Cicatriz
Encontrar a segunda vítima deixa Vanessa e todos nós desnorteados. As pistas são escassas. Mesmo com todo o talento de nossa delegada, é quase impossível descobrir quem é apenas com as pistas deixadas pelo próprio assassino.
Saber que o Serial está um passo a nossa frente, deixa Vanessa extremamente irritada.
E aquilo que ele disse no áudio me deixou com a pulga atrás da orelha.
O que será que ela está escondendo?
Seja o que for que o assassino sabe sobre Vanessa, está tirando-a do sério.
Ela mandou que eu voltasse à delegacia para averiguar umas coisas com Samantha. Eu gostei dessa tarefa, porque além da Falcão ser muito simpática, já não estou me sentindo bem com tudo que está acontecendo lá.
Eu estudei para salvar vidas e agora tudo que tenho feito é prender os culpados por tirá-las.
A adrenalina que senti quando ajudei Vanessa a se soltar de Picolé foi muito significante, mas depois disso encontramos dois corpos e nenhuma pista do criminoso.
Isso está deixando todos loucos.
Entro na delegacia e alguns policiais vêm perguntar se salvamos a vítima e, pesarosamente, lhes digo que — como da primeira vez — tudo não passou de um jogo do assassino.
Não consigo entender o que leva um ser humano a agir assim.
É medonho.
Sigo para a sala onde está Samantha e a vejo concentrada no computador.
Uau! Ela está linda, assim concentrada.
Mesmo sendo mais nova, desde que ela entrou para a equipe, tem se mostrado muito madura. Ela está sempre disposta a ajudar e sempre obedece os comandos de Vanessa. Ambas trabalham muito bem juntas.
Realmente, pensando nisso agora, elas são opostos, porém se complementam de alguma forma.
Confesso que ambas possuem um lugar em meu coração.
Me aproximo e ela não nota minha presença.
Fico por trás dela e começo a massagear seu ombro.
Ela leva um susto. E vira-se rápido para trás.
— Rafael, você quer me matar? — ela fala com a testa enrugada — Eu estava lendo sobre casos parecidos e você chega assim, sem fazer barulho.
— Pensou que o assassino fosse entrar na delegacia para te pegar?
— Sim. Ele pode fazer isso.
Olho para ela sem entender. Então ela continua.
— Eu li alguns artigos de psicólogos criminais, onde falam sobre assassinos em série. Eles relatam sobre alguns casos que trabalharam. Em um desses artigos diz que, se o assassino tem alguém em particular que quer se vingar, ele pode ir atacando o psicológico dessa vítima. Uma das estratégias que costumam usar é a de atacar pessoas próximas. — Arregalo o olho e ela chega em um ponto sensível — Eu acho que ele quer atacar a Vanessa. Ela está escondendo alguma coisa de nós. E o criminoso conhece esse segredo.
— Você também sabia?
— Eu a vi com uma foto. Ela estava chorando enquanto a olhava. Está no armário da sala dela. Ela age estranhamente quando algum repórter se aproxima da delegacia. E tem o que o assassino disse. Quando trouxeram as evidências, me entregaram o gravador que estava no sótão da igreja.
Ela olha para mim e suspira. Então ficamos em silêncio.
É duro imaginar que uma pessoa que, aparentemente, é tão correta está escondendo algo obscuro. Eu posso ter achado ela mandona e até um pouco cruel, mas não consigo imaginá-la fazendo algo errado.
— Eu tenho certeza que ela é inocente. Vanessa não faria mal a ninguém. Ela é extremamente boa... — Samantha diz mais para si mesmo do que para mim.
— Eu também acredito nela.
— Então vamos tentar descobrir? — Ela me olha de uma maneira indecifrável — Eu sei que é errado e se ela descobre nos mata, mas eu quero estar preparada para quando a verdade aparecer. E quem sabe podemos ajudá-la?
Pondero por um instante.
Isso é muito errado. Se ela quisesse, teria nos contado.
Mas temos que protegê-la. Assim como ela sempre nos protege. Mesmo que do jeito estranho dela.
Olho para Samantha e aceno positivamente com a cabeça.
***
Nesse momento, minha cabeça só pensa em uma única coisa: Vanessa vai me matar se me encontrar aqui.
Após concordar em investigar junto com Samantha, aproveitei que Vanessa não estava na delegacia e vim até a sala dela para tentar encontrar a tal foto. Mas, para variar, quando eu estava prestes a abrir o armário com um arame, ouço vozes no corredor.
É Vanessa.
Estou morto.
Meu Deus, me ajude.
Vejo uma mesa no canto oposto e ela tem uma madeira em torno dela, o que pode me ajudar a se esconder.
Corro para lá e no momento que agacho, a porta é aberta. Fico em total silêncio, com medo até de respirar.
— Delegada, me fala, o que ele disse tem a ver com o que a Senhora pediu para eu investigar? — A voz de Douglas é pesarosa.
