II
Dias Atuais...
"Molly, levante esses punhos!"
A garota levantou os braços um pouco antes de ser atingida com um chute a toda força, fazendo-a voar pela sala, bater com as costas na parede e cair no chão, claramente sem forças. Balancei a cabeça e olhei para o vampiro que a havia chutado, levantando uma sobrancelha.
"Forte demais, Jake. Ela não tem nossa resistência."
"Desculpe."
Jake foi até Molly, ajudando-a a se levantar. "Você está bem?"
"Estou." mentiu, quase sem ar.
"Tudo bem, já chega por hoje. Molly, tome um banho e se arrume rápido. A reunião é em um hora. Jake, obrigada pela ajuda, está dispensado."
Jake fez uma reverência antes de sair da sala. Assim que ele já não estava lá, Molly pareceu recuperar o ar e olhou para mim com um sorriso no rosto. "Estou melhorando, não é?"
Olhei para ela, sem responder. Ela vinha treinando desde os dezoito, e, em 4 anos, não tinha feito tanto progresso. Pensei em responder alguma coisa, mas ela logo balançou a cabeça e soltou uma leve risada.
"Não é."
"Molly, você está... Melhorando. Mas ainda tem muito caminho pela frente. E tem que parar de esquecer que vampiros são dez vezes mais fortes que você."
"E se fosse um humano lutando comigo?"
"Talvez você ganhasse, mas sairia completamente machucada."
"Bem pessimista você, huh?"
"Realista. Tem uma diferença."
Molly se sentou no chão, ainda cansada do treino, e eu me aproximei, me sentando do lado dela e fazendo-a olhar para mim.
"A gente consegue, você só tem que aprender a usar a força do outro contra ele mesmo e logo logo vai estar conseguindo derrubar até a mim."
"Será mesmo que uma humana de vinte e dois anos consegue derrubar uma vampira de quinhentos e quarenta e quatro?"
"Quinhentos e quarenta e cinco em alguns meses."
"Pior ainda."
Ri enquanto Molly fazia uma careta e encarava os próprios pés com uma expressão vaga. Conhecia aquela expressão, ela estava refletindo em alguma coisa. Pensei em dizer que eu estava mentindo sobre a luta e que ela estava melhor do que eu havia dito antes - mesmo sendo mentira -, mas achei melhor me manter calada. Olhei para o relógio na parede da sala, lembrando que tinhamos que chegar até a reunião sem atrasos.
"Molly. Banho." falei, fazendo-a despertar.
Ela piscou algumas vezes e assentiu, se levantando e pegando suas roupas para ir para o banheiro.
༶
"Lembra do que fazer e não fazer quando chegarmos lá, certo?" perguntei, olhando rapidamente para Molly e voltando meus olhos para a estrada na mesma hora.
Odiava dirigir, mas as vezes era necessário. Molly não podia se mover na velocidade de um vampiro para os lugares, então eu era obrigada a desacelerar.
"Responder tudo que me perguntarem, não fazer objeções e fingir que sou uma garota educada."
"Exato. Eu sei que você odeia passar por isso, mas é o preço por ser criada por um vampiro. Não que isso já tenha acontecido antes... O Conselho é paranoico demais, então tem que eliminar todas as possibilidades dos humanos voltarem a saber da nossa existência. Foi um problema conseguir convencer eles que fazer uma aliança com o governo americano, assim como os outros governos do mundo, seria uma boa ideia."
"Mas você conseguiu."
"Mas eu consegui. Se você ameaçar as pessoas certas e ter um certo poder de persuasão, você consegue tudo."
"Você não presta."
Dei de ombros. "Ossos do ofício."
Molly sorriu e olhou atentamente para a janela do carro. Percebi sua respiração ficar mais calma que o normal. Ela estava pensando em alguma coisa novamente.
"Ei, no que você está pensando?"
Ela pareceu se assustar, como se o fato de eu perceber que ela estava diferente fosse raro. Eu podia saber cada mudança de humor dela apenas pelo ritmo de sua respiração e a quantidade de batidas que seu coração estava dando. Não era como se eu já não tivesse feito isso antes.
