Rastros (im)perfeitos
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Notas do autor: Olá, meus amores! Enfim a atualização.
Quero agradecer a betagem perfeita entregue por DudaMidoriya_02, através do Sunivers13. Obrigada, gente 🌹
Tenham uma ótima leitura!
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Jungkook finalmente sentou-se à mesa após passar quase duas horas cozinhando e preparando o almoço: japchae e frango frito. O investigador devorava a comida com os hashis como se não houvesse amanhã. Ele não tinha o costume de cozinhar, o que o fazia sentir ainda mais falta da mãe e do tempero especial dela.
Apesar disso, o japchae e frango frito não estavam tão ruins. Jeon diria que poderia sobreviver longe dos mimos da sua progenitora pelo tempo que precisava passar ali. Ele sobreviveria com as suas gororobas tranquilamente.
Enquanto mastigava a comida em silêncio, com as bochechas cheias, Jungkook soltou um suspiro audível. Segurava a tigela com a mão esquerda e os hashis na direita. Do lado de fora, o ambiente estava silencioso e quente, um contraste em relação à noite, quando os grilos e os sapos sempre faziam barulho e o vento era mais gelado.
O investigador sentia ansiedade, ansiando por começar a estudar o caso e enxergar além das entrelinhas em busca de pistas. No entanto, ele estava à espera do material necessário, sem muito o que fazer até então.
As sacolas de compras no canto do balcão da cozinha indicavam a quantidade de itens adquiridos no mercado mais cedo, incluindo materiais para ajustes, como óleo lubrificante para pôr no ventilador barulhento e para as brechas das janelas emperradas.
O olhar de Jungkook vagueava pela sala quando ele ouviu batidas na porta. Automaticamente, seus olhos pretos voltaram-se para ela, interrompendo a sua mastigação nesse tempo; as bochechas ainda cheias conferiam-lhe uma expressão considerada sempre fofa por sua irmã mais velha.
Era uma e quarenta da tarde quando ele checou a hora no celular. Levantou-se com um pouco de pressa, largando a tigela e os hashis na mesa, e foi até a porta para abri-la. Quando seus olhos se encontraram com os de Taehyung, foi o momento em que ele terminou de engolir o que ainda estava mastigando.
Taehyung segurava uma pasta cinza de documentos na mão esquerda, junto com uma sacola branca que tinha uma caixa dentro, e ele ainda trajava a mesma roupa social de antes.
— Oi. — Jungkook sorriu, abrindo mais a porta.
— Oi, te trouxe o que me pediu mais cedo. — Ergueu a pasta e a sacola. — Está tudo aqui, além de um pendrive caso queira estudar por um computador ou notebook.
— Ah, muito obrigado. — Ele pegou o que lhe foi entregue. Jeon deu uma breve olhada para trás, pensando nesse tempo se deveria fazer a pergunta que deu vontade. — Gostaria de entrar?
Taehyung estava com as mãos dentro dos bolsos laterais da calça, olhando o rapaz em silêncio de maneira curiosa.
— Não vou te atrapalhar no seu almoço?
— Não, claro que não, inspetor Kim. — Deu espaço para que ele entrasse. — Por favor, entre.
Kim apenas sorriu fraco e entrou. Jungkook nessa hora mordeu o lábio inferior e fechou a porta, sentindo-se idiota enquanto encarava a superfície de madeira em frente aos seus olhos.
"Por favor, entre." Reverberou em sua cabeça e ele sentiu vergonha por ter dito aquilo. Ele gostaria de voltar no tempo e trocar a última frase por um simples "pode entrar". O "por favor" estava soando ridiculamente em sua cabeça.
Nem era algo tão relevante assim, mas, de alguma forma, Jungkook estava sentindo-se sem jeito. O inspetor conseguiu de alguma maneira ter esse poder inesperado sobre ele. Aquele olhar penetrante parecia desvendar cada raciocínio de Jeon, fazendo com que ele se sentisse exposto e vulnerável diante daqueles olhos perscrutadores.
— Está se habituando, Jungkook?
Jungkook finalmente virou-se, vendo que Taehyung olhava ao redor, de costas para si, e então deu passos na direção da mesa de jantar onde estava comendo.
— Sim, aos poucos. — Resolveu falar, colocando a sacola e a pasta em cima da mesa. — É diferente do que estou acostumado, mas não é como se fosse algo totalmente novo.
Taehyung aproximou-se da mesa, vendo o de fios escuros pegar a tigela nas mãos e voltar a comer o almoço.
— Você almoçou? — Jungkook perguntou. — Ainda tem japchae e frango frito.
— Já almocei, obrigado.
Jeon sentiu os olhos do inspetor analisando cada movimento que ele fazia, ora levando o frango frito à boca, ora pegando uma porção de japchae com os hashis. Ele não era tímido, mas sentiu que ficaria se o outro continuasse olhando-o daquela forma.
