7- Suddenly
Na manhã seguinte, reuni todas as minhas forças para sair da cama num sábado. Tia Emma estava envolta em seu camisola de flores e o habitual coque frouxo quando desci as escadas e a encontrei preparando o café da manhã.
— Bom dia, raio de sol. — Sorriu alegremente antes de pôr mais calda em sua panqueca.
— Bom dia, tia. Acordou animada hoje. — retribui o sorriso e puxei uma cadeira antes de sentar. — Tia Emma, quantos bibliotecários você já teve?
— Só você, querido. Antes de você, éramos só eu e Anne, como agora ela tem outros afazeres. Somos só eu e você, pelo menos, por enquanto. Por quê? — Ela lançou aquele olhar curioso, antes de bebericar seu café.
— Nada... É que eu recebi um... — antes de terminar a frase, a campainha soou estridente e Tia Emma foi atender dando palminhas.
Dei de ombros esperando ela voltar para descobrir algo sobre as cartas, mas a voz familiar penetrou o ambiente de uma forma intensa.
— Bom dia, princesa. Mamãe me pediu para trazer essas margaridas, são suas favoritas, certo? — a voz masculina indagou, não precisava adivinhar quem era.
— Sim. Obrigada, Harry. Fiz panquecas, estão fresquinhas. Quer entrar um pouco? Loulouzinho está com saudades. — Tia Emma convidou-o para entrar, e ele aceitou.
Mas que diabos! Agora tenho um porta voz de fofocas? Eu não estava com saudades, tudo que eu deveria evitar era um Harry beijoqueiro. Um pecado, digo, Deus me livre. Foi a coisa mais insensata que alguém poderia fazer, convidá-lo para entrar.
— Então, onde ele está? — Harry questiona enquanto tia Emma gagueja constrangida, claramente, estão me procurando.
— Bem, ele estava aqui agora a pouco. Enfim, pode sentar-se Harry. Logo logo ele aparece. — Eles puxaram a cadeira e curvo meu corpo na direção contrária. Tudo bem, era ridículo fugir assim, mas não havia esconderijo melhor do que uma mesa com uma longa toalha estampa florida.
— Então, o que achou do Loulouzinho? Ele está mais diferente do que antes? — Minha tia questionou, enquanto eu mordia uma panqueca e ouvia cada palavra.
— Sim. Ele está mais bonito, só é pouco tímido. Louis se divertiu bastante ontem, bem, eu acho. — Escutei uma risada tímida sair e tia Emma ficou calada por um tempo.
— Você ainda gosta do meu Loulouzinho, não é? — Perguntou sem rodeios, não vou negar, estou amando essa conversa.
— Sim. Só que é complicado, sabe? Éramos crianças e agora somos... Bem, não sei... — Ele suspirou fundo.
— No fundo eu torço para que vocês fiquem juntos, mas não é justo brincar com o sentimento dos dois, Harry. Nem com os da Lola, nem com os sentimentos do meu sobrinho.
— Nós nos beijamos... Quer dizer, eu o beijei... — Harry confessou e com a surpresa, murmurei um "porra" antes de bater a cabeça na mesa e eles levantarem a toalha, fui flagrado.
— Há quanto tempo está aí? — Harry franziu o cenho, enquanto eu levantava rapidamente, juntando o resto da minha dignidade.
— Não muito. — Respondi com as bochechas queimando pela vergonha. Tia Emma parecia nos analisar e um silêncio se estabeleceu.
— Emma, eu preciso ir. Só vim deixar essas margaridas. Nos vemos depois. Até mais, Louis. — Harry saiu às pressas, sem dar tempo de me explicar, ou saber mais sobre o assunto.
— Que feio, Loulouzinho. Você poderia ter conversado com ele. Mas, me conta, como foi o beijo? — Tia Emma questionou, dando um sorriso malicioso e eu apenas revirei os olhos.
Após riscarmos Harry de nossa lista de assuntos para o dia de hoje, tia Emma nos levou em sua kombi para ver o pôr do sol e tomar sorvete de morango. Coloquei uma calça jeans e uma camiseta branca, sapatos confortáveis e escovei meu cabelo para o lado. Minha tia vestia suas roupas com flores e cores vibrantes. Era um dia perfeito para uma tarde de sábado, até que ao ver mais ao horizonte, percebo um casal. Mas por que a surpresa? Poderia ser qualquer casal, no entanto, Harry e Lola estavam ali, aos beijos numa tarde romântica. Como ele ousa dizer que gosta de mim e beija ela?!
