• VINTE E CINCO • ANDRÉ
Estou ganhando um amigo.
A verdade dessas palavras me faz esboçar um enorme e luminoso sorriso. Um que é tão grande que minhas bochechas tem câimbras pelo tempo que o tenho no rosto. As coisas entre Pedrinho e eu estão em uma zona um tanto neutra. Desde aquela noite que pulei quase dois metros de distância para longe dele, que não demos nenhum passo a mais em nosso "relacionamento". Ou posso dizer envolvimento. Sei que fui muito extremista em me negar a retirar minhas roupas diante dele mas foi apenas um modo de defesa.
Ainda me lembro do seu corpo bem junto ao meu, do calor de sua pele clara, as ondulações de seus músculos, o brilho intenso em seus olhos, o toque de seus dedos em mim, o gosto de seu beijo, a fome e desejo que consumia a nós dois. Tudo. Então eu com minha insegurança estragos tudo. Esfriando as coisas entre nós. Não esperava pela compreensão dele, de sua amizade tão verdadeira. Na verdade, tem tempo que não espero nada das pessoas ao meu redor. Mas ele tem me mostrado que há pessoas boas no mundo. Ainda que poucas.
A cada troca de mensagens nossa e ligações extensas em diversas horas do dia, a esperança em mim floresce como um campo de flores cultivado com todo amor. Sei que Pedrinho é diferente, acredito que não teria tanta sorte encontrar outro igual em outro lugar. Por isso coloquei em minha mente que irei trabalhar esse aspecto em minha vida. Meu tio disse que eu precisava de ajuda, só não imaginava que era tão verdade.
O pânico que me tomou quando me imaginei nu diante dos bonitos olhos dele, me fez pensar se ele sentiria nojo de mim. Minhas marcas são tão profundas que tocam minha alma. E eu não fazia a mínima ideia disso ou eu apenas escolhi não enxergar.
Um toque sutil na porta me arranca de meus pensamentos. A cabeça de cabelos castanhos lisos de Luiza surge a partir dela. O olhar cobiçoso que direciona a mim é quase opressivo. Retiro meus óculos para leitura, colocando - os sobre a mesa. Há papéis por toda a parte.
- Com licença, está na hora do meu almoço. Posso sair ou vai precisar de mim para mais alguma coisa? - verifico as horas em meu celular, praguejo baixinho ao ver que já se passaram quase meia hora do horário dela.
- Está liberada. - passo meu dedo indicador entre minhas sobrancelhas. - E me desculpe, não vi que era tão tarde!
- Eu também meio que me perdi no horário hoje também. - olha ao redor, mordiscando o lábio inferior que ostenta uma nova camada do batom vermelho vivo que usa diariamente. - Queria te fazer um convite.
- Sim?
- Quer ir almoçar comigo lá no Otto? A comida lá é ótima. Já teve a oportunidade de ir lá?
- Tive o prazer de conhecer e comer lá. Além da comida que é maravilhosa, o atendimento também é de primeira.
- Então vamos? - a animação em sua voz é quase contagiante. Com um sorriso de desculpas, pego meu celular, carteira e óculos escuros. Me levanto com uma ideia em mente que só vai agradar a um de nós
- Sinto muito, fica para a próxima. Já tenho compromisso para o almoço. - o sorriso luminoso em seu rosto cai drasticamente. Me sinto mal por um momento.
- Oh, tudo bem! - arruma a postura. Pigarreia levemente e coloca alguns fios de cabelos soltos no lugar. - Então, estou indo!
Aceno lentamente, enquanto a vejo ir, verifico as janelas e a porta dos fundos. Saio de minha sala a passos largos, passando pela mesa de minha secretária encontro o computador ligado. O desligo rapidamente, tranco o escritório, entro em meu carro e dou partida com um destino em mente. E que Luiza me desculpe, vou almoçar sim no Otto mas não com ela.
Quando sai do escritório com uma missão em mente e com uma determinação que surpreendeu a mim em muitos níveis. Eu apenas dirigi o mais rápido que consegui, torcendo para que ele aceitasse meu convite. Estacionando em frente ao seu local de trabalho, um pouco de minha coragem de esvaiu como água descendo pelo ralo. E se ele já tiver um compromisso? Bem, terei de saber perguntando.
