Capítulo 16
Certo, talvez minha reação tenha sido um pouco exagerada. Mas, fala sério, a ideia de eu estar apaixonado por Cris é tão absurda que chega a ser cômica. Primeiro porque seria burrice. Estou aqui para me aproximar dele, fazê-lo confiar em mim para revelar seus segredos, seduzi-lo como Nicolas quer, não o contrário. E eu nem sei se ele é gay. Nicolas tem certeza que sim, mas como pode saber isso? Os dois nem são próximos.
Segundo porque a única pessoa por quem já me apaixonei foi Emílio. Estive apaixonado por ele anos a fio, sofrendo em silêncio enquanto ele saía com uma infinidade de garotas aleatórias, me conformando em ser apenas o melhor amigo gay. No entanto, quando penso nisso agora, já faz algum tempo que Emílio não ocupa todos os meus pensamentos como costumava fazer. Nem mesmo sua namorada misteriosa me incomoda tanto quanto antes. Mas isso não significa que meus sentimentos mudaram... Ou significa?
Eu só ando com um monte de coisas na cabeça. Agora mesmo estou aqui, à frente da casa de Cris, me preparando para tocar a campainha enquanto penso em tudo isso. Tudo o que me trouxe até aqui.
Sinto uma pressão esmagadora em meu peito. É como se eu tivesse chegado em uma espécie de impasse. Como se, se eu apertasse a campainha agora, não teria como voltar atrás, embora eu saiba que não posso mais voltar atrás há um bom tempo. Penso nas ameaças de Nicolas e também no que Emílio me disse. "Eu gosto desse novo Cristiano" foi o que eu disse a ele no nosso último encontro. E ele estava tão vulnerável, tão desesperado. Agora a culpa me consome...
— Téo, o que faz aqui fora? — é a voz preocupada de Joana. Deve ter me visto pela câmera do interfone ou sei lá o que eles usam para vigiar a rua. — O sol está muito forte, vai acabar derretendo seus miolos. Venha, vamos entrar.
Eu aceito a oferta. Sento por um instante em uma das poltronas cinza chumbo no hall de entrada, enquanto Joana me busca um copo de água gelada. Fico olhando para a escada, mas para a minha decepção Cristiano não aparece. Em vez disso, a porta do escritório do Dr. Joaquim se abre com força desnecessária, e o próprio aparece como um poste rígido. Então ele já voltou de São Paulo.
Derrubo um pouco de água ao levantar de um pulo, assustado pela aparição repentina.
— Estava aguardando pela sua chegada — ele diz com a voz potente e retumbante. — Entre!
Ele estava aguardando a minha chegada? O que isso significa? É agora que vou morrer?
Bebo o restante da água em gole só, tentando me acalmar, mas sinto minhas pernas tremerem ao acompanhá-lo para o interior do escritório. A mesa voltou a ser ocupada pelos papéis e objetos decorativos de antes. Não sei o que fazer com o copo vazio, então o passo de uma mão para a outra, até que o Dr. Joaquim inclina-se sobre a mesa para pegá-lo e colocá-lo sobre ela. Nunca me senti tão idiota na vida.
Não sei se devo me sentar ou não, então encaro uma edição monstruosa de Guerra e Paz ao lado dos papéis espalhados, só para não ter que olhá-lo. Isso não passa despercebido a ele.
— Gosta de Tolstói? — o Dr. Joaquim diz enquanto senta-se em sua cadeira.
O que me obriga a encará-lo. Seus olhos são inexpressivos e não sei porque de repente é tão importante obter a aprovação desse homem.
— Ainda não tive a oportunidade de conhecer a literatura russa, senhor.
Ele repuxa o canto do lábio. Não é um sorriso, é mais como se parecer simpático fosse um esforço tremendo que ele não está disposto a fazer.
— Pelo menos sabe que é russa. Sente-se!
Faço o que ele diz, ainda sem entender o que estou fazendo aqui.
— Então, meu filho me disse que você pretende fazer Audiovisual em São Paulo.
— Esse é o plano, senhor.
