Capítulo 9
Sete anos atrás
Aurora estava em seu quarto novamente encarando o teto. Ela não sabia o que pensar nem como agir diante de toda aquela situação. Durante o caminho até em casa, seu pai falava sem parar na ideia de um aborto, porém, por mais que fosse a coisa certa a se fazer, Aurora sentia seu coração pesar sempre que pensava nessa possibilidade.
Começou a lembrar de uma discussão entre seu pai e sua mãe na época em que Helena estava grávida.
" – Isso que você está me dizendo é um absurdo Charles. Eu jamais seria capaz de fazer uma coisa dessas. – Helena estava impaciente e as lágrimas desciam de forma incontestável.
– Querida, sei o quão cruel pode parecer, mas você corre risco de vida. E Melany também. Pense na vida de Aurora sem uma mãe. Como será para ela? Como será para mim, viver sem você?
Helena tinha os olhos vermelhos e encarava friamente a Charles. Ela tinha outra filha com quem se preocupar, mas jamais seria capaz de abortar a criança.
– Eu confio em você Charles. Sei que será um bom pai para as duas. Amo Aurora tanto quanto amo Melany e é por isso que eu sei que estou fazendo a escolha certa. Eu me arrependeria eternamente se eu fizesse isso. E não adianta contestar. Já está decidido e eu não vou voltar atrás.
– Helena, por favor.
– Não! Charles! – ela grita indo em direção ao quarto".
Aurora levou as mãos até sua barriga e as apertou. Estava assustada, mas dentro dela batia outro coração e pensar nessa possibilidade era emocionante. Sua mãe em hipótese alguma permitira essa prática, provavelmente diria que a criança não tem culpa, mas teria ela coragem suficiente de enfrentar seu pai? Sua mãe fez de tudo para salvar seu bebê, ela também deveria ser capaz. Respirou fundo. Temia a atitude de Charles e temia a responsabilidade que teria que carregar caso ele permitisse que tivesse a criança.
Sua mente estava viajando quando alguém bateu na porta, despertando-a.
– Quem é?
– Sou eu Aurie. Posso entrar? – a voz doce de Melany preencheu o vazio do quarto.
– Entre, princesa.
Melany abriu a porta quase dependurada na maçaneta por ser ainda tão pequenina. Ela olhava tímida para sua irmã, provavelmente querendo alguma coisa.
– Diga pequena. O que você quer? – Aurora dá três tapinhas sobre a cama para que Melany sentasse ao seu lado.
– Papai disse que você está com um problema dentro da barriga. Você tá doente Aurie?
Aurora chocou-se com o comentário de sua irmã. O desespero em sua voz a desconsertou. Abraçou-a e acarinhou seus cabelos.
– Não é nada. Papai é exagerado. Apenas isso.
– E o que você tem na barriga? – Melany desvencilha-se de Aurora e a olha apreensiva.
A jovem loira mordeu os lábios sem saber o que dizer à irmã mais nova. Olhou ao seu redor, em busca de palavras certeiras a se dizer. Mel era uma criança, entendia pouca coisa, poderia simplesmente omitir alguns fatos.
– Digamos que plantaram uma sementinha em minha barriga e agora eu terei um bebê.
Melany franze o cenho. – Um bebê? Quem plantou a sementinha?
Aurora fez movimentos com a boca mais uma vez tentando procurar pelas palavras.
– Foi... O médico? – ela deu um sorriso nenhum pouco confiante.
Melany ficou em silêncio por um instante olhando a barriga de sua irmã. Analisou cada centímetro da mesma e balançou a cabeça várias vezes.
– Tem um bebê aí dentro? Como plantaram essa semente?
Certo. Melany não era tão ingênua quanto Aurora pensava.
– Sabe o umbigo? Então. O médico colocou uma sementinha em meu umbigo. Daí, ela vai crescendo cada dia mais um pouquinho, até se formar uma garotinho ou uma garotinha assim como você. Mas ele tem que ficar na minha barriga porque ele é muito frágil e pequenino, e lá dentro, ele terá toda a proteção para ficar bem.
