03 - Tola
Quem olhasse de longe poderia ter a sensação de quão formal e elegante os quatro jovens se comportavam, quando a dama chegou no local haviam se levantado de forma cortês e conversavam de baixo e com inúmeros sorrisos ensaiados, tudo conforme eles haviam aprendido, porém se chegassem perto o suficiente para ouvirem o que conversavam, iriam perceber que as palavras sarcásticas cheias de provocações que os irmãos destinavam uns aos outros, sem poupar a irmã que os provocava de forma igual... Bom aqueles eram os irmãos Campbell, sempre conhecidos por sua cordialidade e a aura que exalavam quase aristocrática que muitos associavam a beleza superior que a mãe deles possuíam quando jovem.
-- Mabel, mal falou sobre seu tempo em Londres, divida conosco. – Pediu Thomas.
-- O que teria para falar? Eu fiquei todos os dias na escola, seguindo a mesma rotina e convivendo com as mesmas pessoas.
-- Mas estava morando perto da tia Lilian e não é como se não ela não tivesse a persuadido para algumas festas, ao menos conheceu alguém decente? – Patrick perguntou sorrindo a fazendo revirar os olhos.
-- Patrick deixe de asneiras. – Bufou Hector. – Parece uma garota perguntando de festas e homens, essas perguntas certamente serão feitas pela nossa mãe e as amigas dela, caso não saberemos por nossas noivas. – Deu ombros enquanto bebia seu chá, de todos os três irmãos Hector sempre foi o mais amargo para convenções sociais.
-- Foi bom ter abordado esse assunto irmão. – Mabel se pronunciou. – Mal acreditei quando recebi as cartas sobre o noivado, tão inesperado os três ao mesmo tempo, e justamente com aquelas moças. – Fez uma expressão desgostosa ao lembrar.
-- Vivian é irmã de sua amiga, um pouco hipócrita não? – Thomas falou em defesa da noiva.
-- Diana é minha amiga, Vivian não. – Debateu. – Mas me expliquem por favor, não gosto de me sentir no escuro sobre os assuntos da família.
-- O que tem a se falar? São três famílias com moças solteiras e na idade de se casar, elas têm um bom dote e um nome tem algo mais a comentar? – Hector deu ombros com sua típica ignorância.
-- Sem sentimentos, apenas pelo nome... tão triste... – Mabel suspirou enquanto falava a ultima parte, se sentia triste por seus irmãos e por suas noivas.
-- É bom se acostumar com a ideia querida. – Thomas segurou sua mão com o olhar baixo. – Nosso pai recebeu inúmeras cartas e não vai demorar a aparecer vários pretendentes para ele escolher. – Continuou falando enquanto a jovem sentia seus olhos saltando, ela não podia receber visitas de pretendentes, não quando aguardava o retorno de Henry.
-- Espero que não seja tão breve, não é interessante casar assim que voltei. – Bebeu um pouco de seu chá e em seguida olhou para frente. – Quero desfrutar um pouco antes de começar a conversar com pretendentes. – Sorriu amarelo.
-- Ah! Quanto isso não há porquê se preocupar irmã... uma vez que não será você a recebe-los e sim nosso pai. – Hector sorriu de forma maldosa para a irmã.
-- Bom de certo modo você deveria ficar ao menos feliz, uma vez que eu me casarei com Vivian, Diana praticamente virará sua irmã também. – Thomas falou vendo a irmã revirar os olhos.
-- Se casasse com Diana então, não sei se irei conseguir superar o fato de Vivian Gray ser minha irmã.
-- Não pode ser tão mal assim Mabel. – Patrick se pronunciou. – Embora você tenha suas desavenças com as moças não significa que no futuro não possam realmente se tratar como irmãs e trocar confidências.
-- Seria mais fácil caso você fosse aberta a isso, o compromisso já está firmado e em poucos meses as cerimonias ocorrerão. – Continuou Hector, tendo o apoio silencioso dos outros irmãos.