Não sei bem se eu devia chamá-lo de senhor, mas ele não me dá nenhum indicativo para tratá-lo com menos formalidade.
— E por que tão longe?
— Bem, porque é onde estão as melhores oportunidades. Não é uma carreira como o Direito que está em toda parte, ninguém consegue nada em Ribeirão Preto ou outra cidade do interior qualquer. Se eu quiser que isso dê certo, tenho que ir para um grande centro como São Paulo.
O que eu digo é verdade, embora não seja a verdade completa. Também quero ir para São Paulo porque é o lugar mais longe de Salto Belo que consigo pensar.
— Vejo que tem objetivos muito claros para o futuro. Isso é muito raro hoje em dia, a maioria dos jovens não quer nada com a vida.
Espera, isso foi um elogio? Foi para isso que ele me chamou aqui, para falar sobre o meu futuro?
— Pelo menos é o que estou tentando — coloco uma mecha de cabelo atrás da orelha, exibindo um sorriso nervoso.
— Sei... e foi por isso que se aproximou de Cristiano?
Ah.
— Desculpe. Não entendi, senhor.
O homem entrelaça os dedos diante do rosto, os cotovelos apoiados sobre a mesa. Ele me observa como um corvo à espreita da presa.
— Posso repetir a pergunta de outra forma: sendo você um jovem ambicioso e dedicado em alcançar seus objetivos de vida, enxergou em meu filho a oportunidade de aprender com ele a ser mais disciplinado em relação aos estudos, já que ele é um aluno com um futuro brilhante pela frente?
— Seu filho é o melhor da nossa sala, senhor. É uma honra estudar com ele.
— Então foi com esse objetivo que se aproximou dele?
— Sim.
— Não foi com outro objetivo?
Engulo em seco. Ele não poderia saber do plano de Nicolas, poderia? Começo a sentir o suor escorrer pela testa, apesar do ar condicionado estar ligado.
— Que outro objetivo poderia ser?
— Não sei, me diga você.
Seus olhos se estreitam em minha direção e eu afundo na cadeira, me sentindo um completo canalha.
— Juro que não tenho segundas intenções com o seu filho, senhor.
Ele abaixa os braços, recuando pela primeira vez. Já não parece mais um advogado ameaçador, mas apenas um pai cansado.
— Espero que isso seja mesmo verdade. Cristiano é um garoto muito reservado e sensível, não costuma confiar em alguém com facilidade. Da última vez que trouxe alguém para casa... bem, eu farei de tudo para que aquilo não volte a se repetir.
Então Cristiano já trouxe alguém para casa antes de mim? E o que não pode voltar a se repetir? Será que...?
Fico encarando o homem e o pai à minha frente, com a certeza de que minha cara deve estar um desastre total.
— Só espero que você entenda, Téo, que farei de tudo para proteger meus filhos. Sou um homem vivido, tenho experiência o suficiente para saber que no mundo há pessoas sem caráter. Pessoas ruins o bastante que não se importariam em destruir os sonhos de dois jovens inocentes para obter aquilo que querem. Mas enquanto eu estiver aqui, farei o que estiver ao meu alcance para manter esse tipo de gente afastada da minha família, então espero, para o seu próprio bem, que você não seja uma dessas pessoas. Eu não suportaria ver Cristiano sofrendo de novo.
Meus ombros estão caídos. Estou olhando para o chão, porque não consigo mais encará-lo. Tenho medo que se o fizer ele verá em meus olhos que sou exatamente o tipo de pessoa que ele deveria manter afastado do filho. Não sei o que houve no passado, mas estou prestes a causar um sofrimento sem tamanho na vida de Cristiano e me sinto um lixo por isso. Eu deveria me afastar. Ele não merece isso.
E certamente, por mais patricinha que seja, Bianca também não merece um cara manipulador como Nicolas. Mas o que posso fazer? Estou de mãos atadas. Conheço Nicolas o suficiente para saber que ele pode cumprir sua ameaça a qualquer instante.
A porta do escritório se abre de repente e um Cristiano confuso adentra à sala. Dou um pulo da cadeira, indo em sua direção. Tenho que me controlar para não me agarrar a ele.