"Eu só... Nada. Não é nada."
"Sabe que não gosto quando mente pra mim."
"Olly, não é nada de mais, eu prometo."
Resolvi não pressionar. Sabia que se fizesse ela acabaria irritada e aquela não era a hora para uma Molly irritada. Em poucos minutos levei o carro até a entrada de um hotel.
O Sheraton se erguia a nossa frente, algumas poucas pessoas com roupas elegantes andavam até a entrada do hotel. Parei o carro na entrada e fiz um sinal para que Molly saísse do carro. Saímos as duas e um homem prontamente se apresentou para levar o carro. Dei minhas chaves para ele e o vi dirigir para longe.
Me virei para Molly, vendo-a checar seu vestido, olhando para ver se não iria pisar nele enquanto andasse. Me aproximei, ajeitando o seu prendedor de cabelo e lhe dei um sorriso.
"Você está ótima, não se preocupe."
Ela deu um sorriso fraco e olhou para a entrada do hotel, esperando que eu a guiasse. Gesticulei com a cabeça para que me seguisse e caminhei para dentro do hotel. As pessoas olhavam para nós duas enquanto caminhávamos, e não demorou para que alguém da recepção nos interceptasse.
"Perdão, madames, posso saber o que fazem aqui?"
"Temos uma reunião marcada para daqui a alguns minutos no restaurante com algumas pessoas que estão hospedadas em seu hotel." falei rapidamente. "Creio que você poderia nos levar até lá?"
O rapaz pareceu lembrar de alguma coisa, inclinando a cabeça e olhando para mim. "Você é a senhorita Wright?"
Meu corpo tensionou instantaneamente com o uso de meu sobrenome. Havia parado de usá-lo séculos atrás e a simples menção dele era estranha.
"Sim. Olivia Wright."
"Ah, então me acompanhem por favor."
Começamos a seguir o rapaz até o restaurante e ouvi Molly falar baixinho ao meu lado, de um jeito que apenas eu poderia ouvir. "As vezes esqueço que você tem sobrenome."
"Eu também, Molly. Eu também..."
Chegamos a duas portas grandes e belas, podia ouvir o barulho de pratos e talheres logo atrás delas. O rapaz abriu uma delas e entramos no elegante restaurante do Sheraton.
Pessoas com roupas tão caras quanto um carro novo comiam e conversavam ali, alheios aos seus arredores. Não demorou muito para achar quem iriamos encontrar. Me virei para o rapaz afirmando que já havia visto as pessoas com as quais ia jantar e ele nos deu um boa noite cordial antes de se retirar.
Olhei para Molly, vendo seu desconforto, e segurei seu braço com o meu, fazendo-a olhar para mim.
"É apenas uma noite e voltamos a vida normal, Molly. Vai ficar tudo bem."
Ela assentiu, ainda nervosa, e caminhamos até uma grande mesa no canto do restaurante. Assim que me viram, os outros vampiros se levantaram para me receber, ignorando completamente a existência de Molly. Exceto por Ezekiel.
Ele caminhou até a garota e a abraçou com um sorriso amigável no rosto. Nos primeiro anos ele havia ido contra a ideia de criar uma criança humana, mas não demorou muito para que ele se apaixonasse por Molly. O velho parecia ver nela a filha que nunca chegou a ter, e Molly aceitou aquilo rapidamente, tendo em vista que nunca conheceu o pai.
Logo nos sentamos e notei Nicolas bebendo alguma coisa em silêncio no canto da mesa. Ele odiava ter que ir para aquelas reuniões. Ele não fazia nada a não ser ouvir e responder algumas poucas perguntas, mas era obrigado a ir pelo simples fato de dividir poder comigo na colônia.
Ignorei Nicolas, como de costume, me sentando à mesa, Molly tomando a cadeira que ficava entre mim e Ezekiel.
"Olivia, pergunte a sua humana se ela irá querer algo antes de começarmos a reunião." ouvi Jane falar com desgosto.
Jane era uma das únicas mulheres do Conselho, e também a que mas ia de encontro com minha ideia de manter Molly por perto sem a transformar agora que ela já era uma adulta. Ela se recusava a tratar Molly bem, tendo a ideia de que ela não era nada mais que um ser inferior.
