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Havia sombras, sombras em toda a parte, e ele estava no meio das sombras. Ele era as próprias sombras que dominavam a noite.
Estava chovendo, uma tempestade terrível. Relâmpagos clareavam a noite de segundo à segundo, revelando o que se escondia no manto de escuridão. As árvores tinham olhos, eram seres vivos nocivos, seus olhos a acompanhavam, sondavam sua alma. Seus galhos eram garras afiadas que queriam tocá-la, possuir seu corpo e destruí-lo.
Havia o uivo do vento, mas então ela percebeu que aquele ruído eram gritos, gritos aterrorizantes de pavor, pedidos terríveis de socorro que não podiam ser atendidos. Eram as almas de seus amigos, perdidos para sempre na floresta escura, onde se escondia um terror desconhecido.
Juliana começou a correr no meio da floresta escura e convulsa, enquanto as árvores tentavam tocá-la, enquanto atrás dela, a coisa vinha se aproximando.
— Socorro!!
Ela tentava gritar, mas seus gritos eram abafados pelo som da tormenta que desabava.
Não havia como fugir. Ela sabia mas continuava correndo. Correr era a única coisa que ela podia fazer. A floresta escura parecia estar em toda a parte, parecia cobrir o mundo.
Ela continuou correndo e de repente um facho tênue de luz despontou na escuridão. Seu peito arfava, a respiração era sibilante e sua garganta queimava. Juliana sentia-se estranha. Era como se ela estivesse vendo a coisa com os olhos de outra pessoa, como se estivesse dentro de outra pessoa.
Ela avançou pelo que parecia ser uma trilha e viu uma casa obscura.
Sentiu medo.
Não queria entrar naquela casa, porque de alguma maneira ela sabia que lá dentro habitava o terror. Mas ali ela parecia não ter controle sobre sua própria vontade.
Olhou para a sua mão e viu que segurava uma foice. Havia alguma coisa escorrendo do fio afiado e de alguma forma ela sabia que era sangue.
Ela avançou.
A imensa porta envidraçada que dava acesso à casa estava quebrada. Ela passou pela porta.
As trevas dominavam o interior fétido da casa, e de repente Juliana percebeu que aquela casa estava dominada pela loucura. Aquilo crescia pelas paredes como bolor.
Mais gritos aterradores despontaram pela casa tomada pela escuridão. Juliana sabia que um banho de sangue ocorrera ali dentro. Havia cadáveres espalhados por toda a parte, corpos apodrecidos, mas ainda vivos, uma forma grotesca de vida.
Uma luz bruxuleante dissipou a escuridão. Juliana olhou para o lado direito e viu fogo na lareira. Olhando através daqueles olhos que pareciam não serem os seus, ela vislumbrou uma forma sentada no sofá.
"Corre Juliana! Corre !"
Mas ela não pode correr.
Aproximou-se da forma sentada percebendo que era uma mulher.
Havia um cheiro fétido de carniça à impregnar o ar.
A mulher estava sentada, tremendo e esvaindo-se em sangue. Uma poça enorme e fétida de sangue se formava no chão. Seus cabelos ensanguentados e empastados de barro lhe caiam pelo rosto lhe encobrindo a face.
Juliana se aproximou, sentindo o terror lhe dominar a alma.
Ela estendeu a foice que segurava e afastou os cabelos do rosto da mulher. Ela ergueu a cabeça e Juliana viu uma versão bizarra de si mesma. O rosto inchado e morto, os olhos haviam sido arrancados e o que sobrara foram duas órbitas vazias de onde escorria sangue.
— Cuidado com as sombras. - Balbuciou a coisa numa voz cavernosa e morta.
Juliana soltou um grito e afastou-se.
A coisa ergueu um braço flácido e apontou a escuridão.
Juliana olhou naquela direção e viu uma coisa luminosa imensa.
Ela não tinha certeza, mas achava que estava vendo uma nave, um disco voador ou qualquer coisa desse tipo.
Olhou novamente para a mulher sentada e percebeu que não estava mais na casa, estava de volta à floresta, no meio de uma clareira escura.
A coisa - a nave - produzia um silvo estranho que se confundia com a tempestade.
Juliana viu uma sombra esgueirar-se do meio da luz que parecia sair da coisa.
A luz se apagou.
Ela ficou por um momento em total escuridão.
Um rosto terrível apareceu então de repente diante dela fazendo-a soltar um grito.
Juliana deu um salto na cama e acordou.
Ela estava suada, seu coração batia à mil.
Fora um pesadelo.
Ela acendeu o abajur na mesa de cabeceira e sentou-se na cama.
Colocou as mãos na cabeça e suspirou.
Fora um pesadelo terrível, ela ainda podia ouvir aqueles gritos aterradores que viajavam na escuridão.
Olhou no relógio e viu que passava das quatro da madrugada.
Levantou-se e caminhou suspirando até a porta envidraçada que dava para a sacada.
Juliana olhou através da vidraça.Viu o jardim lá em baixo parcamente iluminado pela tênue luz que vinha do poste da rua.
Juliana sentiu-se gelar de alto a baixo.Vislumbrou uma sombra parada próximo ao seu portão.
Parecia um homem de capuz, parado com as mãos nos bolsos olhando diretamente para ela. Juliana quase podia sentir aquele olhar, sondando-a, perscrutando seu interior.
O medo quase a fez perder os sentidos. Ela segurou-se na parede e fechou os olhos colocando a mão na testa. Voltou a abrí-los e olhou novamente para baixo. Não havia ninguém lá, apenas a rua tomada pelas sombras.
Juliana fechou as cortinas e voltou para a cama, mas não conseguiu dormir mais naquela noite.
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