Capítulo XXXVIII
Ainda sentado na cama, Nedoy aceitou a sopa fumegante que lhe era servida numa taça de barro com desenhos a relevo branco. Aquele cheiro de cantina era-lhe familiar e, por isso, reconfortante. Já se tinham passado uns dias, e ele finalmente tinha ganho força suficiente para comer, agora que a náusea não era tão intensa.
Ele tinha sido tão sortudo. A ferida não tinha infetado e, agora que a pele à superfície já estava mais próxima de fechar, havia cada vez menos risco disso. Ainda lhe doía de cada vez que se mexia, e ele sabia que os músculos feridos demorariam muito mais tempo que a pele a sarar, se alguma vez retornassem à sua força anterior. Mas, honestamente? Isso pouco lhe importava. Estar vivo já era muito.
Por esta altura, já era mais fácil discernir os que viveriam dos que não passariam da noite. Alguns, como ele, recuperavam dos ferimentos a pouco e pouco, já sendo capazes de se levantarem por pouco tempo de cada vez e de comer as suas próprias refeições. Conversavam entre si, comparando ferimentos e histórias de luta, daquela batalha e de outras, e passando os rumores que ouviam dos enfermeiros e voluntários que passavam pelo dormitório para os tratar.
Mas havia outros que estavam cada vez piores. Por infeções ou por os ferimentos serem piores do que se inicialmente achava, pelo menos três homens daquele dormitório não tiveram a mesma sorte que ele. Enrolados nos lençóis brancos das próprias camas, foram levados dali sob a coberta da noite, provavelmente para não danificar o moral dos que ainda viviam. Outros estavam só às portas da morte, gemendo de dor a noite toda ou enchendo qualquer momento de consciência com orações. Um em específico estava assolado por alucinações causadas pela febre e, por vezes, gritava a plenos pulmões, aterrorizado. Nedoy estava rodeado da dor e do desespero que se seguiam a uma batalha perdida, e não estava a gostar muito da experiência.
Ele pousou a taça vazia sobre o colo, aproveitando o calor que esta ainda emanava. De olhos fechados, escutou as conversas faladas na sua língua nativa e sentiu as luzes da vida daqueles soldados.
Aquele dormitório era como tantos outros onde tinha servido. Tudo, desde a grossura dos colchões até às barras na janela até à tinta nas paredes, lhe era familiar. O sabor da comida era o mesmo a que se tinha habituado há décadas, ainda que, depois de passar tanto tempo a provar cozinhados tradicionais, ele achasse que lhe faltava picante. Sentia-se mais em casa do que em qualquer momento que passou com os Rebeldes, e precisava de se lembrar constantemente de que não pertencia ali. A maldita tatuagem que o marcava, como um animal, como sendo propriedade da Torre tinha-lhe salvo a vida até agora. Mas se, a qualquer momento, alguém decidisse tomar um pouco mais de atenção ao número dele, voltaria a estar em risco. Ele odiava pensar nisso.
Levantou-se a custo, avançando até à pequena janela com passos pequenos para minimizar a dor. As ruas continuavam desertas, mesmo àquela hora do dia. Nos edifícios que rodeavam aquele, as portadas das janelas estavam todas fechadas e as esplanadas dos restaurantes e dos cafés tinham desaparecido para dentro das lojas fechadas. Pelo menos já não havia corpos espalhados pelo chão, mesmo tendo lá deixado as marcas de sangue e de excremento que ainda ninguém limpara.
Com o tempo, aquilo desapareceria. E, mesmo se assim não fosse, ele não estava a planear ali ficar. Só precisava de sobreviver um pouco mais, e talvez assim conseguisse engendrar um plano.
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Ele estava cada vez mais recuperado. Já andava a pé, mancando menos, e subir as escadas em espiral daquela torre já não era tortura absoluta. Hoje tinham-lhe dado um uniforme novo e limpo e mandado-o dirigir-se a um dos outros edifícios para receber a pistola e a espada. Voltaria ao serviço, daí a nada. A cidade precisava de guardas e a Capital ou ainda não os tinha mandado ou tinha decidido que não o iria fazer.
