V
Passei a mão no rosto, tentando tirar minha expressão cansada dali com aquele gesto, indo direto para a ala dos quartos para guardar minha espada e acordar Riley. O sol já estava quase nascendo então Lorell estaria em sua sala do trono em alguns minutos. Antes que eu pudesse entrar em meu quarto, ouvi uma das portas próximas a mim se abrindo e logo Arin saiu de lá com uma expressão cansada e usando pijamas.
Ele logo me notou parada no corredor e me olhou, franzindo o cenho. "Bom dia."
A voz cansada e a completa confusão em seu rosto por ter acabado de acordar me fez sorrir, e quis agradecer a ele por aquilo.
"Bom dia, Lacamoire." respondi
"Parece cansada."
"Digo o mesmo sobre você."
Ele deu de ombros, logo em seguida apontando para minha espada. "Estava brincando com isso?"
"É um bom passa tempo." abri a porta de meu quarto, vendo a bainha da espada em cima da cama "Deveria tentar aprender, Lacamoire."
"Não. Nunca fui muito fã de esgrima."
"O que eu faço não é esgrima." corri para dentro do quarto, guardando a espada em sua bainha, voltando a sair rapidamente, vendo que Arin havia se aproximado para ver o que eu fazia "Esgrima é um jogo. O que eu faço é uma luta."
"Esgrima. Mas com espadas pontudas e mais perigo de morte." ele sorriu para mim e eu balancei a cabeça "Talvez um dia eu deixe você me ensinar uma coisa ou outra."
Sorri para ele. "Quem sabe..."
Ele retribuiu o sorriso, começando a se afastar para fazer o que quer que ele fosse fazer e eu caminhei até a porta de Riley, me sentindo mais leve pela conversa descontraída com Arin. Bati na porta do garoto e não demorou para que ele abrisse a porta, me fazendo arregalar os olhos para seu estado.
As olheiras pareciam ainda mais escuras em sua pele pálida e seus cabelos ruivos estavam para todos os lados. Ele piscou algumas vezes, como se lutasse para se manter acordado, e logo tentou arrumar a postura para falar comigo.
"O sol já está nascendo?"
"Sim, Lorell já deve estar indo para seu trono."
Ele assentiu, arrumando um pouco os cabelos com suas mãos. "Vou me arrumar. Encontro você em alguns minutos."
Assenti, me afastando enquanto ele fechava a porta e corri até o quarto de Molly, entrando sem bater, e encontrei a garota dormindo tranquilamente. Ela parecia calma, o que me acalmou um pouco também, e eu deitei na cama ao lado dela, fechando os olhos enquanto prestava atenção no ritmo do coração dela. Parecia normal.
Deixei meus olhos fechados, me sentindo cansada novamente agora que estava mais calma, e não demorou para que o sono que havia fugido de mim antes me alcançasse.
༶
Acordei com batidas na porta, vendo que Molly já havia acordado antes de mim e ia em direção à porta para ver quem era. Ouvi a voz de Riley perguntando por mim e fiz uma careta, me perguntando quanto tempo eu havia dormido.
Me levantei da cama, indo até os dois, e passei a mão nos olhos, vendo eles me olharem curiosos. "Desculpe, Riley, acabei dormindo."
"Tudo bem, eu dormi mais um pouco também depois que você saiu." ele sorriu "Mas acho que temos que ir."
"Sim, claro."
"Ir aonde?" Molly se moveu um pouco, olhando para nós dois com a curiosidade latente em seu olhar
"Riley conseguiu uma boa informação e precisamos levar a Lorell urgentemente."
"Posso ir?"
Franzi os lábios, puxando a garota para longe da porta, fazendo ela franzir o cenho. "Molly, eu quero que você fique aqui. Não tente se meter nessa guerra, por favor."
"Olly, eu só quero saber das coisas. Não é justo que eu fique no escuro!"
"Eu conheço você, Molly, você vai querer fazer parte disso de algum jeito." ela pareceu ficar um pouco irritada e eu endureci minha expressão, deixando claro que minha palavra era uma ordem "Não tente negar, você sabe que é verdade. Fique aqui, segura, é o melhor para você."
A soltei, começando a andar na direção de Riley, que parecia nervoso com a conversa que ele havia acabado de presenciar. Mas, antes que eu chegasse até a porta, a voz de Molly me fez parar de caminhar no mesmo momento em que ela soou.
"Você não é minha mãe, sabia?" ela murmurou, provavelmente com a intenção de que eu não ouvisse
Baixei a cabeça, notando que ela havia percebido que eu ouvi suas palavras pelas batidas rápidas de seu coração. Ela estava nervosa. Trinquei o maxilar, virando o rosto um pouco para ela, sentindo um certo vazio, e deixando que meus olhos transparecessem aquilo enquanto meu rosto ainda carregava uma expressão séria.