– Eu terei alguém pra brincar?
– Terá sim! – Aurora diz, mas logo em seguida sente os olhos marejarem.
– E quanto tempo vai demorar?
– Vai demorar um pouquinho, pequena. Você terá que ter paciência. Certo?
– Certo. – ela balança a cabeça em concordância.
– Está na hora da senhorita dormir, não acha?
– Posso dormir com você? – Aurora queria dizer não para não acostumá-la mal. Mas sabia que quem necessitava de companhia era mais ela do que sua irmã.
– Venha.
Depois de tanto tempo, Aurora conseguiu ter uma boa noite de sono. Dormira tranquilamente sem nenhum pesadelo que a amedrontasse. E acordou com uma única certeza, ela não abortaria.
– Pai, posso falar com você? – Aurora estava firme diante de seu pai, o qual estava lendo o jornal.
– Fala. – sua atenção ainda estava no jornal.
– Eu não quero abortar a criança. – ela diz sem rodeios e consegue a atenção de Charles.
– Está brincando, certo?
– Não. Não estou. Minha mãe não quis abortar Melany e eu não quero abortar também.
– Aurora, são situações diferentes.
– Independente. Eu não tenho coragem e não dormiria tranquila sabendo do que fiz.
– Pois você vai tirar essa criança daí, nem que seja a última coisa que você faça na sua vida. – ele se levanta. O tom de voz de Charles havia se alterado, mas Aurora não deixaria se abalar. Estava na hora de enfrentar seu pai.
Charles odiava ter que se lembrar de sua esposa. Sentia uma falta imensa de Helena, e o fato de Aurora ser tão parecida a ela, lha dava ainda mais raiva por não tê-la ao lado.
– Eu não vou tirar essa criança e o senhor pode me colocar pra fora. Eu já tenho onde morar.
Charles ri debochado.
– Vai morar na rua? Vai viver do que, quando essa praga nascer?
– Não irei morar na rua e darei um jeito, mas o senhor não vai me obrigar a tirar esse filho de mim.
– Aurora não me faça perder a paciência. Não me subestima.
– Eu não farei isso, pois sei muito bem do que o senhor é capaz. Infelizmente eu sei. Eu só te digo uma coisa, mamãe está decepcionada demais com o pai o qual você se tornou. Não é só a mim o seu desapontamento, mas ao senhor, também. Ela confiou nossa criação ao marido que ela julgara perfeito, e você não foi capaz de fazer isso. – Aurora diz o que há anos gostaria de dizer.
Talvez fossem os hormônios lhe dando coragem. Ou o instinto de mãe o qual Helena sempre dizia. Charles não conseguiu dizer uma palavra sequer. De certa forma Aurora tinha razão. Sentou-se de volta a mesa e escondeu a cabeça com as mãos. As palavras de Aurora o tocaram mais do que ela imaginava. Tentou conter o choro, mas não pode evitar ter o rosto vermelho. Olhou para Aurora com um grande sentimento de remorso, mas era orgulhoso demais para pedir desculpas ou reconhecer o erro na frente das filhas.
– Faça o que quiser Aurora. A única coisa que eu lhe peço é que não largue seus estudos.
– Não vou. Além disso, eu preciso de um emprego. Terei um filho e preciso de responsabilidades. – subiu ao seu quarto sem esperar pela resposta de seu pai.
Sentiu-se leve após tirar todo o peso de suas costas. Ela teria agora mais um motivo para seguir em frente. Esqueceria dos seus traumas e de suas dores e se dedicaria a cuidar de Melany e de seu filho, independente do que tivesse que enfrentar. Olhou-se no espelho. Estava de pouco tempo, mas o suficiente para ansiar por uma elevação em seu ventre.
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Os meses foram passando e as pessoas em sua volta diziam comentários mesquinhos sobre sua barriga e alguns a ofendia em sua frente. Ora dizendo que o estupro era só uma desculpa, ora comentários machistas dizendo que ela não valia a pena já que a haviam usado e jogado fora. Por mais que muitos comentários a magoassem, ela seria forte o bastante pelo seu bebê.
