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Capítulo 7 - FILIPE - parte I



"Pai, se queres, afasta de mim este cálice;

contudo, não seja feita a minha vontade, mas a tua"

Lucas 22:42

Aos 11 anos de idade...


Corro para casa com pressa para contar à minha mãe a maior descoberta da minha vida.

— Mãe! Mae! Mãããe! — grito, ao alcançar o quintal de casa.

Abro a porta de ferro com força e não encontro minha mãe na sala nem na cozinha. Assim que chego ao seu quarto, vejo-a de joelhos, escorada na pequena cama de solteiro.

— Mãe? — chamo-a um pouco mais baixo.

Ela sussurra um amém, terminando sua prece, e enxuga uma lágrima que caiu acidentalmente em seu rosto. Então abre um sorriso tímido e constrangido, na intenção de evitar algum questionamento. Não preciso perguntar de nada. Sei o que faz minha mãe sofrer. A ausência do meu pai deixou feridas incuráveis.

Eu não queria vê-la sofrer mais. Queria vê-la sorrir.

— O que foi, meu filho? — pergunta, gentilmente, levantando-se com dificuldade.

Seu rosto expressa nitidamente toda sua exaustão. Além do trabalho como empregada doméstica, mamãe agora fazia bicos com a máquina de costura.

Sempre foi assim. Eu sempre vi minha mãe dar seu sangue para que nunca faltasse nada em nossa mesa, e nunca faltou. Sou tão grato a Deus por tê-la, e a única coisa que clamo a Ele é que em algum momento essa aflição estampada em seu rosto vá embora e eu consiga enfim ver um sorriso tranquilo no lugar.

— Aconteceu alguma coisa?

— Aconteceu, mamãe.

Ela franze o cenho e me abraça como se previsse o que eu iria dizer. Seu abraço é tão apertado e carinhoso que meu coração quase salta do peito.

As certezas que eu havia constatado há alguns minutos se tornam a minha única esperança de vê-la sorrir. E, diante da expectativa, dou espaço e lugar para contar-lhe a minha mais nova certeza da vida:

— Eu quero ser padre.


***


É impossível distinguir o que mais me assombrava: a nova cidade, o assédio das senhoras ou os olhos de Aurora.

Era difícil entender como isso estava mexendo comigo. A curiosidade por aquela pequena mulher me deixava meio alucinado. Até que a vi fazendo as pazes com o namorado. Era como deveria ser. Eu deveria pôr um ponto final nisso, mas confesso que o fato de conhecer a cidade com a sua ajuda deixava meu coração ainda mais palpitante.

Não sei por que lhe enviei uma mensagem no WhatsApp quando a vi no outro lado da rua.

Vou até o banheiro, jogo água em meu rosto e faço uma prece.

Afasta de mim esse cálice.

Minha oração é interrompida por cabelos castanhos, por um pingente de flor de lótus, por olhos intensos e cintilantes...

Ela emanava vida. Toda a vida do mundo. E isso estava me deixando atordoado.

Eu teria que prestar contas com Deus em outro momento.

Volto para a sala, para a companhia daquelas mulheres. Depois de tagarelarem e contarem sobre a maioria das pessoas da cidade, Fátima se aproxima de mim.

— Aurora é uma boa moça, padre — conta, com certo cuidado.

Parecia que eu estava cercado por todos os lados.

— Eu percebi isso, senhora Fátima.

— É uma ótima filha. Inteligente, obediente, trabalhadora e namora um rapaz tão bom... — Ela junta as mãos como se agradecesse a Deus. Talvez estivesse. — A minha única preocupação é a relação dela com Deus. Ela era muito apegada ao pai e por conta da sua morte, ela perdeu a sua fé. Quero que me ajude.

O pedido me surpreende.

— Ajudar?

— Sim. Quero que me ajude a mostrar a ela o quanto nosso Deus é maravilhoso.

Seu pedido mexe comigo. Talvez fosse eu que devesse receber ajuda.

É inevitável não comparar Fátima com a minha mãe, Paola. Fervorosa e dedicada. A diferença estava no sorriso que ela me mostra nesse exato momento.

— Farei o possível, senhora.

— É só o que preciso.

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