— Tem refrigerante de latinha, você quer? — Jungkook perguntou, saindo em direção à geladeira. Ele até sentiu o olhar profundo do inspetor queimar suas costas enquanto se afastava.
— Aceito.
Jeon levou à boca a última porção de japchae e colocou a tigela na pia junto com os hashis. Abriu a geladeira e retirou duas latinhas de refrigerante, retornando ao inspetor. Após o "obrigado" do mais velho, as latinhas foram abertas e eles deram os primeiros goles na bebida gelada e gaseificada.
Jungkook lutou contra a vontade de arrotar naquele momento, sentindo os olhos lacrimejarem pelo gás forte.
— Posso começar mais uma sessão de perguntas para você responder, inspetor? — Taehyung sorriu, assentindo com a cabeça e dando mais alguns goles generosos na sua latinha. — Quando encontraram a primeira vítima?
— Há exatamente duas semanas e três dias.
— E já estava em decomposição avançada?
— Não. — Ele bebeu mais um pouco do refrigerante, voltando o olhar para Jungkook. — Segundo a perícia, o corpo foi encontrado apenas algumas horas depois do assassinato.
— Onde?
— Perto de um lago a alguns quilômetros daqui, ela foi encontrada pelos moradores.
— Perto de um lago... — Jungkook repetiu as palavras do inspetor, os olhos fixados em alguma coisa enquanto parecia refletir. — Todas em lugares movimentados e com fácil visualização, a primeira perto de um lago...
— No que está pensando?
— Acha mesmo que isso não é obra de um assassino em série? — perguntou, encarando os olhos castanhos escuros. — As vítimas foram mortas e colocadas em lugares estratégicos. Pensa comigo, por que não esconder o corpo ou tentar se livrar dele no lago ou em outro lugar? — Fez uma pergunta retórica. — O assassino queria que elas fossem encontradas, queria expô-las como um troféu e exibi-las como se fossem um quadro em um museu de artes.
— É um belo ponto, Jungkook. — Sorriu, chacoalhando levemente a latinha na mão esquerda.
— Qual a relação entre elas? — Ele voltou a beber o refrigerante, sem tirar os olhos de Kim.
— O que sabemos é que eram jovens, na faixa dos vinte anos, solteiras e com nada pendente. — Fez uma breve pausa. — Eram garotas exemplares, digamos assim.
— Só se sabe isso?
— Até o momento, sim.
Jungkook pareceu pensar, perdendo o olhar mais uma vez.
— Precisamos de respostas. — Suspirou. — Você concorda que precisamos ir atrás das respostas, não é?
— Agora que você chegou, finalmente iremos atrás — Taehyung disse simples, colocando a latinha agora vazia em cima da mesa. — Apesar do meu subinspetor adorar a investigadora Jisoo, eu sempre a achei lenta demais e até me arrependo de ter deixado a liderança nas mãos dela, mesmo que tenha sido apenas por um mês. — Resolveu revelar. — Você parece ser diferente e bem mais determinado a encerrar esse caso, o que é admirável, Jeon — continuou, fazendo uma breve pausa. — E agora que finalmente consegui tempo para focar no trabalho, irei solucionar de uma vez todo esse mistério, com a sua ajuda.
Jungkook sentiu curiosidade ao absorver a última fala do inspetor, então decidiu perguntar o que lhe veio à mente.
— Você é pai? — Automaticamente ele se sentiu bobo por perguntar aquilo, vendo Taehyung franzir as sobrancelhas.
— Pai?
— Ah, desculpa. — Fechou os olhos, xingando-se mentalmente. — É que você falou de tempo e focar no trabalho, então só veio crianças na minha cabeça. — Ele viu Taehyung sorrir fraco em sua direção. — Eu sou tio e as filhas da minha irmã ocupam bastante do meu tempo quando fico com elas, logo posso imaginar que ser pai requer muito esforço e tempo.
— É, eu não discordo de você. — Cruzou os braços. — Mas eu não sou pai, apenas cuido da minha avó que mora comigo.
— Ah, entendi. — Ele pegou a latinha vazia em cima da mesa e se dirigiu até a área da cozinha, jogando as duas latas no pequeno lixeiro ao lado da geladeira. Ele ainda se xingava mentalmente, sentindo-se bobo.
— O seu sinal repetidor está dentro da caixa. — Apontou para a sacola em cima da mesa. — Agora eu tenho que ir.
— Tá bom, obrigado. E obrigado por me trazer os materiais. — Voltou até a mesa, sorrindo fraco para o inspetor. — Irei estudar bastante, darei o meu melhor para encontrar pontas soltas.
— Contarei com isso.
