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Capítulo 18 - AURORA


 "Lembra de ficar um pouco mais

Quando pensar em ir embora

E querer muitos minutos à toa

Sem se importar com a demora"

Anavitória – Nós


Por que ele me abraçou?

Por quê?

Eu o queria.

Eu me sinto tão errada porque eu quero o toque do seu abraço quente mais uma vez.

Eu me sinto tão imunda porque só de pensar em suas mãos em mim fico louca de desejo. Se ele me causa isso apenas com um abraço, o que mais eu poderia sentir?

Sinto-me envergonhada e enojada de mim.

E o que é pior em tudo isso? Eu quero que aconteça novamente.

Tanto.

A confirmação de que tudo que sinto quando estou com ele é recíproco não me deixa feliz.

Se para mim há uma batalha, não consigo imaginar o que seja para ele.

Enxugo as lágrimas idiotas que caíram sobre o meu rosto. Respiro fundo e entro no bistrô com um nó na garganta.

Só quero pegar minha bolsa e ir embora. Vou até a mesa que estávamos e a pego.

Por sorte, Giulia canta Like a Virgin alto no palco.

Quando tento sair à francesa, Pablo me encontra na porta.

— O que está fazendo?

Forço um sorriso e levanto um pouco os ombros.

Eu não sei!

Não sei o que estou fazendo!

Ele segura um copo cheio. Pego da sua mão e bebo a vodca de uma só vez e ele arregala os olhos, assustado.

Parada a sua frente, vejo os seus olhos. Seria tudo tão mais fácil se eu sentisse a mesma coisa por ele.

Sem pensar demais, eu o abraço.

Abraço apertado.

Pablo acaricia minhas costas.

Eu queria sentir a mesma coisa por ele. Não por um padre.

Aninhada ao Pablo, meu coração não acelera. Minhas pernas não ficam estremecidas. A vontade de nunca mais sair também não existe.

E o teste fracassa.

Pablo não é Filipe.


***


Acordo com o sol no rosto e cabeça estourando de dor.

O lugar é conhecido. As paredes em azul claro me dão a certeza de onde estou.

Viro-me para o outro lado da cama e vejo Pablo, dormindo.

Ah, merda!

Levanto o lençol que me cobre e vejo que estou apenas com lingerie.

O que eu fiz? O que fizemos?

Sento-me devagar para não acordá-lo. Preciso me lembrar de como vim parar na casa do Pablo.

Eu estava triste e liguei o foda-se.

Pablo me deu mais bebida. Giulia também. Eu me afoguei para poder esquecer.

Giu me arrastou para o palco e não me recordo nem de qual música cantei. Deve ter sido um desastre.

Lembro-me de querer ir embora, mas o Pablo não deixou. Pegamos carona com alguém que também não lembro e pronto. Não consigo lembrar de mais nada.

Pablo se remexe e me vê.

— Bom dia — diz se despreguiçando.

Forço um sorriso.

A dor na cabeça por conta da ressaca está dilacerante.

— Tem algum analgésico? — pergunto.

— No banheiro. Lá na caixinha de remédios.

Levanto-me com o lençol sobre o corpo e vejo minhas roupas dobradas em cima da poltrona.

Antes de entrar no banheiro, me viro para ele.

— Nós... — aponto para nós dois.

— Não lembra, não é?

Faço que não.

Detesto não ter controle sobre as coisas.

Eu deveria ter tido pelo menos um pouco de bom senso.

Deveria ter ido embora quando Filipe foi.

Ele se senta na cama, achando minha pergunta engraçada.

— Pegamos carona e você dormiu dentro do carro. Eu só te coloquei na cama.

Aceito a resposta com um sorriso casto. Pego a minha roupa na poltrona e coloco dentro da minha bolsa. Abro a terceira gaveta da sua cômoda, sem cerimônia, e pego uma calça mais antiga e uma camiseta cinza. É a gaveta onde eu costumo deixar roupas sobressalentes para quando durmo aqui.

Entro no banheiro.

É quando eu me dou conta que fazia mais de um mês que eu não vinha dormir com ele.

Isso deveria ser um sinal, ou não?

Respiro fundo, aliviada por não ter transado com Pablo. Isso seria um caos. Engulo um remédio, tomo um banho rápido e me visto.

Quando saio do banheiro, encontro Pablo colocando um short de moletom.

— Ei, não precisa ir embora tão depressa — reclama ao me ver arrumada.

— Nós precisamos conversar, Pablo.

Ele me olha e ajeita o cabelo, se sentando novamente na cama.

Eu me sento na outra extremidade.

