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🍊 𝘊𝘢𝘱𝘪𝘵𝘰𝘭𝘰 1 | 𝘗𝘦𝘳𝘴𝘰, 𝘵𝘳𝘢 𝘷𝘦𝘴𝘱𝘦 𝘦 𝘤𝘰𝘮𝘣𝘢𝘵𝘵𝘪𝘮𝘦𝘯


Capítulo 1 | Perdida, entre vespas e brigas.

Perdono!

Disse, a pré-adolescente brasileira, de cabelos incendiários e all star laranja, que por sua infelicidade havia derrubado o assistente do vagão, durante a sua falha tentativa de filmar a estrada em movimento. ⸺ Dove sono i tuoi genitori? "Onde estão os seus pais?"

Sono sola. "Estou sozinha"

O maior desafio para a garota naquele momento seria botar em prática o seu italiano e tentar não se perder, pois apesar da sua família materna serem provenientes da Itália, o português continuava sendo a sua língua materna. O homem, então se rendeu, ao ver que a garota estava viajando sozinha, e deixou o sermão para outrora. Dessa forma, a acompanhou até o seu  assento.

Incontrerai i tuoi familiari? Ho potuto vedere dall'accento, che non è di qui... "Está indo reencontrar os seus familiares? Pude ver pelo sotaque, que não é daqui."

Sì, mia zia mi aspetta. "Sim, minha tia está à minha espera." 

In 15 minuti arriveremo a Rosa da Ventânia. "Em 15 minutos chegaremos em Rosa da Ventânia."

Pelo crachá pendurado na camisa do homem, ela pode vê seu nome. ⸺ Gracias, Patrício!

Recebeu um aceno, e um meio sorriso de volta. ⸺ Prego, Rafaela!

Rosa da Ventânia, era o destino de seu longo trajeto. Um vilarejo modesto localizado na costa da praia. À sua essência é o cultivo de frutas exóticas, de todos os tamanhos e cores nunca vistas. E sem a presença dos agrotóxicos para conseguir esta inovação, a cidade se tornou o ponto de referência para a grande competição que acontecia todos os anos em Gênova.

Logo, a mesma pode apreciar a vista incrível direcionada para o mar, as rochas formando cavernas e as gaivotas sobrevoando às margens, e as ondas se chocando contra a costa da praia. Seu estômago se contorceu de animação e um fio de nervosismo tropeçou em sua mente. Será que à sua família italiana a tratariam bem? Eles nunca mais a viram, desde que era apenas um bebê. Muita coisa havia mudado, e agora já beirava à adolescência com os seus doze anos quase completos de puro ódio, e muito refrigerante de laranja.

O trem apitou sinalizando estar próximo da estação, e agora seria à hora da verdade.

A ruivinha pegou sua mala de mão e à sua mochila repleta de customizações e pôs em suas costas, trajando uma camiseta arco-íris por baixo de um moletom vermelho e um calça de ganga azul, mas sem detalhes e enfeitada por um cinto marrom. O que mais chamava à atenção eram as suas meias coloridas de cano alto, e os seus óculos de sol vermelho deixava bem transparente o fato de ser uma estrangeira no meio das pessoas que carregavam malas, sacos de verduras, galinhas, pets de estimação, e muito mais.

Quinze minutos depois...

Não havia ninguém esperando por ela naquele local, e apesar de andar em círculos à procura de alguém, no final acabou se dando por vencida. Sentada em um banco, com sua bagagem ao lado, o trem ia embora causando um aperto em seu peito.

Do outro lado da estação, os seus olhos miraram em um menino da sua idade, de cabelos castanhos ondulados e olhos verdes, que trajava uma camisa branca de linho e short marrom e em seus pés estava uma sandália de couro. Mas o que chamou mais à sua atenção foi o seu olhar triste para o chão, parecendo ter perdido alguma coisa.

Será que deveria ir até ele? E se o mesmo pudesse ajudá-la a encontrar o caminho da casa de sua tia? Sem pensar muito, a garota agarrou sua bolsa, andou até o outro lado da estação e se aproximou vagarosamente.

Ciao? "Olá?"

Sì? "Sim?"

È perso? O perso qualcosa? "Está perdido? Ou perdeu alguma coisa?"

Sì, ho perso mio cugino. "Sim, perdi minha prima postiça"

Mi dispiace davvero... "Sinto muito..."

Va bene, è venuta dal Brasile. È la prima volta che viene qui, deve aver preso la carrozza sbagliata. "Tudo bem, ela veio do Brasil. É a primeira vez dela aqui, deve ter pegado o vagão errado."

Naquele mesmo instante às bochechas dela inflaram de constrangimento, pois tudo dava a entender que era ela, a prima perdida, e o garoto que a todo momento não havia olhado em seus olhos, não imaginava que a mesma estaria bem em sua frente.

