Pânico
Mamãe sempre me ensinou que garotas bonitas conseguiam tudo que queriam.
Elas não precisavam se esforçar para isso, era só ir e pegar. Garotas bonitas não eram odiadas, na verdade elas eram invejadas, e ninguém nunca teria coragem de fazer algo de mal contra elas, porque ninguém tinha coragem de machucar um rostinho tão bonito. Bem, minha mãe estava redondamente enganada.
Fui um babaca com todos à minha volta, desde a minha melhor amiga até a garota que eu gostava, com a ideia de que ninguém faria nada contra mim. Até que essa merda aconteceu: morta três vezes, nem Jesus sofreu tanto.
E, para piorar, morta três vezes pela garota que eu amava.
Acho que amava Lisa, no fim das contas. Amava tudo nela, eu só era idiota demais para admitir, e brinquei com os sentimentos dela por meses. Agora não parava de pensar nas vezes em que cortei suas prováveis declarações de amor e até zombei do seu alojamento. Burra, eu fui burra. Sentei-me na cama, relembrando o momento exato que Lisa teve a ideia de me matar. Lembrei-me que, antes de sair do seu alojamento, ela disse que eu deveria tomar cuidado. Era esse o recado?
Olhei para frente, para ver o reflexo de Nayeon na frente do espelho. Eu estava no corpo da vice-representante. Será que tudo isso não passava de um inferno pessoal e eu estava morta desde o princípio? Fadada a morrer todos os dias do Halloween e acordar em um corpo diferente, porque fui uma filha da puta com todas as pessoas ao meu redor? Porque magoei a garota que eu amava e agora ela queria me matar? Se eu fosse uma pessoa diferente, nada disso estaria acontecendo. A culpa era minha no fim das contas e doía como a morte admitir isso — e olha que eu sabia como a morte doía.
Pisquei algumas vezes, fitando o traçado vermelho no espelho. Primeiro, pensei que fosse coisa de Nayeon, já que o quarto era dela e eu nunca pisei nele, e nem sabia porque a sua colega de quarto não estava aqui, mas por fim, achei a marca de batom bastante esquisita. Era uma seta apontando para a porta do banheiro. Levantei-me devagar, ainda me acostumando ao modo como esse corpo andava, e me aproximei da porta do banheiro a passadas curtas. De repente, tudo à minha volta pareceu ganhar destaque, desde a minha respiração descompassada, até o sol forte transpassando a janela do quarto e me atingindo com uma luminosidade cegante. Meus dedos foram até a barra do pijama, torcendo-a numa esperança nula de ganhar coragem enquanto engolia o nada.
Respirei fundo e, com o som do meu coração bombeando sangue, empurrei a porta do banheiro.
As treliças enferrujadas fizeram um som alto quando abriram, mas logo o sol iluminou o cômodo. Era até estranho eu sentir medo, mesmo com tudo claro ao meu redor. Normalmente aprendemos a sentir medo do escuro, não do contrário, mas esses últimos dias me fizeram temer a minha própria sombra. Engoli em seco e dei um passo em direção ao cômodo, agora, com ele claro, a minha atenção foi diretamente para o espelho do banheiro.
Os escritos em batom vermelho me causaram um torpor.
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO, AS 10H.
VAMOS ACABAR COM ISSO DE UMA VEZ POR TODAS, VADIA.
TE ESPERO LÁ.
Ajoelhei-me no azulejo fio, em frente ao vaso, e mal tinha terminado de levantar a tampa quando o vômito veio com tudo, rompendo pela minha garganta. O gosto amargo impregnou a minha boca, junto as lágrimas que escorriam pelas minhas bochechas, bochechas que não eram minhas, na verdade. Eu me sentia traída e pronta para aceitar a morte pelas mãos de Lisa de uma vez por todas. Se era isso que ela achava que eu merecia, era isso que eu teria.
Eu devia mesmo ser a pior pessoa desse mundo.
Com os meus olhos inchados e doloridos, decidi abraçar o meu destino uma última vez. Entendi o recado do espelho, ela esteve aqui enquanto eu — ou Nayeon — dormia e escreveu isso, porque sabia que me matar não adiantaria nada, assim como estou presa nesse dia ela também estava e, no hospital da faculdade, longe do campus da Kappa, eu finalmente morreria e ela sairia desse maldito dia. E eu só queria sair desse inferno particular.