Saiu da torre dormitório para a rua, pela primeira vez em demasiado tempo. O ar cheirava a rio, à humidade da água corrente, ao aroma das algas verdes que lhe tingiam as correntes. Mesmo com o sol a subir numa manhã cada vez mais tardia, o ar não lhe queimava a pele ou lhe secava os pulmões da mesma forma como o do meio do deserto o fazia.
O edifício que estava a servir de sede ficava do outro lado da rua, e era um verdadeiro ninho de atividade. Estava rodeado de multidões desordenadas de pessoas maioritariamente fardadas com os símbolos da Torre. Soldados, guardas e civis entravam e saíam incessantemente, carregando mantimentos e sacolas de mensageiro ou só uma expressão de foco intenso, e espalhavam-se pelas ruas com propósito. Ele nunca tinha visto um grupo tão grande de pessoas a fazer tanto silêncio, cada um preso nos seus pensamentos e objetivos, recusando-se a partilhar o que lhes ia na alma com os colegas.
Se os portões da cidade não estivessem fechados e se o rio não estivesse a ser tão fortemente patrulhado, talvez ele tivesse utilizado esta hipótese para fugir. Quem repararia nele, no meio daquela confusão silenciosa? Mas ainda estava ferido e desarmado e, resignado, optou por entrar a medo pelas portas abertas à procura do armazém onde, se tivesse sorte, receberia uma arma e pólvora suficiente para a disparar.
Ele não tinha sido feito para mentir. Estava atrás de linhas inimigas, sabendo que o mais pequeno deslize levaria no mínimo à sua captura e no máximo à sua morte. Odiava aquilo com todo o seu ser. A adrenalina que sentia em cada momento do seu dia não era em nada a mesma que o enchia antes de cada combate, era só uma ansiedade intensa e constante que lhe enchia as veias e que o tornava paranóico. Podia até ser para o seu próprio bem, achava, porque não se podia dar ao luxo de dar sequer um passo em falso, mas era pior que desconfortável.
Mesmo sabendo tudo aquilo, estar de volta sob a tutela da Torre, a obedecer a ordens bem dadas e a ouvir somente a sua língua fazia-o por vezes esquecer-se da sua situação, fazia-o esquecer-se de tudo o que tinha aprendido desde que os abandonou. Às vezes, mesmo sem querer, ele desejava poder voltar a pertencer ali.
Ele encostou-se perto da porta do pequeno escritório para onde o tinham dirigido. Não lhe era permitido entrar diretamente no armazém onde as armas eram guardadas, que pena.
–E quem é hoje? –disse um homem franzino, abrindo a porta com um sorriso. Olhou para Nedoy com surpresa no olhar, levantando os papéis que trazia na mão para lhes passar os olhos. –Eu a ti não te conheço, –disse sem humor na voz. Abriu a porta completamente e gesticulou para que ele entrasse. –E o seu nome é...
–Nedoy, –respondeu ele.
Não lhe serviria de nada mentir, nem se fosse capaz disso.
O secretário entrou no pequeno escritório e Nedoy seguiu-o com receio. O homem encostou-se à secretária de madeira, talvez demasiado ocupado para realmente se sentar, e leu um dos papéis com mais cuidado, passando o dedo em cada nome que via na lista. Encontrando o dele, puxou outro e começou a comparar as listas. Nedoy ficou de pé no centro da sala, em sentido mesmo sem ter razão para isso, tentando acalmar a ansiedade que o enchia naquele momento. Quando o homem franzino ergueu uma sobrancelha num questionamento silencioso, ele sentiu o coração a falhar um batimento.