Eles andaram até a porta e Taehyung girou a maçaneta, abrindo-a. Jungkook observou o inspetor sair e caminhar até um carro esportivo, estacionado na frente da casa, ao lado do seu carro. Kim lançou um último sorriso e um aceno com a mão, fazendo Jungkook acenar de volta.
O inspetor entrou no veículo e deu ré, partindo pela estrada de terra alaranjada. Jeon permaneceu do lado de fora, observando o carro afastar-se até desaparecer completamente. Em seguida, ele adentrou novamente na casa e fechou a porta, dirigindo seu olhar à mesa onde estavam a sacola e a pasta cinza.
Iria instalar logo o sinal repetidor e começar a estudar todo o caso minuciosamente.
[...]
Marcas de batom vermelho e uma linha fina entre a garganta e o queixo.
Jungkook sorriu vitorioso e recostou-se na cabeceira da cama, os olhos fixados na tela do seu notebook. Todas as vítimas partilhavam dessa característica em comum, além de outras pistas que ele acreditava que descobriria ao longo da investigação.
Agora, questionava-se porquê ninguém havia comparado aquelas marcas de batom para verificar se eram idênticas, e por que não havia menção nos registros da autópsia àquela linha fina, quase imperceptível, entre a garganta e o queixo das garotas; uma linha que só podia ser vista em uma foto de cada conjunto relacionado às vítimas.
Ou ninguém havia percebido, ou consideravam aquela linha insignificante.
Jungkook começou a duvidar seriamente da capacidade daquelas pessoas para investigar um crime daquele nível.
Após pesquisar bastante, descobriu que aquela cidadezinha nunca tinha enfrentado algo semelhante, o que explicava a cautela do inspetor e da equipe em relação ao termo "assassino em série". Ele percebeu que todos ali eram simples, viviam em um lugar de localização desfavorável, com comércio apenas local e um único hospital para atender toda a cidade. Tudo indicava que precisavam de ajuda; os recursos eram totalmente limitados e a investigação era delicada.
Jungkook deu-se conta de que ele era a melhor opção para liderar o avanço da investigação, o que agora justificava a sua transferência urgente e repentina para lá.
Aquele departamento precisava de um impulso e Jeon Jungkook era quem o proporcionaria.
Batom vermelho e uma linha abaixo do queixo. Ele separou as três fotos, cada uma de uma vítima, onde era possível ver a linha quase imperceptível na pele. O rapaz de fios escuros voltou a analisar mais uma vez as fotografias e ficou instigado com mais uma coisa em comum: as unhas das garotas.
Havia uma linha preta por baixo de algumas unhas, entre a carne e a unha, como se fosse um vestígio, deixando uma interrogação no ar.
Talvez fosse apenas sujeira. Ou talvez não.
Não tinha uma observação a respeito daquilo nos registros da autópsia, o que fez Jungkook suspirar em derrota. A primeira vítima já tinha sido enterrada, enquanto as duas últimas ainda estavam no necrotério.
Jeon passou as mãos pelo cabelo liso e soltou mais um suspiro, encarando as folhas dos registros.
Precisava estudar os corpos pessoalmente e aproveitar que eles ainda estavam disponíveis para análise no necrotério. Tinha que falar com Park Jimin e se arrependeu amargamente por não pegar o número dele mais cedo.
Entretanto, isso não seria um empecilho para Jungkook, ainda mais por se recordar de que Jimin havia mencionado morar ali por perto. Iria vestir-se e sair perguntando de casa em casa até alguém lhe dar o endereço do médico.
[...]
As casas eram simples em Suncheon; a grande maioria era composta por tijolos e sem acabamento. As que tinham paredes de barro exalavam o calor do dia, enquanto as janelas sem cortinas deixavam o vento quente adentrar os cômodos.
O som dos pássaros e o cheiro da terra seca estava presente no ar, criando uma atmosfera típica das tardes quentes no interior. À sombra das árvores frondosas, as casas pareciam abrigar-se do calor intenso, criando um cenário que convidava ao descanso e à contemplação da vida simples e pacata daquele lugar.
Jungkook andava entre as moradias, o suor formando-se em sua testa enquanto procurava pela casa de Jimin. O calor intenso castigava e o chão de terra batida refletia o brilho inclemente do sol. Naquele momento, Jungkook chegou a lamentar não ter optado ir de carro, mas sabia que a abordagem a pé era a melhor escolha que ele poderia fazer. Era essencial passar de porta em porta, indagando aos moradores sobre a localização da casa do médico Park. Além disso, essa abordagem permitia-lhe conhecer o local de forma mais ampla, sem as limitações de uma visão restrita pela janela do automóvel.