﹝•••﹞
Ao me aproximar da construção de cinco andares com duas torres, vi várias ambulâncias e carro de polícia. As luzes vermelhas de emergência contrastavam com a aparente tranquilidade da rua. Aproximei-me devagar, observando as pessoas confusas tomarem conta do pátio do hospital.
— O que aconteceu aqui? — perguntei a uma garota com jaleco, ela também fitava a construção com o cenho franzido.
— Não sei, evacuaram todo mundo há uns vinte minutos.
Balancei a cabeça, confusa.
— Evacuaram o andar inteiro?
— Evacuaram o prédio inteiro — respondeu ela.
Mordi os lábios. Lisa queria mesmo um grande finale.
Esgueirei-me entre os socorristas, universitários ou só curiosos, e entrei pela entrada de serviço do hospital. A luz vermelha acionada e a sirene ecoando pelos corredores deixava o ambiente carregado de uma tensão que revisava o meu estômago. Eu não sabia se estava curada do envenenamento de noite passada, mas aparentemente Nayeon estava com uma cólica fudida, eu mal conseguia raciocinar com as diversas fincadas na barriga.
Sem saber onde seria esse tal encontro, apenas vaguei pelos corredores vazios e vermelhos até ouvir um som vindo do segundo andar.
De repente, o ar ficou rarefeito.
Tentei controlar a tremedeira no corpo e fui até o segundo andar pela escada de incêndio, já que os elevadores estavam parados. Subindo os degraus com o coração batendo rápido, percebi que não queria aquele embate com Lisa. Seria melhor morrer eternamente e viver o mesmo dia, a ter Lisa cara a cara, pronta para me matar. Desemboquei no corredor vermelho. A luz piscava incansavelmente, como em uma boate. No fim do corredor vazio e silencioso, a mascarada me esperava ao pé do elevador.
As portas estavam abertas e o vão da caixa metálica parecia não ter fim, era só um buraco negro pronto para engolir aquele ser. Talvez esse fosse o intuito de Lisa tão perto daquele vácuo: me dar um gostinho de vitória ao tentar empurrá-la, quando na verdade, eu nunca conseguiria fazer. Aproximei-me a passos lentos, sem saber onde achar forças para colocar um pé na frente do outro, enquanto não tirava os olhos daquela máscara. Inusitado como a primeira vez achei tudo engraçado, desde a máscara ao manto rosa e, agora, um arrepio de medo cruzava a minha espinha.
Cara a cara com a mascarada, fechei os olhos, esperando o golpe, mas ao abri-los vi que ela estava parada no mesmo lugar, a um passo de cair do elevador. Franzi o cenho, algo estava errado. Muito errado. A respiração dela era espessa, além de soltar murmúrios abafados. Primeiro, pensei que fosse uma pegadinha, poderia ser um manequim. Rodei os calcanhares, mas o corredor ainda continuava o mesmo, tomado pelo filtro vermelho inconstante.
Voltei à mascarada e, prendendo a respiração, puxei a máscara.
Era Lisa.
Amordaçada.
— O que...? — Soltei a pergunta engasgada.
Dei um passo para trás, confusa, enquanto Lisa tentava mover a cabeça para os lados, mas a mordaça em sua boca a fazia babar e os cabelos loiros eram uma bagunça. Então, percebi que na verdade ela estava amarrada na frente do elevador e se movesse um centímetro, poderia cair lá embaixo.
No fim, não era Lisa? Não podia ser, como pensei que fosse? Seus olhos lacrimejantes me faziam querer chorar também.
— Ai meu Deus! — Parti para cima de Lisa, sentindo uma mistura de alívio e pânico, mas ela me impediu de aproximar manejando a cabeça em negação. Os olhos arregalados tentaram me alertar sobre algo atrás de mim.
Parei com a mão no ar, sem querer me mover, sem querer olhar para o que acontecia na minha retaguarda.
A lâmina cortante pressionou as minhas costas.
— Olá, Ruby.
Eu conhecia aquela voz.
Devagar, virei a cabeça para o lado, dando de cara com a caloura.
— Sunim? — perguntei incrédula.
Ela me olhou, em choque.
— É Somi, porra! Qual o seu problema?