Charles quase não falava com ela. Economizava nas palavras e por mais que aquilo a incomodasse preferia assim a ter que discutir com ele. Apesar de tudo, Aurora sabia que estavam passando por dificuldades, e esconder de suas filhas que sua saúde estava indo de mal a pior, estava cada vez mais difícil para o senhor Hough.
Aurora estava trabalhando em um bar na esquina de sua casa. Não pagavam bem, mas ajudava em algumas despesas e a comprar as roupas de seu bebê. Ela havia descoberto que era uma menina e a cada salário conquistado, cuidou de comprar um berço a ela ao lado de sua cama.
O tão esperado nove meses havia chegado e Melina poderia nascer a qualquer momento. Aurora escolhera o nome tentando achar uma combinação perfeita entre o nome de sua mãe e o de sua irmã, seus maiores amores. Ela estava acariciando sua enorme barriga enquanto descansava em seu quarto.
Aurora cantava musiquinhas a sua filha quando a mesma soluçava, e fazia carinhos para que ela relaxasse. Melany adorava sentir a sobrinha chutando o ventre de sua irmã e não conseguia conter a ansiedade de ver seu rostinho.
A filha mais velha de Charles sentiu uma forte dor na lombar seguida de uma pontada intensa em baixo da barriga. As dores começaram a se intensificar e sem conseguir conter, gritou. Levantou-se de imediato, tentando encontrar seu pai o mais rápido possível. Quando então sentiu um líquido escorrendo em suas pernas. Gritou mais uma vez.
– Pai!
Charles apareceu desesperado e notou o que estava acontecendo. Ainda transtornado pegara o telefone e ligou para um taxi, ao mesmo tempo em que tentara fazer Aurora se acalmar. A dor aumentava de forma constante. Melany estava assustada com os gritos da irmã. Começou a chorar compulsivamente.
– Melany, sua irmã está em trabalho de parto, não tem com o que se preocupar, vai ficar tudo bem, eu prometo. – Charles tentava consolar a filha, mas Melany ainda chorava.
O táxi finalmente havia chegado e os três embarcaram para o hospital. Aurora tentava respirar para conter a dor, mas ela vinha cada vez mais aguda.
– Vai ficar tudo bem, Mel, eu juro. Sua sobrinha está nascendo para brincar com você. Ai! – grunhiu novamente.
O motorista estava apreensivo e se assustava a cada grito da jovem em trabalho de parto. Mesmo correndo o mais rápido que podia, o carro parecia cada vez mais lento. O trânsito não ajudava, e as dores de Aurora só aumentavam. Melany gritou quando percebeu que Aurora sangrava. Ela chorou com medo de perder sua filha, ou ainda mais a vida sem conhecer sua doce filhinha e deixá-la aos cuidados de seu pai. Desesperou-se e sentiu falta de ar, desmaiando logo em seguida.
Aurora acordou já no hospital. Estava com um lençol em sua frente e sentiu as lágrimas rolarem em seu rosto. Implorou para que tudo ocorresse bem. Seu coração batia de forma acelerada, não podia se mexer e estava agoniada. Só conseguiu sentir alívio quando ouviu um choro agudo preencher um ambiente. Seu sorriso estava salgado e seu rosto molhado.
Cortaram o cordão umbilical da pequena Melina e a enrolaram num pequenino pano azul. Ao lado de Aurora, Melina foi se acalmando aos poucos e o choro foi ficando contido. Apesar de muito nova, Aurora sabia que teria feito a escolha certa. O amor que sentia por aquele ser tão pequenino era revigorante e intenso. Depositou-lhe um beijo na testa e sussurrou para a doce Melina:
– Não se preocupe. Mamãe vai cuidar de você.
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– Como você está? – perguntou Charles.
– Um pouco cansada, mas bem. E minha filha? – ela sorriu.
– Está com fome?
– Não. Eu quero ver Melina.
Charles ficou em silêncio. Olhava o chão e balançava os polegares com as mãos cruzadas.
