XXI - Último suspiro de alívio
SENTIA AS AMARRAS NAS minhas costas serem puxadas com força, tirando-me o ar, como se não tivesse piedade nenhuma de mim.
— Está apertado demais — reclamei.
Através do espelho logo à minha frente, pude ver Kitty logo atrás me mandar um olhar irritado e de reprovação, enquanto ainda fazia os laços.
— Responda-me algo, está tentando me matar sem ar? — perguntei e logo pude sentir as amarras afrouxarem em minhas costas, fazendo-me rir logo em seguida. — Estava brincando.
— Não brinque com isso — Kitty falou. — Eu estou do seu lado, sempre do seu lado.
Concordei com a cabeça.
— Eu sei.
Kitty torceu o maxilar de um lado ao outro.
— Por quê está irritado?
Ele me olhou novamente através do espelho, como se me perguntasse com o olhar se eu havia mesmo feito aquela pergunta a ele, ao qual eu apenas ergui minhas sobrancelhas em sua direção, esperando por sua resposta.
Ele suspirou enquanto pegava meu vestido em cor vermelha, o direcionando para um de meus braços, me ajudando a vesti-lo.
— Thomas é um rei novo demais, incompetente demais. O mesmo nunca deve ter lutado uma guerra ou matado alguém, isso o torna cego às coisas ao seu redor — o olhei sem entender. — Como desconfiaria de alguém querendo lhe matar debaixo de seu próprio domínio se nunca teve um domínio ou teve que dominar antes? O pai dele morreu precipitadamente, ele é um governante de um resultado precipitado.
Mordi meus lábios e o olhei pensativa.
— Isso quer dizer que não acredita que seja ele quem tentou me matar?
— Você não acredita, então eu também não — respondeu terminando de me vestir.
Kitty estava ali porque eu confiava nele, não confiava nos outros rostos desconhecidos que entravam e saiam pelo quarto, não sabia o que os mesmos queriam de verdade comigo.
Mas sabia que mesmo de olhos fechados podia confiar em Kitty e os caminhos pelos quais ele me guiasse.
— Acha que minha intuição é boa assim?
Ele riu.
— Você e eu já sabemos quem fez isso.
Suspirei e concordei com a cabeça.
— Eu também errei, não foi somente ele como rei. Não desconfiei de nada até que você me revelasse, não sabia que estavam me matando aos poucos... realmente não sabia. Sem você eu estaria morta.
— Não diga isso, Anne — falou terminando de amarrar os fios do vestido. — Não estava ofendendo ou repreendendo, a sabedoria vem com o tempo e os erros. Nós erramos uma vez para não errar mais. Sou o que sou por que lutei minhas guerras e travei minhas batalhas. Para mim é normal desconfiar de todos e reparar em tudo, meu trabalho é matar e morrer por você, seus pais e meu país. Meu caminho é um só, assim como o do meu pai foi.
Me virei em sua direção e o olhei desconfortável.
— É um péssimo trabalho, por que escolheu ele?
Deu de ombros como se fosse óbvio.
— Era a única coisa que conhecia e o dinheiro e honras no meu nome são muito bons também — falou rindo e eu o acompanhei. — Meu pai morreu porque eu era novo demais para o proteger, mas minha mãe ainda está viva.
— Quero proteger quem é importante para mim também, mas como fazer isso se não consigo nem comigo mesma? — suspirei. — Se tivesse tido a escolha, certamente não teria sido a família real.
Ele concordou com a cabeça.
— Algumas escolhas são nossas e outras não. Não há nada que possa ser feito quanto a isso — falou e depois sorriu encarando meu cabelo. — Está vestida como uma rainha, porém, uma rainha despenteada, terá que fazer esta parte sozinha, infelizmente sei apenas dar nós.
Dei de ombros.
— Tudo bem, eu posso fazer isso.
Ele concordou com a cabeça.
— Irei lhe esperar do lado de fora — avisou enquanto ia em direção da porta. — Você está melhor, não está? — perguntou antes de sair.
Concordei com a cabeça.
Quando Kitty adentrou meu quarto logo após Thomas sair, ele havia trago outro de seus frascos esverdeados, o que me fez sentir-me melhor.
Não estava sentindo que tudo estava totalmente normal dentro de mim, mas sabia que estava no caminho certo.
— Tudo bem — falei e ele concordou mais uma vez com a cabeça e estava prestes a fechar finalmente a porta, quando eu o chamei o impedindo. — Obrigada, Kitty.
Ele sorriu em minha direção, um sorriso cheio de dentes e logo após, fechou a porta, me deixando sozinha no enorme cômodo.
Me olhei no espelho e comecei a finalmente tentar arrumar meu cabelo sozinha.
Nunca havia feito nada do tipo antes, mas não estava me preocupando tanto assim com o resultado no momento.
Thomas me esperava no salão, eu precisava ser rápida.
Kitty havia dito sobre viver suas próprias guerras e lutar suas próprias batalhas.
Eu estava vivendo a minha, e também estava prestes a talvez, ter que sujar minhas mãos de sangue pela primeira vez.
Eu as encarei.
Pálidas e limpas.
Eu sabia muito bem o meu posto, mas apesar de tudo, apesar de saber o que deveria fazer e o que era certo. Não sabia se estava pronta para arrancar a vida de alguém.
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