Entro sendo recebido pela brisa fresca do ar condicionado, o piso lustroso e claro conferem ordem ao lugar. A moça que atrás de um balcão extenso de mármore branco acena sutilmente para mim. Os cabelos escuros longos, o rosto magro, o corpo em forma e lembram da mesma moça que acompanhava Pedrinho na padaria muitas semanas atrás. Bem, essa deve ser Layla. Com ambas as minhas mãos em meus bolsos, me aproximo lentamente. Ela termina de falar seja o que for ao telefone dedicando toda a sua atenção a minha pessoa.
- Boa tarde, em que posso ajuda - lo?
- Boa tarde! Pedro Bianco está? - seu olhar me percorre de cima a baixo.
- Quem deseja? - curiosidade é nítida em seu tom de voz.
- André! - é ouvido alegremente. Antes que ele chegue, seu perfume que virou meu preferido me arrebata.
- Pedrinho. - com todo o seu jeito aberto de ser, já estou sendo envolvido por seus braços. - Vim te fazer um convite. Já almoçou?
Se separando de mim aos poucos, ele nega com uma careta em seu bonito rosto. - Não! Pensei que nem tempo para isso daria!
- Dá sim!
- Layla!
- O que? - joga um olhar em minha direção. Faz gestos rápidos arrancando sorrisos dele.
- Me diga sobre esse convite!
- Só queria comer tendo sua companhia! - dou de ombros.
- Já tem! Estou morrendo de fome e não dará tempo de ir em casa almoçar.
- Posso te esperar aqui então?
- Deve! Só vou buscar minha bolsa! - ganho um beijo estalado no rosto.
Ainda estou acariciando esse lado do meu rosto quando ele retorna. Sua bolsa de lado parece estar pesada, mas quando ofereço ajuda para leva - la, ele dispensa educadamente. Nos despedindo da moça, seguimos em direção a Otto. A curta viagem foi feita em silêncio, mas não me incomodei em preenche - lo, estar no mesmo ambiente que ele já é recompensador. Não há necessidade de palavras em todo o tempo, quando somente sua companhia já me basta.
Enquanto procuro uma vaga para estacionar, Pedrinho vai na minha frente em busca de uma mesa para nós. Hoje o restaurante está abarrotado de pessoas. Depois de encontrar uma vaga no final do pequeno parque de estacionamento, entro no lugar e sou recebido pela mistura de ares quente e frio. Avisto Ivana que acena animadamente para mim, com um sorriso apertado ergo minha mão acendendo de volta. Ela vem até mim.
- Oi André! Como vai? - os olhos verdes vivos estão atentos em meu rosto.
- Vou bem Ivana e você?
- Mais do que bem! O que fará na sexta que vem?
- Até o momento nada!
- Quer jantar com seu pai e eu? - quase saltita em seu lugar. A animação dela é tão bonita e forte que contagia. Ivana se provou ser uma mulher que está além da beleza. Tudo nela grita bondade e estou feliz que meu pai a encontrou.
- Olha....- passo meu dedo indicador entre minhas sobrancelhas.
- É só um jantar! Não um casamento! - ri baixinho. Aperto seu braço suavemente.
- Tudo bem! Eu gosto muito de doces só para deixar registrado! - pisco um olho em divertimento.
- Vou encomendar com minha amiga Lili! A mulher é uma deusa nessa área.
- Bem, já me ganhou! - olho ao redor em busca do homem que tem invadido uma grande parte de meus pensamentos. As vezes além da conta.- Viu Pedrinho por aí? Ele entrou primeiro do que eu dizendo que iria pegar uma mesa para nós.
- Oh, ele está na nossa nova área. Como houve um considerável aumento na clientela, tivemos que aumentar um pouco mais o lugar. Assim poderíamos atender a todos com comodidade. - Vou leva - lo lá, tudo bem?
- Me guie então!
Nem cinco minutos depois de deixarmos a entrada do restaurante, entramos na parte traseira. Me lembro que aqui era apenas um espaço com uma grama bem cuidada. Mas as enormes janelas que vão do teto ao chão, as mesas quadradas dispostas de modo que nenhum cliente se sinta oprimido por outra mesa e a música baixa que toca contam outra história.
- Ficou bonito e arejado aqui. Fizeram um bom trabalho.
- Vou dizer ao meu pai. Ele estava um pouco inseguro em relação a isso.
- Diga a ele que deu muito certo. Acho que esse será meu lugar preferido.
