para a arquibancada. Emily estava preocupada com a shinigami porque lembrou do resultado do último confronto das duas. Por outro lado, Megumi animou-se porque tinha a chance de analisar e aprender sobre o uso de espadas. Afinal, ainda precisava dominar a arma dada por sua mãe.
Ivy sentou-se na arquibancada balançando as pernas, seu olhar expressava total curiosidade.
As duas oponentes se encaravam e a elfa sorria gentilmente, puxando ambas as espadas para ficar em posição de combate; porém, Ririchiyo já estava na sua frente golpeando-a verticalmente. Kaylessa só teve tempo de fazer um "X" com as espadas, recuando há vários metros por causa da força da adversária. A shinigami rapidamente avançava, iniciando uma sequência contínua de golpes não dando brecha para a albina revidar.
Ainda assim, Kaylessa girava horizontalmente uma katana na tentava de acertá-la, mas a garota jogava-se para trás vendo a lâmina passar à poucos centímetros do seu rosto. O seu corpo caía lentamente no chão e, no último segundo, deu um mortal para trás chutando a mão da elfa fazendo-a jogar a sua arma para cima. Infelizmente, a albina deu um rápido salvo pegando a espada no ar.
Quando ia pousar no chão, recebeu um corte na barriga recuando alguns metros e viu o sangue sujar um pouco o seu uniforme. Ririchiyo permanecia com uma expressão indecifrável, avançando contra a oponente mais uma vez.
— A Chiyo-san está mais habilidosa! — exclama Emily surpresa.
— Ela deve ter treinado muito. — supõe Houka.
— Eu não diria isso.
— Por que, Ivy?
— A colega de vocês encontrou o que procurava: determinação. Um guerreiro com uma genuína determinação, é capaz de ultrapassar barreiras consideradas impossíveis. Eu creio que verão um pouco mais do poder dela.
Kaylessa também não facilitava, girando como um peão com os braços abertos e as katanas estiradas. A shinigami sorria de canto pois não cairia no mesmo truque duas vezes. Então, esperou a oponente estar próxima o suficiente abaixando-se no último segundo, golpeando a elfa na sua perna e a ouvindo gritar de dor. Ao se erguer, já executava um golpe vertical de baixo para cima onde Kaylessa defendia com uma espada – apesar da dificuldade – e usava a outra para tentar decepar a cabeça da adversária.
Para a surpresa de todas, Ririchiyo soltou a sua Zanpakutou com uma mão e antes da arma tocar o chão, ela a segurou com a outra – por estar mais próxima do alvo – causando um choque de lâminas.
Os movimentos de ambas eram quase imperceptíveis aos olhos humanos, o mais incrível é que nenhuma delas usava alguma habilidade além das suas condições físicas. Kaylessa também conseguiu atingir sua adversária, revidando os golpes com cortes por todo o seu corpo. Porém, Ririchiyo permanecia de pé e sempre encontrava uma brecha para contra-atacar. Então, minutos depois de uma sequência rápida de ataques, as duas são lançadas para as extremidades do campo. Em seguida, cada uma correu em direção à outra com suas respectivas armas em posição.
Megumi e Houka pararam de respirar devido à tensão. Era uma luta de guerreiras com fortes vontades de vencer e, maior ainda, desejo de provar para si mesmas o seu valor.
O choque de lâminas foi inevitável mas ninguém esperou que Ririchiyo abaixaria sua Zanpakutou, erguendo-a somente quando a oponente se aproximou demais. Então, no momento em que sua espada se ergueu, também subiu a katana de Kaylessa que, em consequência, voou no ar. A elfa reflexionou os joelhos para efetuar o pulo e recuperar a arma, porém a shinigami foi mais rápida e conseguiu desarmar sua segunda mão, girando agilmente o corpo e cortando-a na região do peito.
Kaylessa recuou assustada e mal teve tempo de pensar pois a lâmina foi apontada para a sua garganta.
— Fim de jogo.
