Capítulo 13
Suas mãos tremiam. Detestava quando isso acontecia. Essa sensação devulnerabilidade a destruía por completo, mas precisava prosseguir. Os números estavamtodos lá no visor. Só tinha que pressionar o botão verde e deixar que o seu aparelhocelular fizesse o resto.
Hesitaria por segundos. Encarou novamente o número e o nome que aparecia emseus contatos. Respirou fundo. O toque da chamada ecoava dentro de sua cabeça. E umavoz dizia: "não atende".
Já era a sua quarta tentativa de efetuar essa ligação naquela semana. Enfimreuniu coragem e agora desejava abortar. Era tarde.
— Liv? Aconteceu alguma coisa?
— Você está sozinho? Ele está perto? — Sua voz indicava nervosismo.
— Não muito. Está arrumando os instrumentos para essa noite.
— Consegue ir para outro lugar? Não queria que ele soubesse.
Mark respirou fundo. Olívia, do outro lado da linha, conseguia sentir a tensãonaquele gesto. O rapaz não gostava dessa posição que a ex-patroa estava lhe colocando.De certa forma, Olívia sabia que Mark ficaria ao lado de Orange. Homens são muitomais unidos nessas questões, assim ela supunha. De toda maneira, o rapaz seguiu para oestoque.
— Pode falar. Estou sozinho. — Não havia simpatia em seu tom de voz.
— Como está tudo por aí?
— Caminhando na medida do possível.
— Estava preocupada dele não ter voltado...
— Estava mesmo?
— Claro que sim! Do contrário não teria deixado o bar para ele.
— E só agora ligou. Olívia... — Mark, em todo esse tempo, falara o nome delauma única vez, no dia em que foi contratado e agora usava da formalidade parademonstrar todo o seu desapontamento. — Apesar do que tu fizeste, ele tá conseguindoseguir, e se você voltar a rondar talvez isso não aconteça.
— Por isso liguei para você. Não sei o que ele te contou...
— Que você largou dele para ir atrás daquele cara esquisito que apareceu aqui.Ele me disse que vocês eram amantes.
— É mais ou menos isso. Ele te contou o que eu era antes de comprar esse bar?
— Não. Disse apenas que esse cara te bancava.
— Nem estando com raiva ele consegue ser um cretino. — Olívia suspiravatristonha. Aquele homem nunca seria idiota, pelo menos não com ela.
— O que quer dizer com isso?
— Esse cara esquisito que esteve me procurando me bancava, sem sombra dedúvidas, ele até me deu esse bar. Só que o que Orange não te contou é que eu era umaacompanhante de luxo, uma palavra chique para prostituta.
— Eu sei o que é uma acompanhante. Talvez seja difícil para ele dizer que éapaixonado por uma prostituta, então prefere dizer que você era a amante do tal cara.
— O que não tem muita diferença, não é? Apenas uma palavra de conotaçãomenos agressiva, mas não muda o fato de que as duas sugam o que esses homens têm.Mas eles também nos sugam. Algumas têm mais ou menos afeto, mas todas acabamtendo as contas pagas pelo dinheiro deles, direta ou indiretamente.
— Essa foi a maneira que ele achou de lidar com a situação. Ele voltou tem umasemana.
— Então foi quando eu cheguei aqui. — Olívia ficaria pensativa nesse momento.
— Veio para fechar, já que você não tinha me dito nada, apenas sumiu e nãorespondeu minhas mensagens. Fiquei um pouco perdido e continuei tocando.
— Obrigada por isso.
— Não me agradeça. E então, no dia seguinte ele mudou de ideia. Encaixotoualgumas coisas, acredito que sejam suas e mandou para algum lugar. Anda quieto, masfocado no que o bar precisa. Estamos em baixa temporada, então você sabe como omovimento fica. Ele falou em reformar.
— Isso é bom. Está ocupando a mente.
— Confesso que se estivesse no lugar dele não ficaria aqui.