"Sim, eu sei." respondi, vendo-a engolir em seco
Ela abriu a boca para falar, mas eu apenas levantei minha mão, pedindo que ela se mantivesse calada. Riley parecia assistir tudo nervosamente, sem saber exatamente o que fazer.
"Conversaremos mais tarde. No meio tempo, faça o que quiser. Tem razão, não sou sua mãe." voltei a andar para a saída do quarto, caminhando pelo corredor sem esperar que Riley me seguisse
"Olivia!" ouvi Molly me chamar, mas não olhei para trás, e logo ouvi os passos de Riley me alcançando
Começamos a caminhar pelos corredores em silêncio, mas eu podia sentir a inquietude dele. Não demorou muito para que ele se pronunciasse.
"Ela não quis dizer aquilo."
"Sei que não." comentei, olhando vagamente para ele enquanto andávamos, ainda me sentindo vazia "Mas não deixa de ser verdade."
Pude ver de relance Riley balançando a cabeça. "Não, você com certeza é uma figura materna para ela. Mas Molly parece ser teimosa, ela só quer descobrir o mundo por ela mesma."
"O problema é que o mundo que ela quer conhecer está em guerra." notei as portas gigantes da sala do trono no final do corredor e andei mais rapidamente "E ela não sobreviveria sozinha nele."
Riley se calou, parecendo pensar em algo, e logo os Ninphs que guardavam as grandes portas se curvaram, abrindo-as para que pudessemos entrar. A figura imponente de Lorell nos observava entrar no salão, sentada em seu trono de cristal, e logo notei que havia mais alguém no salão.
Arin estava de costas para nós, mas logo seu rosto se virou para ver quem entrava. Franzi o cenho ao vê-lo ali, notando ele voltar a olhar para Lorell logo em seguida.
"Bem, senhor Lacamoire, eu lhe desejo uma boa viagem." Lorell falou sorrindo gentilmente para Arin "Tenha cuidado."
"Viagem?" eu e Riley perguntamos ao mesmo tempo, vendo Arin se virar para nós
Seus olhos se voltaram diretamente para os meus e eu o questionei silenciosamente para onde ele ia, mas ele apenas baixou os olhos.
"O senhor Lacamoire irá para o Brasil em algumas horas. Aparentemente os lobisomens demandam que ele esteja lá para resolver alguns problemas de sua raça." Lorell explicou
"Voltarei o mais rápido possível." Arin completou, olhando para mim e para Riley "Alguns lobisomens lá estão causando problemas, não posso deixar que continue, certo vampira?"
Ele sorriu para mim e eu apenas assenti, franzindo os lábios. Arin estava se tornando um amigo no qual eu podia confiar e que parecia ser um dos únicos capazes de me distrair de tudo ao meu redor. Saber que ele provavelmente passaria algum tempo longe me preocupava um pouco.
Riley se aproximou de Arin, sorrindo para ele e o desejando boa sorte antes que ele saísse do salão. Balancei a cabeça, arrumando minha postura e olhando para Lorell, me curvando levemente.
"Majestade..." pude vê-la curvar a cabeça em retorno e dei um passo a frente "Temos notícias que podem ser boas."
"Por favor, digam."
"Um de meus animorfos na Rússia construiu uma máquina que acabou por prender um Ghoul." pude notar o interesse de Lorell assim que Riley disse aquelas palavras "Não é algo simples, mas foi capaz de capturar um Ghoul que, aparentemente, esteve na presença de Khoz recentemente."
"Achamos que alguma informação importante sobre os planos de Khoz possa ser tirada dele." cruzei os braços, respirando fundo com a ideia de que algo útil para nós poderia ser retirado do Ghoul "Não é cem por cento certo de que isso aconteça, mas é uma possibilidade."
Lorell ficou em silêncio, apenas observando a mim e a Riley, antes que ela se movesse em seu trono, olhando diretamente para mim. "Pretende ir?"
"Sim, creio que posso arrancar as informações dele."
"E seu povo?"
"O Conselho ficará no controle enquanto faço isso." balancei a cabeça, olhando para o chão, subitamente lembrando que eu era a líder agora "Sei que talvez não seja adequado que eu saia, mas quero fazer isso."
"Acha que o seu Conselho pode cuidar de tudo enquanto está fora?"
"Sim, senhora. Ezekiel é o chefe do Conselho, confio nas decisões dele com minha vida, e sei que ele irá cuidar de tudo enquanto estou fora." assenti, falando aquilo mais para mim do que para Lorell "Além do mais, não espero passar muito tempo lá."
"Falando nisso," Riley deu um passo a frente "seria sábio levarmos também um Ninph conosco caso o Ghoul saia do controle."