Ao ouvir aquilo olhei atentamente para ela, vendo-a olhar de volta. Peguei o cardápio que estava em cima da mesa e fiz uma careta, não dando real atenção ao que estava escrito nele. "Jane, é preocupante sua condição."
Ela pareceu ficar confusa com o que eu disse, e logo se pôs a falar novamente. "Minha condição?"
"Sim. Quero dizer, são quase quinze anos desde que fazemos essa reunião e você ainda não decorou o nome de Molly..." virei a página do cardápio e olhei para ela em seguida "É claro que tem algum problema aí."
Pode ouvir o leve rosnado que ela deu, e o ignorei com um leve sorriso. Fechei o cardápio e o coloquei em cima da mesa de qualquer jeito, o conteúdo dele não me interessando.
"Se vamos passar por isso novamente, que esteja claro que ela deve ser chamada pelo nome."
"E quem é você para dar ordens?" Jane indagou, irritada
"Vamos ter essa conversa novamente? Eu sou a líder da maior colônia no mundo no momento, vocês estão em meu território então que obedeçam as minhas regras. Conselho ou não, o poder aqui é meu." falei, fazendo todos os 5 membros do Conselho engolirem em seco, juntamente com Nicolas. "E devo lembrar-lhe, Jane, que o único motivo de você ser do Conselho foi porque recusei o pedido de Azriel. Contenha-se, você tem tanto poder quanto um Daemon aqui."
Ela pareceu se encolher na cadeira e eu assumi uma posição mais ameaçadora. Não controlava quando meus surtos de liderança aconteciam, mas quando aconteciam eu parecia sempre sair vencendo.
"Espero ter sido clara." falei rapidamente antes de me virar para Molly. "Está com fome?"
Ela assentiu levemente, envergonhada, e eu lhe passei o cardápio. "Escolha o que quiser, não precisa se apressar."
Chamei um garçom pedindo uma garrafa de vinho para tomar. Felizmente, vampiros também eram suscetíveis aos efeitos do álcool. Talvez um pouco mais resistentes, mas ressaca não era uma característica particular dos humanos. Tendo isso em conta, precisava relaxar um pouco para me manter calma em meio àquelas pessoas.
Assim que meu vinho e a comida de Molly chegaram, me pus a falar.
"Enquanto ela come, podemos cuidar de outros assuntos, creio eu."
"Certamente." Ezekiel falou, retirando um envelope do bolso do paletó dele. "Quase ia me esquecendo. Azriel mandou que lhe entregasse isso."
Olhei para o envelope desconfiada. Podia ver o selo de cera de Azriel que mantinha a carta fechada e senti meu corpo se tensionar um pouco com a memória dele. Peguei a carta com cuidado, vendo a parte da frente do envelope.
A caligrafia de Azriel estava lá, impecável. Só havia uma palavra ali, mas ela já era o suficiente para me fazer estremecer, lembranças de épocas em que recebia cartas com aquela mesma palavra, naquela mesma caligrafia forte pareciam voltar rapidamente. Lembrava da urgência que as cartas dentro daqueles envelopes traziam desde que havia me tornado uma vampira. Esta provavelmente não era tão diferente das outras.
Molly olhou discretamente para o envelope, notando que a única coisa nele era o selo vermelho e meu nome escrito a mão, adotando uma feição de confusão em seu rosto.
Abaixei o envelope, colocando-o sobre a mesa, vendo a inveja nos olhos dos outros vampiros presentes. Eram poucos os que recebiam uma carta de Azriel, e eu parecia ser a que mais recebia essa espécie de privilégio. Mas o preço que eu pagava por aquele privilégio não valia a pena.
"Não vai abrir?" ouvi Klaus, um dos membros do Conselho, falar.
Olhei a minha volta, todos os vampiros, e até mesmo Molly, curiosos para saber o que havia de tão importante naquela carta. Tomei um gole de meu vinho e dei a carta para que Molly segurasse. Ela a pegou, confusa.
"Molly, pode me lembrar de abrir isso em casa, querida?"
"Ahn... Claro. Posso sim..."
Assenti e tomei mais um gole do vinho, olhando para todos ali, deixando claro que o que estava naquela carta não seria discutido naquela mesa.
Uma conversa amigável se iniciou enquanto todos esperávamos Molly terminar seu prato. Assuntos alheios sobre as vidas de todos ali ultimamente, e política. Parecia uma conversa promissora entre amigos, como se o fato que quase todos ali me invejassem e que eu não tolerava metade deles não fosse importante naquele momento. Logo Molly terminou de comer e o silêncio voltou a mesa, todos se preparando para a monotonia que era aquele processo que faziam a pobre Molly passar todos os anos.
"Vamos começar com as perguntas, está pronta?" Ezekiel falou, olhando para Molly ternamente.
Olhei para Molly, vendo-a assentir levemente. Ela estava nervosa e todos ali podiam perceber isso. Felizmente, Ezekiel se encarregou de fazer as perguntas desta vez, fazendo Molly ficar visivelmente mais relaxada.
"Bem, vamos começar..." ele disse, se ajeitando na cadeira para olhar para ela melhor. "Quantos anos você tem, Molly?"
"Vinte e dois."
"Ok... Molly, o Peter e o Michael nunca vieram numa reunião dessas." ele falou, apontando pra dois vampiros que estavam sentados à mesa. "Você poderia, por favor, dizer o exato porquê dessa reunião?"
Molly se mexeu desconfortável na cadeira. "Para provar que a Olly tem capacidade de manter minha guarda. E que não sou, de algum maneira, uma ameaça."
Todos pareceram estranhar o apelido que ela havia me dado, mas eu já estava acostumada a ouvi-lo diariamente, não me dando conta de que ela havia o usado e que aquilo era um tanto pessoal.
"Obrigado, querida. Agora, às perguntas rotineiras... Levando em conta sua idade, você deveria estar estudando ou fazendo algum tipo de trabalho para manter a aparência de uma vida humana normal. Você está fazendo alguma coisa?"
"Ah, sim! Estou quase terminando a faculdade, e trabalho em uma loja de brinquedos..."
Molly então prosseguiu a responder as perguntas sobre a vida dela, garantindo ao Conselho de que o fato de eu cuidar dela não estava afetando sua vida. Percebi Nicolas respondendo algumas poucas coisas também. Após algum tempo, e três taças de vinho, percebi que todos se voltaram para mim. Passei a prestar atenção.
"Olivia, se não se importa, temos apenas duas perguntas para você."
"Pergunte então."
"O fato de você tutelar uma humana está atrapalhando nas suas tarefas como líder dessa colônia?"
"Nem um pouco. Molly não mudou meus deveres."
"Certo, só mais uma coisa... Você pretende transformá-la?"
Todo o barulho ao meu redor pareceu desaparecer naquela hora, o mundo pareceu entrar em câmera lenta. Vi Molly olhar para mim e a olhei de volta, não conseguindo identificar sua expressão. Ao mesmo tempo em que eu podia ver medo, podia jurar ver um pouco de esperança.
Voltei a olhar para todos na mesa. Aquela pergunta nunca havia sido feita em uma reunião, ao menos não com Molly presente, e sempre que me perguntavam, eu fugia do assunto. A verdade era que eu não queria transformá-la. Queria que ela se mantivesse humana, talvez por ser uma coisa que eu não pude ser. Eu não tive escolha. Mas Molly também não teria, eu não podia deixar que ela também se tornasse aquilo e se arrependesse no final.
Então, com isso, eu finalmente dei minha resposta à pergunta.
"Não. Ela se manterá humana e terá uma vida humana." baixei os olhos para a mesa, olhando com atenção o tecido branco que a cobria. "Não será uma vampira."
Ao olhar para os rostos a minha volta pude ver suas expressões. Ezekiel e Jane pareciam surpresos, não esperavam uma resposta negativa, já os outros pareciam satisfeitos com a escolha. Molly nunca foi realmente bem vinda entre os vampiros, então suas reações não me surpreenderam. Mas Molly parecia desapontada, talvez até um pouco irritada. Como ela poderia estar irritada com aquilo?
