• DOIS • ANDRÉ
Não sabia o que porra havia acabado de acontecer, eu nunca tinha tratado nenhum desconhecido daquela maneira tosca que fiz. Confesso que fui um babaca com aquele rapaz. Eu deveria como tio Mikael me ensinou, ser ao menos educado e ter agradecido por ter me entregue o bagunceiro do meu pequeno cão. Bem, o contrário aconteceu.
Enquanto faço o caminho de volta, a noite clara e fresca me acalma a medida que me aproximo da casa do meu tio. Beijo os pelos recém lavados de Aquiles, mas me arrependo. Ele cheira a vinho puro, então a raiva volta a me dominar novamente. O rosto incrédulo do homem sem nome invade minha mente, suas bochechas com uma barba rasa vermelhas de raiva e seus gritos indignados.
Eu odeio bebidas e cigarros, pois foram essas drogas malditas que acabaram com minha vida. Não que eu vá obrigar as pessoas ao meu redor a parar de beber ou fumar por que simplesmente eu não gosto. Todos nós temos o direito de escolha, e o daquele rapaz assim como outras pessoas, é beber. Só de me lembrar que ele estava cheirando a bebida, me embrulha o estômago, Aquiles balança sua pequena calda freneticamente louco para ir para o chão mas não permito, ele já aprontou demais hoje.
Chego em casa verificando seu pote de água e ração. Ele anda ao redor de mim ansiosamente, dou uma risada baixa para sua pressa sem tamanho para comer, o cão parece uma pequena draga. Assim que dou um passo para o lado, Aquiles com toda a sua educação ataca seu pote de ração, esquecendo completamente da minha existência. Retiroinha blusa encharcada de suor e com um leve cheiro de vinho, jogando - a longe. Minha calça de corrida segue o mesmo destino, amanhã eu coloco na máquina para secar, estava cansado da viajem as pressas que fiz de Londres para cá. Não estava em meus planos vir para cá, mas a notícia de que meu tio, uma das poucas pessoas que realmente me amou, não estava bem de saúde, me desestabilizou por completo. Sem olhar para trás, muito menos ficar a pedido do homem que se diz meu pai, eu só precisava chegar ao meu tio o mais rápido possível.
Então, as cinco da tarde estava entrando nos limites de Campos de Esperança, uma minúscula cidade, que não é citada no mãos mas que tem recebido muitas empresas e tem crescido seria meu novo lar por não sei quanto tempo, pois não vou deixar meu tio enquanto ele não estiver cem por cento. Abri a geladeira somente de cueca boxer vermelha, o corpo suado e quente, inevitavelmente pó ouvir tio Mikael reclamar como uma senhora o quanto faz mal abrir a geladeira com o corpo quente. Bebo a água estupidamente gelada no gargalo mesmo, meus olhos capturam sobre a bancada a travessa com os biscoitos maravilhosos que sempre comia quando morava ou passava as férias aqui.
Sem cerimônia alguma, me sento no banco alto e ataco os deliciosos biscoitos artesanais com pedaços de morango. O aroma adocicado, a textura bem macia quase desmanchando em minha boca e a explosão de sabores me tem gemendo baixinho. Aquiles perdeu o interesse em sua ração e anda ao redor da cadeira em busca de um pedacinho se quer dessa maravilha. O olho de esguelha, rindo baixinho.
- Interesseiro! - joguei um minúsculo pedaço para meu faminto cão, que desapareceu em segundos em sua boca gulosa. Não demora muito, ele senta no meio de minhas pernas em busca de mais.
- Vejo que encontrou os biscoitos. - meu tio fiz calmamente. Cruza os braços observando - me.
- Desculpa tio, mas não resisti. São muito bons.
- E eu não sei? - ri fazendo - me acompanha - lo. - Lili tem mãos de fada. Além de linda de ser linda, é claro!
- Senti uma pontada de interesse aí? - ergo uma sobrancelha, divertido com a situação. Meu tio nunca apareceu com uma namorada ou namorado em casa. Estava sempre trabalhando demais para isso.
- Não. - disse com o olhar idêntico ao meu, só que distante. - É complicado.