Ririchiyo sentia uma grande satisfação interna por ter vencido a sua maior adversária no colégio. Agora, podia se considerar uma das alunas mais fortes sem receio algum; não somente por derrotar Kaylessa, mas também por ter compreendido um pouco mais sobre a sua força interior. Ela tinha a esperança de falar com Utau ao fim da batalha, por isso moveu o olhar em direção à Zanpakutou mas essa continuava inerte. Enquanto Emily se aproximava para elogiar o desenvolvimento dela, a expressão de decepção em seu rosto era evidente.
Ignorando todas as demais, Ririchiyo seguiu em direção à sala tendo consigo o fardo do fracasso. Por mais que desejasse comemorar a sua vitória, não se sentia realizada pois seu maior objetivo era reestabelecer a conexão com Utau.
— Eu preciso encontrar outra forma. — murmura para si mesma andando pelos corredores. — Ou perderei por completo a minha audição.
Megumi tentou acompanhar seus passos mas desistiu, sentindo Houka a puxar pelo braço com um sorriso bobo.
— Vamos, a Kaylessa está meio triste porque perdeu e ela disse que um abraço coletivo a ajudaria.
Particularmente, ela não tinha intenção de abraçar uma assassina em série mas faltava opções melhores. Além do mais, percebeu como Kaylessa não era de todo mal, apenas fruto da sua própria mente perturbada.
Enquanto voltava para a arena, olhou por cima dos ombros a silhueta de Ririchiyo sumir e sua curiosidade aumentou. Nesse colégio, cada aluno carregava uma história e a maioria delas parecia interessante. Quando Megumi descobriu o passado de Emily – mesmo que incompleto – sentiu empatia por suas dores, e agora se questionava: qual passado seria o próximo a ser revelado?
(...)
As férias chegaram mais rápido do que o esperado. Para a surpresa dos alunos, eles possuíram passe livre para sair do colégio, podendo visitar suas famílias e amigos. Caso não houvesse ninguém os esperando do lado de fora, deveriam permanecer trancados onde teriam atividades extracurriculares. Emily e Ririchiyo sentiram um certo receio porque não possuíam família as esperando.
Houka viu a apreensão das colegas e as convidou para ir na sua casa. Emily aceitou sem pensar duas vezes, Megumi pensou um pouco mas não tardou a aceitar, porém Ririchiyo estava um pé atrás com essa decisão. Mesmo assim, optou por segui-las por ser melhor do que ficar dentro daquele colégio.
As quatro foram para Kyoto mas não, especificamente, para a cidade. Elas se afastaram da região, indo além dos limites territoriais e caminhando por um vasto campo gramado. Emily sentia-se liberta por estar longe do colégio e de toda a pressão para despertar os poderes. Megumi encarava sutilmente a rosada, querendo saber o porquê do seu semblante tenso. Ririchiyo permanecia inexpressiva, caminhando com as mãos dentro dos bolsos da calça preta que usava.
Ao pararem na frente de uma simples cabana, Houka dava duas leves batidas na porta e engole seco. Uma mulher de longos cabelos ondulados rosas surgia, rendendo exclamações surpresas das demais garotas. As mechas tocavam abaixo da sua cintura e os olhos azuis cintilavam majestosamente, refletindo a luz solar. Ela usava uma bota de cano longo preto por cima da calça verde cana que possuía listras marrons na vertical. A parte superior de uma roupa era uma camisa preta colada ao corpo e um longo sobretudo verde cana, tocando o chão. As pontas do sobretudo eram rasgadas propositalmente, como se demonstrassem o desgaste do tempo. A peça subia até sua cabeça em um capuz de mesma tonalidade. Ao abaixá-lo, percebem os traços delicados de seu rosto.
— Oi, mãe...
— Filha!
Maeka Kikuchi não pensava duas vezes em abraçar forte a sua filha, apertando-a carinhosamente contra seu corpo. Os meses passaram-se como longos anos para a mulher, pois não havia um dia sequer que não se preocupasse com sua filha. Houka tentou miseravelmente segurar as lágrimas mas elas já caíam sem sua permissão, então retribuiu o abraço soluçando baixinho.