–Que estranho, –sussurrou ele, genuinamente confuso. Desviou as listas, puxou da cadeira para finalmente se sentar, embrenhado nos documentos que enchiam a secretária progressivamente mais desordenada. Tanto quanto Nedoy conseguia ver o homem mantinha-se ignorante quanto ao transtorno que lhe estava a causar. Revirava papéis, listas e apontamentos à procura de... algo. Depois de um momento longo demais, endireitou uma resma de papéis, dirigindo um olhar cansado a Nedoy. –Parece que os registos anteriores ao ataque não estão aqui, por qualquer incompetência. Obviamente, não lhe posso dar o equipamento sem essa documentação. –Nedoy engoliu em seco, deixando o homem revirar nas gavetas da secretária para tirar um formulário, tinta e uma pena de escrita. –Tendo em conta as circunstâncias extraordinárias, vamos acelerar o processo. Responda só a umas perguntinhas.
Nedoy acenou com a cabeça, segurando um riso. Depois de tudo o que tinha passado, o que lhe era um formulário?
–Claro.
–Ótimo. Ora bem, em que esquadra da guarda estava colocado? –perguntou-lhe, molhando a pena na tinta. –Assim basta-nos conferir com o seu superior direto e...
–Eu sou Cavaleiro, –respondeu, firme. Era incapaz de mentir e, mesmo se o conseguisse fazer, sabia que seria facilmente apanhado.
–Oh, –disse o homem, sacando de um formulário diferente. –Melhor ainda. Mostre o braço...
Nedoy fez o que lhe foi indicado, e o homem hesitou por um momento antes de apontar o número no papel. Colocou-lhe umas perguntas de rotina, preenchendo o formulário a pouco e pouco com cada vez mais pressa. Finalmente levantou-se da cadeira, a tinta ainda húmida no papel, para se dirigir à porta de saída.
–Fique aqui, senhor. Não deve demorar muito a conferir isto, e eu já volto com o equipamento.
Nem deu tempo a Nedoy para reagir antes de fechar a porta atrás de si, deixando-o sozinho naquele escritório, ainda de pé e sem saber como reagir.
Se tivesse sorte, o homem não conferiria as listas negras da Torre, dando a Nedoy a hipótese de começar de novo ali, sem ser preso pelo seu passado. Mas ele tinha quase a certeza que o burocrata tinha reconhecido o número e que estaria neste momento à procura da razão disso. Mas de que lhe serviria sair dali, tentar fugir? Com a ferida como estava não teria hipóteses de lutar e, honestamente, não lhe apetecia nada levar mais tiros do que estritamente necessário. Poder-se-ia esconder, talvez, se tivesse para onde ir. Se o que restava da sua família ainda estivesse na cidade e, por algum milagre, ainda morasse na mesma casa, talvez ele tivesse hipóteses. Mas ele não queria causar angústia à sua velha mãe, muito menos pô-la em perigo. Se ela ainda estivesse viva.
Praguejou em voz alta: a porta estava trancada. O que queria de certeza dizer que o maldito homem franzino tinha sim reconhecido o seu número e devia estar neste momento a chamar ajuda. O que queria dizer que todas as ideias de fugir dali tinham tão simplesmente sido destruídas. Nedoy começou a abrir as gavetas da velha secretária, dizendo palavrões enquanto procurava a vaga esperança de uma chave suplente. Se não estivesse ferido podia deitar a porta abaixo e se fosse melhor com magia talvez a conseguisse destrancar mas, neste momento, nenhuma dessas hipóteses lhe estava disponível.
Como raio é que ele acabava sempre naquelas situações?
Escondeu-se o melhor que pôde atrás da secretária assim que ouviu a chave a virar na fechadura. Sentia a energia do franzino e, com ele, as de dois guardas musculados com as mãos na pistola. Pensou em usar magia, mas depois pensou melhor: para já, ainda tinha a hipótese de ser capturado com vida, mas se fizesse isso sabia que eles não hesitariam em lhe enfiar um balázio entre os olhos.
–Como é que ele escapou? –disse um dos guardas. O outro saiu para o corredor, de certeza para o procurar.
–Isso é impossível, –disse o burocrata. –Só há uma saída daqui. Eu nem direito a janelas tenho neste escritório!
–Não é altura de te queixares! Fica aqui, –disse o outro, ignorando as queixas e os insultos que o homem lançava à sua inteligência, andando de arma em riste e posição tática pelo corredor.