-- Irei pensar sobre o assunto. – A jovem falou se levantando. – Irei andar um pouco, Patrick poderia me acompanhar?
-- Claro... – Se levantou enquanto abotoava seu paletó. – Thomas quando eu voltar iremos nos reunir novamente? – Perguntou enquanto andava até ficar ao lado de Mabel.
-- Se quiser... – O mais velho falou se encostando na cadeira enquanto dava ombros. Patrick concordou com um breve aceno e em seguida ofereceu seu braço para a irmã.
Nenhum dos dois pronunciavam sequer alguma palavra ou som, o único barulho existente era de seus passos pelo chão de grama rala mostrando um pouco da terra e os pássaros que cantavam de forma graciosa nas copas das árvores. Assim como a casa, o resto da propriedade não havia mudado em nada, quase como que uma fazenda podia se ver ao fundo alguns animais, que seu pai preservava apenas pelo gosto da criação, não pela necessidade, o lado positivo era que através disso algumas pessoas se beneficiavam cuidando dos animais e ganhando por isso.
A jovem olhou para o céu suspirando, sem saber o que falar naquele momento, ou melhor como falar sem parecer ser intrometida... tantas coisas em sua mente, a ideia do casamento arranjado de seu irmão gêmeo ainda não lhe descia, Patrick sempre teve um espirito livre e ser amarrado a um compromisso tão cedo era de partir o coração e sentia o mesmo ao olhar nos olhos do jovem.
-- Meu irmão... – Chamou com a voz baixa, controlando seus sentimentos para que não os fossem despejados de uma vez só. – Sinto que seus sentimentos não são positivos sobre o casamento, não quero ofender, porém...
-- Não está errada. – A cortou sorrindo. – Eu realmente estou relutante sobre me casar com a senhorita Johnson... entretanto não é pelo motivo que você está pensando irmã. – Sorriu novamente apertando a mão da jovem contra a sua.
-- Então diga, tentarei ajudar o máximo possível. – Sorriu docemente.
-- Estou receoso de não ser o melhor marido para Celina. – Soltou sem rodeios enquanto observava a expressão de surpresa de Mabel. – Olhe para Thomas e Hector, mesmo desviados eles já são homens perfeitos, sabem como devem cuidar dos negócios da família e serão excelentes esposos.... Mas eu? – Riu de escárnio enquanto soltava a mão da irmã e andava próximo a uma cerca e se empoleirava na mesma. – Sou apenas um jovem... jovem e tolo que não consegue ler meia dúzia de papéis sem os jogar contra a parede... compreende Mabel?
A jovem observava Patrick em meio sua confissão, nunca tinha visto seu irmão daquele jeito, cheio de dúvidas e inseguranças, completamente o oposto do que estava acostumada de ver.... Esse novo traço de personalidade vindo do mesmo era uma novidade para si, afinal quando iria imaginar tamanha vulnerabilidade vindo do mesmo, mas de certo modo o entendia, afinal mal haviam completado dezenove anos e um mar de responsabilidades eram jogadas em seus braços.
-- Entendo o que está dizendo. – Se aproximou de Patrick e apoio seus braços na mesma cerca em que seu irmão estava sentado. – Porém tem algo que eu sei, embora Thomas e Hector tenham tido destaque, eu sei que logo você também os alcançara e Celina será uma das mulheres mais felizes do mundo por ter um marido como você. – Sorriu ao perceber que os olhos azuis lhe encaravam firmemente. – E bom... de certo modo você não é o único que está receoso sobre o futuro.
-- Espero que seus questionamentos não sejam tão conturbadores quanto os meus. – Patrick sorriu enquanto descia de onde estava sentado. – Bom... – Olhou para o céu e franziu levemente as sobrancelhas. – Creio que já ficamos um bom tempo aqui fora, você me acompanha ou vai ficar um pouco mais aqui fora?