Após andar mais um pouco, ele finalmente avistou a casa de Jimin, com sua fachada simples; de tijolos e gesso e protegida por um alpendre sombreado por trepadeiras floridas. Exatamente a casa que ele procurava, segundo a descrição de alguns moradores.
Ao se aproximar da residência, ele ouviu o som suave de um riacho próximo, onde crianças brincavam para escapar do calor daquela tarde. Ele sorriu brevemente ao vê-las correr descalças pelo solo alaranjado, deixando um rastro de pegadas pequenas no chão.
Jungkook finalmente bateu à porta, aguardando ser recebido. Ele enxugou o suor da testa com as costas das mãos e foi nesse momento que Jimin abriu a porta, surpreso ao encontrar o investigador ali.
— Investigador? O que faz aqui? — ele perguntou.
— Oi, Jimin. — Jungkook sorriu fraco, a boca seca pela caminhada debaixo do sol quente. — Que bom que está em casa. Podemos conversar?
— Claro, entra.
Jimin deu-lhe espaço para que entrasse. Jungkook entrou na casa e suspirou, cansado. Pelo menos agora estava mais resguardado do mormaço presente lá fora.
— Você veio andando? — Jimin perguntou.
— Sim, vim perguntando aos moradores onde era a sua casa.
— Deve estar cansado, quer um pouco de água?
— Sim, obrigado.
— Pode se sentar, eu já volto. — Jimin apontou para o sofá bege encostado na parede.
Jeon apenas sentou-se e fechou os olhos por um momento, recompondo sua respiração.
O interior da casa era simples e organizado; estava bem mais fresco ali se comparado ao lado de fora. A luz do sol filtrava pelas janelas de madeira, pintando o chão de tábuas desgastadas com um tom dourado. Móveis rústicos de madeira maciça compunham a decoração.
O silêncio era quebrado apenas pelo suave zumbido de uma mosca, que voava de um lado para o outro, pelos gritos distantes das crianças que brincavam lá fora e pelo tique-taque suave do relógio de parede ecoando no ambiente.
O aroma de café recém-coado pairava no ar, misturando-se com o perfume fresco das flores do campo dispostas em pequenos vasos pela sala. A brisa morna entrava pelas janelas abertas, trazendo consigo o cheiro da terra aquecida pelo sol.
Na cozinha, onde Jimin estava, panelas de ferro fundido repousavam sobre o fogão à lenha. A simplicidade dos utensílios contrastava com a organização impecável, cada item tendo seu lugar designado.
Park tinha oferecido água, mas naquele momento estava terminando de passar alguns biscoitos, que ele mesmo havia preparado, do recipiente redondo de vidro para um prato de porcelana raso. Em seguida, cuidadosamente, serviu um pouco de café em duas pequenas xícaras de porcelana, a fumaça quente saindo da garrafa indicando que o café acabara de ser retirado do fogo.
Jimin voltou até a sala e Jungkook o olhou em silêncio, observando a bandeja de madeira que ele segurava.
— Eu trouxe a sua água e um pouco de café com biscoitos — disse, sorridente, aproximando-se do mais novo que continuava sentado no sofá.
— Não precisava se incomodar, Jimin. — Sorriu igualmente, vendo o médico sentar-se ao seu lado com calma para não derramar o café dentro das xícaras.
— Que nada.
— Obrigado. — Ele pegou uma xícara, ignorando o copo com água. — Você quem fez os biscoitos?
— Sim, com essência de goiaba. Espero que goste. — Jimin ainda continuava com um sorriso sincero no rosto, os olhos até pareciam estar fechados.
Jungkook comeu o primeiro biscoito e assentiu com a cabeça, sorrindo para Jimin. O médico baixou a cabeça, tímido, e passou a deslizar os dedos destros na alça de porcelana da sua xícara.
— Estão ótimos, parabéns — Jeon falou, a boca um pouco cheia. Ele bebericou o café, notando Jimin com as bochechas ruborizadas. — Aparentemente você gosta de cozinhar.
— É, mais ou menos — riu, voltando os olhos para o investigador. — Eu não costumo receber muitas visitas e nem costumo sair muito, então acabo enjoando da minha própria comida e consequentemente acabo perdendo a vontade de cozinhar. Mas, tirando isso, eu gosto sim.
Jungkook sorriu mais uma vez e terminou de comer os biscoitos, acompanhado do café. Um silêncio tomou conta do ambiente, apenas interrompido pelo tique-taque do relógio de parede. O de fios escuros finalmente tomou a água no copo de vidro enquanto era sutilmente observado por Jimin.
Park perguntava-se sobre o que o investigador queria conversar, já deduzindo que se tratava do caso das três garotas assassinadas.
— Então, Jimin, eu estava estudando o caso e percebi algumas coisas que ninguém notou. — Jungkook foi direto, sem rodeios, colocando a xícara de porcelana de volta no pires e devolvendo-a à bandeja de madeira sobre o sofá. — Na verdade, eu observei algumas coisas que não constam no prontuário que você fez.