- A vida nunca foi fácil tio. - jogo suas palavras sempre usadas contra mim.
- Lu costumava fazer esses biscoitos, bolos e tortas junto com sua namorada. Mas depois do...- balança a cabeça em negação. - Ela se afastou, decidindo ficar somente com o salão. O único e muito bem equipado da cidade.
- Elas estão juntas tem tempo não é?
Pergunto jogando mais uma migalha para Aquiles, enquanto mastigo a coisa maravilhosa me lembro que Liliane e Luara são companheiras desde que me entendo por gente ou desde que vim morar um tempo aqui, dois anos inteiros dentro de casa. E que tinha um terceiro cara na relação delas. Era estranho e fascinante ao mesmo tempo, se sustentar uma relação a dois era difícil, imagine uma relação a três. Nas poucas vezes que os vi, eu sentia que havia união entre eles, harmonia e pensava que nada poderia quebrar aquilo. A não ser a morte. Quando o terceiro integrante da união deles veio a faltar, eu já estava em Londres, cuidando de minha mãe, a mesma que fodeu minha vida.
- Muito, eles tinham algo que fazia funcionar para os três. Então tudo mudou, nada mais foi o mesmo. Lili continuou com as encomendas e Lu simplesmente arrancou isso da vida dela.
Olho atentamente para o rosto muito jovial de Mikael Lins, o homem que me amou e ama a mim mais do que meu próprio pai, seu irmão. As linhas de expressão ao redor de seus olhos e boca não o deixam mais velho ou algo do tipo, lhe dá charme. Meu tio é bonito demais para ficar sozinho, me lembro de Vânia. Sua única namorada de vinte e quatro horas de duração. Esse foi o tempo que durou seu relacionamento. Nunca mais a vi, mas me lembro dos seus gritos indignados.
- Você gosta de Lili. - afirmei sem medo. Meu tio não moveu um músculo se quer. - Por que não vai até ela, se declara e vivam juntos para sempre?
- Nem tudo que desejamos, conseguimos meu filho. - ofereço um biscoito a ele, que nega simplesmente.
- Ela sabe de seus sentimentos?
- Elas sabem, mas para não perder suas amizades, deixamos tudo assim. Em suspenso.
- Eu sou a favor de que você lute. Se for pelas duas que seja.
- Você não entendeu ainda André? - digo realmente perdido. Ele sorri sem um traço de humor. - Lu não aceita outro na relação, Lili parece viver um tanto área. Se posso oferecer minha amizade como suporte, é o que vou fazer.
- Isso é... doentio.
- Amor. Eu amo tanto aquela mulher, que posso ser seu suporte para a vida toda se quiser.
Ficamos em silêncio, Aquiles se casou de esperar por minhas migalhas correndo para o colo do meu tio, que simplesmente entregou um biscoito inteiro na boca do cão infame, quase rosnei como um animal selvagem, arrancando uma gargalhada alto dele. Relaxei pois consegui fazê - lo rir, ele anda um tanto triste por esses dias.
- Guto ligou, perguntou de você.
- Hum...
- Ele disse que está para se apresentar, que viria para cá...
- Já sei, recuperar o tempo perdido? - disse um tanto ácido.
- Ele quer ser seu pai.
- Não acha um pouco tarde? Trinta e sete anos de atraso te diz alguma coisa?
- Nunca é tarde. Faça isso por mim, seu tio moribundo. - tentou fazer piada, falhando miseravelmente. De repente nada mais passa em minha garganta, meus olhos ficam úmidos mas me recuso a chorar.
- Isso foi golpe baixo velho!
- Vocês precisam de uma chance. Os dois.
- Se você diz. Amanhã eu começo no escritório. - guardo a travessa com os biscoitos na geladeira.
- Amanhã é domingo, você sabe sim?
- Todo dia é dia para trabalhar, tio.
- Não em pleno domingo.
- Só vou verificar alguns arquivos, nada mais. Vou pela manhã.
- Isso é bom, pois Lua nos chamou para um almoço de boas vindas.
- Eu não vou.
- Posso saber o motivo?
