Epílogo
AURORA
Termino meu banho e vou em direção ao meu quarto, vapores de água quente reverberando por todo o lugar, respiro fundo. Consigo sentir meu cheiro de âmbar se impregnando pelas minhas narinas. Com apenas uma toalha branca enrolada no corpo, me sento na cama.
Observo o vestido cinza que deixei na minha cama para eu vestir na festa que ocorrerá hoje a noite. Seguro o colar de estrelas douradas que minha melhor amiga me deu. Laura deve estar no apartamento dela agora, provavelmente se arrumando, se não ela já estaria aqui. Dou um pequeno sorriso à medida que passo a mão pelo vestido macio. Agora, eu e minha melhor amiga unidas eternamente, fiz um juramento e vou cumpri-lo até o fim.
Com um pequeno suspiro, tiro a toalha do meu corpo e visto o vestido que não passa dos joelhos. Esse mesmo vestido que meu pai me deu quando ainda vivo. Tinha quatorze anos na época, mas, por incrível que pareça, ainda serve.
Faço uma maquiagem leve e também faço ondas pelo meu cabelo que passa da cintura em uma cascata de castanho-achocolatado. Me encaro no espelho. Minhas bochechas com cor, meus lábios macios e rosados, meus olhos com um brilho que me faz sorrir.
Me sinto melhor do que nunca estive. Sabe aquela sensação de que você está aqui e agora? Está vivendo e está satisfeita com as pessoas que ama? É uma sensação maravilhosa. Na maioria das vezes, ela demora para chegar. No meu caso, demorou praticamente um ano. Pode ser diferente para você. Mas eu garanto; ela chega, em algum momento. A maioria das pessoas estão ocupadas demais preocupadas com outras coisas, então elas não percebem o quanto esses momentos são incríveis, e deixam escapar. Depois, elas reclamam. Eu já fiz isso, mas não vou fazer mais. Vou aproveitar, vou amar, vou viver e ter uma vida plena, assim como meu pai mencionou na carta, assim como todos nós merecemos.
Descobri que sentir saudade de alguém nunca fica mais fácil, só mais tranquilo. Você aprende a viver com a dor da saudade dentro do peito, se entristece pelos momentos bons que compartilharam e, às vezes, se permite sofrer. Mas eu também aprendi que também dá para seguir em frente... Criar novos bons momentos, com novas pessoas. Assim, sorrir de novo; nem que seja um pouco. Com o tempo, tudo fica melhor, mais fácil.
Instantaneamente, viro meu rosto para encarar a imagem de meu falecido pai, na cômoda não muito longe de onde estou. Me aproximo e seguro a imagem na minha mão. Deixo a carta que eu reli inúmeras vezes ao lado. Coloco a fotografia no bolso do meu vestido, que é quase imperceptível. Quero que ele esteja comigo. Quero que ele veja, aonde quer que esteja, que hoje é um dia especial.
— Eu consegui, pai — Murmuro para a imagem. Um sorriso já começa a cresce em meu rosto — Eu consegui.
Tento não chorar enquanto encaro a imagem. O sorriso ainda permanece em meu rosto. De onde Michael está, tenho certeza que deve estar orgulhoso de nossa família, que está feliz por estarmos felizes. Por termos todos conseguido vencer a dor, tristeza e solidão. Sei que tudo o que passamos não foi fácil. Foi muito difícil. Mas também acredito que tudo tem um motivo e eu não me arrependo de nada. Mesmo que a vida não seja perfeita... ela ainda pode ser boa. Do seu jeito. Se você olhar com atenção.
Desço as escadas e encontro minha mãe preparando comida. Ela está cantarolando, não me viu, pois se encontra de costa para mim. O cabelo dela está preso em uma rabo de cavalo. Alice está com um lindo vestido de cor café. Ela parece feliz e isso me faz me sentir mais feliz ainda.
— O cheiro está ótimo. — Digo com um sorriso. Me aproximo dela e a abraço por trás. Ela sorri com timidez.
— Oi, filha — Minha mãe me observa com orgulho — Uau — Ela me encara com atenção — Você está linda!
Dou um beijo demorado em sua bochecha, que ela responde com um afago em meu cabelo. Nossa relação está melhor do que nunca.
— Obrigada. Você também está espetacular.
Em resposta, minha mãe acena com carinho e volta a preparar alguns petiscos para o encontro que teremos hoje a noite devido ao último dia do ano. Ofereço minha ajuda e ela acaba aceitando. Ficando assim por longos minutos, limpando, cozinhando e sorrindo. Assim como nos velhos tempos. Minha mãe mais radiante que nunca e sinto que também estou assim.