— Em primeiro lugar, muito obrigada por me trazer em segurança. Eu exagerei.

— Todos nós exageramos, foi uma noite legal — ele abre um grande sorriso.

Ali não havia nenhum vestígio de que ele sabia o teor da conversa.

Meu peito se aperta. Ele deveria prever. Não é possível.

Aperto os lábios.

Para mim, foi uma noite péssima.

Lembro-me do Filipe e meu peito não só se aperta, como dói.

Na minha frente, Pablo mantém o sorriso.

— Pablo, eu...

— Podemos esquecer todas as brigas, Rory. Eu amo você.

Sinto-me péssima, mas não tinha outra saída. Fecho os meus olhos por milésimos de segundo e os abro novamente.

— Eu acho que chegamos ao fim, Pablo.

— O quê?

— Não, eu não acho. Eu tenho certeza.

Ele faz que não com a cabeça.

— Como você pode dizer isso?

— Você não vê? Essa relação não é como qualquer outra.

— É isso que você quer? Uma relação igual à de todo mundo?

— Não estou dizendo isso.

Ele se levanta, alterado.

— O que quer dizer então? Hein?! É justamente isso que tanto prezo na gente. Conseguimos entender o tempo um do outro e...

— Você precisa entender que...

— Nós temos algo lindo, Aurora! Nós...

— Eu não te amo, Pablo! — Não haveria outra oportunidade ou um melhor jeito de dizer isso. Eu preciso ser sincera com ele.

Nada do que ele falasse iria mudar o que sinto.

Eu não queria ouvi-lo sobre como tudo para ele era perfeito. Não era para mim.

— Como não ama? — indaga com a voz entrecortada.

— Me perdoa.

Seus olhos expressam pânico.

— E só reparou isso agora? Três anos depois?

Eu não sabia o que era amar até...

Faço que sim. Constrangida.

— Você mentiu pra mim esse tempo todo? Você disse. Poucas vezes, mas disse que me amava.

— Eu achava que sim, eu...

— Você acabou de acordar... — Ele se senta ao meu lado e pega a minha mão. — Você está nervosa com sei lá o quê... Não vamos nos precipitar e...

— Pablo, me ouça...

— Eu vou te dar um tempo. Um tempo para pensar e...

— Pablo! — falo um pouco mais alto, querendo que ele pare. Puxo minha mão da dele. — Eu não estou me precipitando.

— Vai dizer agora que o problema é com você? De novo?

— Não. Nós dois somos o problema — digo.

Ele faz que não com o dedo.

— Eu te amo. O problema não é meu.

— Não. Você não me ama.

Ele fica bravo com a minha resposta. Nunca havia visto essa sua expressão.

— Não coloca palavras na minha boca, Aurora! Você não está aqui dentro. — Ele aponta para o coração. — Sempre consegui te entender. Sempre dei espaço a você. Sempre evitei exigir algo porque a gente é assim.

— Mas é aí que está! Talvez eu tenha querido isso ou então não teríamos estendido por tanto tempo essa relação.

— Você vai me deixar, é isso?

— Pablo, nós não éramos um casal há muito tempo.

— Como? — pergunta ele e não compreendo.

— Como o quê?

— Como percebeu que não me amava sendo que nunca amou ninguém?

Engulo em seco.

E, nesse momento, eu percebo algo devastador.

Porque o mais perto do amor que eu já senti era por um padre.

Levanto-me da cama, atordoada. Eu não tinha mais o que dizer.

— Você ama outra pessoa? — Sua pergunta soa desesperada.

Pego minha bolsa sem conseguir olhar para ele.

— Espera aí!

— Isso é ridículo, Pablo. Não vou te responder isso. A nossa relação não tem nada a ver com essa resposta.

Ele demonstra uma expressão espantada, incrédulo com o que acabou de perceber. Abro a porta do seu quarto.

Eu sou uma burra por não conseguir, ao menos, mentir.

— Espera... Rory...

Passo pela sala e abro a porta principal pegando o celular e pedindo um taxi. Encontro os convites dentro da minha bolsa.

— Por favor, vamos resolver...

Vou até ele e seguro uma das suas mãos, colocando então um convite do lançamento do vinho.

— Espero que possamos continuar amigos, Pablo. Talvez você não compreenda agora, mas eu tenho certeza de que a vida irá te mostrar que foi o melhor para nós dois. Seu apoio foi fundamental. Eu só tenho que agradecer. Espero que consiga ir à festa e obrigada por tudo.

Ele observa o convite e não esboça nenhuma emoção. Eu o entendia e me apoiava ao fato de que ele perceberia que deveria ser assim.