— Douglas, eu pedi para não tocar nesse assunto. Você me prometeu que não falaria sobre isso sem ter certeza de que não há ninguém perto.
— Desculpe-me. Eu esqueci de averiguar. Eu só não entendo porque a Senhora não me explica exatamente do que se trata...
— Chega, Douglas! — Sua voz é autoritária — Se eu não te falei, é porque não deve ser falado. Há coisas que outras pessoas não devem saber, para seu próprio bem. E... — Ela para de falar.
Ai meu Deus! Será que ela me viu aqui?
— O que foi, Vanessa?
— Esses livros foram mexidos... E essa gaveta também. — Ela diz abrindo a gaveta na qual revirei as coisas.
— Como a Senhora sabe?
— Eu deixo sempre tudo alinhado. Não gosto das coisas fora do lugar... Veja. — Ela para por um segundo antes de continuar. — É um arame, alguém tentou abrir meu armário. — Puta merda, deixei o arame cair. — Vamos até a sala da Samantha, temos que ver as filmagens.
Quando ouço a porta bater e os passos seguindo para fora, saio do meu esconderijo e, sutilmente, da sala. Quando abro a porta com cautela, dou de cara com Vanessa com uma arma apontada para minha cabeça.
— Fui descoberto. — Levanto meu braços.
— Rafael? — Ela não abaixa a arma. — O que está fazendo escondido em minha sala?
Resolvo falar a verdade.
— Eu queria descobrir o do que se trata a ameaça que o assassino lhe fez. — Deixo meus braços caírem sobre meu corpo.
Ela abaixa a arma e fica olhando para mim. Com se estivesse me analisando.
— Vocês não entendem... — Vanessa fala após um profundo suspiro e olhando para cima, como se estivesse tentando não chorar. — Eu só quero proteger vocês! — Ela fala duramente, cerrando os punhos.
— Proteger de quê? — Martin aparece no corredor — Por que você não pode deixar a gente proteger você? Você não acha que somos de confiança?
Ela se abaixa no chão.
Eu nunca imaginei em ver alguém como a delegada Vanessa Dutra desta forma. Ela começa a chorar e eu fico sem saber com reagir.
Olho para Martin e ele está com os braços caídos, com um olhar perdido.
Provavelmente, sem saber o que fazer também.
— Vocês sabem o que é carregar uma cicatriz no coração e na alma? Uma que perpetua por mais de cinco anos? — ela funga — Uma dor que você sabe que merece sentir? É isso que acontece comigo. Eu não quero que vocês sofram. Não quero que corram perigo. Vocês são tudo o que eu tenho... — Ela leva o braço ao rosto e enxuga uma lágrima.
Pego meu celular e mando uma mensagem para Samantha, pedindo que viesse aqui.
Mulheres sempre sabem o que fazer nesses momentos.
— Não tentem descobrir o que aconteceu. Não agora. Eu não tô preparada para isso. Por favor. — Ela soluça.
Chega a ser constrangedor não saber como agir nesse momento. Isso nos pegou de surpresa. Douglas e Martin estão encostados na parede, sem se mover.
Ninguém nunca imaginou ver a Vanessa chorando.
Isso não combina com a imagem que ela passa.
— Delegada... — Samantha se agacha e dá um abraço em Vanessa — Pode chorar. Chorar faz bem. Não vamos te julgar...
— Isso, Delegada. — Douglas também se aproxima — Eu não sei o que aconteceu, mas eu tenho certeza que a Senhora não foi culpada...
— Eu fui! Eu não impedi. Eu não conse... — Ela chora mais.
— Vem, vamos para a sala de descanso. Me ajude aqui, Martin.
Quando Martin se aproxima para ajudar a levantá-la, ela o abraça. Ele fica espantado, mas acaba a abraçando também.
— Se ELE aparecer... — Ela fala entre soluços — Não deixe machucar ninguém da...
Ela apaga.
— Delegada! Acorda! DELEGADA! — Martin e Samantha tenta acordá-la, mas não adianta.
— Vem, vamos levá-la ao hospital. — Martin a pega no colo e sai do corredor. Douglas o acompanha.
O único pensamento que consigo ter nesse momento é que eu causei isso!
Vanessa não ficaria assim se eu não tivesse falado o que estava procurando na sala dela.
— Não foi sua culpa... — Samantha se aproxima e coloca sua mão pequenina em meu ombro.
Eu a puxo para um abraço.
— Só me deixa ficar assim por um instante.
Acaricio seu cabelo. Ela é minúscula, mas se encaixou perfeitamente em meu abraço.
— Não se culpe. A culpa foi minha. Eu que dei a ideia... — Ela fala enquanto dá tapinhas em minhas costas.
Isso é tranquilizador...
Queria que minha mãe tivesse feito isso nos momentos em que eu duvidei de mim.
Eu a afasto um pouco e olho em seus olhos que estavam passando uma mensagem positiva, por assim dizer.
— Vamos lá no hospital...
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