- Olha lá, aquele lindo já te viu! Se senta que vou pegar os cardápios. - me dá um empurrãozinho. Rindo sutilmente, me sento de frente para Pedrinho. Ele tem um grande sorriso no rosto, olha ao redor e indica com as mãos.
- Ficou tão bonito aqui não é?
- Sim, fizeram um bom trabalho. Ivana me disse que o pai estava inseguro com relação a abertura dessa parte.
- Vou ter que dizer a ele que fez um ótimo trabalho.
- Ele ficará feliz.
Bebe um pouco de sua água. Algumas gotas de água se fixam em seus lábios e a vontade imensa de lambe - las para fora é quase alucinante. Pigarreio gravemente e me ocupo da minha água também.
- Como a menina está?
- Ótima! Crescendo forte a cada dia que passa. Ela ganhou quase um quilo e meio, acredita?
- Sim, vocês fazem um ótimo trabalho cuidando dela. - sua face se ilumina como céu repleto de fogos de artifício.
- Tentamos não é! Ainda acho que Manu não deveria ter nos deixado. Sinto falta dela.
- Ela não será esquecida por vocês, eu tenho certeza disso. Não a conheci tão profundamente quanto você ou sua família, mas ela era uma boa pessoa. - a alegria se extinguiu um pouco de seus traços. Emendo outro assunto para dispensar esses pensamentos obscuros. - Quem fica com ela quando está no trabalho?
- Quer uma lista?
- Há uma? - ergo uma sobrancelha realmente curioso. Sua mão aperta a minha sobre a mesa, meus olhos estão voltados para esse gesto.
- Pode apostar que sim! De segunda a sexta cada uma ficaria um dia com ela. Como estava receoso de voltar a trabalhar e deixa - la com uma estranha, ainda que seja uma enfermeira que Isabela me recomendou. Não estava a vontade. Então dois dias atrás enquanto limpava meu peito da sujeira que Ella fez em mim, seu quarto foi invadido pelas tia e minhas avós. Até vó Moira marcou presença.
- Moira?
- Oh, mãe do meu pai Henrique! Ela mora aqui mas não saia muito por causa de uma queda que teve sua perna de molho por um mês inteiro.
- Como disse, você tem sorte de ter sua família ao seu lado.
- Você parecia muito a vontade com Ivana. Se conhecem desde quando? - ele não diz com malícia nem nada do tipo. Somente curiosidade pura e simples.
- Ah, ela namora meu pai!
- Oh, sabia que conhecia aquele homem de algum lugar.
- Onde o viu?!
- Aqui mesmo. Ele é sua cara, me senti olhando para você anos lá na frente. - diz pausadamente.
Ivana traz os cardápios e optamos pelo especial da casa. Enquanto a música soa baixa, me permito ser embalado pelas notas suaves e encantadoras da música. Mesmo que estejamos em silêncio, esse não é constrangedor ou pesado. Só é um adicional, creio que não preciso ter um monólogo ensaiado quando estou com ele. Tudo se torna tenro e suave.
- Você tem uma boa relação com seu pai?
- Não tinha.
- Agora tem? - se inclina sobre a mesa.
- Estou tentando.
- Isso é bom! Já é um começo não é? - seu dedo indicador alisa a borda do copo distraidamente. Bem, não tenho vontade de falar sobre meu pai mas se ele quiser falar de rosquinhas estou dentro.
- Nós nem sempre foi assim. Nós costumavamos pescar. Eu fingia não me lembrar desses tempos, pois eram a lembrança fiel e crua do que perdi entende. E fiz o mesmo quando ele chegou a cidade e foi me procurar. Fomos pescar mas fiz como se fosse a primeira vez. - digo distraidamente acompanhando seu dedo. Nunca disse isso para ninguém, nem para meu tio e me surpreende que eu faça logo com Pedrinho. - Isso faz de mim uma pessoa ruim?
- É muito cedo para julgar. E nem eu ou ninguém tem o direito de te julgar sabe? Cada um sabe das dificuldades que vive. Eu tive a sorte de nascer em uma família que me aceita como eu sou. Mas há tantos que não são aceitos, são agredidos e expulsos de casa. É triste ver como o ser humano trata seu igual. Então, não te acho uma pessoa ruim. Para você ter esse distanciamento todo em relação a seu pai, alguma coisa aconteceu.