Pablo não diz mais nada. Apenas volta para sua casa e fecha a porta.

Não é difícil responder como me sinto nesse momento. Parece que tirei um peso das costas e, ao mesmo tempo, sentia muito por ele. Pablo merece muito mais do que eu poderia lhe oferecer.

O táxi logo chega e vou para Monte Belo pegar o Sun.

Ao chegar na praça, entro no Sun e quando vou dou a partida, vejo um amontoado de gente no meio da praça e avisto minha mãe com as mãos no rosto. Ela parece chorar.

Meu coração salta.

Saio do Sun correndo e vou até ela.

— Mãe?

— Minha filha! — Ela me abraça apertado.

— O que foi? O que está acontecendo?

Sobre seus ombros vejo todas as suas amigas em lamúrias. Em um canto mais afastado, Filipe sério.

— O que foi, mãe? Pelo amor...

Eu estou desesperada.

Ela chora ainda mais.

Filipe chega perto e toca o meu ombro.

— O que está aconteceu, Filipe?

— Dona Eleonora. Ela faleceu ontem à noite.

Olho para as senhoras que estão ali. E, realmente, Eleonora não está entre elas.

— O que houve com ela?

— Coração. — Soluça minha mãe. — Ela tinha problema no coração. Ela era minha amiga, Rory.

— Eu sinto muito, mãe. Muito mesmo.

Ela concorda, secando o rosto com um lenço branco que Filipe a entrega e eu a abraço.

— Como está o padre Giovanni? — Minha mãe pergunta a ele.

Filipe franze o cenho e nega com a cabeça.

— Ele deveria estar aqui, não? — indago.

— Ele se trancou no quarto desde que soube da notícia — responde Filipe. — Não quis abrir a porta.

— Eleonora era muito próxima ao padre — diz minha mãe com pesar.

Ergo meus olhos para Filipe, que está emocionado.

— A família dela disse que logo o corpo chegaria para a missa — fala uma das senhoras. — Poderia rezar uma missa para a gente, padre Filipe, já que o padre Giovanni não tem condições?

Filipe parece enrijecer ao meu lado.

Seus olhos alternam entre os presentes.

— Eu...

— Por favor, padre. — Minha mãe pede.

É estranho. O proibido sempre foi presente. Porém, foram poucas as vezes que me recordei com tanta convicção a sua real condição: Padre. Ele é padre. Um padre real. Daqueles que rezam missas e fazem cerimônias. Daquele que abençoa e que não se relaciona com mulheres.

E eu estou apaixonada pelo único homem que não poderia estar.

Com tantos olhos sobre ele, Filipe concorda.

— Fica comigo, filha? — pergunta minha mãe virada para mim.

Faço que não, sem pensar.

E ver Filipe ministrar uma missa?

Ver a sua vocação e sentir o meu amor se esvair mais?

Nem pensar!

— Me desculpe, mãe. Você sabe que não entro na igreja — sussurro em seu ouvido.

— Por mim, filha. Por favor.

É a minha vez de olhar para Filipe, que abaixa o olhar.

Ele sente, assim como eu, que isso faria tudo mudar.

— Bom, eu vou abrir a Igreja — diz Filipe, sem me olhar.

As senhoras agradecem.

Comentam sobre o horário do enterro e como a família recebeu a notícia. Fico triste pela perda dela. Por mais que eu quisesse sair dali, não poderia negar ao pedido da minha mãe. Em contrapartida, conhecendo-a como eu conheço, sei que no fundo está apenas aplicando a situação para um bem maior: me fazer entrar na igreja. Ela sabe da minha resiliência em relação à religião.

A Igreja Matriz de São Francisco de Assis é aberta e as senhoras e outras pessoas que vão brotando na praça vão entrando. Eleonora era bastante conhecida na região. Praticamente sou arrastada pela minha mãe, que entrelaça seu braço no meu para que eu não a solte.

Ao entrar na Igreja tudo parece voltar. Todas as sensações da última vez que estive aqui. E, a causa, era a mesma: a morte.

Sinto minhas pernas tremerem. Minha mãe repara e segura minha mão com mais força.

— Seu pai ficaria feliz por você estar aqui.

Eu esperava que sim e resolvo me apegar a isso.

As pessoas se sentam nos bancos de madeira.

Eu havia esquecido como esse lugar é lindo. Para uma cidade tão pequena, ela é grandiosa.

No altar, vejo Filipe com túnica e quase saio correndo. Como se a certeza da sua condição me mostrasse a cruel realidade.