Tia Emma percebe meu olhar e levanta meu rosto que em vão tento esconder.
— Se ele já escolheu com quem quer ficar, sua opção é aceitar e depositar amor em uma pessoa que valha a pena. — Tia Emma sorriu compreensiva e enxugou uma única lágrima que desceu por meu rosto.
— Preciso de livros, Tia Emma. São o meu melhor remédio. — Sorri e ela assentiu, levantando e estendendo a mão para mim.
— Tudo bem, querido. Não há melhor companhia do que um livro. — Sorrimos e fomos para a biblioteca.
A tarde tinha tudo para ser perfeita, exceto, Harry com a língua na boca de sua namorada. Como pude me deixar levar por suas palavras? Achei que poderíamos ter algo, mas lá estava a vida, deixando bem claro que "hoje não"
Organizei alguns livros e lá estava o exemplar de O Pequeno Príncipe, suspirei fundo e torci para achar a outra carta. E, lá estava ela.
Querido Bibliotecário,
Espero que esteja tendo um dia bom, a primavera sempre irá alegrar os nossos corações antes da tristeza chegar. Se estiver lendo isso, você acertou minha dica, e, espero do fundo do coração que você não desista das pessoas que classificam como "causas perdidas" e se o piloto tivesse desistido do Pequeno Príncipe por achá-lo maluco?! Os dois jamais teriam tido a melhor aventura de suas vidas. Então, se estiver pensando em desistir de alguém, reflita bastante antes de abrir mão de alguém que poderia mudar a sua vida. A próxima dica: eu chegarei de alguma forma até você.
Suspiro fundo tentando entender que tipo de pessoa sádica faz uma coisa dessas. Guardo o bilhete e ajudo tia Emma com algumas coisas antes de irmos para casa. No meio do caminho, peço para que ela pare e digo que preciso fazer uma coisa. Minha tia não questiona e apenas pede para que eu não demore tanto. Ponho as mãos nos bolsos e caminho um pouco antes de chegar lá. Suspiro fundo e toco a campainha.
Anne aparece e rapidamente acena para que eu entre, sorri e converso brevemente com ela. Subo as escadas e a porta do quarto dele está entreaberta, vejo Harry deitado em sua cama, sem camisa, apenas de calça moletom. Suspiro fundo e bato na porta antes de adentrar.
— Oi Loulouzinho... Entra. — Ele sorriu alegremente mas não foi correspondido.
— Você não tem... Não tem o direito... de brincar com os meus sentimentos, Harry. — Seguro na maçaneta com força enquanto tento reunir cada palavra que sai de minha boca. — Não teve o direito de me beijar, de ir na casa da minha tia e dizer que gosta de mim. Não tem o direito de fazer isso. — Controlo as lágrimas quentes que ameaçam tocar o meu rosto mas é em vão. Deixo que elas escapem e tiro o bilhete do bolso, jogando na direção de Harry.
Saio correndo de sua casa e deixo Anne confusa quando não me despeço. Choro durante todo o trajeto até chegar na casa de Tia Emma e não encontro ela pelo recinto. Suspiro fundo e escuto o barulho de algo caindo. Sigo a direção do som e subo as escadas rapidamente, gritando seu nome pela casa.
— Lou... Lou... Meu remédio, ele... Acabou... — Tia Emma chorava sem parar e estava transtornada, sentada entre uma pilha de remédios.
— O que aconteceu? Quais remédios? O que devo fazer? — Tentei chegar perto dela mas tudo que Emma fez foi recusar meu toque.
— Loulouzinho, por favor. Me deixe sozinha, eu... Eu... Só preciso dos meus remédios. — Vê-la chorar pela primeira vez, abriu uma fenda no meu coração.
— Eu tomo antidepressivos, eles acabaram, eu... — Ela pôs as mãos nos rosto, como se estivesse com vergonha de falar sobre isso.
Observei o jeito frágil e vulnerável que ela estava, tentei não chorar com ela, sentando-se ao seu lado. Abraçando minha tia que sempre foi meu alicerce, se tornar alguém que necessitava de um colo. As pessoas mais felizes, nem sempre são o que parecem. Elas apenas sabem disfarçar bem a sua dor.
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