"Bem... Eu acho que é só isso." Ezekiel falou. "Creio que estejam todos liberados."
Assim que ele falou aquilo, Molly se levantou da mesa, caminhando para fora do restaurante a passos rápidos, sem falar uma palavra. Todos olharam para mim e eu apenas olhei para minhas mãos, sem expressão alguma.
"Se me derem licença..." disse, antes de me levantar e seguir o caminho que Molly tomou.
Apressei o passo, alcançando-a rapidamente e segurando seu braço para que ela parasse.
"Molly, o que foi isso?"
"E se eu não quiser ser humana?" ela falou, fazendo algumas pessoas ao redor a olharem estranho. "E se eu quiser ser transformada?"
"Não." minha voz soou autoritária e ela percebeu isso.
"Você não pode me controlar pra sempre Olivia. Eu não sou mais uma criança assustada. Eu quero ajudar você! Eu quero parar de ser apenas um empencilho!"
"Molly, eu não sei o que faz você pensar que a transformação é uma opção viável para você, ou que você é algum tipo de empencilho, mas acho melhor termos essa conversa em casa."
Ela pareceu notar que haviam pessoas ao redor e bufou, irritada.
"Pegue o carro. Vá para casa e relaxe um pouco. Vou depois."
A raiva dela pareceu diminuir levemente. Ela assentiu e começou a caminhar para fora do hotel. Tomei um caminho diferente, indo para perto da piscina sem chamar a atenção dos funcionários. Me sentei em uma das espreguiçadeiras e fiquei encarando a água, pensando no que fazer quando chegasse em casa.
"Sabe, Atlanta é realmente uma cidade bonita. Uma pena que estou aqui apenas a negócios." a voz de Ezekiel soou atrás de mim e eu o ignorei. "Quando você disse que queria estabelecer a sua sede aqui, achei bem estranho. Você devia ter ficado em Washington, próximo ao centro político humano desse país. Mas agora entendo o porquê aqui, é realmente um ótimo lugar e em constante mudança. Não é de hoje que você detesta monotonia."
"Ezekiel, se não se importa, não estou no humor para conversas."
"É compreensível." ele sentou no chão ao meu lado, os cabelos claros pareciam mais bagunçados que o normal. "Mas sabe, sempre achei que você iria querer transformá-la... Digo, Molly é como se fosse sua filha! Imaginei que você a quisesse manter por perto."
"Eu adoraria." disse com sinceridade. "Mas não posso. Ela tem a chance de se manter normal. Não vou deixá-la jogar isso fora. Ela não entende o peso que é carregar a imortalidade nas costas."
"Talvez ela não se importe."
"Bem, eu me importo." minha voz tinha e tornado impaciente. "Eu daria tudo para ser como ela e-"
"E ela daria tudo para ser como você." ele me interrompeu.
"Ela não sabe o que é ser como eu, Ezekiel. Ela é ingênua, uma criança!" me levantei, andando de um lado para o outro, inquieta. "Ela acha que sabe como é minha vida mas há tanto que ela não sabe."
"Conte a ela então! Talvez ela mude de ideia."
"Ah, se fossse fácil assim." soltei uma risada e passei a mão no rosto.
Todos esses anos e nunca havia contado Molly nem metade da minha vida. Muitas coisas eu preferia esconder, ela não precisava saber de tudo, só o suficiente. Era injusto que eu escondesse tudo dela dessa maneira, mas era preciso.
"Acho melhor ir para casa. Vai ser uma longa caminhada."
Ezekiel se levantou, me dando um abraço. "Família é complicado, Olivia."
"Nem me diga."
Me soltei de seu abraço, começando a andar para longe da piscina e indo para fora do hotel. Não estava tão tarde então as ruas estavam movimentadas, o que fazia com que eu fosse olhada com estranheza graças às minhas roupas elegantes, não muito apropriadas para uma caminhada noturna.
Caminhava ignorando as pessoas ao meu redor, minha cabeça estava ocupada demais para ligar para elas. O que eu poderia fazer para convencer Molly? Ela era esperta, seria difícil, mas eu tinha que tentar.
Talvez eu pudesse, de fato, contar a ela minha história, mas não acho que ela se manteria perto de mim se eu o fizesse. Talvez a convencesse de que a transformação era idiotisse, mas eu era egoísta demais para afastá-la de mim. Mas não egoísta o suficiente para mantê-la para sempre. Passei uma mão no rosto, ainda caminhando, sentindo que precisava gritar.
Desde que tinha decidido criar ela, sabia que aquele dia ia chegar, mas sempre odiei a ideia de que chegaria. Eu precisava dormir um pouco, descansar meu corpo e mente por algumas horas, e talvez aí eu poderia conversar com ela. Talvez convencê-la de que a transformação não era uma opção viável.
Era tão mais fácil quando ela era apenas uma criança...
Fui tirada de meus pensamentos quando ouvi passos se aproximando. Franzi o cenho e olhei para trás, vendo um rapaz vindo em minha direção. Assim que o olhei, ele sacou uma arma e a apontou para mim. Rolei os olhos e voltei a caminhar normalmente.
"Pare! Isso é um assalto!"
"Não tenho dinheiro, vá embora moleque."
E então ele atirou. Senti o incomodo da bala perfurando minhas costas em algum lugar perto do meu ombro. Me virei para o rapaz, vendo-o me olhar confuso.
"Você não deveria brincar com isso, pode acabar matando alguém." passei a mão no local onde a bala havia entrado, sentindo a repentina dor me fazer querer gritar.
Meus dedos estavam manchados com meu sangue e o rapaz começou a ficar assustado. Levantando a arma em minha direção novamente, suas mãos agora tremendo.
"Largue a arma e você não se machuca." falei
E então ele atirou novamente, desta vez atingindo estomago. Senti minhas presas alongarem de raiva e o olhei, vendo-o gritar e tentar correr, falhando miseravelmente. Ele tropeçou numa falha da calçada, sua arma voando para longe, e quando tentou levantar, eu já estava na frente dele, o segurando pela gola da camisa.
Ele parecia chorar mas eu estava com raiva. As pessoas aprendiam com o tempo que misericórdia não era um traço meu quando raiva estava envolvida. E naquele momento a ideia era a mesma. Quantas pessoas ele não deveria ter matado com aquela arma por causa de dinheiro? Quantas pessoas deveriam ter sofrido por causa dele? Talvez a resposta fosse nenhuma ou muitas, mas eu não tive vontade de perguntar. Se ele havia tido coragem de abrir fogo contra mim, não hesitaria com outra pessoa.
E, com isso, eu o mordi. Mas eu não o mordi para que se transformasse, não o contaminei com meu veneno. Ali minha única intensão era o matar.
Ele se debateu para fugir de mim, mas eu era mais forte. Ele gritou e se esperneou tentando escapar, pedindo por ajuda, mas ela não viria. Em pouco tempo pude sentir suas forças esgotando e seu coração cada vez mais lento.
Parei de tomar seu sangue, garantindo que não o drenasse completamente. Arrastei seu corpo semi-morto até um beco vazio e peguei sua arma. Tomar todo seu sangue seria suspeito, humanos eram desconfiados demais, então, sem pensar duas vezes, puxei gatilho, abrindo um buraco em seu pescoço aonde a marca das minhas presas estavam. O pouco sangue que ainda restava em seu corpo começou a jorrar do ferimento.
Respirei fundo e olhei para mim mesma, dois buracos de bala que ainda sangravam e sangue que não era meu manchavam minha pele e roupas. Uma imagem não muito boa para uma caminhada noturna. Precisava chegar em casa e tirar as balas de dentro de mim para que eu pudesse me curar.
Mantive a arma em minhas mãos e decidi que era hora de correr pra casa.
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NOTAS DA AUTORA:
Obrigada por lerem! Não tenho muito o que falar sobre esse capítulo, ele é mais uma introdução à personagem da Molly como adulta e da história como um todo.
Espero que tenham gostado! Próximo capítulo no dia 18/09.
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