Filipe não usa roupa de padre no dia a dia e talvez isso tenha me feito esquecer tantas vezes.

Abaixo minha cabeça. Não queria vê-lo assim.

Eu estava amando um homem que havia destinado a vida a Deus.

Olho para a imagem de Cristo crucificado com o coração apertado.

Não precisava me punir dessa forma, Senhor.

Minutos depois minha mãe me cutuca.

— Aleluia! Padre Giovanni está aqui! Eleonora iria querer que ele rezasse a missa.

Avisto o altar novamente e padre Giovanni fala algo para Filipe. Ele parece respirar fundo e, passando os olhos por mim, sai dali.

Padre Giovanni está bastante abatido, com o rosto inchado e vermelho.

Filipe reaparece logo depois usando roupas comuns. Caminha pelo corredor central da igreja e passa por mim. É impossível não nos olharmos.

Estou com nó na garganta e feliz por ver que Filipe não irá dar a missa.

O caixão com Eleonora chega, junto com a família.

A perda é sempre dolorosa. Saber que jamais verá aquela pessoa nessa vida é quase enlouquecedor. Ainda sinto tanto a falta do meu pai que parece que a saudade só aumenta.

Não vejo Filipe durante a missa de corpo presente. Também não procuro.

Tudo está tão agitado dentro de mim que mal consigo respirar.

As lembranças me dominam.

Todos os domingos começavam com a missa da manhã na nossa casa. Não sei se ele vinha mais pela minha mãe, mas nunca vi meu pai reclamar. Ele tinha um jeito peculiar de ser e, se tratando de um homem do interior, era diferenciado. Ele era devoto à natureza. Sentava comigo à beira do vale apenas para tentar me mostrar a beleza do mundo. Existe muito mais além, dizia ele.

Ele gostava de ler. Lia rigorosamente a bíblia, citava Allan Kardec e até mesmo Buda. Por isso ele me presenteou com o pingente da flor sagrada: Lótus. O lótus, na filosofia Budista, é pureza do corpo e da mente. Ele tinha tanta fé em mim. Eu amava isso nele. A sua facilidade em ser e não ser de lugar nenhum. Não me lembro dele contar sobre algum sonho ou desejo. Ele era feliz com o pouco que tinha e isso era o bastante.

Eu era tão nova quando ele faleceu e mesmo com tão pouco tempo de vida ao seu lado, fui dominada por uma sabedoria grandiosa.

Acho que ele não ficaria feliz em saber que eu carregava tanta mágoa de Deus.

Engulo em seco e a missa acaba. As pessoas se abraçam e vão saindo da Paróquia aos poucos. Acompanho minha mãe de braços dados conversando com suas outras amigas.

Na porta da igreja, pronta para sair dali, eu me viro novamente para o altar e vejo Filipe sentado sozinho, de costas para mim, em um dos bancos no meio da igreja.

Sem dizer nada a minha mãe, desenlaço nossos braços e a deixo sair com os parentes da senhora Eleonora.

Devagar, caminho em sua direção e me sento ao seu lado.

Filipe não reage. Continua com a cabeça meio erguida para o altar.

— É sempre muito angustiante lidar com a morte — diz ele, percebendo a minha presença.

— É. Acho que é a maior angústia que podemos sentir.

— Será? — Ele me olha de lado rapidamente.

Meu coração dispara.

Ficamos alguns segundos em silêncio e quando olho em volta, percebo que estamos sozinhos.

— Você veio à igreja — afirma ele, baixinho.

— Sabe há quanto tempo não venho aqui? Ou a nenhuma outra?

Ele faz que não com a cabeça.

— Há mais de 14 anos.

Filipe se vira para mim.

— Por quê?

Respiro fundo e me viro para o altar.

— Quando meu pai caiu ao meu lado foi um choque. Ouvi o médico dizer para a minha mãe que apenas um milagre o faria acordar. Então, fui fazer o que minha mãe sempre dizia ser o correto. Ela dizia que Deus era o único que tinha o dom para fazer milagres, o senhor de todas as coisas e... — arfo. — Afinal, a história era que se pedíssemos com fé, Deus nos atenderia. E eu vim. Vim até aqui. Até essa igreja com toda a fé que uma menininha de nove anos, que amava o seu pai incondicionalmente, poderia ter. Ainda consigo me lembrar da angústia que sentia em meu peito. O medo de perder o meu melhor amigo era grande demais. Mas... — Meus olhos se enchem de lágrimas. —, mas ele não me ouviu. Ele não fez o milagre que eu tanto esperava, mesmo com tanta fé dentro de mim. Então eu parei.

— Parou?