— Senti sua falta, Houka...
— Eu também senti a sua, mãe...
— Encontrou o que procura? — questiona afastando-se um pouco e segurando as mãos da filha.
Houka não pôde deixar de notar as luvas pretas na mão da mulher, onde a parte dos dedos era exposta. Maeka sempre soube se arrumar, o seu senso de moda é impecável e causava inveja até a mais bela modelo.
— Infelizmente não... Perdão...
— Não se cobre tanto assim, você vai conseguir quando menos esperar. — dizia apoiando a mão no rosto da filha, fazendo uma leve carícia até notar a presença das demais. — Oh! Trouxe amigas?
— Elas não são exatamente minhas...
— Sejam bem vindas a minha humilde casa. Sou Maeka Kikuchi, a mãe da Houka.
— Prazer, Megumi.
— Emily.
— Ririchiyo.
Após as devidas apresentações e cumprimentos, Maeka as conduzia para o interior da cabana. Do chão ao teto, quase tudo era feito de madeira como se estivessem diante de uma construção da Idade Média. A lâmpada envolta de um casulo artesanal de palha, alguns sinos presos no teto e a cozinha estava uma completa bagunça, repleta de plantas e órgãos de animais espalhados pela mesa.
— Acho que chegamos em uma péssima hora. — murmura Emily para Megumi que apenas concorda com a cabeça.
— Ficará definitivamente, filha?
— Não, o colégio nos deu férias.
— Colégio?
De fato, os alunos eram selecionados no colégio através do anonimato e ninguém do mundo exterior sabia sobre a existência da instituição. Maeka sinalizou para as meninas se sentarem no simples sofá rústico no canto da sala, perto da janela onde dava acesso à bela visão do campo gramado.
— É uma longa história, mãe.
— E quanto tempo passará aqui?
— Fomos liberadas por apenas uma semana.
— Que rígido.
Você nem faz ideia, pensa Megumi.
— Então, eu aposto que estão com fome. — Maeka quebrava o estranho silêncio de longos minutos. — Eu estava terminando uma poção mas posso deixar para depois.
— Poção? — questiona Emily curiosa.
— Sim. Eu sou uma bruxa especialista em poções e feitiços de contenção.
— Que incrível!
— Você acha? — sorria envergonhada. — Sou a responsável por cuidar das florestas da região, então não saio muito de casa. A vantagem é que posso testar qualquer tipo de experimento sem ser incomodada.
— Deve ser uma missão difícil. — comenta Megumi.
Ririchiyo continua calada tentando entender a conversa, pois a sua audição tendia a piorar. A mãe de Houka analisou cuidadosamente o seu rosto e a shinigami fez o mesmo, vendo uma certa semelhança naquela mulher.
— Pequenina, como você cresceu!
— Mãe, você a conhece?
— Sim, eu a encontrei nas ruas com fome e toda suja.
Maeka aproximava-se de Ririchiyo, ajoelhando-se até estar na mesma altura já que a garota estava sentada. Em seguida, tocava sutilmente seu rosto com um sorriso gentil e Ririchiyo recua um pouco, mantendo o semblante frio.
— Parece que você mudou...
— A minha audição... Ela...
— Desculpa, o meu feitiço acabou perdendo o poder com o tempo.
— O que está acontecendo, mãe?
— Ela é surda.
Essa frase deixava as três jovens surpresas, todas pensavam que a falta de comunicabilidade da shinigami era uma opção dela. Ririchiyo apenas abaixou a cabeça, sentindo a vergonha tomar seu íntimo pois odiava quando sua condição era revelada. Maeka observou tudo compreendendo a situação e caminhou em direção à mesa bagunçada.
— Infelizmente, é um feitiço de mão única. Eu não posso lançar novamente na mesma pessoa.