Nedoy rezou mentalmente, sabendo demasiado bem a precariedade da sua posição. Sentia o franzino a avançar para onde ele se escondia, dando a volta à secretária e, sabendo estar prestes a ser descoberto, optou por saltar para o atacar de surpresa.
O homem caiu contra um armário, empurrado pelo peso de Nedoy que, o mais rápido que pôde, saiu para o corredor à procura de fugir dali. O espaço estava muito mais vazio que dantes —ele via as energias das pessoas escondidas atrás de portas fechadas— e Nedoy correu quase sem impedimento à procura de uma saída. Sentia os guardas armados e, assim, as suas posições, e sabia que lhe era impossível sair por onde tinha entrado. A maldita saída estava protegida!
–Ele estava aqui! –gritou o franzino, já mais recuperado do impacto. –Ajudem!
Nedoy forçou-se a não praguejar alto. Viu-se forçado a abrandar; os músculos do abdómen ainda lhe doíam demasiado com a pressão do movimento e, por mais que a adrenalina ainda lhe permitisse continuar, ele não gostaria de reabrir a ferida. Havia alguém a cobrir a entrada, ele estava rodeado, e magoar-se mais não o ajudaria a escapar. A única coisa que lhe restava era rezar para ser capturado com vida, porque realmente não havia forma de ele sair dali.
Raios!
Quando a arma carregada apareceu na esquina, apontada para ele, Nedoy não ficou surpreendido. Ergueu as mãos em rendição, sabendo que não demoraria até que o outro guarda aparecesse também, seguido pelo burocrata de quem ele sentia a energia fraca. Estava somente agradecido por ainda ninguém ter disparado.
–Rende-te, Cavaleiro, –disse o guarda, com uma autoridade que não tinha.
Nedoy ergueu uma sobrancelha, fazendo um gesto lento com as mãos abertas como que para mostrar que já se tinha rendido bem antes dessa ordem.
–Põe as mãos atrás das costas, –disse o outro homem atrás de si, tirando uma corda rígida para lhas prender. Nedoy obedeceu, sorrindo. Como é que acabava sempre naquelas situações?
–Se vocês me tivessem escutado, não tinham tido que andar atrás dele, –queixou-se o burocrata. –A sério, nunca ninguém me ouve...
–Cala-te lá, Santiago.
O burocrata bufou, e Nedoy deixou que o guarda lhe atasse as mãos. Com isso, o outro relaxou e deixou de lhe apontar a pistola ao peito.
–Que tens a dizer em tua defesa, traidor?
Há quanto tempo é que não ouvia aquilo dito assim? Felizmente para ele, já pouco lhe incomodava.
–Que isto é um mal-entendido, –disse, mais calmo do que devia.
–Veremos, –disse o guarda, fazendo de propósito para, ao o empurrar, lhe magoar o abdómen. –Fazes ideia com quem podemos falar para resolver este "mal-entendido"?
–Mosé está na cidade, –respondeu, casualmente. –Suponho que ele vos possa pôr ao corrente.
À menção daquele nome, ambos os guardas congelaram e o burocrata aproveitou para se tentar escapulir.
Era uma jogada perigosa, claro. Se estivesse errado, acabaria morto de certeza. Tanto quanto sabia, Mosé poderia ter saído da cidade pouco depois do seu encontro com Yex, e era até provável que aqueles homens nem soubessem que ele ali tinha estado. Mas a verdade era que, se não fizesse nada, acabaria morto na mesma. Se tivesse razão, ficaria com um trunfo na manga. Os Irmãos estavam interessados em Yex, ela própria lho tinha dito; talvez aquilo que Nedoy sabia pudesse ser trocado por mais uns momentos de vida e, com sorte, até de liberdade. Pelo menos até arranjar um plano melhor.
Depois do choque passar, um dos guardas riu-se. –Claro, claro; vamos obviamente falar com uma das pessoas mais importantes da Torre, que não é vista viva há sei lá quanto tempo, a pedido de um traidor. Não vejo porque não!