Lorell concordou, movendo o maxilar de um lado para o outro, parecendo considerar cada palavra que dizíamos. "Irei verificar a disponibilidade de Alya e a mandarei com vocês. Ela poderá ser de grande ajuda caso algo aconteça."
Assenti, aliviada de saber que era um Ninph conhecido. "Acho que isso é tudo, majestade."
"Estão dispensados então. Falarei com Alya o mais rápido possível e, se for possível, ela os levará até lá hoje mesmo."
"Obrigado, majestade." Riley falou, se curvando, e logo começamos a fazer nosso caminho para fora da sala do trono
"Olivia..." a voz de Lorell me chamou e eu me virei para olha-la "Posso conversar com você, por favor?"
Engoli em seco, olhando para Riley rapidamente, vendo-o me desejar boa sorte silenciosamente antes de sair da sala do trono. Me aproximei novamente de Lorell, vendo sua expressão se tornar cansada quase instantaneamente, me fazendo franzir o cenho.
"Acho que não preciso dizer que já sabia que você se tornaria rainha, não é mesmo?" ela se levantou, começando a caminhar pela sala do trono
Me mantive em meu lugar de cabeça baixa, apenas ouvindo suas palavras e engoli em seco.
"A possibilidade me veio a cabeça, sim." respondi, percebendo que ela ainda estava em movimento
"Eu vi a morte de Azriel séculos atrás, a lâmina atravessando o corpo dele ao invés do seu." ela disse, parando para respirar fundo por um segundo "Não revelei a ele a causa ou o dia de sua morte, mas ele já estava preparado para que aquilo acontecesse."
"Me perdoe majestade," a interrompi, levantando a cabeça e virando meus olhos para ela, que me encarava com curiosidade "mas por quê está dizendo isso agora?"
"Porque não vi que tipo de rainha você seria. Vi sua liderança nesses séculos, Olivia, sei que é capaz. Os relatórios cheios de elogios à líder que você é que recebi durante todo esse tempo me provou isso. Mas estamos em meio a uma guerra." ela se aproximou, me fazendo encarar seus olhos agitados "Preciso pedir que seja sábia com suas decisões e sua liderança. Estamos muito próximos de perder a guerra, e isso me assusta. Não consigo ver o futuro mais, algo me impede, mas sinto que você terá de enfrentar mais do que você talvez seja capaz de aguentar."
Senti um calafrio passar pela minha espinha e engoli em seco. O peso das palavras de Lorell pareciam querer me afundar no chão, a responsabilidade que ela me dava se acumulando com as que eu já tinha que lidar.
"Isso tem haver com minha ida para a Rússia?" minha voz tremeu levemente e eu me repreendi mentalmente por isso, não era o momento de ser fraca
"Não, não... Não sinto que haverá riscos de grande porte com sua ida. Como você já disse, Ezekiel pode tomar conta de tudo. Conheço o vampiro e sei de sua competência." ela deu um leve sorriso, me fazendo sorrir junto ao lembrar do velho "Mas creio que o futuro é incerto, então peço que esteja preparada para essas incertezas."
"Sim, senhora." falei, tentando parecer confiante
"Meu encontro com Khoz está cada vez mais próximo. Não creio que coisas boas sairão dele." ela parou bem a minha frente, sua postura ficando um pouco mais relaxada, me fazendo pensar que eu falava agora com uma amiga que precisava de ajuda, não com a criatura mais poderosa do mundo "Mas creio que não possa evitá-lo. Tudo começou com nós dois, é quase inevitável que termine da mesma maneira."
"Estaremos lá para ajudá-la." falei, colocando uma mão em seu ombro e a vendo sorrir gentilmente para mim
"De uma coisa tenho certeza sobre você, Olivia." ela segurou meu rosto com cuidado me fazendo a olhar, suas mãos quentes e macias contra meu rosto levemente gelado "Você é mais do que a líder dura e fria que todos vêem. Sua multitude de personalidades a fazem uma criatura fascinante."
Abri a boca para falar algo, mas logo a fechei, não encontrando uma resposta. Ela retirou suas mãos de meu rosto e voltou a caminhar até seu trono, se sentando delicadamente e ponto uma expressão dura em seu rosto, mas eu ainda conseguia ver que aquilo era só uma máscara para manter a sua aura de poder agora.
"Pode ir, criança. Você tem coisas para resolver, não é mesmo?"
Assenti, me curvando para ela antes de sair da sala do trono, deixando que todas as palavras dela voltassem a repercutir em minha cabeça.
༶
Alya havia confirmado que poderia ir conosco, deixando Winnie encarregada de cuidar dos curandeiros enquanto ela estava fora - me encarregando de fazer o mesmo e dando Ezekiel a responsabilidade do trono -, e partiríamos naquele fim de tarde. Estava em meus aposentos, jogando roupas dentro de uma pequena mochila, quando ouvi a porta abrir e a presença de Molly encher o lugar. Ela parecia incerta.