– Pai. O que aconteceu? – sua aflição era nítida, começou a chorar sem mesmo saber o motivo.
– Aurora, eu sinto muito.
– O que aconteceu pai? – seu rosto avermelhou-se. Agora as lágrimas caíam em grande intensidade.
– Devido a hemorragia que você teve e o desmaio, o bebe teve algumas complicações durante o parto. Parece que não foi oxigênio suficiente ao cérebro da criança e isso fez com que ela tivesse poucos segundo de vida. – ele dizia a olhando seriamente e aparentemente abatido.
– Não. Não pai, ela estava bem. Ela chorava com vontade, não é possível. Me diz que não é verdade. Me diz que você está mentindo, eu juro que serei a filha que você sempre quis que eu fosse, só não me diz que Melina morreu. – os soluços tomaram conta de sua garganta.
– Eu sinto muito Aurora.
– Não! – ela chorava totalmente desolada. Charles tentou consolá-la, mas ela se esquivou. Estava odiando a vida por ter lhe tirado mais uma vez algo que amava de forma imensurável. Novamente em posição fetal ela se desmanchou em lágrimas. Lembrava-se das roupinhas e do berço que com muito sacrifício havia comprado. Sua filha não as usaria e teria que se desfazer de tudo. Ninguém sabia explicar a dor que Aurora estava sentindo ela só sabia que a dor era insuportável e torturante.
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Aurora se fechou completamente. Alimentava-se mal, não dormia, e andava parecendo um zumbi. Recusou-se a ir ao velório de sua filha, mas quis ir ao enterro. Ela precisava se despedir. Arrependeu-se no mesmo instante em que se deu conta de que não a veria nunca mais. Chorou por incansáveis semanas. Aproveitou o tempo de licença a maternidade juntamente com as férias de fim de ano que estavam para começar.
Ela precisava de um tempo longo para se reconfortar no luto e seguir sua vida. Ou como diria ela, sobreviver um dia após o outro. Estava fria. Não dirigia meras palavras a quem quer que fosse e nem Melany conseguia lhe consolar. Gritava de forma desesperada sempre que lembrava da segunda maior notícia drástica de sua vida.
– Aurora! – chamou seu pai entrando em seu quarto. Ele não ousara interromper o luto da filha, pois sabia que aquela dor era tão similar a sua em relação a sua esposa. – Precisamos conversar.
A filha de Charles olhava o lugar que antes era ocupado pelo berço que seria de Melina. A jovem velava aquele local e passava dias imaginando como seria sua princesinha. Era o seu passatempo durante dois meses. Ela não se mexeu, nem seus olhos fizeram questão de enxergar o rosto do homem com quem Aurora criara tantos ressentimentos. De certa forma ele era o grande culpado por tudo o que acontecera a ela.
– Eu sei que a dor aí está difícil de curar, mas você precisa se animar minha filha. Precisa sair desse quarto. Pense pelo lado bom, agora você não terá uma criança para se preocupar. Além do que a situação aqui em casa está difícil e eu preciso que você me ajude. Preciso de alguém para trabalhar e me ajudar a pagar o aluguel. Estou velho, não tenho mais condições de trabalhar. Já vou avisando que seremos despejados e o quanto antes precisamos achar um lugar para morar. Pense, é até bom que essa criança não tenha sobrevivido. Imagina os transtornos, imagina termos que cuidar de uma criança passando necessidade.
– Vão todos vocês para o inferno. – foram as únicas palavras que Aurora conseguiu dizer.
– Eu ainda sou seu pai e exijo respeito. – Charles se altera. – Eu não vou mais ser condolente Aurora. Preciso que aja, ou eu não conseguirei agir. Precisamos de um lugar para morar, e logo. – ele sai de seu quarto.
O rosto de Aurora denunciava uma lágrima teimosa que insistia em cair. As coisas estavam indo de mal a pior e não conseguiria suportar aquilo por muito tempo Era sofrimento demais em apenas um ano, um longo e terrível ano.