— Não lhe dei muita escolha, já que deixei o bar para Samantha. Ele está aí porela.
— Realmente ele comentou em trazer Sam para morar aqui.
— Isso seria formidável.
— Liv... — Mark nesse momento já conseguia tratar Olívia como antes, mesmoque não concordasse com o que ela fez. — Preciso voltar. O bar daqui a pouco começaa encher. Se cuida.
— Você também, Mark. Se acontecer algo me liga, por favor.
Aquela conversa ficaria na mente de Olívia pelo resto do dia. O fato de terficado sozinha influenciou nessa necessidade de notícias. Andava evitando a sua velhavida, nem para a mãe vinha ligando com frequência. E devido aos compromissosprofissionais, Henry voltaria apenas no final daquela noite.
A mulher teria de se acostumar com essa rotina. Como acompanhante ela tinhadele dias exclusivos, que reservava em sua agenda lotada. Agora, como sua futuraesposa, agendas não seriam usadas. Isso significava ficar à mercê de seus horáriosdesregulados.
E o que fazer com esse tempo? Era algo que Olívia não estava acostumada emadministrar. Uma semana sem ter nada para fazer é algo até revigorante, mastransformar isso em rotina poderia ser perturbador. E ela havia entendido isso.Tentou ocupar o seu tempo. Pela manhã fez exercícios na academia disponívelno edifício em que ficava a cobertura de Henry. Detalhe que ele desconhecia. Quandoseu tempo permitia, Henry às vezes nadava. Já tinha um bom tempo desde a última vezque entrou na piscina da sua mansão.
Tomaria em seguida um banho revigorante e demorado na banheira da agora suasuíte. Como de hábito, o motorista a esperava. Olívia chegou a tirar habilitação nos seusdezesseis anos, porém nunca adquiriu um veículo, e com o tempo acostumou-se a usartáxis e carros com motoristas. Dirigir não estava entre as coisas que desejava fazer. Orapaz a levaria em um restaurante que Sr. White frequentava.
Olívia não ia a tais lugares sozinha. Sentia-se desconfortável e deslocada. Decerta forma os homens que acompanhou lhe davam um ponto de apoio. Novamente teriaque se acostumar a tais hábitos. Respirou e encarou o salão assustador.
O peixe estava delicioso e o vinho sugerido, soberbo. Olívia dispensou asobremesa. Ainda era cedo para retornar para o apartamento, então, o que fazer? Henryhavia lhe dado um cartão de crédito. Desde que chegou, ainda não tinha se aventuradoem preencher o seu lado do closet. Estavam lá apenas poucas peças que trouxeraconsigo. Nada muito memorável ou que lhe destacasse como mulher de um milionário.Há três dias ele chegou com uma caixa em suas mãos pequenas. Olíviareconheceu de imediato o que era. Desejou tanto aquilo, mas o presente que recebeu hámuitos anos veio de outra marca e agora finalmente ela teria um Louboutin de fundovermelho.
— Por quê?
— Para que definitivamente você a deixe para trás.
O fato era que Olívia ainda não estava completamente certa da escolha daquelepresente. Não negava que eram muito bonitos. Livrando-se desses pensamentos,acabaria na Regent's Street. Sentiu-se como em uma Uma Linda Mulher, só que sem aparte da humilhação. Andou de loja em loja. Uma mais cara que a outra. No finaldaquela aventura – Olívia julgou dessa forma –, sentiu-se até incomodada por ter gastotanto em coisas supérfluas. Sabia que poderia ter achado essas peças de roupas em lojasmais populares e com qualidade similar. Faria isso na próxima vez.
Voltou para o apartamento, mas antes desfrutou do seu tão apreciado café.Assim que acomodou tudo que havia comprado, olhou pela imensa janela. Ainda estavaclaro, mas logo anoiteceria. Avaliou e decidiu ariscar-se.