— Parei. Alguns dias depois meu pai teve morte cerebral diagnosticada por conta do aneurisma. Não tive tempo de me despedir e nem de dar um último abraço. Deus não me ouviu, Filipe. Nem quando eu mais precisava dele. Por que eu deveria ouvi-lo?

Filipe me olha. Seu olhar é complacente. Eu nunca havia contado essa história para ninguém. Nem mesmo a minha mãe.

As lágrimas escapam dos meus olhos e meu peito se aperta.

— Por favor, não chore, Rory.

— Ele não ficaria feliz com isso, Filipe. Eu precisei voltar aqui para perceber isso. Ele não ficaria feliz com tanta mágoa dentro de mim.

Ele enxuga meu rosto com o dedo.

— Fez as pazes com Ele?

Faço que não.

— Preciso trabalhar nisso — choro mais.

— Não se preocupe tanto, Rory. Deus conhece o seu coração. Ele sabe a pessoa que você é. Para mim, isso é suficiente.

Ele acaricia meu rosto com uma das mãos e, sem perceber, acaricia também a minha alma com a sua declaração.

Até que ele me abraça.

Um abraço forte.

Sinto toda a sua bondade e carinho.

Quase me desfaço em seus braços com o abraço que eu tanto ansiava em sentir novamente.

Enfim, eu consigo me acalmar.

— Desculpe, eu não deveria estar falando de mim nessa situação e...

— Não se preocupe, Rory. Ouvir você me faz feliz. Seja em qualquer situação.

Nós dois voltamos a olhar o altar.

— Eu te disse que não conheço meu pai, não disse? Que minha mãe foi abandonada — fala, desfazendo o silêncio. Faço que sim com a cabeça. — E por isso, ela foi infeliz a vida inteira.

— Eu sinto muito.

— Por muito tempo me senti culpado, achando que tudo o que eu fiz para ela se orgulhar e se alegrar não haviam sido o suficiente.

— Tenho certeza de que ela tinha orgulho de você — digo. Filipe é um homem bom e sempre falava de sua mãe com um carinho imenso. Não era difícil perceber isso.

— É. Talvez sim. Eu tentava a todo custo suprir a falta que ele fez a ela, mas não deu. Ela foi embora com a mesma dor que carregou por tantos anos.

— Não podemos nos culpar por algo que não temos controle — falo.

— Você ouviu o que acabou de dizer? — Ele se vira novamente para mim. — Não. Não podemos ter controle. A hora do seu pai havia chegado, Rory. Não havia nada que você pudesse fazer. E meu pai preferiu não fugir com a minha mãe e ter uma família com ela. Eu não poderia obrigá-lo a isso. Não tivemos controle e, mesmo assim, nos sentimos culpados. E sabe qual é a maior aprendizado que tenho nisso tudo?

Faço que não.

— Que eu sou humano. Um ser-humano comum. Que sente e que se chateia, magoa por qualquer coisa. Às vezes, sendo padre, as pessoas nos veem como robôs. Robôs perfeitos que vivem de forma exemplar. Seres que não se preocupam ou que não têm sentimentos. Simplesmente máquinas que abençoam e perdoam qualquer um.

— Vi mais sentimentos em você do que em muita gente.

— Aí é que está, Rory. Você me vê além do padre. Você vê o Filipe. Por mais que eu tente dizer que os dois são a mesma pessoa, eles não são.

Abaixo a cabeça e Filipe levanta meu queixo para olhar em meus olhos.

— Eu fiz votos para toda uma vida. Achei que nunca aconteceria o que está acontecendo dentro de mim.

Meu coração dispara.

— Mas? — Minha voz sai em um sussurro.

— Mas eu sou falho. Não irá adiantar eu me punir. Acho que estou cansado disso.

— Me perdoa por...

— Não. Não peça perdão, Rory. Por favor... não peça perdão a mim. — Ele fecha os olhos e respira fundo antes de abri-los novamente. Fitando-me com seus profundos olhos azuis. — A minha condição não me permite ir além, mas, ao mesmo tempo, eu sinto que não devo ficar longe.

— Então não fique.

Ele me olha. Realmente me enxerga por completo. Eu sinto arrepios pelo corpo. Eu me sinto quente e fria ao mesmo tempo. Estou tremendo. Nesse momento, sou invadida por um sentimento que me dá a certeza de que poderia passar meses, anos, uma vida inteira, mas ele sempre seria único para mim.

— Só iremos nos machucar. Sabe disso, não sabe?

Eu concordo, sentindo minha garganta fechar. E, novamente, não consigo segurar as lágrimas.


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