Passo número 3 - Tire proveito da rotina (Parte 2)
— Então você é um bisbilhoteiro. — Brinquei, apesar de estar um pouco incomodada com a situação. A vergonha poderia me fazer agir como um avestruz, se quer saber. Aliás, cadê meu buraco? Por que os buracos nunca estão por perto quando precisamos deles?
— Pode-se dizer que sim. — Ele não negou. — Mas eu realmente tenho um grande motivo para isso.
— Explique-se, Edmund. — Pedi, passando uma mão sobre seu ombro. Não sei exatamente o motivo para ter agido assim, apenas agi. Fora muito semelhante ao que uma mãe faria, passando conforto para uma revelação possivelmente de enrubescer as bochechas. Talvez uma namorada agisse daquela forma reconfortante... Mas eu não sou sua namorada! Longe disso! Aliás, como essa ideia absurda veio parar na minha cabeça? Culpa dos romances dos poucos filmes que assisto, só pode!
— Podemos conversar sobre algo sério? — Ele olhou para baixo, como se estivesse envergonhado.
— Diga.
— Em particular? — Sua voz desceu uma oitava quando disse isso, quase como se não quisesse dizer.
— Já entendi o recado, senhor conquistador. — Nick disse, piscando para ele. — Saiba que se fizer algum mal à minha amiga, serei o primeiro a te perseguir, sem ligar para seu péssimo estado de espírito. — O sorriso que ele deu foi um tanto quanto cínico. Foi engraçado de ver.
— Entendido, senhor capitão. — Edmund bateu continência, fazendo-me imaginar se ele já pensara em seguir carreira militar. Ele tem tudo para dar certo nisso, assim como meu Henry.
— Amy sabe se proteger sozinha, porque é uma baita de uma mulher, como todas são, mas eu acabaria com a sua raça da mesma forma.
— Depois de mim. — Sorri com falsa amabilidade. Eu não estava brincando. Realmente acabaria com ele caso fosse necessário, apenas não seguiria os mesmos métodos de Nick. Sem violência para mim!
— Poderíamos acabar com ele juntos, não acha? — Nick sorriu para mim, iniciando o planejamento de nossa vingança mirabolante.
— Eu chuto e você soca, o que acha? — Brinquei, apesar de saber que dificilmente seguiria isso.
— Chuta o meio das pernas?
— Sim!
— Estou gostando do som disso... Posso socar essa carinha bonita? — Ele indicou o rosto de Edmund, mas a pergunta foi direcionada a mim.
— À vontade!
— Gosto mesmo do som disso!
— Idem!
— Você espalharia as besteiras dele para as meninas da faculdade depois, certo?
— Afirmativo, senhor capitão. — Brinquei. Edmund parecia se divertir com nossas ameaças sem fundamento.
— Posso esquartejá-lo em praça pública? Colocar partes do corpo dele pela cidade? Como fizeram com aquele cara lá no seu país...
— Tiradentes. — Afirmei, lembrando da vez em que lhe contara tal história. Acho que ele sabe mais da história do Brasil do que muitos brasileiros. Aliás, tenho certeza.
— Isso!
— Eu poderia fazer uns cartazes com os crimes dele e...
— Ok, já chega vocês dois! — Edmund finalmente se pronunciou. — Estava engraçadinho até a parte de me esquartejarem em praça pública.
— Bem-vindo ao Brasil! — Eu disse em português, apenas para dar maior impacto. Depois traduzi para eles.
— Caramba! Essa sua língua latina é muito... caliente! — Nick disse, lembrando uma das poucas palavras espanholas que conhecia.
— Caliente é em espanhol, meu amor. — Revirei os olhos. — Na minha língua é "quente".
— Gosto muito de sua língua. Será que consigo alguém que fale assim?
— Não sei.
— Oh, beije-me, Marco! — Disse, com voz afetada, fazendo-me rir.
— Sem referências a Anna e o Beijo Francês, meu caro. — Balancei a cabeça, mas completei o diálogo em mente. "Será que Marco vai gostar de Futebol?"; Stephanie Perkins, o que fez comigo? — Além disso, não creio que encontraria um Marco no Brasil.
— Falou Amelia Stone!
— Você é um idiota! — Xinguei, mas ri em seguida, o que anulou o xingamento.
— Vou seguir com a minha idiotice para a mesa de Poker! — Disse, então se afastou, despedindo-se com a mão.
— Fico meio sem jeito com as brincadeiras de vocês. — Edmund disse, assim que ficamos a sós.
— Pode entrar na brincadeira, sabe? Não mordemos!
— Posso fazer um comentário então?
— Fique à vontade!
— Sua língua latina é realmente quente. — Ele disse, os olhos brilhando com uma intensidade que eu nunca vira antes. Ah não! Minhas bochechas esquentaram 180º Célsius, tamanha foi minha vergonha. Ouvia Nick dizer isso o tempo todo, mas ouvir Edmund repetir suas palavras foi... Não sei! Constrangedor, mas não apenas isso. Não sei explicar!
— Obrigada. — Disse, acanhada. Talvez devesse agradecer ao meu bom e velho português brasileiro, mas não consegui pensar em dizer nada mais.
— Agora posso revelar uma coisa idiota?
— Diga.
— Bem... — Ed suspirou e se apoiou à parede mais próxima, analisando-me. — Eu odeio ser quem sou, às vezes.