Levantou-se e fez a única coisa que achou conveniente fazer. No fundo ela acreditava que seria a melhor ideia. Foi até o quarto de seu pai que olhava fixamente para a fotografia de sua esposa. Aurora poderia achar aquilo estranho, mas ela estava sem ânimo para pensar em qualquer outro sentimento que não fosse sua dor.
– Meg estava com problemas de arranjar um inquilino. Mas isso já faz tempo. Poderia tentar ver com ela.
– Ela não nos deixará morar de graça.
– Vende as roupinhas do bebe. Vende algumas joias de mamãe ou sei lá. Você queria uma ideia e disse a única que me veio em mente. Senão quiser, tem vários bancos para se deitar na rua. – saiu e voltou ao seu quarto.
Charles ficou pensativo. Não tinha o que fazer e provavelmente a figura de Meg ajudaria a sua filha e ter ânimo para viver. Não só isso, mas também porque suas filhas precisavam de alguém para que cuidasse delas. Sabia que seu fim estava próximo e por mais carrasco que fosse, era a única forma de tentar se redimir com Helena. Sem pensar muito, foi atrás de Meg.
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Os três integrantes da família Hough se hospedaram na edícula, aos fundos da casa Meg. Aurora sabia que tinha que arranjar um emprego já que do último ela havia se demitido. Meg por sua vez dizia que eles poderiam ficar o tempo que quisesse, pois havia se familiarizado com a família, principalmente por Aurora.
Era a enfermeira quem preparava a comida e chamava uma vez por semana uma empregada para que ajeitasse a casa, já que ficava mais tempo no hospital e queria poupar Aurora pela sua dor. A jovem ainda permanecia calada. O máximo que fazia era lavar uma louça e fazer sua higiene, depois voltava para a cama e por lá ficava até que o sol surgisse novamente.
Era uma noite chuvosa e a água caía sem trégua. Estavam todos jantando à mesa em um silêncio absurdo onde o único som que se ouvia era a da chuva e do tilintar dos pratos. Isso sem dizer da tosse insuportável que Charles dava sem parar. Aurora apenas deslizava os talheres sobre a comida. Ela mal se alimentava. Aquela situação a incomodava e achou melhor sair de lá.
– Estou sem fome – largou o garfo no prato e estava prestes a se levantar, mas seu pai a interrompeu.
– Pois se sente aí e come. Está querendo se matar?
– Tanto faz – deu de ombros – Só estou sem fome.
– A mesma desculpa de sempre Aurora. Já chega dessa infantilidade.
– infantilidade? O que você entende de infantilidade? Um velho que age feito um ogro porque não conseguiu superar a perda da esposa. O que você sabe? Sabe o que é perder uma mãe com doze anos? Sabe o que é cuidar de uma criança nessa idade? Claro que não sabe, porque o senhor nem sequer foi capaz de trocar as fradas de Melany, eu perdi minha mãe, minha dignidade e agora minha filha. Não me fala de infantilidade quando o senhor não faz ideia do que eu estou sentido. – ela tentava manter-se firme, mas seu rosto vermelho a entregava. Estava exausta de todo o peso que estava carregando, mal sabia que era só o começo.
– Já chega Aurora! – Charles grita raivoso. – Eu não te dou o direito de gritar comigo desse jeito. Eu sou seu pai e exijo respeito.
– Pois que vá a merda esse seu papel barato que o senhor pegou de pai. Você foi péssimo.
– Parem, por favor! Querem que Monterrey inteira escutem vocês? – Meg tentava apaziguar. Enquanto Mel tapava os ouvidos e chorava descontroladamente.
– Sobe ao seu quarto ou não respondo pelos meus atos.
– Eu já ia fazer isso mesmo – ela o olha de forma irônica e a tosse de Charles aumenta, o que lhe causa falta de ar. Meg mais que depressa tenta socorrê-lo, e Melany assistia tudo aquilo assustada e amedrontada.