Mesmo Ririchiyo sendo a pessoa mais imparcial de todas, não conseguiu ocultar a expressão de tristeza. Quando não podia ouvir, os seus dias nas ruas foram como anos no próprio inferno.
— Não há alguma forma de restaurar a audição dela? — pergunta Emily preocupada. — E por que não contou para a gente que é surda?
— Porque não é da conta de vocês.
— Somos uma equipe, tudo que acontece com você é da nossa conta. — repreende Megumi séria.
— Então, por que não nos conta sobre o seu passado? — rebate Ririchiyo ficando de pé abruptamente e parando frente à frente com ela. — Ou há algo que queira nos esconder?
Megumi engoliu seco diante de tamanha intimidação mas não ousou desviar o olhar. Pelo contrário, sacou sua espada pronta para fatiá-la ali mesmo. Em contrapartida, Ririchiyo segurava firme o cabo da Zanpakutou para tornar a oponente em picadinho. Houka recua assustada, encostando-se na parede enquanto Emily ia ao seu encontro.
— Houka-san, precisamos fazer alg-...
A voz de Emily era cortada pela cena a qual presenciou. Duas bolhas verdes de água prendiam ambas guerreiras e resistia aos seus ataques. Maeka estava com a mão esticava para frente e mantinha o mesmo semblante descontraído, afinal raramente perdia a calma em uma batalha.
— Ora, ora. Por que tanta raiva? Vamos apreciar a beleza da natureza. — comenta vendo as duas se debatendo por causa da falta de ar. — Estamos de acordo, não é?
Após acenaram com dificuldade, Maeka desfaz as bolhas d'água e as duas caem sentadas no chão, estranhamente secas. Megumi não pôde deixar de pensar sobre o poder daquela mulher.
Ela é forte!
— E-Eu vou tomar um banho. — comenta Houka subindo rapidamente as escadas para cortar o clima tenso.
Maeka estalava os dedos, criando um mini buraco negro que sugava toda a bagunça da cozinha e logo sumia. Em seguida, sentou-se no sofá soltando um longo suspiro.
— Desculpa, eu não queria usar meus poderes em vocês mas eu não tive escolha.
— Tudo bem. — as duas dizem em uníssono.
— Ela era linda.
O comentário de Emily prende a atenção das demais. A denker segurava um porta retrato onde havia a foto de uma jovem – de aproximadamente vinte anos – de longos cabelos azuis, presos em cada lado por fitas douradas. Ela estava com os olhos fechados e um sorriso bobo nos lábios, além das bochechas ruborizadas. As suas roupas eram semelhantes às da Houka, mudando a cor já que a moça da foto optou pelo tom azulado.
Maeka olhou de canto para aquela imagem, sentindo uma dor esmagadora no peito. Uma lágrima teimosa surgiu mas tratou de secá-la antes de ser notada.
— Quem é ela? — questiona Megumi curiosa, aproximando-se para ver de perto. — Parece muito com a Houka.
— É a minha filha Kaori. Ela faleceu há quase dois anos atrás...
— Meus pêsames.
— Houka-san deve ter sofrido tanto. — comenta Emily com pesar na voz. — E ainda é a alegria do nosso grupo.
— Ela é uma garota incrível. Eu não sei como suporta tanta dor, já que viu a própria irmã morrer em seus braços.
— Que horrível...
— E como ela morreu? — pergunta Megumi.
— Ela...
Maeka estava em dúvida se deveria contar ou não, até porque a história era complexa demais. Então, a melhor opção era omitir detalhes.
— Ela foi atacada por bruxas usuárias da magia negra.
Megumi ponderou as palavras da mulher, tentando entender a história pois sabia que Houka usava magia negra mas a sua mãe não. Com base no pouco conhecimento decorrente das aulas de raças, ela sabia que a rosada precisou vender cometer um sério pecado para obter os poderes. Infelizmente, precisou conter a vontade de perguntar pois Maeka as chamou para a ajudarem no jantar.