— Ué. — Pisquei. Por essa eu não esperava! — Por quê?
— Não sei ao certo. — Suspirou novamente. — Quero dizer, saber eu sei, só não consigo explicar, entende?
— Tente. — Andei até seu lado, encostando-me na parede. Então deslizei por ela até estar sentada no chão.
— Eu não sei... — Ele deslizou pela parede, imitando tudo o que eu fizera. Agora, lado a lado, ele parecia ainda mais vulnerável. — Às vezes, quando estou na multidão, como agora a pouco, jogando Poker, eu sinto que estou sozinho.
— Entendo. — E eu realmente entendia. A maior solidão é a solidão em meio à multidão.
— Todos me observam, sem realmente me enxergar. Seus olhos alcançam somente o que sou por fora, somente a imagem que o dinheiro e meu estilo de vida proporcionam. — Olhou para suas próprias mãos, enluvadas, então continuou, a voz mais baixa a cada palavra pronunciada. — Eles esperam que eu seja perfeito o tempo todo, mas também ficam ansiosos por um erro para julgar.
— Como se você fosse um líder? — Perguntei, lembrando-me da rainha da Inglaterra. Elizabeth passara por isso diversas vezes, como The Crown apontou, principalmente por ser mulher, pois é sempre quando esperam o dobro de você, uma vez que se consideram inferior.
— Sim. Eles esperam que eu esteja sempre preparado para tudo, que eu ria intensamente, mesmo com a dor me consumindo.
— Acho que a sociedade no geral espera isso.
— Eu sei, mas sinto que é mais forte comigo! — Disse, exaltando-se um pouco. — Desculpe, sei como deve ter soado egocêntrico. — Encolheu os ombros.
— Não, tudo bem. Continue. — Sorri, encorajando-o. Estava gostando de saber que ele conseguia realmente se abrir comigo, como se fôssemos amigos antigos.
— Minha família é um pouco famosa, sabe? Ao ponto de chamar a atenção da imprensa.
— E isso é ruim?
— É péssimo! Eu não preciso de câmeras mostrando apenas um ponto de vista! Não quero câmeras me perseguindo e manipulando minha imagem.
— Realmente deve ser chato.
— É insuportável! — Ele olhou no fundo dos meus olhos, fazendo-me sentir uma fração do que ele sentia. — Não sou perfeito! Eu sou apenas um cara, sabe? Um homem qualquer que está procurando seu lugar no mundo.
— Tentando encontrar seu caminho?
— Sim! — Ele sorriu, como se estivesse feliz por alguém o entender. Sorri de volta, sabendo que isso o faria se abrir ainda mais. — Todos esperam um show, mas ninguém está realmente interessado em te dar espaço, em ouvir o que tem a dizer.
— É frustrante. — Concordei.
— Você acha que o mundo se preocupa com você, ao te observar, mas eles apenas esperam o momento de sua queda.
— Para apontar para você e te julgar. — Eu estava impressionada com a profundidade daquela conversa. Estávamos sentados no chão de um dos corredores da faculdade, no meio de um dia de aula, com pessoas indo e vindo com seus materiais. Era um dia comum, rotineiro para um aluno de Harvard, mas nós estávamos o transformando em um dia para desabafar.
— Também se sente assim? — Ele piscou, confuso.
— O tempo todo! — Revelei. — Nunca sou boa o bastante para nada, como insistem em me lembrar. Mas quer saber de uma coisa?
— O quê?
— Você não pode desanimar!
— Como não desanimar diante disso? Eu sequer sou o melhor da minha turma!
— Eu não diria que sou a melhor aluna de todas, mas eu me esforço para chegar pelo menos próximo disso. E é isso que você deveria fazer!
— Me esforçar?
— O máximo que conseguir!
— É fácil para você falar, é tão esperta.
— Não o tempo todo, pode ter certeza.
— E como não desanima?
— Eu penso coisas boas.
— Quais?
— Deixe-me pensar... — Mordi meu lábio em um movimento involuntário. Sempre faço isso quando estou muito concentrada. — Lembre-se: sempre haverá alguém tentando te derrubar, dizendo que há alguém melhor do que você. E, realmente, sempre há alguém melhor, mas nunca haverá alguém que faça algo do jeito que você faz. Você é único! — Sorri, tocando seu nariz gelado. — E sabe de outra coisa? É reconfortante saber que sempre tentamos ser nossa melhor versão. Eu, pelo menos, sempre tento ser minha melhor versão.
— E funciona?
— Sou uma brasileira em Harvard, não sou? — Lembrei, provando meu ponto.
— Uau! Você deveria fazer Relações Públicas! Imagine esse discurso na ONU!
— Eu não consigo imaginar isso. — Ri, agradecida pelo elogio original. — Mas eu imagino você na ONU, mostrando que, apesar das inseguranças, você cresceu na vida o bastante para falar bonito em um lugar importante. E, de quebra, imagino você sendo uma inspiração para toda uma geração.
— Como você consegue ser tão legal? — Ele sorriu, um sorriso realmente brilhante se quer saber.
— Não diria que sou legal. Sou apenas... Eu.
— Gosto de você então.
— Eu também gosto de você, Ed. — Por que eu fiquei vermelha ao dizer isso?
— Agora vamos! — Ed levantou, estendendo a mão para que eu fizesse o mesmo. — Tenho uma surpresa para você, senhorita Amelia!
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