— Tipo o quê? — O médico bebia tranquilamente o seu café na xícara.
— Tipo a marca quase imperceptível abaixo do queixo, acima da garganta, em todas as vítimas. — Fez uma pausa, analisando a reação dele nesse tempo. — E também a coloração atípica embaixo das unhas, como se fosse uma linha preta de sujeira.
Jimin piscou algumas vezes, processando o que acabara de ouvir. Depois de alguns segundos, ao absorver a fala do outro e refazer mentalmente todo o seu trabalho nas vítimas, convenceu-se de que cometera erros graves ao analisar os corpos, falhando miseravelmente em pequenos detalhes como aquele.
Park sentiu-se estúpido, incapaz de encarar o investigador nos olhos, que por sua vez observava-o meticulosamente, como se esperasse por um vacilo ou algo do tipo.
A verdade era que Jimin não estava acostumado com aquilo; lidar subitamente com estudos de defuntos assassinados e uma investigação delicada não fazia parte do currículo da faculdade. Ainda assim, ele aceitou o pedido do inspetor para se juntar à equipe, simplesmente porque era Taehyung.
— Me desculpe, eu cometi uma imperícia.
Jungkook notou quando Jimin engoliu em seco, botando a xícara em cima do pires na bandeja de madeira em silêncio.
— Deve estar pensando coisas horríveis sobre mim — ele disse em um fio de voz. — Talvez esteja duvidando até da minha capacidade médica — riu soprado, sem humor nenhum. — A verdade é que tudo isso é novo para mim, não me sinto à vontade no meio dessas coisas, ao contrário de você e do inspetor Kim, que sabem o que estão fazendo e nem se deixam abalar com cenários como esse.
— Não duvido de você como profissional, Jimin, não pense isso.
— Eu sei que você deve estar se perguntando "mas ele não é médico? Não deveria estar acostumado com coisas pesadas assim?" — Novamente riu sem humor.
— Jimin, eu não estou—–
— Eu fui imprudente, me desculpe — falou por cima da fala dele. — Eu sabia que não iria dar conta disso, eu sabia. — Continuou. — O Taehyung estava contando comigo, ele disse que precisava muito da minha ajuda no caso e que eu seria o melhor para isso, então eu acabei aceitando.
— Entendi. — Jungkook esperou alguns segundos antes de voltar a falar, analisando o rosto bonito do mais velho. — Não pense que estou pensando algo ruim sobre você, Jimin, inclusive, acredito que seja um ótimo médico. — Ele viu quando o de fios mais claros sorriu sem mostrar os dentes, desviando o olhar.
— Obrigado, Jungkook.
Park Jimin era adorável, isso segundo Jungkook, e o investigador não teria motivos para crucificá-lo injustamente. Jeon sabia que ali as coisas eram realmente bem diferentes da cidade grande, em relação às limitações e dificuldades. Ele estava começando a compreender perfeitamente.
— A primeira vítima já foi enterrada, certo?
— Sim — Jimin respondeu, simples.
— E quanto às outras duas vítimas?
— Estão no necrotério do hospital, na ala exclusiva.
— Me leva até lá? — Jungkook perguntou, esperando fielmente que Jimin aceitasse. — Preciso analisar algumas coisas pessoalmente e até solicitar a identificação de uma amostra, já que ninguém fez isso.
— Que amostra seria?
— O batom vermelho — disse, simples. — É comum mulheres usarem batom como parte da maquiagem, porém, nas fotos, o batom das vítimas parece ter exatamente o mesmo tom, o que me leva a considerar a possibilidade de ser o mesmo produto... — Continuou falando. — E eu preciso de uma prova que convença a todos, inclusive o Taehyung, de que estamos lidando com um assassino em série, embora pareça bastante evidente que seja o caso.
— Olha, já sabemos que se trata de um assassino em série, mas não saímos comentando isso por aí porque a prioridade é conter o pânico entre os moradores.
Jungkook perdeu o olhar em algum móvel da sala de Jimin enquanto os pensamentos vagavam nas conversas anteriores daquele dia. A menção do subinspetor Min a respeito da antiga investigadora e a fala do inspetor Kim quanto ao tempo livre para o trabalho.
— O inspetor estava ausente no caso? — Decidiu perguntar, vendo Jimin assentir com a cabeça. — Há quanto tempo? Um mês?
— Sim, quando ele me chamou para ajudar no caso como médico legista, ele não estava na liderança, tinha passado para a investigadora Jisoo.
— Você sabe me dizer o que aconteceu?
— É que a avó dele às vezes tem surtos de raiva e o irmão mais velho é depressivo e nunca fala com ninguém. É bem complicado.
Jimin viu Jungkook olhá-lo em silêncio, como se estivesse processando a informação.
— Na verdade, eu perguntei a respeito da investigadora Jisoo, se você sabe dizer o que aconteceu com ela para ter que sair do caso.
— Ah... — Park prensou os lábios, sentindo-se envergonhado. Na maioria das vezes ele era assim, tagarela, sempre dando com a língua nos dentes. Era um tipo de pessoa que não precisaria muito esforço para tirar alguma informação. — Ela está grávida.
— Grávida? — Ele não esperava essa resposta. — Quantos meses?
— Eu não sei, acho que seis. — Cruzou os braços. — O caso não avançou quase nada com ela na liderança, então ela pediu para se afastar e foi para a casa dos pais em Daegu.
— E o Taehyung?
— O que tem ele?
— Como ele lidou com isso?
Jimin suspirou, como se estivesse pensando em alguma coisa.
— Segundo o Taehyung, o subinspetor Min age muito na emoção, tê-lo como líder seria como ter uma bomba-relógio dando as ordens, por isso, Taehyung precisou retomar a liderança do caso após a saída da investigadora Jisoo. Ele voltou para a investigação um dia antes de você chegar.
Jungkook assentiu com a cabeça, assimilando as informações.
— Agora entendi o porquê de ele ter dito que só agora iremos atrás das respostas. — Também cruzou os braços. — Vocês são próximos? Você e o Taehyung?
— Ah... — Jimin esperou alguns segundos antes de responder, coçando levemente a nuca nesse tempo. — A verdade é que a gente já ficou algumas vezes. Conversamos sobre algumas coisas e passamos um tempinho juntos. Eu diria que somos amigos, entende?
— Acho que entendo — Jungkook riu sem humor algum, vendo Jimin sorrir sem jeito. — Enfim, você me leva no hospital?
— Claro, é só me dizer quando quer ir.
— Se possível, agora mesmo — respondeu de imediato.
— Tá bom, irei apenas pôr uma roupa mais adequada e então te levo. — Levantou-se do sofá. — Iremos no seu carro?
— Sim, inclusive, eu acho melhor ir lá buscá-lo enquanto você se arruma. — Também se levantou do sofá. — Vai ser mais rápido assim.
— Tá, tudo bem. — Sorriu.
— Então até daqui a pouco. — Andou até a porta, abrindo-a.
[...]
A sala do necrotério estava gelada, o vento cortante tocando a pele de Jungkook e fazendo-o tremer. O ambiente espaçoso abrigava algumas mesas de aço dispostas em um canto, além de papéis, canetas e documentos espalhados sobre uma mesa de madeira, onde havia um notebook fechado.
Jungkook seguia os passos de Jimin atentamente, observando cada detalhe ao redor, até que o médico parou subitamente, capturando a atenção de Jeon.
— Aquelas duas bem ali. — Jimin apontou para duas mesas com uma coberta.
Jungkook assentiu com a cabeça e se aproximou do local apontado por Park. Ao parar ao lado de uma das mesas, observou atentamente a lona fina que cobria o corpo imóvel. Antes que pudesse agir, Jimin entregou-lhe um par de luvas cirúrgicas brancas, protegendo suas mãos enquanto descobria o corpo da garota.
A pele pálida e sem vida, os olhos fechados, os lábios acinzentados e levemente roxos, os cabelos opacos e negros. Ao revelar o rosto da jovem, Jungkook não pôde deixar de notar a linha quase imperceptível entre a garganta e o queixo, especialmente na região da papada.
Jungkook reconheceu a curiosidade daquela marca e sabia que ela já indicava o que ele pretendia comprovar para Taehyung e toda a equipe. No entanto, ele tinha plena consciência de que não poderia fundamentar suas conclusões apenas naquilo. Havia muito mais a ser considerado antes de apresentar qualquer veredicto sobre as mortes das garotas.
— É quase invisível — Jimin comentou, olhando para a marca sutil abaixo do queixo da última vítima. — Mais uma vez peço desculpas, investigador — ele falou, envergonhado.
— Está tudo bem, Jimin. — Jungkook lançou-lhe um olhar confortante. — Não se martirize tanto.
— Esqueci de te falar uma coisa.
— Pode falar. — Jungkook voltou o olhar para a vítima, analisando-a melhor com toques sutis na face gelada dela, procurando por algo a mais.
— Precisará fazer um pedido externo para ter o resultado das comparações do batom e dos resíduos embaixo das unhas, ainda não conseguimos fazer isso aqui.
O investigador olhou para o mais velho, suspirando em derrota. Ele já sabia que as coisas eram significativamente diferentes ali. E um tanto atrasadas, para ser mais exato. No entanto, mesmo estando ciente disso, ele foi pego desprevenido com aquela informação.
— Tudo bem, eu tenho contatos que nos ajudarão com isso. — Sorriu fraco.
Jungkook realizou uma minuciosa análise do corpo da última vítima, examinando cada detalhe com cuidado. Sua atenção foi chamada para uma peculiaridade no couro cabeludo: uma pequena área onde os fios negros pareciam ter sido arrancados de forma brusca, localizada entre a divisão parietal e temporal.
Ao perceber isso, dirigiu-se apressadamente à outra mesa coberta, sob o olhar atento de Jimin. Ao remover a lona, revelou o corpo embalsamado da segunda vítima, ainda mais pálido que a anterior. Desta vez, além da marca abaixo do pescoço e do resquício de batom vermelho ao redor da boca, chamou a atenção — igualmente — uma pequena região comprometida no couro cabeludo, porém em um local diferente da primeira garota. Neste caso, os fios de cabelo pareciam ter sido puxados abruptamente na divisão entre as regiões occipital e parietal.
Essa variação levou Jungkook a considerar que talvez não houvesse um padrão definido seguido pelo assassino. Se aquilo era intencional ou não, ainda não havia como ele saber.
— Jimin, você percebeu isso? — ele perguntou, olhando para a região no couro cabeludo da garota após lateralizar a cabeça dela.
O médico aproximou-se, analisando atentamente a região que o investigador apontou. Cruzando os braços, ele balançou a cabeça negativamente. A cada nova pista descoberta por Jungkook nas vítimas, ele se sentia profundamente envergonhado por não ter registrado aquelas informações nos prontuários.
— O que você acha?
— Não sei... — O médico suspirou, parecendo pensar por alguns instantes. — Talvez uma consequência de uma luta corporal com o assassino?
— Poderia ser, mas não há sinais de hematomas ou qualquer outra coisa que indique que houve uma luta em tentativa de defesa. — Esperou uns segundos antes de prosseguir, raciocinando uma coisa a outra. — Preciso saber o que há embaixo das unhas.
— Você tem algum palpite? — o de fios mais claros perguntou.
— Talvez seja algum tipo de fluído, ou então algum resquício de solo específico. — Fez uma pausa. — Não sei, são muitas possibilidades.
— Solo humoso, talvez? — Jimin pegou a mão direita da garota, verificando melhor e com bastante calma as unhas arroxeadas. — Olha, analisando melhor, não me parece ser resíduo de lama ou de terra humosa... Diferente da primeira vítima, a segunda não foi encontrada perto de um rio onde a região é úmida e com o solo composto por pedras de seixos. Na verdade, a segunda foi encontrada sobre a grama do acostamento de uma estrada bem movimentada, próxima do centro.
— Uma estrada de terra vermelha? — Jungkook decidiu perguntar, também analisando as unhas da vítima.
— Sim, e isso também não me parece ser resquício de solo vermelho e nem de grama.
Jungkook novamente pensou por alguns instantes, como se estivesse juntando as peças do caso pouco a pouco.
— Onde a última garota foi encontrada? — perguntou.
— Ela estava em um campo aberto onde geralmente alguns adolescentes sempre jogam bola, o corpo foi colocado dentro da trave do gol.
— Sempre em locais movimentados — falou mais baixo que o normal, como se tivesse pensado alto. — Jimin, por acaso você esteve nos três locais onde encontraram os corpos? Você as viu lá?
— A primeira eu não cheguei a ver no local do assassinato, mas a segunda e a terceira, sim — respondeu, simples. — Mal tinham marcas nas roupas, o que não correspondia com o chão onde estavam, e isso deixou claro a hipótese de que foram mortas em outro local e só depois foram transferidas.
— A pessoa por trás disso é astuta. — Suspirou. — Seja lá o que for esse resquício nas unhas, é um padrão que as vítimas possuem e que aparentemente não condizem com o lugar onde foram encontradas.
— Elas devem ter tentado se defender em algum momento, não acha?
— É o comum. Tem algum palpite?
— As possibilidades são muito amplas, como você disse... — Jimin cruzou os braços, os olhos alternando entre as duas vítimas nas mesas. — Pode ser algum tipo de tintura, talvez de tecido.
— Tecido?
— Sim, imagina uma luta corporal. — Jimin andou para o centro da sala, onde estava mais espaçoso. — Imagina que estou tentando lutar contra alguém, tentando me soltar ou algo assim. — Jungkook aproximou-se, atento à explicação do médico. — Eu usarei meus braços e minhas mãos nessa hora, se eu tenho unhas consideráveis, elas com certeza irão arranhar o que estiver na ponta dos meus dedos. — Ele simulou uma cena, fazendo movimentos com os braços como se tentasse soltar-se de alguém invisível.
Jungkook arregalou levemente os olhos, assentindo com a cabeça. Ele andou apressadamente até a primeira garota, a última vítima, e passou a analisar igualmente as unhas dela.
— Uma luta corporal para se defender... Unhas com o possível material químico, ou até mesmo biológico do autor dos crimes, quem sabe? — Ele sorriu, assentindo com a cabeça. — Seria loucura apostarmos nisso? — Olhou para Jimin.
— Não custa nada. — Levantou os ombros, relaxando-os em seguida. — De qualquer forma, a análise precisa ser feita.
— Eu vou ligar para um amigo que é perito e um excelente especialista nas áreas de vestígios químicos e biológicos, ele vai nos ajudar com isso. — Fez uma pausa curta. — Tem mais alguma coisa que você se lembra de ter visto? Qualquer informação é fundamental para que o meu colega de trabalho possa se aprofundar nas análises.
Jimin aproximou-se, cruzando os braços e fechando os olhos, esforçando-se para recordar algo, qualquer coisa. Havia algo em comum que ele havia percebido, algo que agora escapava à sua percepção.
Ao abrir os olhos, encontrou o olhar esperançoso de Jungkook fixo nele, em busca de uma nova pista.
— Tinha cheiro de açucena.
— O quê? — Jungkook franziu as sobrancelhas.
O médico perdeu o olhar por alguns instantes, pensativo, antes de falar novamente.
— Os dois locais onde a segunda e a terceira garota foram encontradas, tinham um leve cheiro de açucena no ar, bem suave e quase imperceptível.
— Algo que também seria considerado fora do comum dentro dos cenários? — Park firmou com a cabeça. — Açucena... isso é algum tipo de flor?
— Sim, ela também é conhecida por lírio-branco, já ouviu falar?
Jungkook soltou um pequeno suspiro, sorrindo fraco logo em seguida.
— Já, eu conheço.
Ele se recordava daquela flor. Sua avó tinha predileção por flores e rosas, e ele se lembrava vividamente que seus avós mantinham um jardim particular nos fundos de casa. Lá, cultivavam o lírio-branco, embora Jeon não recordasse com clareza a sua fragrância.
— O lírio-branco é altamente comercializado por aqui? — Decidiu perguntar.
— Não, é apenas uma flor como outra qualquer onde a maioria gosta de pôr em jarros para enfeitar a casa.
— Não tem nenhum significado? Sei lá, como as rosas vermelhas que são atreladas ao amor?
Jimin pensou um pouco mais, tentando obter outra informação relevante para a pergunta de Jungkook.
— Na verdade, o lírio-branco é bem visto pelos devotos — ele disse com uma expressão pensativa. — E a população de Suncheon é até bastante religiosa, pelo menos a grande maioria.
— Então açucena tem um significado religioso para a população?
— Pelo o que eu sei, ela é como um símbolo da Virgem Maria e aqui os mais devotos costumam utilizá-la como essência purificadora ou algo assim.
— Isso é bem curioso... Se não tinha um campo de plantação ou algo que justificasse a essência dessa flor no local, então temos que investigar. — Ele olhou para Jimin. — Pode não ser nada ou simplesmente pode ser tudo. Você tem certeza que sentiu a essência vindo do local e não de outra pessoa?
— Sim, não era perfume, era como a própria açucena bem suave no ar — respondeu, simples. — Eu só não faço ideia de qual direção estava vindo, até porque não durou muito, e como eu disse, foi quase imperceptível, talvez eu só consegui distinguir graças à minha rinite que deixa o meu olfato estranhamente mais sensível e aguçado.
— Certo, irei informar tudo ao meu colega e já considerar isso uma pista. — Sorriu sem mostrar os dentes. — Fizemos um avanço, Jimin. Obrigado.
O médico sorriu e assentiu com a cabeça.
Com as novas informações e questões a serem esclarecidas, Jungkook não hesitou em contatar o seu colega de trabalho. Ele confiava plenamente na colaboração desse colega para desvendar o caso e dar um passo decisivo rumo à sua resolução.
As amostras encontradas sob as unhas das vítimas, os vestígios de batom que pareciam ser do mesmo produto, as anormalidades no couro cabeludo de ambas as vítimas, e outros possíveis indícios, eram áreas em que seu amigo, especializado em vestígios biológicos e químicos, poderia fazer descobertas.
Além disso, havia o relato de Jimin sobre o aroma de lírio-branco nos dois locais onde as vítimas foram encontradas. Tudo isso demandava investigação e esclarecimento, e Jungkook sentia que estava progredindo e que em breve teria respostas.
Ao menos ele tinha a certeza de que teria as respostas para as indagações no próximo dia. Ele sabia que podia contar com Seokjin e o ótimo trabalho que ele faria. Então, ele estava plenamente confiante.
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