O guarda que o empurrava não respondeu, só retomou o passo.
–Até lá, –continuou o outro, –temos um ótimo lugar para prender gente como tu.
Nedoy engoliu em seco. Haveria algo mais humilhante que ficar preso no exterior, atado às argolas em que se prendiam os cavalos? Se o houvesse, ele preferia mesmo ficar na ignorância.
–Ele tem razão, –sussurrou Santiago, o burocrata, falhando na sua tentativa de que Nedoy não o ouvisse. –Mosé está na cidade.
O guarda que o guiava hesitou enquanto o outro abria a porta de saída do edifício. Depois acenou ao de leve com a cabeça, talvez achando que Nedoy não conseguia ver na retaguarda. Não sabiam das suas aptidões mágicas, o que era algo de positivo.
Ataram-no com força à argola de metal. Havia gente na rua, quase todos vestidos com fardas da Torre, avançando para trás e para a frente a fazer o seu trabalho. Mas, mesmo assim, não conseguiam evitar olhar para ele, para o facto de ele estar preso e escoltado por dois guardas, mesmo estando vestido com o uniforme da Torre. Por alguma razão aqueles castigos eram tão eficazes: garantiam que os outros se comportassem para evitar acabar na mesma situação.
–Aqui estás! –disse o guarda que o gozava, cantarolando ao garantir que as cordas que rodeavam os pulsos de Nedoy estavam apertadas o suficiente para doer. –Já vem alguém aqui buscar-te. Eventualmente. Talvez.
Nedoy forçou-se a sorrir, dirigindo a palavra ao outro guarda. –Desde que vão confirmar aquilo que eu vos disse no entretanto, por mim tudo bem.
O homem baixou os olhos, incerto. O pior dos dois guardas riu-se mais uma vez.
–Fica bem, traidor, –disse, antes de voltar para dentro do edifício.
Àquela hora do dia, o sol queimava. Bem, o sol dali queimava a todas as horas mas, agora, ao lhe bater diretamente na face desprotegida, parecia-lhe muito mais agressivo que o costume. Ele baixou a cabeça para o chão, tanto para se fazer a maior sombra possível quanto para evitar os olhares e murmúrios da gente que passava. O ar ainda cheirava ao mesmo que antes, à humidade da água corrente, ao aroma das algas verdes que tingiam as correntes do rio, ao peixe pescado e por pescar, mas agora cheirava a calor, também, ao aroma próprio da terra quente e da pele queimada e do suor das cada vez mais parcas multidões que paravam de trabalhar durante as horas mais quentes do dia. Ele sentia-se vermelho quer da vergonha de estar ali, preso como um burro ou outro qualquer animal de carga, a ser punido por um crime que definitivamente cometeu; quer pelo ardor cada vez maior que sentia na tez escura e morena do pescoço exposto que o cabelo não era longo o suficiente para cobrir. Sabia que a humidade que o cobria era de suor, mas o paranóico em si dizia-lhe que a ferida de bala tinha reaberto e que ele não demoraria a descobrir que o calor húmido que lhe corria sobre a pele era realmente o seu sangue. Não era como se pudesse subir a camisa para acalmar os seus receios, não com as mãos presas atrás de si, os pulsos cortados pelas cordas apertadas demais que o feriam em cada movimento que fazia, não naquela posição desconfortável que era forçado a manter que já lhe fazia doer o pescoço e os ombros que pareciam querer sair do sítio para aliviar a pressão.
Como raio é que ele acabava sempre naquelas situações?
Arrependia do que tinha feito, há todo aquele tempo atrás. Tinha-se arrependido nem sequer segundos depois de ter usado a faca nas costas de alguém que devia proteger. Mas agora era só disso que se arrependia. Não tinha vergonha de ter libertado aqueles rebeldes, especialmente agora que sabia que pelo menos alguns tinham chegado à segurança de Eshafra; não tinha vergonha de se ter juntado a Yex, primeiro por necessidade e depois por escolha; já não se arrependia de ter sido bem-vindo em Eshafra nem de ter lutado pelos Rebeldes naquela guerra; nem de ter feito parte da batalha na sua própria cidade, mesmo tendo perdido. Como se podia arrepender disso, sabendo que tinham sido as escolhas certas?