Houka ouvia tudo sentada nos primeiros degraus da escada, sentindo as lágrimas inundarem o seu rosto. Ela queria contar a verdade, mas sabia que nunca seria aceita entre as colegas do seu time.
(...)
Não muito longe dali, uma mansão encontrava-se cercava pelo vasto campo gramado. As suas paredes pareciam ruínas devido à idade, mas continuavam conservadas mesmo com o musgo verde em algumas partes. Uma escadaria oval estava na frente da residência com um leve gramado em sua superfície. Os dois andares em estilo rústico com sacadas greco-romanas de gesso.
Uma silhueta alta e corpulenta aproximava-se jogando os quadris para os lados. Ela possuía longos cabelos brancos e volumosos que tocavam sua cintura. Os olhos escarlates analisavam o local com um sorriso de canto. A sua pele morena ganhava destaque à luz da lua, junto com os braceletes de ouro em cada braço. A mulher usava uma saia túnica branca de tecido fino, arrastando-se pelo chão como o véu de uma noite. A peça de roupa estava presa por um cinto de ouro onde no centro havia um losango de pé. A parte superior era um top da mesma cor e tecido no tamanho de um sutiã e as bordas feitas de ouro. A região central presa por um losango deitado como enfeite. Ela não usava sapato algum por achar desconfortável.
Misteriosamente, a grande porta de madeira abria-se sem que ela precisasse bater e a albina seguiu diretamente para a sala de reuniões no segundo andar. A mesa redonda de madeira com estofado vermelho em sua superfície estava rodeada de cadeiras, porém apenas duas delas eram ocupadas. O primeiro presente era um homem de longos cabelos negros tocando sua cintura, as pontas levemente cacheadas e havia uma faixa azul escura ao redor da cabeça. Ele não usava nenhuma camisa, expondo as diversas tatuagens coloridas em ambos seus braços. Algumas delas eram dragões e desenhos de animais. O misterioso ser usava uma calça folgada branca.
— Demorou, Karin. — ele repreende erguendo o braço onde uma águia pousava nele.
Ela revira os olhos apoiando as mãos na cintura.
— Eu recebi algum convite com as horas? Ah, não. Eu fui ressuscitada dos mortos e sem noção de espaço. Então, o atraso é mais do que justificado, Dante.
— Discussões são desnecessárias. — uma voz masculina ecoava pelo local.
Após se manifestar o terceiro homem se ajeitava na cadeira, movendo cuidadosamente a taça em sua mão. Ele tinha o porte físico maior do que Dante mas não tão musculoso, apesar dos atributos físicos melhorados, oculto pelo terno preto. O seu longo sobretudo preto quase tocava o chão, combinando com a bota da mesma cor e a gravata. Quando ele inclina a cabeça para o lado, é perceptível o brinco vermelho de tamanho mediano. O seu cabelo preto tocava a nuca, possuindo um corte mais "informal" mesmo com os fios lisos e macios. A pele tão branca como se estivesse morto mas seus olhos vermelhos indicavam o contrário.
Vladmonteir Lawford II odiava discussões, principalmente em seu horário mais ativo: a noite.
— O nosso feiticeiro conseguiu ressuscitá-la, Karin. — comenta Vladmonteir bebericando o líquido vermelho em sua taça. — Mas foi difícil.
— Não me culpe. Eu fui chutada para o lado mais obscuro do inferno, vendo coisas horríveis e sendo alvo de todo tipo de tortura. — dizia com o olhar vazio. — Mas Lúcifer me resgatou daquele lugar e me levou para o seu castelo, onde pude servi-lo por alguns séculos. De qualquer forma, não viemos aqui falar sobre minha fodida alma queimando, quero saber porque as madames demoraram tanto.
Karin se sentava ao lado de Dante que continuava acariciando a sua águia.
— Não é fácil abrir um portal.
— Eu sei, Vlad, mas...