O seu lado traquina logo pensou em lhe pregar uma peça.

Sai che aspetto ha? "Você sabe qual é a aparência dela?"

...Piccolo, rosso, pieno di lentiggini, occhi chiari. "...Baixinha, ruiva, cheia de sardas, olhos claros."

Forse ho visto qualcuno così. "Talvez eu tenha visto alguém parecido."

Dove? "Onde?"

Allo specchio stamattina. "No espelho, hoje de manhã."

O menino subiu o olhar arregalado, encontrando o rosto dela que estampava um sorriso arteiro. ⸺ Rafaela!?

Ele pegou a menina em seus braços e a tirou do chão, gritando de felicidade. ⸺ Pensei que havia-te perdido!

⸺ Espera! Você fala português? Como assim? ⸺ Indagou, desacreditada.

⸺ Eu sou brasileiro. A sua tia Ofélia me adotou quando eu era apenas um bebê. ⸺ Explicou.

⸺ Mas se era um bebê, como aprendeu morando aqui?

⸺ Esqueceu que sua tia fala português fluente? E também várias pessoas aqui em Rosa da Ventânia são descendentes de brasileiros, tanto que na minha escola essa matéria foi adicionada.

O garoto contava com empolgação, enquanto Rafaela ouvia atentamente como se aquilo fosse um milagre ou uma coisa bastante surreal.

⸺ Caramba, à mamãe deveria ter-me contado...

⸺ Rafaela, estou tão aliviado. Posso jurar que já estava pensando em um novo lugar para morar, porque creio que mi madre me colocaria no orfanato novamente se eu voltasse sem ti.

⸺ O quê? À minha tia não seria tão ruim a esse ponto, não é?

O menino ficou calado, deixando um silêncio estranho pairando no ar.

⸺ Claro que não, estou te zuando. Talvez não... ⸺ Falou, rindo da expressão de medo dela.

A mesma revirou os olhos com um meio sorriso e reparou na mão estendida em sua direção. ⸺ Haroldo Nata, piacere di conoscerti.
"Prazer em conhecer você."

Rafaela apertou a mão dele de volta, e sorriu largamente pela sua forma extrovertida de agir. Em seguida, Haroldo a levou para fora da estação, onde pegariam um transporte para a casa de sua tia, mas ao contrário do que a garota pensava, não havia nenhum ônibus ou sequer um carro de aluguel.

⸺ Onde está o nosso transporte?

⸺ Está bem aqui. ⸺ O mesmo apontou para uma moto vespa LX 2005 da cor vermelha. ⸺ Esta é a minha vespa.

Ela ficou em silêncio.

⸺ Eu sei, ela é linda, né? E muito rápida também. Você precisa experimentar.

⸺ Haroldo, eu tenho medo de andar de moto.

O menino ficou calado tentando processar a informação.

⸺ Eu cai da garupa de um motoqueiro quando tinha uns 6 anos, desde lá nunca mais andei em uma...

⸺ Mas eu nunca te deixaria cair. Ei! Eu entendo o seu medo, mas tu precisa ser coraggiosa ou teremos que andar a pé por uns 40 minutos.

O corpo de Rafaela implorava por descanso, pois as cadeiras do trem não eram tão confortáveis, e só de se imaginar andando por mais quarenta minutos, sentia calafrios.

O olhar de cachorro abandonado de Haroldo a fez querer rir. ⸺ Ok, certo. Eu vou tentar andar na vespa com você.

Ele quase não se conteve de ansiedade e já ligou a moto, entregando um capacete para a ruiva que se ajeitou em sua garupa de uma forma em que fosse impossível cair tão fácil.

⸺ Se segura!

⸺ HAROLDO!

A vespa disparou pela estrada de pedras e Rafaela segurou firme sua cintura, enquanto ele ria feito uma hiena. Ao mesmo tempo, ela parou para observar a cidade.

Os casarões repletos de roseiras, as roupas estendidas nos varais, alguns animais andando livremente e crianças brincando na praça. Era tudo tão diferente do centro da grande Goiânia que até o ar parecia ser mais tragável.

Buongiorno! Lucia. "Bom dia! Lúcia."

Ouvia o menino dizer para uma senhora de idade sentada em frente à uma padaria.

"Haroldo parece o prefeito, pois todos cumprimentam ele." Pensou, Rafaela.

⸺ Estamos chegando, "ela". ⸺ Avisou, dando ênfase ao apelido que tinha acabado de lhe dar.

No mesmo instante, ela avistou um ônibus indo na mesma direção que eles. — Haroldo, você disse que não tinha ônibus.

— Talvez, eu tenha omitido isso para você subir na minha garupa. — Respondeu, receoso.

Assim que ela começou a reclamar, ele começou a cantarolar alguma coisa à ignorando.  

Após passarem por uma estrada de terra que beirava um caminho de pedras para o mar, ela avistou uma grande casa, com um jardim enorme ao seu redor.