- Coisas da vida! - dou de ombros como se não fosse importante. - Mas me conta, o motivo da sua tensão no museu.
- Ah, você notou? - me olha simplesmente.
- Você parecia bem preocupado.
- Houve um furto de um artefato no museu. Então a polícia teve que ser chamada, fomos interrogados e uma investigação vai ser instaurada, pois parece que foi feito por um interno.
- Nossa, a história sendo saqueada. Olha, do ser humano não espero mais nada.
- Mas vai dar tudo certo no final. Acredito nisso.
Sorrimos quando a comida chega. Agora nosso silêncio é bem vindo. O almoço foi melhor do que imaginava, a comida estava maravilhosa como esperava e quase no final da refeição, tivemos a companhia de meu pai. Ele estava radiante, como tem estado desde que começou seu relacionamento. O vejo renascer diariamente e é bonito de se ver. Acabei chamando Pedrinho para ir comigo a esse jantar, ele nem ao menos piscou. Aceitou com um sorriso no rosto. Agora estava ansioso por esse encontro por outros motivos.
[....]
Paro em frente ao seu local de trabalho permanecendo com as mãos segurando o volante, meus dedos estavam brancos tamanha a força empregada no ato. Estava me segurando para não agarra - lo, beijar sua boca de forma quase punitiva e me enrolar em seu corpo malhado. É demais para mim. Com um suspiro baixinho, indico com meu queixo.
- Está entregue! - observo - o se desfazer do cinto de segurança habilmente. O sorriso que traz em seu rosto é quase ofuscante, me deixando feliz por ser o responsável por te - lo colocado ali.
- Obrigado pelo almoço, me ajudou a me distrair um pouco.
- Então eu sou uma distração?
- Digamos que sim!
- Uma boa ou ruim? - deixando sua cabeça cair para trás por alguns instantes, olha o teto do carro para logo voltar sua atenção para mim.
- Uma bela distração eu diria!
- Aceito esse meu novo título então! Já quero agradecer desde já por ter aceitado ao meu convite.
- É muito cedo para conhecer sua família mas faço esse sacrifício. - diz com humor.
- Não vai se arrepender!
- Eu sei!
Me desfazendo também do meu cinto de segurança, meu corpo inconscientemente se inclina em direção ao seu, parecendo ser atraído como um ímã. Vejo - o engolir em seco, a língua rosada sai para umidecer os lábios finos mas que me marcaram como nunca. Pigarreio gravemente de repente com minha garganta apertada, somente com meus olhos, traço as linhas rígidas de sua clavícula exposta pela maldita blusa dois números menores que ele. Estamos respirando o mesmo ar, seu cheiro é embriagador.
- O que acontece com suas camisas? - solto de repente. As sobrancelhas escuras como a noite se franzem, piscando algumas vezes, observa o tecido em questão.
- Pensei que me beijaria!
- Eu vou mas... primeiro responda! - pedi realmente interessado em sua resposta. Um segundo apenas se passa então ele simplesmente gargalha alto, a cabeça jogada para trás, posso ver seus dentes brancos que compõe seu perfeito sorriso assassino.
- Você me diverte sabia?
- Não mas é bom saber!
- Não há nenhum problema com minhas camisetas ou blusas. Gosto delas assim. - dá de ombros.
- Dois números menor que seu corpo?
- Sim, agora pode por favor me beijar! Senti falta dessa sua boca gostosa!
Resmungando como um velho senil, amaldiçoando suas blusas que o deixam muito bonito para minha própria sanidade, termino com o espaço entre nós, tomando sua boca na minha, me permito curtir o momento. De sua língua buscando pela minha, de seu gosto me acendendo por inteiro e de seu corpo quase se fundindo ao meu. Não sei o que somos ou o que seremos. O que começou com uma discussão pode ser muito mais do que esperava ou precisava. É arriscado para ambos, nossos corações estão na mira do destino. Eu tinha que estar com medo mas somente o que sinto é a sede de me render completa e exclusivamente para esse homem que aos poucos tem conquistado um lugar em meu coração onde poucos são permitidos estar. Mas que ele invadiu sem pedir licença, estabelecendo morada aqui, tocando e transformando tudo ao redor.
O medo já não é o meu adversário afinal de contas, mas sim o sentimento que vem crescendo aos poucos em mim. A questão é: se estou sentindo sozinho?
Último do dia.
06/08/2019
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