— Se sabe, o silêncio será a sua melhor arma. — ele a cortava. — Nós precisamos dos três instrumentos profanos para abrir o portal. Por sorte, o Dante encontrou um feiticeiro capaz de ressuscitar uma alma do inferno e escolhemos a sua.
— Ótimo. Pelo menos, percebo que usam a cabeça. — Karin comenta com um sorriso de canto. — Não estou entre derrotados. Então, todos temos os mesmos objetivos?
Os dois assentem com a cabeça.
— Qual o primeiro artefato?
— O amuleto de Abaddon.
— Interessante. Eu suponho que vocês não saibam, então por isso me chamaram.
— Você é a última integrante do grupo.
— Cheguei na parte boa da festa. Pois bem, se me permitem... Ou não permitindo, foda-se. Eu farei.
Karin subia na mesma ignorando o fato da sua saia ser aberta dos dois lados e não usar calcinha. Ela abria os braços recitando um feitiço antigo em latim e fechou os olhos. Do outro lado do país, o túmulo da mulher tremia e debaixo da terra saía uma varinha de madeira. O objeto voava em alta velocidade, atravessando as cidades até parar na mão da sua dona. Karin voltava a abrir os olhos deixando-os com um brilho vermelho e movia sutilmente a varinha.
— In Deo Mortis, ad causa chao. (1)
Nada acontecia, pelo menos naquele lugar.
— O que você fez? — pergunta Dante confuso.
— Achou que eu sujaria minhas mãos para conseguir o amuleto? Que idiotice, eu não preciso disso. Então, mandei meus novos servos fazerem isso.
Karin sorria satisfeita descendo da mesa e murmurando outro feitiço, esticando a mão para frente. Um holograma surgia na frente dos três, os limites do país eram desenhados por luzes negras formando um mapa de grande escala. O brilho vermelho de seus olhos se intensificava enquanto ela continuava a recitar:
— Cantatio locus. (2)
No mapa, a cidade de Kyoto era marcada por uma sutil luz vermelha. Então, a mulher voltava a se sentar.
— O amuleto está lá, na posse de uma bruxa de magia branca. — comenta estalando os dedos e a imagem de Maeka aparece no holograma. — O seu nível de poder é baixo, fiz certo em não mandar mais do que dois serv-... — ela parava de falar analisando o holograma, aproximando-o com o seu poder até visualizar Houka conversando com a mãe antes de dormir. — Essa pirralha...
— Eu consigo sentir a sua energia negativa. — dizia Vlad sem demonstrar expressão alguma. — Seria uma serva de Lúcifer?
— Não, ela tem um certo nível de "pureza" não condizente com o fluxo de energia demoníaca.
— O que quer dizer com isso, Karin?
Dante tentava entender a linha de raciocínio dos seus companheiros, mas não conseguia.
— É difícil explicar, mas é melhor matá-la antes que se volte contra nós.
— Acha que não dá conta dela?
— Claro que dou, mas não gastarei o meu poder com batalhas desnecessárias. Por que eu vou desperdiçar tempo e energia lutando com um oponente mais fraco do que eu quando posso ficar mais forte? Ou quando posso conseguir os outros artefatos? Não sou uma criança brincando de malvada, sou uma mulher sensata.
Vlad erguia o olhar em sua direção, sorrindo friamente enquanto bebericava o líquido sem tirar os olhos da mulher. Karin possuía uma autoconfiança invejável e não era prepotência, porque ela sabia do seu próprio poder.
— Querida aliada, como iremos acabar com ela?
— Eu consegui invadir as memórias dela e vi algo interessante. Acho que um terceiro servo será mais útil.
Então, usava o seu poder mais uma vez imaginando como seria divertido assistir o caos que causará.
Dentro da floresta de Kyoto, havia um túmulo entre as belas árvores. Misteriosamente, uma mão saía de dentro da terra e os dedos abriam caminho para o corpo sair.
*(1) = Em nome do Deus da morte, venham causar o caos.
*(2) = Feitiço de localização
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