-- Pode ir, eu vou aproveitar um pouco mais da brisa, estava com saudades do ar puro de Dover. – Riu brevemente sendo acompanhada do jovem.
-- Se assim prefere, bom eu vou andando e cuidado ao voltar. – Falou enquanto andava.
-- Você fala como se eu fosse capaz de me perder na minha própria casa! – Resmungou alto para que o mesmo ouvisse.
-- Eu falo por que tenho a mais plena certeza de que é capaz minha cara! – Patrick riu alto enquanto apressava seus passos em direção da casa principal.
Mabel revirou os olhos enquanto observava as costas de seu irmão, porém segurou o riso ao ver as calças do mesmo em completa ruína com terra e algo que a mesma julgou ser grama seca... bom isso renderia boas risadas aos seus irmãos mais velhos e talvez mais tarde poderia aproveitar para gozar da cara dele também.
A jovem se virou apoiando-se novamente na cerca enquanto olhava o horizonte, as mesmas duvidas que cercavam Patrick hora ou outra lhe rodeavam, não tinha total certeza se seria uma boa esposa e que Henry se agradaria da mesma, a dois anos atrás essa hipótese era um sonho que alimentava diariamente enquanto esperava o regresso do mesmo, porém agora tudo isso parecia cada vez mais perto e de fato era um pouco aterrorizante, afinal, o que será que Henry esperava dela como uma esposa? Agora não era mais uma jovenzinha como quando o mesmo tinha ido para o Canadá... não agora era uma jovem mulher e não demoraria para que seu pai escolhesse um pretendente para a mesma, por essa razão desejava intimamente que seu adorável pretendente retornasse logo para desposa-la.
Pensou se não era melhor escrever uma carta para o mesmo e anunciar que já estava em Dover, porém não se sentia confiante o suficiente já que a um bom tempo sua ultima carta não havia tido uma resposta, então o que lhe garantia que essa seria respondida? Só restava para a jovem esperar pacientemente que o filho mais velho da família Morgan respondesse sua carta e junto com a mesma boas novas estariam escritas no papel.
Ela não sabia dizer quanto tempo ficou parada naquele lugar observando o céu em meio seus devaneios, porém sabia que tinha sido um bom tempo conforme percebia os tons de rosa e laranja que o céu era tingido pouco à pouco, como se fosse uma bela pintura, desejava ficar nesse mesmo lugar até que o sol se recolhesse por completo, porém não dispunha de qualquer fonte de luz para voltar, então logo descartou a ideia ao ponderar o quão custoso poderia ser andar na mais completa escuridão, por essa razão após inspirar e soltar todo o ar de seus pulmões observou uma ultima vez a bela paisagem antes de dar as costas e começar a andar para sua casa, deixando no local seus pensamentos.
Ao chegar em casa se despôs de seu xale e chapéu os deixando logo na entrada e sendo atraída pelo barulho na sala seguiu curiosa até encontrar seus irmãos reunidos com um papel em mãos, se aproximou de Hector e não tardou a falar:
-- Carta? – Perguntou sendo respondida com um aceno de cabeça. – Mamãe e papai?
-- Sim. – Respondeu rindo. – Eles vão ficar um pouco mais em Dublin, pelo que parece nossa mãe ficou apaixonada pelas artesãs e nosso pai pelo Whisky. – Hector falou rindo enquanto Mabel o olhava impactada.
-- Não acredito! Deixe-me ler Thomas. – Falou tomando o papel do mais velho que soltou um som de protesto sendo ignorado pela mais nova que passava seus olhos pela caligrafia de seu pai. – Mais uma semana em Dublin? Pensei que nosso pai detestasse os Irlandeses.
-- E detesta. – Thomas falou pegando a carta novamente para si. – Entretanto ele está conseguindo bons investimentos por lá então.