Sorriu com a ironia. Estava ali para ser torturado e humilhado. Com certeza que a Torre não pensava que seria àquela conclusão que ele chegaria.
A rua estava quase vazia, agora. O calor árduo do início da tarde fazia com que as pessoas pausassem para almoçar, já que era quase impossível estar do lado de fora ao sol àquela hora. Não é que ele tivesse opção. Talvez ele pudesse usar este momento para se livrar das cordas; de que servia saber magia se nem conseguisse fazer isso? Mas o mesmo problema de sempre veio à tona: mesmo se se livrasse daquilo, não tinha para onde fugir.
Suspirou, optando por afrouxar os nós o suficiente para poder pelo menos endireitar os ombros. Teria que servir, por agora.
Era difícil saber quanto tempo tinha passado. Acompanhou o dançar das sombras finas dos edifícios, vendo-as a virar à medida que o sol passava de Norte para a sua descida no Oeste. Devagar, a rua voltou-se a encher com o movimento dos que voltavam ao trabalho, entrando e saindo da porta tão próxima dele, distribuindo-se pelas ruas com murmúrios silenciosos e com expressões focadas. Já tinha passado uma eternidade quando alguém veio finalmente ao seu encontro.
–Há alguém que quer falar contigo, –disse o guarda, desatando Nedoy da argola metálica com cuidado para garantir que os nós que lhe prendiam os pulsos ainda estavam bem feitos.
Em resposta, Nedoy só sorriu um sorriso matreiro que devia ter herdado de alguém. A sua aposta tinha dado frutos, agora só precisava se aproveitar aquela hipótese para, com sorte, sair dali com vida. "Só".
A sério, como raio é que ele acabava sempre naquelas situações?
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Hahahahahahhahahahahha oi gente! O que dizem: como é que Nedoy acaba sempre nestas situações?
(A culpa não é minha, eu juro. De todos os meus personagens, ele é o que menos me obedece. Culpem-no a ele!)
Já conheceram Mosé antes. O que acham que ele vai fazer a Nedoy? Qual é o seu interesse nele, em que é que ele lhe é útil? Será que a aposta do nosso ex-cavaleiro realmente deu fruto?
Este capítulo foi escrito basicamente do 0. Até agora, nesta 2ª versão do livro, eu estive somente a fazer pequenas alterações. Houve poucas cenas que tive de mudar completamente/ escrever do zero porque eu já tinha toda a história até aqui bem planeada.
Mas o Nedoy ficar ferido em batalha e acabar por ser confundido por um Cavaleiro da Torre simplesmente... aconteceu. Era suposto ele ter ficado escondido atrás daquela parede e não levar com uma bala, mas nãaaaaaaao, o nosso Quebra Destinos precisava de se fazer de herói para acabar nesta situação. Aconteceu da primeira vez e agora eu, como a escritora que sou, tenho que fazer sentido do maldito novelo de lã todo atado que criei durante o primeiro rascunho. Moral da história: aquilo que eu tenho escrito desde aqui até praticamente ao último capítulo (o último capítulo vai ficar igual que eu não sei se tenho força de o reescrever 😭) está quase tudo inútil. Ou seja, vou demorar mais tempo a criar os capítulos, estarão escritos de uma forma mais confusa e menos eloquente (já repararam nisso neste, certo?) e podem ter certas inconsistências nas quais eu não reparei. Por favor, avisem-me se notarem nisso! Não posso melhorar se não reconhecer os meus erros, certo?
(Update: estão todos escritos, e até estou feliz com como ficaram!)
Espero que, mesmo com essas ressalvas, estejam a apreciar a história. O sofrimento de Nedoy não vai parar aqui, isso eu vos garanto... <.<
Opiniões? Queixas? Comentários humilhantes para o nosso protagonista? Aqui aceita-se tudo! 💖
Beijinhos!!^3
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