- Não conheço essas pessoas. - ficando nervoso ao ter que ser simpático com pessoas que só vi de longe.
- Isso é bom, esse almoço é para isso mesmo.
- Mas tio...- deixo minha cabeça cair contra o mármore frio.
- Sem mais André, mania de se isolar. Não vou deixar acontecer como quando tinha treze anos.
- Eu vou porra!
- Vai conhecer Felippe e Pedrinho filhos de Henrique e Lua, assim como também Tábata filha de Lu e Lili, menina de ouro. Poderá fazer amizade com eles. São boa gente.
- Ok. - disse por fim. Conversamos um pouco mais sobre a situação do escritório. Logo depois ambos fomos dormir, pois amanhã o dia seria cheio.
Acordo com lambidas em meu rosto, passo a mão por ele, gemendo quando algo molhado se agarra a minha mão. Abro um olho, Aquiles sobe e desce sobre meu peito, animado ao extremo, olhando diversas vezes para a porta. Resmungando de forma mal humorada, coloco um moletom qualquer, pego sua coleira sobre a mesa e saio com ele. Ele corre na minha frente, pula em minhas pernas e faz suas necessidades. Voltamos para casa, tomo um banho e coloco meu terno cinza perfeitamente alinhado. Sei que hoje fará calor, mas para estar no escritório preciso estar a caráter.
Estaciono em frente ao lugar que não vejo tem anos, não mudou nada. Aquela fachada azul clara, com letras prateadas com o nome da família em destaque. Coloco meus óculos de sol, e entro. Olho para a mesa da única secretaria que temos e quase me sento ali para organizar sua mesa. A bagunça ali, está enorme. Na segunda falo com Luiza.
Entro na sala do meu tio, um lugar espaçoso, de decoração clara, as fotos dele recebendo alguns prêmios enfeitam as paredes, a ampla janela que nos dá uma visão ampla da praça lá fora. Olho para uma foto nossa, Neka eu estava seriamente pedindo para morrer, na época era minha formatura com honras na faculdade, somente meu tio apareceu e no final me obrigou a tirar essa foto onde ele aperta minhas bochechas.
Vou em direção ao arquivo e minha manhã se passa rapidamente comigo enfiado entre alguns papéis. Ações que precisam serem vistas com o máximo de urgência, reunião de aconselhamento e entre outras coisas. Até um pedido de adoção em aberto tinha. Afrouxo minha gravata pensando em quanto tempo meu tio ficou afastado e só me chamou agora. Teimoso.
Meu telefone toca sobre a mesa e atendo sem ao menos ver quem é.
- Alô!?
- Onde você está André? Estamos todos te esperando. Está trinta minutos atrasado!
- Oh merda! - olho para o relógio sobre a mesa. - Desculpe tio, me perdi aqui. A hora passou-se e nem vi.
- Estamos te esperando meu filho, não demore.
- Não pedi por almoço nenhum. Por que não começam sem mim? - revirei os olhos, meu tio bufou impaciente do outro lado da linha.
- Não seja um mal educado e venha logo! - desligou na minha cara.
Guardo os arquivos, fecho as janelas que abri para que o ar circulasse aqui dentro, coloquei meus óculos escuros novamente e depois de trancar o escritório, parti em direção ao tal almoço.
Cheguei ao endereço que meu tio me enviou por mensagem, a casa é linda, grande e bem conservada. Respiro algumas vezes e já sem o terno, usando somente minha blusa social branca e calças, aperto a campainha da casa, lá dentro posso ouvir as vozes altas, risadas e latidos.
Passos pesados e apressados chegam até mim, me lembro de retirar os óculos guardando - os dentro do bolso de minha calça, a porta se abre. Primeiro vejo o mesmo cara de ontem, tem uma expressão azeda em minha direção. Também não escondo meu desgosto em vê - lo, mesmo seus lábios vendo agora na luz do dia, sendo rosados, cheios e meio que irresistíveis.
- O que porra meu cachorro está fazendo aqui? E com você?
Não resisti e postei!!!!!
Espero que tenham gostado. Esses dois!!
22/06/2019
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