O Hyde Park lhe abraçou com um lindo entardecer. As folhas caíam das árvores,tingindo o chão de ferrugem. O outono vinha com seus ventos mais amenos. Olívia seprotegia com o casaco. Achou um banco e ali ficou, contemplando as pessoas passaremcom suas bicicletas. Ela tinha achado o seu lugar de corrida. Não teria mais um banhode mar no final, mas teria Henry em seus braços. Uma troca muito justa, pensou.Quando regressou, faltavam ainda duas horas para que ele voltasse e pudessemse conectar. Estava sem fome, porém sedenta. Encontrou uma garrafa de cerveja e deugraças por aquilo. A levaria para a sala de televisão.
Um dos seus filmes favoritos passava. Questão de Tempo, esse era o título. Ésobre um rapaz inglês esquisito que adquire habilidade de viajar no tempo e nesseintermeio se apaixona por uma garota; com medo de perdê-la, começa a usar tal recurso.Olívia amava aquele filme do fundo do seu coração por conta das decisões finais que opersonagem resolve tomar, mas por outro lado também a deixava triste. O protagonistatinha uma relação muito bonita e próxima do pai, algo que ela deixou de ter quando oseu a abandonou aos dez anos.
— Há quanto tempo está aí? — Olívia encarava Henry, assustada, enxugandoalgumas lágrimas teimosas que não conseguiu evitar.
— O suficiente para vê-la se emocionar.
— É que é tão lindo ele com o pai!
— Tendo você como base, posso julgar que sim.
— Sente falta do seu? — Olívia estendeu sua mão para que ele sentasse ao seulado.
— Muita. — Henry juntou-se a ela no sofá, acomodando-a próxima do seu peito.
— É dela que sinto mais falta. Talvez porque a tenha perdido ainda em vida.
— Ou porque ela era mais amorosa. Vivian falou sobre ele e o quanto podia sermanipulador.
— Ele tinha seus momentos perturbados. — Henry suspirou, recostando suacabeça na almofada. — Não era assim o tempo todo. Somos diferentes, mas tudo quesei sobre os negócios veio dele e nisso era ótimo. A visão que tinha ia além. Eu precisode outras pessoas para atingir o mesmo resultado.
— Não tem ressentimentos dele?
— Tenho um. — Henry a abraçou, fechando os olhos momentaneamente. —Quando Katherine morreu. Ele não foi assim tão sensível à minha dor. De outro lado,acabou fazendo o certo. Eu talvez não estivesse aqui hoje se não fosse a suaintervenção.
— Não me diga que pensou em... Tenho até medo de dizer. — Olívia tornaria alhe encarar assustada, não conseguia imaginar o quão grave fora aquele período paraHenry.
— Foi uma possibilidade que pairou sobre mim por algum tempo. Evaporouquando ele morreu. Eu precisava cuidar da minha mãe. E foi isso que fiz. Cuidei dela.
— E esqueceu-se de cuidar de você mesmo.
— Bom, você apareceu e cuidou de mim. E me diga. O que fez o dia todo? —Henry decidiu que aquele era o momento de mudar de assunto, essas lembranças semprelhe levavam para um lado escuro que ele pretendia nunca mais visitar.
— Tanta coisa e nada ao mesmo tempo. Henry, preciso me ocupar com algo ouficarei louca! Eu que sempre fui da lei do menor esforço, estou aqui desejosa por algopara fazer.
— O que gostaria de fazer?
— Aí é que está, eu não sei! A única coisa que sei fazer é ser umaacompanhante.
— Marque um encontro com Vivian, talvez ela consiga te ajudar com isso, o queacha?
— Farei isso.
Olívia deitou a cabeça no ombro de Henry e, encaixados no sofá, terminaram dever aquele filme mágico que mostra a importância da vida, das pessoas próximas, que opassado não é o mais importante e sim o futuro que se abre, e era exatamente isso queeles estavam se propondo a fazer.
No dia seguinte, Olívia procurou Vivian, como lhe fora sugerido.
— Fiquei tão feliz quando me convidou para conversarmos.
— Eu também, Vivian. Sabe, faz muito tempo que não tenho outra mulher paraconversar. Apenas uma amiga ficou do meu lado quando eu decidi entrar naquela vida,as outras me viraram as costas e assim foram anos apenas tendo as outras meninas daagência para papear, e mesmo assim com muita cautela, você nem imagina como éarriscado revelar demais. Muita disputa.
— Posso imaginar, afinal não é algo assim tão diferente em outros lugares.Quando eu ainda exercia a minha profissão em um escritório, passei por essasintriguinhas dos colegas.
— Posso te fazer uma pergunta?
— Claro! Fique à vontade.
— Como você ocupa o seu tempo?
— Ah! Sim. Vejo que o tédio já está se instalando aqui. — Vivian apontou parao centro de Olívia.
— Não imagina o quanto. Posso parecer ingrata, afinal sempre quis isso.Imaginava que uma vida em eventos e compras fossem mil maravilhas, mas isso cansa eno final acaba sendo um tédio.
— Não é para todas, acredite. Bom, eu tive filhos um bem próximo do outro eisso nos ocupa quase o tempo todo, ainda mais que dispensei o uso de babás.
— Algo raro, né?
— Muito! Eu sempre quis ser mãe, então não conseguia suportar a ideia de teroutra pessoa cuidando dos meus filhos. E assim meu tempo foi todo tomado por eles, evocê pensa que vai ter alívio quando ficam maiores? Aí que se engana. Viramos seusmotoristas, literalmente. Podia ter pulado essa parte, mas eu sempre gostei de estarpresente e assim foram passando os anos. E aí veio a doença do Jonathan.
— Sinto muito por ele.
— Obrigada. — Vivian controlou as lágrimas e encarou a vista da cobertura deHenry. Já estivera tantas e tantas vezes ali, porém nunca se cansava. — O que acha deeventos beneficentes? Podíamos trabalhar juntas com isso, o que me diz?
— Não entendo absolutamente nada. Para ser sincera, Vivian, a única coisa naqual eu sou boa é entre os lençóis.
— Não se subestime, mulher! Lógico que você é mais do que isso, se não fosseele não estaria com você dessa forma.
— Sei lá. Não tenho muita certeza disso.
— Como não tem certeza sobre isso? Certamente Henry não está com você sópara que transem!
— Não sei o que ele espera de mim.
Olívia, em seus momentos mais frágeis e inseguros, sentia que estava ali apenaspara ser a esposa troféu de Henry White. A mulher bonita para as vistas e boa de camapara lhe satisfazer.
— Mais do que sexo, isso eu tenho absoluta certeza. Você não vai estar sozinha,faremos isso juntas e com o apoio da White Health Corporation. Eles sempre têm umaquantia reservada para essas questões.
— Tenho uma ideia. — Os olhos de Olívia ganharam um brilho assim queavistou sobre um dos aparadores a imagem da mão de Henry em um dos porta-retratos.
— Adoro pessoas que pensam rápido. Conte-me!
Olívia havia ficado impressionada com o breve contato que teve com a Sra.White da vez em que esteve com ela no hospital. Assim que pôde, fez algumaspesquisas sobre como aquela doença agia. E agora, a encarando, sabia como agir.Vivian lhe dera um propósito.
Era boa com eventos. Antes de ser acompanhante, trabalhava com isso e tambémhavia se destacado, tanto que o convite de se juntar àquela agência de garotas veio porconta da sua postura profissional.
Vivian viria com o seu conhecimento legal e social, e Olívia brilharia com suaaudácia e a palavra que Henry gostava de usar quando se referia a ela: sagacidade paraangariar fundos para sua causa social. A primeira delas.Instituições mais simples que cuidam de pacientes com Alzheimer seriam o seufoco. Henry ficaria muito orgulhoso. Só lhe faltava colocar uma aliança naquele dedo.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro