•Negociações •
- Não acho que seja prudente envolver-me em uma guerra que não é minha, e arriscar a vida de toda a tribo para um simples capricho de raça.
Estamos nesse argumento já faz tempo e meu tio com toda a sua lábia ainda não conseguiu convencer Maxuel a aliar-se a nós.
- Não é um simples capricho de raça. Vocês sabem que os vampiros tentam a séculos exterminar os lobos. É uma questão de sobrevivência.- meu tio contra argumenta.
- Ainda sim há muito em jogo. Como líder, tenho que pensar no melhor para minha tribo. - ele reafirma.
Melhor para a tribo...É isso!
- Lord Maxuel - digo chamando sua atenção - é exatamente a vida de seu clã que está em jogo. - digo fazendo com que uma ruga surja em sua testa.
- Não entendo como. Eles não querem a nós, mas a raça humana. Não temos nada a ver com isso.
- Tem sim. Se a raça humana acabar onde o senhor acha que os vampiros procurarão sangue?
Ele abre a boca para rebater, mas desiste e a fecha.
- Acha que eles irão se contentar com animais? Coelhos e veados? Retirando seu alimento da floresta?
Ele ouve cada palavra atentamente. Consegui mexer na ferida. Me levanto com as mãos às costas e circulo o local.
- Eles podem até passar alguns meses bem, de fato, mas e quando o sangue animal não for suficiente?
Suas sobrancelhas envergam diante da possibilidade.
- E quando a abstinência do sangue humano começar a aparecer? Eles procurarão o mais perto de suas antigas presas possíveis.
Chego à suas costas, e coloco a mão em seus ombros.
- Acha que serão os Elfos? - digo do lado direito de seu pescoço - esse pessoal que nem mesmo possui um sangue parecido com o humano e que vive isolado, cercado por magias de camuflagem?
- Acha que serão as bruxas de Agnes? Essas asquerosas que dão nojo e repulsa só de olhar? - pergunto agora do lado esquerdo - Porque as bruxas brancas e todas as do lado do bem, de certo estarão todas mortas.
O clima se faz tenso e posso ver a preocupação estampada no rosto do Lord Lobo.
- Pense Lord Maxuel. A guerra não é sua e você acabará pagando o preço por algo que não fez. Os respingos atingirão vocês. Pense nos seus homens. Nas mulheres. Nos jovens e nas crianças. Todas elas subjugadas de modo tão cruel e injusto... - concluo sentando em minha poltrona outra vez, encarando o alfa do grupo - Pense em seu filho.
Ele me fita por um longo tempo, então se levanta e parece ponderar o que disse.
- Então? Você irá a luta conosco? - digo me levantando novamente e lhe estendo a mão.
Ele me fita intensamente, e aceita minha mão a apertando firme.
- Pode contar com os lobos em sua batalha, Samhara... - espera por meu sobrenome.
- Apenas Samhara já está bom, Milord.
☆♤•♤☆
Passamos dois dias na tribo dos lobos nos preparando para a próxima viagem. Infelizmente as tribos costumam ter certa rivalidade. A maioria levanta bandeira branca diante de uma batalha para se unir, mas ainda sim existem algumas cujos alfas são teimosos demais para dar trégua a rixa.
Maxuel disse que conseguiria mais aliados dentre os lobos, mas ainda sim ainda existia uma tribo mais isolada que teríamos que ir pessoalmente, uma vez que eles também tem bastante influência. E assim iríamos fazer. Depois de tudo acertado e esclarecido, estávamos nós partindo mais uma vez.
- Agradecemos a hospitalidade Lord Maxuel. - diz meu tio.
- Vocês todos foram muito gentis e prestativos conosco. - completo.
- Obrigada a vocês pela honra de sua presença. Possuem muita determinação, principalmente você minha jovem.
- Obrigada. - agradeço.
- Você é o tipo de garota que eu adoraria ter como nora. Daria uma ótima Líder ao lado de meu filho - Onde ele quer chegar?
- Deculpe, mas seu filho Cassian já não é comprometido? - disse lembrando do noivado do "príncipe". O que era estranho, porque Cassian tinha apenas quinze anos.
- Sim. Mas me refiro a meu filho mais velho. Ele foi enviado para uma vila humana para saber como funciona o mundo lá fora. Até que complete a idade.
- Ficaria honrada, mas tenho planos mais urgentes. - digo dando um meio sorriso.
- É claro. Quem sabe quando tudo isso acabar não é?
- Sim, quem sabe... - respondo séria.
Quem sabe no dia em que os fanáticos de Aarn dançarem pelados pelos campos no inverno.
- Ah, só me respondam algo antes. - disse.
- O que seria? - Maxuel questiona.
- Porque vocês demoraram tanto para nos interceptar se já estavam a nos vigiar desde que entramos na floresta? - pergunto.
- Acho que vocês se enganaram. Só notamos sua presença quando chegaram ao rio perto daqui.
- Então, deve ter sido engano mesmo... - Tem coisa aí.
- Vamos indo então. Até mais Lord Maxuel - se despediu meu tio.
- Até breve. - me despeço.
- Que a paz os acompanhem.
Dito isso seguimos nosso caminho.
- Conseguimos o primeiro querida. - diz meu tio.
- Se dependesse da sua tão famosa lábia teríamos virada janta - caçoei amigavelmente.
- Ele foi osso duro de roer, mas me parece confiável.
- Acho o contrário. Não tenho confiança nenhuma nesse homem. Seus olhos avisam perigo ele é ardiloso. Está estampado na cara dele.
- Você não está se precipitando? Talvez toda essa confusão tenha te deixado desconfiada demais.
- Pense o que quiser. O fato é que não confio nem um pouco nele. - disparei a frente e segui o caminho em silêncio.
Só faltava essa. Meu tio dizer que estou com mania de perseguição. Minha mente nunca esteve tão lúcida como agora.
☆♤•♤☆
Depois de sairmos demoramos três semanas para chegar na outra tribo.
TRÊS SEMANAS!
De viagem. De poeira. De estrada. De chuva. De tudo! Porque esses loucos não podiam morar mais perto? Acontece que a mata onde vivem, fica em outra província. Apesar de todas as viagens que fiz todas estavam dentro da província de Helles. Agora estávamos indo para outra. Qual não importa, o que importa é que é longe. Muito longe.
Nós cortamos pela floresta, mas ainda sim tivemos que pegar estrada. Algumas vezes conseguimos carona em alguma carroça, o que ajudou bastante.
Agora estamos aqui, amarrados no meio de um clã de lobos com mãos e pés atados. Eu e meu tio lado a lado e o alfa a tagarelar qualquer coisa sobre invadirmos o território dele. Ah, ele acabou de falar.
- Pronto? - pergunto - porque já me cansei das acomodações, sem querer ser indelicada.
Acabei de queimar as cordas do meu pulso e meus pés. Eles deram um passo atrás instintivamente enquanto soltava meu tio.
- Como ousam? - o alfa pergunta.
- Ouça - olhei pra ele - se você quiser salvar seu traseiro peludo e dos seus súditos sugiro que escutem o que temos pra dizer. - completei impaciente.
Entramos no escritório e fazemos o mesmo jogo. Ele escutou atentamente e pareceu mais inclinado do que Maxuel. Meu Tio acabou de falar claro que usando meus argumentos anteriores.
- Seria um privilégio me juntar a vocês nessa batalha, mas tem uma condição.
- Sempre tem - digo o fitando. - fale logo.
- Uma batalha. Para provar que são merecedores honrados. O seu melhor com o meu melhor.
- Isso é um abs...
- Aceito. - interrompo meu tio - Aceito seu desafio.
- Isso é loucura Samhara não temos que nos humilhar dessa forma.
- Vamos acabar logo com essa palhaçada. Não temos tempo a perder. - ignorei Raymond.
- Certo - o homem continuou - amanhã depois do nascer do sol na arena. Descansem, tem toda a tribo a disposição caso precisem.
Somos guiados para casas diferentes. Uma ao lado da outra, ambas de madeira escura e lustrosa. É um cômodo simples que serve de quarto e sala mais um banheiro com tina. Dentro encontram-se uma lareira já acesa, uma cama de casal, uma cômoda e duas poltronas. E uma estante com livros.
Livros.
Sempre lembrarei dele quando olhar um livro.
Me aproximei do espelho. Estava tão diferente...devido aos exercícios que mantenho meus músculos ganharam uma pequena definição. Meu cabelo só fica trançado com alguns fios soltos e a blusa com espartilho, calças abertas nas laterais com cordões e botas. Meu olhar está tão frio que chego a não me ver neles. É como olhar um vulto da pessoa que eu era. Sabe quando você não se reconhece mais?
Eu nunca pensei em perder parte da minha base, das minhas estruturas. O futuro que eu imaginava pra mim se foi, não tem mais mercado pra tomar conta ou Wallya. Ser caçada como uma besta tirou todos os bons sentimentos que eu tinha por aquele lugar que foi meu lar por tanto tempo.
Eu conhecia todas as ruas, todos os becos, fizera tantas traquinagens quando criança que não podia contar. E aquelas pessoas que eu conhecia de pequena, queriam me matar. Jason morreu antes de mim e ele era meu único amigo. Única pessoa além da minha família que eu podia contar. Agora ele estava apenas nas minhas lembranças.
Toda essa decepção, frustação, raiva, se inviezava cada vez mais fundo apagando os sabores do mundo que um dia eu provei. E eu não sabia se seria capaz de provar outra vez.
Tomei um bom banho e caí na cama, onde durmi o sono dos justos.
☆♤•♤☆
Acordei com o amanhecer. Dia de batalha. Após levantar e comer um café da manha deixado por alguma boa alma na minha cabana, fiz uns alongamentos e saí para tomar um pouco de ar. Toda a aldeia estava movimentada com cestos de comida zanzando pra lá e pra cá. Até que uma mão pousou em meu ombro.
- Estranho não é? - ouço a voz de meu tio - toda essa movimentação e agitação por causa de uma luta. Tão diferentes de nós.
- Diferente entre eles mesmos também. A tribo de Maxuel não é assim.
- Os de Maxuel são mais diplomáticos. E essa é uma das razões de suas desavenças. Um grupo acha errado o outro manter tanta conservação tribal, tantos costumes que eles consideram "antiquados", e o outro não acha certo o primeiro deixar sua "identidade" se perder.
- Não há respeito. Mas mesmo com tudo isso os povos antigos tem o costume de manter sua palavra, enquanto os diplomáticos...
Deixe a frase morrer no ar e me afastei. Percebi que todos seguiam para um mesmo local e andei junto da multidão acabando em um lugar onde havia um grande círculo no chão, e vários bancos em volta. Provavelmente a arena.
Me aproximei de Raymond que não sei como chegou aqui antes de mim.
- Você não precisa fazer isso - ele diz fitando o vazio - Samhara você não tem que mendigar aliados.
- Não estou mendigando. Estou batalhando. Aqueles que se juntarem a mim tem que ter confiança do lado em que estão.
- Se você prefere assim... - ele suspira - então vá em frente.
- Toda essa balbúrdia é para eu conseguir soldados, de que adianta eu ter saído da sua casa se não estou disposta a ter uns arranhões? - Ele virou o rosto.
- Você é tão nova e já passou por tanta coisa...enfrenta problemas tão grandes, desafios tão adultos - vi algo como pena passar por seus olhos, mas preferi ignorar.
- No fim nós não temos escolha de nada não é? - ri - A gente só se adapta a decisões maiores que algum déspota divino mastiga e cospe sobre nós. Querendo ou não, a gente só dança a música que ele põe pra tocar.
Me aproximei de onde o líder se encontrava. Ele estava perto da arena como todos os outros da tribo, sentado em um dos bancos.
- Bom dia pra vocês. Espero que tenham sido bem tratados - bebeu algo em seu copo.
- Fomos sim, mas vamos ao que importa. - não estava com paciência pra conversa fiada.
- Certo, certo. Como foi você que aceitou o desafio imagino que seja você quem irá lutar?
- Eu mesma.
- Leyan! - ele chama.
Um grandalhão de quase dois metros aparece e se coloca no centro da arena. O cara parece um bárbaro, não um lobo.
- Suponho que este seja Leyan, meu adversário.
- Acertou. Tem certeza de que quer continuar com isso criança? - o Lord me pergunta.
Estava até inclinada a acabar com essa piada, mas eu odeio que duvidem da minha capacidade...como odeio.
- Não vou dar pra traz agora - O desafiei com um sorriso.
- Sam é muito perigoso, você não precisa disso. - meu tio tenta me convencer.
- Preciso sim, querendo ou não, essa luta trará respeito e meus aliados não me verão mais como uma criança - enfatizei olhando pro Alpha.
- Nada do que eu disser vai te fazer mudar de ideia não é?
- Não.
- Então se cuide querida. - passou a mão em meu rosto.
Entrei na arena onde o tal de Leyan estava. Dois caras apareceram, um veio até mim com uma bandeja de armas e o outro até ele. Eu peguei uma faca parecida com a minha de caça. Ele pegou uma espada.
- Vale ferir, mas não matar. Essa é a única regra. - algo me diz que não é a única.
- Certo então. - disse.
- Antes, falta uma coisa - ele dá um sorriso malicioso - não vale usar poder algum.
Sabia que vinha uma armadilha, mas eu já esperava por ela.
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