-- Sim, mas ele ainda insultou os Irlandeses no meio da carta. – Patrick pontou. – Olhem bem aqui ele os chamou de um bando de idiotas que tem medo de fadas.
-- Bom, não é como se em algum momento de nossas vidas ele não tivesse contado algo do tipo. – A jovem deu de ombros, afinal se lembrava com facilidade de quando seu pai falava de uma lenda sobre um tal "Círculo de fadas" que possuía estranhas criaturas, mas agora, depois de crescida possuía plena certeza que não passava da fértil imaginação infantil.
-- Que seja! – Hector se pronunciou. – Não é como se isso tivesse grande relevância, afinal não há novidade alguma em um casal prolongar uma viagem após terem os filhos crescidos. – Continuou falando enquanto recebia a concordância silenciosa de seus irmãos. – O que realmente nos importa agora, é o fato de que em breve será a colheita da primeira safra e nosso pai nos deixou de mãos atadas.
-- Relaxe um pouco Hector. – Thomas falou com seu tom calmo. – Ainda há algumas semanas até a primeira safra, até lá creio eu que nossos pais já deveram ter retornado e com isso não há de termos problemas.
-- Irmãos, se estão tão preocupados dessa forma com as próximas semanas, talvez podem me ensinar a fazer algo para ajudar...enquanto nossos pais não voltam. – A voz de Mabel foi ouvida, um pouco baixa de inicio porém conforme ganhou confiança seu tom se estabilizou, esperançosa de ser atendida.
Os rostos que antes demonstravam algum tipo de preocupação futura, se viraram para a Jovem só que dessa vez confusos e depois de assimilar o que foi dito a mesma pode até mesmo ver algum tom de divertimento em seus olhares trocados, toda segurança que Mabel havia sentido para falar se esvaiu e sumiu como fumaça, automaticamente ela desejou não ter exposto aquela ideia tola.
Thomas, seu querido irmão que sempre foi conhecido por esconder suas peripécias se aproximou com um sorriso amistoso dela, porém quieto como se procurasse palavras para se expressar. Tomou as mãos de sua jovem irmã e as segurou antes de beija-las com afeto.
-- Mabel... – Seu tom gentil a fez encolher imediatamente os ombros, como uma criança preste a ser repreendida. – Fico muito contente ao ver o quanto se importa com os negócios da família, sei bem que nem todas as moças se prestam a tal serviço e pouco se importam... porém minha querida irmã, mesmo que esteja cheia de boas intenções peço encarecidamente que não se preocupe com esses assuntos de negócios e os deixe conosco, seus irmãos.
Por alguns milésimos de segundos a jovem segurou a respiração, enquanto ouvia Thomas falando, embora tenha sido imensamente gentil era inegável o fato de que ele havia deixado exposto que ela não teria opinião contribuinte para o assunto, na verdade nem sabia o motivo de tal pensamento ter passado pela sua cabeça e se sentiu tola, obviamente seus irmãos tratariam melhor do assunto do que a mesma, afinal do que sabia? Além de bordar e tocar piano?
O silêncio começou a ficar incomodo conforme o tic-tac do relógio passava, sem ninguém se pronunciar, por essa razão achou melhor vestir sua mascara gentil e quebrar o clima incomodo que se formou.
-- Você está certo Thomas. – Sorriu amavelmente. – Eu realmente não tenho com o que me preocupar, já que vocês estão cuidando de tudo não há o que temer, certo? – Inclinou a cabeça observando seus outros dois irmãos.
-- Temos certeza que será uma excelente esposa Mabel, além de amável e gentil se preocupa também com os assuntos masculinos, seu noivo será um homem de sorte. – Hector falou com um sorriso brincalhão, enquanto Patrick confirmava e a jovem sustentava mais ainda o sorriso que havia sido ensinado na escola de etiqueta, porém aquele sentimento incomodo não havia ido embora e continuava a se sentir...
Tola....
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