O senhor Hough estava deitado ao sofá, pois não tinha forças para ir até o seu quarto. Meg tentava fazer de tudo para acalmá-lo, mas a dor em seu peito e em seu braço aumentava. Ele tentava respirar com dificuldade e graças a um medicamento dado pela enfermeira, ele conseguiu relaxar. Não poderiam ir a um hospital com aquela chuva, provavelmente seriam atingidos por raios ou poderiam pegar uma pneumonia.
Aurora estava sentada em sua cama e segurava em sua mão uma mantinha. Fora a única coisa que não conseguiu se desfazer. Segurava em seu colo e imaginava sentir Melina em seus braços. Deitou na cama e colocou a manta ao seu lado acariciando-a a fim de sentir a textura do tecido. Ela imaginou segurando as mãozinhas pequenas de sua filha, escutando seu chorinho, e ver o seu sorriso mais sincero. Imaginou cantando a música que sua mãe cantava sempre que tinha algum pesadelo ou quando o sono demorava a chegar. Chorou novamente por não tê-la ali naquele momento.
Ela escutou o ranger das portas e virou-se para olhar quem a interrompia de seu momento. Seus olhos fulminavam aquele ser pequenino e de olhos temerosos.
– Quem te mandou entrar aqui? – ela pergunta de forma seca.
– Estou com medo dos trovões Aurie. Não consigo dormir.
– Pare de agir feito criança. Isso é um medo idiota, volte para o seu quarto e se esforce para dormir. – ela diz com raiva e Melany deixa escorrer as lágrimas que transbordaram por não ter mais espaço em seu peito. Ela se virou lentamente e agarrou ao seu ursinho, indo em direção ao quarto e tendo apenas a escuridão como sua companheira.
O soluço de Melany trouxe o gosto amargo do arrependimento a Aurora. Ela se levantou de forma a ficar sentada e então gritou pelo nome de sua irmã.
– Mel! – sua voz agora era doce.
Sua irmã caçula voltou sua atenção para Aurora, temendo que a irmã lhe desse uma bronca.
– Venha cá, pequena. – Aurora chamou e Melany se sentou ao seu lado.
As duas ficaram em silêncio por um tempo. Estavam constrangidas, uma a frente da outra depois de tanto tempo sem trocarem uma só palavra.
– Por que você não gosta mais de mim Aurie?
– Ei, por que pensa assim?
– Você não brinca mais comigo. Só fica brava. – Melany tinha medo da reação de sua irmã e abraçava ainda mais forte seu ursinho. Seu rosto estava baixo e por um instinto secou as lágrimas dele.
– Me perdoa, Mel. – Aurora segurou o queixo de sua irmã e levantou seu rosto para avisar que não tinha com o que se preocupar.
– Meg me disse que você está assim porque Melina foi morar com a mamãe lá no céu, e que agora mamãe está cuidando dela.
– Ela te disse isso? – Mel consente e Aurora se emociona com o que acabara de ouvir. Ela não tinha pensado dessa forma e a ideia era de certo modo, reconfortante. Novamente deu espaço para que as lágrimas tomassem conta. – Meg tem razão. Agora mamãe e Melina são nossos anjinhos que estarão cuidando de nós lá de cima.
– Jura? – Melany se animou. – E por que está chorando?
– Estou emocionada – era um sentimento inexplicável – Escuta Mel, vamos fazer um trato certo?
– Certo.
– Nós iremos cuidar uma da outra. Seremos sempre um elo infinito. Você é a pessoa que eu mais amo nesse mundo e eu juro que tudo o que eu fizer na minha vida vai ser pensando em você. Nunca duvide do meu amor, está bem?
Melany sorriu animada. Aquilo encheu seu coraçãozinho de esperança.
– Eu prometo Aurie, mas o que é elo?
– É uma ligação muito forte que nós teremos. A partir de hoje será você e eu, está bem? Somos uma família.
As irmãs se abraçaram e dormiram selando um acordo eterno.
A manhã havia trazido um céu claro e um sol ardente. Nem de longe parecia o tempo asqueroso da noite anterior. Naquela manhã, Charles havia acabado de falecer.
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