Ah, eu sabia que começava com S. Maneei a cabeça, confusa, então... então esse tempo todo quem estava me matando era a caloura? Aquilo... fazia sentido. Lisa disse que pegou a cerveja de umas meninas da casa, mas só agora esse detalhe ressurgiu na minha mente. Acho que ela percebeu a confusão estampada no meu semblante, porque me empurrou para frente. Caí aos pés de Lisa, sentindo a minha cabeça rodar.
— Eu estou tentando te matar há dias e você não sabe nem o meu nome! — berrou ela.
Summer balançou a cabeça, fazendo os fios loiros se movimentarem numa graciosidade que eu não tinha notado antes. Ela se vestia como todas as garotas do Kappa, um conjuntinho xadrez amarelo, com um blazer de ombreiras e um cropped. As botas brancas fizeram um som tilintente quando ela caminhou balançando a faca, como se decidisse o que fazer em seguida.
Ajoelhei-me, respirando entrecortado.
— Olha, o seu problema é comigo, você pode deixar a Lisa ir embora, ela nem sequer sabe quem sou eu, você pode..
— Naninanão, ela fica — Some apontou a faca em direção a Lisa, que agora suava frio. — Ela pode não saber quem é você, Jennie, ela pode não estar entendendo nada do que está acontecendo, mas você sabe quem é ela, e você vai sofrer quando ela morrer. É sobre isso.
O ar saiu em um jato das minhas narinas enquanto o desespero tomava conta dos meus pensamentos.
— Você já não está me fazendo sofrer por todos esses dias? — perguntei.
— Ah, não, você não sabe o que é sofrer, você não tem o direito de dizer isso! — rebateu ela, aproximando-se para repousar a faca no meu pescoço. Ela forçou a minha cabeça para cima, para que ficássemos cara-a-cara. — Sabe o que é passar a vida toda sofrendo bullying por não ser bonita como as outras garotas? Por não ser rica? É um inferno, pode ter certeza! Você não sabe o que eu sofri, você nunca vai saber. — Ela falava com tanto ódio que chegava a salivar. — Eu decidi ser uma garota diferente quando entrei na faculdade, queria ser como vocês... e eu fiz tudo parecer a vocês! Eu emagreci, fiz plástica, até pintei a porra do meu cabelo! Entrei na Kappa pensando que, finalmente, eu pertenceria a um grupo, e só encontrei um bando de vadias fúteis, mimadas e babacas, que não pensam em nada a não ser no próprio umbigo! Mas aí eu entendi, entendi que nunca conseguiria me encaixar...
Pisquei algumas vezes, sentindo as lágrimas descerem quentes pelas bochechas.
— Ninguém consegue, Somi, é esse o problema, esses padrões são..
— Se você for militar agora, eu juro, enfio essa faca na sua garganta! — Ela forçou a lâmina com mais força contra a minha pele, arrancando um filete de sangue. — Foda-se se os padrões são inalcançáveis porra, não é essa a questão! A questão é, já que eu não posso me encaixar, eu vou acabar com quem se encaixa. A começar por você, você, Jennie, você é a representação de tudo que há de pior na Kappa House. Você sempre foi bonita, nunca precisou se esforçar para nada, acha que as pessoas devem rastejar aos seus pés, e é uma filha da puta com todo mundo sem ao menos um motivo! — Ela gritou contra a minha cara. — Além de ser burra pra caralho! Eu sabia em que corpo você estava sem ao menos me esforçar!
Engoli o seco, pensando em formas de contornar a situação. Ela estava fula ao ponto de ser me matar e matar Lisa num piscar de olhos, então ser passional era o que nos faria sair dessa.
— Você tá certa, eu era assim, eu... eu não conseguia perceber, mas agora...
De canto de olho, notei algo que atiçou o fio de esperança que borbulhava em meu peito. Lisa estava conseguindo se desamarrar com a ajuda de um estilete. Ela cortava as fitas em volta das mãos, e a sua sorte era que o manto rosa encobria a façanha. Ao olhar de relance para mim, não sei se havia entendido alguma coisa ou só estava lutando para se salvar, mas naquele tempo que cruzamos o olhar, acho que me reconheceu.
Voltei a Semi, espumando de raiva.
— Agora você mudou, né? Agora é uma nova garota? — desdenhou ela. — Deixa eu te contar uma coisa, Ruby, é tarde demais. Já estamos presas nesse loop temporal. — Ela soltou uma gargalhada sem humor. — Quem diria que aquelas regras fossem mesmo valer alguma coisa?
— Podemos sair dessa, juntas... — rebati. — Se você não me matar, quem sabe amanhã não acordamos em um novo dia? Sei que você quer isso tanto quanto eu, que não aguenta mais essa repetição, podemos fazer isso juntas, hm? O que você me diz?
Vi algo brilhar nos seus olhos, como se pensasse na possibilidade, e eu até achei que ela aceitaria a minha proposta, mas por fim, a caloura deu de ombros.
— Ah, Jennie... — Ela faz uma careta. — Eu não suporto esse feminismo.
E enfiou a faca na minha barriga.
A dor se alastrou pelo meu corpo como um fio condutor que roubou o ar dos meus pulmões. Atrás de mim, ouvi um grito abafado e não entendi se era Lisa ou só uma divagação da minha mente confusa. Sumie encostou a cabeça na minha e seus olhos não largaram os meus, brilhando em uma perversidade mórbida.
— Me matar não vai... — Engoli um engasgo sucessivo. — Não vai adiantar nada, você ainda vai ser uma vadia fracassada, Simim.
Ela soltou um grito gutural e, quando estava pronta para me esfaquear pela segunda vez, um vulto rosa a impediu.
Lisa pulou em cima da caloura e às duas caíram no chão, rolando até chegarem bem perto do vácuo do elevador. A tailandesa agarrou as mãos da garota e bateu no chão, fazendo-a soltar a faca. Enquanto isso, eu me arrastei para longe, sem saber o que fazer, mas em pânico pelo rastro de sangue que saía da minha barriga. Elas se engalfinharam como gatos de rua, era difícil saber o que fazer, mas a faca chegou até mim e eu a peguei em um pulo, sentindo o cabo quente envolto na minha mão. Apontei a faca para Sumiu, mas ela estava embaixo de Lisa, e eu não conseguiria aceitá-la sem arriscar acertar Lisa. De repente, a caloura deu uma cabeçada em Lisa, fazendo-a cair para o lado.
Era a minha chance, mergulhei em sua direção, mas habilmente ela puxou Lisa para a sua frente, pressionando o estilete no pescoço da tailandesa.
— Se der um passo, eu acabo com ela! — gritou para mim, com os lábios rubros de sangue.
Olhei para Lisa, que tentava me dizer algo mesmo com a lâmina pressionando sua glote.
Pisquei algumas vezes, tentando deixar de lado o que fazia o meu coração bater mais rápido. Lisa sabia quem eu era, fitando os seus olhos desesperados eu vi a certeza em seu olhar. Ela maneou sutilmente a cabeça em negação, mas eu não podia deixar a caloura matá-la.
— Deixa a porra da faca no chão, Jennie! — Somi disse.
Abaixei as mãos devagar, mesmo com os protestos de Lisa, mas, a um passo de deixar a faca no chão, uma ideia arriscada ganhou forma na minha mente.
— O que você está esperando, sua maldita? — ranhou a caloura. — Chute a faca para cá!
Olhei de relance para Lisa e, pelo olhar que recebi em troca, ela pensou a mesma coisa que eu. Olhei para a caloura enquanto soltava do cabo da faca e, quando estava prestes a deixá-la, agarrei-a com força de novo. Raiva cintilou nos olhos de Sumi, mas Lisa aproveitou a oportunidade e deu uma cotovelada nela, conseguindo se soltar do aperto. Nada me impediu de partir para cima, nem a facada na barriga, e como Lisa já tinha saído do caminho eu chutei a caloura com força, empurrando-a para o vão do elevador. Somi deslizou até brecar na porta e, a um passo de cair, tentou se equilibrar segundo as portas abertas da caixa metálica, mas Lisa a empurrou de vez.
Vi em câmera lenta a garota soltar um grito gutural até cair no abismo do elevador, mas ao invés de sentir alívio, tentei em um último segundo salvá-la. Não sei de onde veio esse sentimento, mas eu não queria vê-la morta, apesar dos pesares. Somi era só uma vítima. Corri em direção às portas do elevador, vendo-a se agarrar com apenas uma mão em um dos cabos que seguravam a caixa. Seus olhos estavam borbulhando um sentimento diferente, um conformismo difícil de encarar. Ajoelhei-me na borda, lançando o braço em sua direção.
— Anda! Vem! — gritei, e minha voz ecoou na escuridão.
Com a mão livre, ainda segurando estilete, ela alcançou o meu braço, mas diferente do que pensei que faria, ela enfiou a lâmina no meu pulso. A dor irradiou pelo meu braço, acompanhando de um grito agudo enquanto ela, de bom grado, se soltou e caiu para a morte.
﹝•••﹞
Tive medo de abrir os olhos, então rolei para o outro lado da cama e quase caí no chão.
Novamente, o pânico de não saber onde estava me fez abrir os olhos.
Encarei o teto branco e, como previsto, a dor me acertou em cheio. Tentei me sentar, mas uma mão afundou-se no meu peito, fazendo-me voltar a deitar.
Olhei para o lado, dando de cara com Lisa, sentada ao lado da cama. Soltei um suspiro de alívio, ignorando todas as perguntas entaladas na garganta para me jogar nos braços dela. Em um primeiro momento, Lisa devolveu o beijo de maneira confusa, mas logo nossas línguas encontraram um ritmo calmo até terminarmos em pequenos selares.
Ela sorriu com a boca próxima à minha e acariciou as minhas bochechas. Olheiras escuras tomavam conta do seu rosto, dando-lhe um ar abatido.
— Ah, Jennie, quer me matar de susto?
Jennie. Ela me chamou de Jennie. Eu estava no meu corpo? Antes de ter certeza, eu precisava saber.
— Que dia é hoje?
— Primeiro de novembro — respondeu ela.
Dessa vez, o alívio foi tanto que encheu os meus olhos de lágrimas. Apalpei o corpo, fitando o quarto à nossa volta até perceber que estávamos em um hospital.
— O que aconteceu depois...? — Não consegui completar a frase, tanto por não querer reviver o que passamos; tanto por ter nítido em minha mente a caloura caindo para a morte sem tirar os olhos de mim. Eu não me lembrava de nada depois disso, talvez a facada tenha me matado de novo, mas as minhas mãos pelo meu rosto me deram total certeza, eu estava no meu corpo.
Queria pedir um espelho, algo que me fizesse ver, mas a voz de Lisa me trouxe novamente para a realidade.
— Você não se lembra? — perguntou ela.
Maneei a cabeça em negação.
— Dentre todas as meninas, você foi quem sofreu um efeito colateral maior, então é normal ficar confusa... — respondeu.
Franzi o cenho, fitando os olhos arregalados de Lisa.
— Dentre todas as meninas?
— O envenenamento, Jennie — disse ela. — Uma caloura da Kappa envenenou a comida da festa de boas vindas, no Halloween. A maioria das meninas está aqui no hospital. Jisoo até veio saber como você está.
— Jisoo? — perguntei, sentindo o meu peito apertar de saudade. Eu tinha tantas coisas para resolver, principalmente com Jisoo e Rosé.
Lisa concordou, lançando-me um sorriso acolhedor.
— E quem envenenou todo mundo foi a Sumin? — sussurrei, incerta.
— Somi — Lisa corrigiu.
Droga, o nome dela nem era tão difícil. Engoli o seco, repassando todos os últimos três dias em que passei revivendo o Halloween em um corpo diferente, sendo morta em um corpo diferente, para no fim estar no hospital por conta de um envenenamento. Lisa não se lembrava de nada desses últimos dias, para ela eu também só fui vítima de um envenenamento qualquer, mas as lembranças do que passei na mão de Somi eram reais demais. Não era um simples delírio, eu tinha certeza que aconteceu.
— O nome dela tá em todos os jornais... — prosseguiu Lisa, em um suspiro. — A história é longa e ninguém sabe muito bem o que aconteceu. Ela envenenou toda a irmandade, depois tentou se matar pulando no vão do elevador aqui no hospital... acharam o corpo dela destruído, mas ela não morreu. Foi mandada para um hospital psiquiátrico.
Lisa não percebeu o meu choque e continuou:
— Odeio dizer isso, mas uma hora ou outra isso ia acontecer. A Kappa é cheia de garotas egoístas e regras malucas, você sabe.
Pisquei algumas vezes, afugentando as lágrimas.
— É... — concordei com um bolo na garganta, encarando a cicatriz no meu pulso. Um pequeno e, talvez, evidente sinal do meu embate com Somi.— A Kappa é cheia de regras malucas...
E, algo dentro de mim, me dizia que não seria o último.
◇─────◇─────◇
Obrigada a todos que chegaram até aqui! 🦋
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