Mas logo apareceram três meninos correndo e chamando exasperadamente pelo seu primo. O mesmo então, parou a vespa em frente ao pequeno portão e eles se aproximaram ofegantes.

Haroldo, Marcos ha invaso il nostro club e ha preso il nostro porcellino. "Haroldo, o Marco invadiu nosso clube e levou o nosso porquinho." ⸺ Disse, um dos garotos de olhos castanhos, pele escura, short jeans e regata azul e boné cinza.

Quel bastardo! "Aquele desgraçado!" ⸺ Vociferou, rangendo os dentes.

⸺ Haroldo...o que está acontecendo? ⸺ Ela perguntou, e os meninos que antes estavam paralisados observando a garota arrumaram suas posturas.

⸺ O seu português é perfeito! ⸺ Disse, um outro menino ao detectar o idioma, este tinha os olhos azuis, pele clara, e trajava um conjunto amarelo.

Ela ficou surpresa, mas como Haroldo mesmo disse, todos ali possuíam o conhecimento da língua portuguesa.

⸺ Acabei de chegar do Brasil. ⸺ Responde, rindo.

⸺ Ela, este é o Alberto. ⸺ Apontou para o menino que lhe deu aquela péssima notícia. ⸺ Este é o Vincenzzo ⸺ Apontou para o menino que à elogiou. ⸺ E este quieto na dele é o Luigi. ⸺ Apontou para o menino de colete verde, olhos castanhos, pele parda, e óculos de grau, que analisava à garota de cima à baixo.

⸺ Prazer! ⸺ Diz, com as bochechas avermelhadas pelos olhares curiosos.

⸺ Esta é minha prima Rafaela, veio passar as férias de verão conosco.

Todos à cumprimentam de volta.

Eles desciam da vespa e o mesmo guardava ela no quintal da casa. ⸺ Agora eu tenho que ir.

Seu primo avisou, e saiu correndo em companhia de seus amigos.

Marco Belucci, tem 15 anos e é filho do prefeito de Rosa da Ventânia, e vive perturbando o grupo, tanto pela competição de maiores frutas do país, como pela sua birra com Haroldo.

MARCO! ⸺ Gritou, enfurecido o garoto de olhos verdes.

Estavam no meio da pracinha, e o tal adolescente se exibia no meio de um círculo de meninas.

Haroldo, pensavo che non ti avrei visto così presto. Ancora di più dopo le botte che gli ho dato. "Haroldo, achei que não o veria tão cedo. Ainda mais depois da surra que lhe dei..."

Abbastanza! Ridateci il nostro maialino o dovrete vedervela con me. "Já basta! Devolva o nosso porquinho ou vai se ver comigo."

Questo? "Este?" ⸺ O mesmo levantou um cofrinho em forma de porco para eles, que ficaram ainda mais revoltados.

Aquelas eram as economias do grupo para a reforma do clube que ficava numa casa abandonada, além das despesas para viajarem até Gênova, pois a competição aconteceria lá e seus pais não podiam pagar naquele momento.

Combatti come un uomo! "Lute como um homem!" ⸺ Chamou, Haroldo.

Os seus amigos também estavam preparados, mas sabiam que aquele duelo teria que ser somente entre os dois, pois a guerra só acabaria após a derrota de Marco.

Logo as pessoas se aproximaram do círculo e começaram a gritar por quem estavam torcendo.

O rapaz de pele bronzeada, camisa polo azul e short cinza partiu para cima do menor e iniciaram uma troca de socos. Era até injusto, e Haroldo ao se distrair recebeu um golpe no nariz o fazendo cair para trás.

Mas antes que pudesse reagir, se deparou com o Marco caído no chão, e ao olhar para cima à sua prima massageava o próprio punho.

⸺ Odeio injustiças. ⸺ Ela disse olhando para o menino ao lado.

O pessoal inteiro estava boquiaberto, antes de gritarem em euforia. Os meninos não imaginavam que a ruiva seria tão forte, mas agora não importava, pois Marco tinha sido derrotado.

Pegaram o porquinho de volta e correram pelo mesmo caminho que vieram. ⸺ Caramba, isso foi incrível! ⸺ Disse, Vincenzzo.

Enquanto eles comemoravam, Haroldo colocou o braço por cima do ombro de Rafaela. ⸺ Que tal participar do nosso clube? Você poderia ser a capitã vermelha.

⸺ Capitã vermelha? Por conta do meu cabelo? ⸺ Ele assente. ⸺ Gostei!

⸺ Eu já montei todo o nosso cronograma para estas férias, e espero que seja a melhor da sua vida.

⸺ Fechado! E qual é o seu codinome?

⸺ General Laranja.

⸺ Seu cabelo não é laranja, o porquê do nome?

⸺ Logo você saberá...

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