Franzi os lábios, lembrando da frase de Molly mais cedo, e continuei arrumando as coisas sem lhe dar muita atenção.
"Olly-"
"Estarei indo para a Rússia em algumas horas." me virei para ela com uma expressão vazia "Não sei quanto tempo ficarei fora, mas não pretendo passar muito tempo lá."
"Olivia, por favor, me escute."
"Já escutei." não contive o sorriso machucado que se estampou em meu rosto
Ela baixou a cabeça, esfregando seus braços com as mãos, assumindo uma posição tristonha. "Me desculpe, eu não queria ter falado aquilo."
Soltei o ar com força, percebendo que, mesmo magoada, não conseguiria ficar com raiva de Molly por muito tempo. Me aproximei dela, vendo-a me olhar incerta enquanto eu a puxava para um abraço.
"Eu sei que sou dura com você, mas você tem que entender que tudo o que eu faço é por você. Você e Ezekiel são minha única família e eu preciso proteger esse resto de família que eu ainda tenho." balancei um pouco a cabeça, sentindo-a me apertar um pouco mais no abraço "Eu daria minha vida pela sua, meu mundo gira em torno de você desde o dia em que eu resolvi a acolher, e eu não posso deixar que nada lhe aconteça."
"Eu sei..." ela sussurrou "Você não é minha mãe, Olly. Nunca vai ser ela, ela está morta. Você não é minha mãe, mas é minha mãe, e eu não poderia ter pedido por uma mãe melhor."
Franzi as sobrancelhas com suas palavras, vendo que ela parecia tão confusa com o que havia dito quanto eu.
"Você entendeu..." ela sorriu para mim
Descansei meu rosto em seu ombro, mantendo o abraço e deixando que Molly me acalmasse.
"Me prometa que vai ficar aqui, segura, e se recuperando."
"Eu prometo, não se preocupe."
༶
O céu nublado da Irlanda pairava sobre mim, e eu sentia as finas gotas da garoa que caía atingindo a pele de meu rosto enquanto eu olhava para o céu. Ouvi passos se aproximando, percebendo ser Riley assim que ele parou ao meu lado, completamente agasalhado para o frio que enfrentariamos na Rússia.
"Tem certeza de que não quer colocar uma roupa mais quente?" ele perguntou, parecendo legitimamente preocupado, e eu levantei as sobrancelhas "Uma jaqueta de couro não parece ser adequado..."
"Ela é resistente ao frio." a voz de Alya soou atrás de nós, nos fazendo virar para vê-la "Pode passar vinte e quatro horas em um clima extremamente frio sem que sofra alguma consequência. Mesma coisa com climas muito quentes."
Sorri para Riley, levantando as sobrancelhas - contando vantagem dessa minha característica - e ele apenas sorriu, balançando a cabeça. "Acho que podemos ir."
"Sim, podemos." Alya se aproximou, tocando em nossos braços, e nos olhando atentamente "Já que não sabemos o local exato para onde temos que ir, irei nos levar até alguém que estará nos esperando com um transporte."
Nós dois assentimos e logo em seguida tudo pareceu ficar turvo, e logo não estavamos mais nos jardins da Casa Belvedere, mas bem em frente à um grande monumento que eu logo reconheci. O Campanário de Ivã se erguia prepotente, o clima escuro do inverno russo parecendo acentuar sua beleza.
"Moscou..." pensei em voz alta, sorrindo levemente, vendo algumas pessoas nos olhando estranho "Seu amigo está aqui?"
Riley esfregou as mãos antes de pegar o celular da mochila que ele carregava e logo notei Alya esfregar a testa, parecendo cansada. Fui até ela, tocando em seu ombro, vendo-a me olhar com um leve sorriso no rosto.
"Estou bem, não se preocupe, é só que minha magia não é exatamente a melhor para teleportes como este, aonde eu tenho que levar mais de uma pessoa comigo."
"Ahn, más notícias." Riley se pronunciou "Richard vive em uma área isolada de uma cidadezinha chamada Shoksha."
"O quão longe é a cidade?" perguntei, segurando Alya um pouco, vendo que ela estava levemente tonta
"Segundo o GPS? 13 horas daqui se formos de carro."
Respirei fundo, mordendo o lábio inferior, irritada com o leve contratempo. Alya se livrou de mim, apontando na direção de um carro preto parado a alguns metros de nós.
"Eu disse que nos traria até o transporte." ela sorriu levemente, mas parecia tão descontente quanto eu com a distância
Dei de ombros, movendo a cabeça, chamando Riley para nos seguir até o carro. Seria uma longa viagem.
_____________________
NOTAS DA AUTORA:
Próximo capítulo: 04/06!
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro