💠-7-💠
Eram exatas 1:15am e até agora nada de David pensar em dormir.
Ele não queria dormir e nem me deixava dormir. Eu deitava ele no meu colo e o que ele fazia? Resmungava bravo. Estava passando pela nonagesima vez galinha pintadinha na televisão, eu estava a ponto de me jogar de cabeça na primeira ponte que eu visse pela frente.
Ao ver dar uma e meia da manhã e David nada de demonstrar estar cansado, eu coloco uma roupa mais quente, o agasalho, tranco toda a casa e pego seu carrinho.
- Uma boa caminhada de madrugada irá te ajudar. - falo olhando para o bebê que estava ocupado demais brincando com um brinquedo de pano.
Eu tinha certeza que essa bairro era seguro para dar essas caminhadas noturnas. Me lembro de Drew pesquisando por incessantes dias um dos bairros mais seguros de Luisiana antes de comprar uma casa e esse ficou em primeiro lugar na sua lista.
Eu vestia apenas uma calça de moletom, uma blusa de moletom de zíper da cor cinza cobrindo o meu ridículo pijama de moranguinho e um chinelo qualquer nos pés. Já David estava idêntico a mim, a diferença é que ele estava com uma mantinha que o protegia da brisa fria.
- Sabe David, estamos juntos a um dia e eu percebi que nunca quero ter filhos. - comento empurrando o carrinho e David me olhava com atenção enquanto chupava uma chupeta preta - Você é mais difícil do que mulheres. - brinco e desço a calçada indo em direção ao asfalto - Mas pensando bem, não vou me sentir tão sozinha. Você concorda comigo, não concorda? - pergunto começando a andar na rua deserta que era iluminada pela luz dos postes e da lua.
Olho para o céu estrelado e respiro fundo. Olhar para o céu me dava paz, me deixava mais leve e calma. No último mês, olhar o céu me ajudou a passar pelo tsunami que surgiu na minha vida e eu esperava que isso surgisse efeito em David e o fizesse dormir.
- O seu pai dizia que cada pessoa que morre, vira uma estrela no céu. Acredita nisso? - pergunto olhando para uma brilhante estrela. Desvio minha atenção para David que agora olhava para o céu - É, foi o que eu pensei. - afirmo com a cabeça virando a esquina.
- Você acredita que o único ser vivo que eu já cuidei e não morreu foi uma cachorra chamada Cleo? - continuo o olhando e ele desvia os olhos do céu para o meu rosto - Bom, ela não morreu comigo mas a minha ex vizinha do andar de cima a roubou quando ela escapou e não me devolveu até hoje. A filha dela me mandava fotos dizendo que ela estava sendo bem tratada e só por isso eu não entrei com um processo de sequestro canino. - solto uma risada baixa - Eu particularmente acredito que ela salvou a cachorra de mim mas sabe de uma coisa? Ninguém vai te salvar de mim, garoto. - estico meu braço e toco sua barriga o fazendo rir.
Continuo caminhando sem rumo com David atento no carrinho e uma mulher de roupão sentada na calçada me chama a atenção. Fico hesitante se devia correr para longe ou passar perto e dizer um simples boa noite.
Escuto a voz em minha cabeça me mandando continuar e assim eu faço. Vou conversando com David e ao passar pela mulher, a olho e digo:
- Boa noite. - meu tom sai baixo e assim que a mulher me olha, a reconheço e vejo que era Madelaine.
- Boa noite, Vanessa. - esboça um sorriso de lado e paro de andar - Caminhando essa hora? - pergunta abraçando as próprias pernas e eu faço careta negando com a cabeça.
- É essa bomba de fralda que não consegue dormir. - aponto para o carrinho e David grita, automaticamente eu deduzo que esse grito foi em protesto por tê-lo chamado de bomba de fralda.
- Entendo. - solta uma risada baixa e olha para o asfalto por alguns segundos antes de voltar a me olhar - Tirou boas fotos? - pergunta puxando assunto e me viro para ela apoiando apenas um braço no carrinho.
- Você acredita que eu ainda não vi nenhuma? - coloco a mão na cintura a fazendo rir novamente - A vida materna não é para mim, entende? - pergunto e ela me olha confusa.
- Ele não é seu filho? - nego com a cabeça e suspiro.
- Longa história que envolve eu tendo que ficar com ele. - explico resumidamente antes que ela pergunte o porque e me deixe deprimida pelo resto da noite - Mas e você? Por que está sentada na rua às... - olho para o relógio em meu pulso - uma e cinquenta da manhã?
- Insônia. - faz careta e joga seu cabelo para o lado.
- Em trinta e quatro anos, eu nunca sofri disso. - puxo o carro para perto da calçada, travo as rodas - Eu vou me sentar aqui. Com licença e pode começar a se arrepender nesse exato momento por ter puxado assunto. - digo enquanto me sento na calçada e apoio meu corpo em minhas mãos.
Madelaine levanta a sobrancelha e me olha com um sorriso divertido antes de soltar uma risada baixa e voltar a encarar o céu.
- Sorte sua não ter insônia. - faz uma careta enrugando o seu nariz e olha para David que nos olhava com atenção.
- Eu deito a cabeça no travesseiro e apago. - rio dando de ombros - Mas com ele não querendo dormir, isso se torna impossível. - bocejo e coço meu olho com as costas da minha mão.
- Minha filha era exatamente assim... Uma técnica que ajudava muito era a deitar sobre o meu peito, ela dormia em segundos.
- Sério? - pergunto desacreditada e olho para David - Garoto sem vergonha, quer dormir quebrar a regra três de novo. - brinco cutucando seu pé e ele ri batendo as mãos na proteção do carrinho.
- Regra três? - me olha curiosa.
- Eu estabeleci três regras com ele. A primeira é nada de chorar de madrugada, a segunda é nada de birra e a terceira é sem dormir na minha cama. - explico e Madelaine tomba a cabeça para o lado e ri - Tem outras mas não tive tempo para estabelecer.
- Você deveria saber que bebês não entendem nada desse tipo de regra até pelo menos um ano e meio.
- E não é que é mesmo? - digo demonstrando indignação - Eu não entendo nada de bebês mas eu achava que eles entendiam isso pelo menos.
- Você realmente não entende nada de bebês? - me olha e eu nego com a cabeça.
- Não tenho aquele dom materno, sabe? - deixo meus ombros caírem e cruzo minhas pernas - Madelaine, eu gostaria de me desculpar novamente por ter te abordado daquela maneira na saída do cemitério. - falo após um silêncio de instalar no ar.
- Eu já disse que não dei importância para isso.
- Eu achei insensível da minha parte. - confesso e ela solta uma risada baixa.
- Está tudo bem, eu só fui fazer a visita anual ao túmulo do meu marido. - suspira e eu arregalo os olhos brevemente querendo me socar por ter ido falar com ela.
- Eu sinto mui...
- Está tudo bem, ele morreu a dois anos. - explica mas percebo um pouco de dor no fundo da sua voz - Se me permite perguntar e sem querer ser invasiva, quem você foi visitar?
- Fui levar ele para se despedir dos pais. - forço um sorriso tocando o pé do meu sobrinho e Madelaine mexe com a cabeça de forma sútil como se estivesse arrependida de perguntar isso.
- Se você quiser, eu posso te ensinar algumas técnicas com o bebê. - Madelaine diz por fim e eu a olho como se ela fosse uma espécie de deusa a minha frente - Coisas que ele pode comer, o que não pode, como ajudar a dormir mais rápido...
- Sério?
- Claro, você acaba de entrar no grupo das mães solo então uma mão lava a outra. - sorri calorosamente.
- Ai meu Deus. - murmuro agradecida - Você não sabe o quanto vai me ajudar, eu tenho tanto medo de fazer algo errado e machucar ele ou o deixar doente. Não sabia para quem pedir ajuda. - falo com afobação fazendo a mulher rir.
- Eu entendo esse seu medo, quando Isabella era da idade dele eu tinha medo até de descer as escadas com ela. - comenta.
- Garoto, agradeça a ela por me ajudar a não te deixar doente. - digo apontando para Madelaine e o mesmo ri mexendo os bracinhos. Seu riso sai abafado devido a chupeta mas eu acho adorável e acabo esboçando um sorriso para ele.
Madelaine e eu começamos a conversar sobre as fotos e quando elas ficariam prontas. Quando menos percebo, David estava adormecido no carrinho com a chupeta caída ao lado da sua boca.
Ouço uns pisados sutis se aproximando de nós duas, viro minha cabeça para trás e vejo uma garotinha descabelada, com um pijama roxo e pantufas infantis se aproximando.
- Mamãe, por que está aqui fora? - Isabella fala manhosa se jogando nos braços de Madelaine que ri e a abraça.
- Você não deveria estar dormindo, mocinha? - pergunta tentando arrumar os cabelos ruivos da mesma.
- Acordei para fazer xixi. - sussurra me fazendo rir baixo e negar com a cabeça.
- Não vai cumprimentar a Vanessa, sua mal educada? - brinca dando uns tapinhas na bunda da menina que ri e me olha.
- Oi, moça bonita. - acena para mim e eu sorrio.
- Boa noite, mocinha linda. - brinco com o apelido que ela me da a fazendo sorrir envergonhada e afundar o rosto na blusa da mãe.
- Eu acho que já vou indo para colocar essa espertinha para dormir novamente. - Madelaine diz me olhando e eu me perco alguns segundos pela visão que daria uma linda foto a minha frente.
Sua pele era beijada pela luz da Lua, seus cabelos tinham um brilho excepcional junto com algumas ondas que iam até a metade das suas costas, seus lábios estavam destacados por conta de algum protetor labial que ela usava naquele momento e seus olhos brilhavam por sua filha estar por perto.
Realmente, daria uma linda foto.
- Eu também já vou indo, ele finalmente conseguiu dormir. - digo em um tom mais baixo me colocando se pé. Madelaine se levanta com dificuldade por conta da menina de seis anos em seus braços e esboça um pequeno sorriso.
- Adorei conversar com você. - Madelaine diz no mesmo tom enquanto eu ia destravando as rodas do carrinho.
- Podemos fazer isso novamente qualquer hora. - sorrio arrumando a manta sobre David.
- Claro. - sorri de lado.
- Boa noite, Isabella. - digo e a menina me olha sonolenta.
- Boa noite. - se limita a dizer para então voltar a afundar o rosto no peito de Madelaine e eu rio.
Garota de poucas palavras. Eu gostei dela.
- Boa noite. - Madelaine murmura arrumando Isabella em seus braços.
Eu aceno com a cabeça, me ponho a andar de volta para casa e poder finalmente dormir. Apenas seis horas mas já era algo já que noite passada eu não cheguei a dormir nem duas horas e estava exausta. Só esperava que David não fosse ter uma nova crise de choro de madrugada e acordar a cada vinte minutos.
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