Aceno em despedida para Alice. Logo, quando ultrapasso a porta da cozinha, sinto alguém agarrar minha cintura e quase grito de susto. Mas esse grito foi interrompido quando noto o menino à minha frente. Patrick, está em seu habitual preto, seus cabelos negros levemente penteado e um sorriso já está em seus lábios. Eu não tinha visto ele chegar, mas estou feliz por ele estar aqui. Tento controlar a minha respiração acelerada conforme o observo. Ele é tão lindo.
— Você me assustou! — Resmungo com um sorriso.
Patrick passa os braços por minha cintura. Ele parece querer dizer algo, mas antes que possa dizer a companhia toca. Logo depois, Laura e Caio aparecem na sala. A primeira impecável como sempre, seu vestido é de um tom verde e seu cabelo cacheado preso em um coque despojado, e sua maquiagem valoriza ainda mais seu lindo rosto.
Meu irmão está igualmente lindo ao seu lado, seu braço apoiado na cintura da minha melhor amiga. Ele parece radiante.
Patrick se senta na poltrona e faço menção de sentar ao seu lado, mas ele me puxa para seu colo. Não me oponho, e ficamos assim. Um sorriso sincero em meus lábios à medida que passo o braço pelo seu ombro. Me aproximo para beijá-lo, mas a compainha toca mais uma vez. Solto um pequeno bufo frustrado, o que faz uma risada gostosa soar contra meu cabelo.
— Pode deixar que eu atendo. — Caio diz, por ser o mais próximo da porta. E, solto um suspiro de alívio, voltando ao colo de Patrick que me encara com um sorriso no rosto. Patrick roça os lábios pela minha orelha. Ele já está se aproximando para um beijo, quando Matheus entra com Felipe ao seu lado.
Já faz meses, desde que Felipe está trabalhando no Briar. Eu o considero meu amigo. Não há ressentimento entre mim e Matheus, pelo beijo. Eu o perdoei. Os dois nos cumprimentam — O que interrompe, mais uma vez, nosso beijo —, e se sentam no sofá em formato de L, à direita de Laura e Caio.
Todos tem que estar aqui hoje, ninguém vai ficar sozinho neste dia especial. Ninguém. Todos tem que ver os fogos de artifícios, comer e dar risada das piadas sem graça do meu irmão.
Não demorou muito para Gael, primo de Laura aparecer também. Ele parece melhor. Em seu olhar, que um dia foi triste, vazio, agora com um leve brilho. Ele se senta ao lado de Felipe. Os dois se entreolham e sinto o clima esquentar. Felipe segura a mão de Gael, e ele não se afasta, pelo contrário, retribui o toque.
Eles formam um belo casal.
Com um pequeno sorriso, abro a boca para dizer algo, presumindo que todos estão aqui. Mas a compainha toca novamente, o que interrompe minha fala.
— Deixa que eu atendo. — Laura diz, um pouco animada. Não me oponho, apesar de estar confusa. Vejo Laura abrir a porta e consigo notar a figura ruiva ali.
Melissa está com um vestido de um tom vermelho escuro, seu batom da mesma cor. Ela parece diferente de certa forma, mas, do mesmo modo, o bom estilo continua o mesmo. Eu consigo enxergar o abraço que as duas dão uma na outra, é um abraço repleto de saudades. Por um momento, tenho vontade de estar ali no meio das duas.
— Senti sua falta. — Consigo escutar Laura dizendo para Melissa.
Com um beijo suave em Patrick, me aproximo mais de onde elas estão.
— Eu também senti sua falta. Todos os dias — A ruiva diz para Laura.
— Bom saber que está de volta, Melissa. — Me pronuncio de modo provocador para a Melissa. A ruiva se vira para me ver, Melissa me encara surpresa e me lança um pequeno sorriso. Ela parece me observar por longos minutos, decidindo o que dizer. Parece que há um brilho em seus olhos, parece muito melhor de quando foi para Floriana.
— Para o desagrado de alguns. — Ela diz de modo sarcástico, ao cruzar os braços. Mas ainda assim há um sorriso sincero em seu rosto, que eu acabo retribuindo.
— Senti falta da sua ousadia. — Digo enquanto cruzo os braços também — E, mesmo que não admita, sei que também sentiu minha falta. Nem que seja um pouco.
Melissa nega com a cabeça de modo brincalhão. O sorriso ainda em seu rosto. Parece outra pessoa, o corpo e o cabelo é o mesmo, mas é como se fosse uma versão melhorada. Eu gostei disso.
Estou me preparando para voltar para Patrick, porém uma uma voz me impede.
— Aurora... — Melissa murmura, hesitante — Podemos conversar, por favor? Assinto. Ela me puxa para o canto da sala, para termos mais privacidade.
— Sim?
Melissa se mexe desconfortavelmente em seu corpo. Procuro não dar muita importância aos pensamentos frenéticos em minha cabeça. Pelo menos, Richard está preso agora. Estou aliviada de certa forma, pois estamos todos seguros agora. Principalmente o lindo de cabelos negros que está nos observando de longe. Assinto para Patrick, que parece preocupado, mas não há com que se preocupar, não agora. Ele entende o recado, mas ainda continua nos encarando.
— Peço perdão, por toda a dor que eu causei a você. — Melissa diz com lentidão e profundidade, como se fosse difícil pronunciar tais palavras. Parece realmente pesarosa — Sei que não foi justo com nenhum de vocês. Principalmente com você. Na época, eu estava magoada, irritada e com raiva. Eu só precisava de alguém para culpar. Cometi muitos erros, e me arrependo deles. Sei que nunca vou poder compensar o que eu fiz... Mas, de verdade, eu sinto muito pela dor que causei a você.
Dou um suspiro. OK, não estava esperando por essa. Parece que Melissa realmente mudou, o que eu acho bom. Ela parece realmente arrependida pelos seus erros e está sendo uma melhor agora. Eu acho isso admirável.
Coloco minha mão carinhosamente em seu ombro. Sei que não foi culpa inteiramente dela, além do mais, está tudo bem agora. Não tem porque ter rancor, ódio e mágoas. Eu também não sou perfeita, não devo julgá-a pelas suas decisões passadas. Até porque eu também errei e fiz más escolhas. Contudo, nós duas estamos dispostas a melhorar e seguir em frente. O que há de errado nisso?
— Por ela... — Murmuro ao encarar a menina de cabelos enrolados e olhos verdes, que está do outro lado da sala sorridente enquanto conversa com Caio. — Por ela, eu teria feito o mesmo.
Melissa e eu somos mais parecidas do que imaginamos. Tudo o que sempre queremos era uma pessoa com quem conversar, uma amiga, e agora temos isso em comum. E sinto que ainda vamos ser grandes amigas. Nós três.
— Você está bem? — Pergunto ainda encarando-a — Depois de tudo...
Melissa cruza os braços em frente ao corpo.
— Se você quer saber se eu vou ter uma crise a qualquer momento e atropelar alguém? — Ela dá um sorriso de lado — Pode ficar tranquila, eu estou bem e não vou fazer isso. Dou um sorriso e a ruiva retribui, mas logo esse sorriso some quando ela encara um ponto além de mim. Me viro para encarar o que a fez perder o riso.
— Melissa? — Escuto uma voz a chamar — O que está fazendo aqui?
Encaro-os supresa.
— Vocês se conhecem? — Pergunto para Matheus, ao alternar o olhar entre ele e Melissa.
— É uma longa história... — Ele responde ao engolir em seco. Seus olhos arregam e sua boca se entreabre.
— Nem tão longa. — Melissa retruca, mas há mágoa em sua voz.
Se bem que Melissa foi para Floriana e Matheus veio de lá... Será que ela é a menina que ele está apaixonada? A que ele não conseguiu esquecer? Afasto os pensamentos da cabeça. Quando um silêncio constrangedor se instala no lugar, Melissa bate os pés pelo corredor, mas Matheus a segue.
Desvio meu olhar para Laura, ela dá um dar de ombros, tão confusa quanto eu. Antes que pudéssemos continuar com essa troca de conversa silenciosa, meu irmão a puxa para seu colo e a beija. Reviro os olhos de modo brincalhão, mas dou um sorriso ao ver a cena.
Sinto a brisa rodear meu rosto e cabelo à medida que me me viro para a janela, para encarar as estrelas. Respiro o ar gélido da noite e observo o céu escuro acima. Me apoio no batente da janela e fico encarando-as. Consigo observar as constelações conhecidas.
Pássaro branco. Meteorous. Estrela acima.
Parece que elas estão brilhando mais forte agora. Há tantas delas.
Sinto uma mão rodear minha cintura, já sabendo quem pode ser, me viro para encará-lo. Rapidamente, sinto menta me atingir e respiro o cheiro, para que assim permaneça por mais tempo em meu pulmão. Dou um sorriso quando estou cara a cara com o menino à minha frente. Patrick se aproxima apenas para colar nossas testas. Seus olhos negros estão significativos e brilhantes.
— Aurora, minha luz. — Patrick sussurra com nossas testas coladas.
Ela fica um minuto em silêncio, antes de continuar.
— Não importa o quão forte seja o brilho das estrelas... da lua ou sol; o seu sorriso sempre será mais radiante. Ele sempre irá fazer meu peito palpitar. Jamais deixe que essa luz se apague, pois ela é a direção que me mantém. — Você é minha direção. — Ele faz pausa, percebo um brilho de emoção em seus olhos — Eu te amo, Aurora. Como eu nunca amei ninguém antes. Isso me assusta, pois esse sentimento é tão grande que me consome por inteiro. — Sinto meu peito se agitar de amor. Lágrimas escorrem pelo meu rosto.
Por muito tempo, fiquei me perguntando o que era o amor. Nunca entendi ao certo o conceito dessas palavras, mas, aí, Patrick apareceu e eu descobri que o amor vai além de uma palavra, vai além do nosso entendimento, da compreensão. O amor acontece dia a dia. A cada momento que estamos com quem amamos. O amor é um processo.
— Patrick... — Sussurro — Eu precisaria de mais de uma vida para explicar o quão preenchida me senti depois da sua chegada. Te amar nessa vida nunca será o suficiente, pois eu te amo além do infinito.
Meu amigo, meu companheiro e meu namorado. A pessoa com quem conversei quando ninguém me escutou, que me fez enxergar colorido quando tudo estava cinza, que tem meu coração, corpo e alma. O menino de cabelos negros que eu amo, e sempre vou amar. Não importa quanto tempo passe, sempre será ele o garoto dos meus olhos.
No fundo, eu sempre quis que isso acontecesse. Porque desde o momento em que esbarrei com ele no corredor do colégio, eu soube que ele de alguma forma iria virar meu mundo de cabeça para volta e não teria volta.
Me aproximo dele e colo nossos lábios em um beijo carinhoso. Patrick retribui conforme segura minha cintura. Há desejo, amor e carinho. Há sentimento, palavras e emoções no modo como nossas línguas se encontram e movem. Percebo que é assim que eu queria estar. Sempre.
Em algum momento, nos afastamos para recuperar o fôlego. Melissa e Matheus voltam juntos de onde quer que estiveram. Percebo que Melissa está com o batom levemente borrado e um pequeno sorriso se encontra nos lábios de Matheus, mesmo que ele tentam disfarçar, ambos estão descabelados e com olhos brilhantes. Acho que eles se reconciliaram. Eles parecem se amar, e sei que vão lutar por esse amor.
Me aproximo da cozinha, onde todos estão na mesa agora. Encaro todos nos olhos. Laura ao lado de Caio; Gael ao lado de Felipe; Matheus segurando a mão de Melissa; Minha mãe ao lado de julia, e, por fim, Star rodopiando o rabinho no chão.
Meu olhar se contém em meu irmão, seu sorriso resplandecendo em meu coração. Caio dá um aceno de cabeça para mim e eu retribuo. Faço o mesmo para Laura que me encara com carinho.
Consigo sentir a presença calmante de Patrick ao meu lado. Sinto sua mão rodear suavemente minha cintura à medida que pego uma taça de espumante e bato com o talher na mesma, o que faz todos me encarar com atenção. Meu coração repleto de alegria e felicidade, por estar aqui com as pessoas que eu amo.
As pessoas sempre se lembram de momentos, pois eles nos levam aonde devemos estar. Os incidentes que nos deixaram marcas e nos engoliram por inteiro. Tive muitos momentos na vida, esses que me transformaram, que me desafiaram, que me assustaram e me moldaram . No entanto, nos mais importantes — eu tive pessoas que se importaram comigo, uma família e amigos, e, principalmente, Patrick. Ele sempre esteve ao meu lado, tanto nos dias bons quanto ruins — Principalmente nos dias ruins.
Patrick aperta sua mão em minha cintura em sinal de apoio silencioso. Ele beija minha bochecha, e sinto meu coração se agitar no peito.
— Pessoal quero fazer um brinde. — Digo firme, ainda encarando cada um nos olhos. Feliz por tê-los conhecido, por chamá-los de família, por um novo ano, com pessoas que eu amo e que se importam comigo. Um sorriso já começa a crescer em meus lábios.
Foi um ano difícil para todos nós. Erramos, aprendemos e melhoramos. Mas o que importa é que estamos juntos, e se continuarmos assim podemos sobreviver a qualquer coisa, superar qualquer coisa. Contanto que estejamos juntos, seremos inabaláveis.
Sim, eu consegui. Nós conseguimos.
Aperto a fotografia do meu pai que ainda está no bolso do meu vestido. Dou um suspiro, ainda com o sorriso no rosto e levanto mais a taça, que brilha com espumante. Todos me encaram com atenção e com olhos brilhantes, esperando para o que tenho a dizer.
— Um brinde, aos Recomeços!
FIM!
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