— Téo! Joana disse que já estava aqui, mas você não subiu...
Ele olha para o pai, que já se levantou também e ajeita a gravata do terno.
— Estávamos apenas trocando uma ideia, como vocês jovens dizem.
Cris estreita os olhos.
— Pai! Já conversamos sobre isso. Não era necessário...
— Era só uma conversa amistosa. Não estava intimidando ninguém. Diga a ele, Téo!
Eles conversaram sobre mim? O que isso significa?
— Era só uma conversa amistosa — digo para tranquilizá-lo. — Está tudo bem.
Ele lança um último olhar desconfiado para o pai, então me puxa para fora.
— Vem, vamos subir. Já estamos atrasados.
Cris me arrasta pela escada e eu me deixo levar de bom grado. Seu cheiro de menta e de grama cortada me deixa um pouco tonto, de um jeito bom e assustador. Ou talvez eu ainda esteja atordoado pela conversa com o Dr. Joaquim.
— Ele estava te intimidando, não estava? — Cris diz assim que fecha a porta do quarto. Seus olhos têm um brilho intenso ao me encarar.
Minhas pernas ainda estão tremendo. Procuro a cadeira da escrivaninha para me sentar, antes que passe o vexame de desmaiar em seu tapete chique.
— Não estava, não. Ele só queria saber o que pretendo fazer no futuro.
Cris se aproxima de mim. Não parece nem um pouco convencido.
— Pode dizer a verdade. Eu sei como ele é.
— Ele só estava preocupado com você. Ele quer te proteger, só isso.
— Bom, meu pai não pode fazer isso. De qualquer forma, não é comigo que ele deveria se preocupar, vou conversar com ele depois...
— Não! Cris, está tudo bem, sério — digo, tentando convencer a mim mesmo. — Vai ficar tudo bem, não precisa falar com ele sobre nada disso.
Cris abaixa os olhos, a testa franzida. Sigo seu olhar até perceber que estou segurando sua mão. Meu coração congela e sinto o sangue subir para o rosto. Então tiro a mão e desvio os olhos para a janela, me sentindo estúpido. Parece que tirei o dia de hoje para passar vergonha.
— É melhor começarmos logo...
Mas não consigo por nada no mundo me concentrar. Minha cabeça está fervendo com os últimos acontecimentos. Nunca me senti tão confuso na vida.
Olho para Cris quando acho que ele não está olhando. Ele está concentrado, os olhos fixos na apostila à sua frente. Fico pensando nas nossas mãos juntas... quero tocá-lo de novo, só para sentir sua pele na minha. Quero fazê-lo sorrir para ver sua covinha de novo. Deus, o que está acontecendo comigo?
Eu devia seduzi-lo, esse é o meu papel aqui, não o contrário. Tenho que enviar um relatório para Nicolas na sexta-feira... Mas Emílio acha que estou apaixonado por Cris e começo a pensar que talvez ele tenha razão. Quanto mais tempo passo com Cris, mais quero ficar com ele. Até consigo imaginá-lo me beijando...
Não! Eu não posso pensar nisso. É uma loucura sem tamanho. E não tem a menor chance de dar certo. Meu destino é fazê-lo sofrer. Eu devia ouvir o que o Dr. Joaquim disse e apenas me afastar dessa casa. Me afastar de Cris. Assim ele teria uma chance de ficar bem.
Talvez eu possa fugir de Nicolas de alguma forma. Posso ir para a casa do meu avô em Uberaba, embora isso signifique que terei de abrir mão da faculdade em São Paulo...
— Você está bem? — Cris diz de repente, olhando para mim. Preocupado. Lindo.
Quando foi que ele ficou tão lindo?
— Estou.
Não estou nada bem. Me sinto sufocado, como se não houvesse ar suficiente nesse quarto. Estou apaixonado por Cris. Acho que vou morrer.
— Tem certeza? Você está suando...
Tento respirar fundo, mas o ar não alcança meus pulmões.
— Não.
— Espere aqui, vou chamar Joana.
Ele já está se levantando quando o agarro pelo braço, impedindo-o de sair.
— Não, Cris! Eu só preciso... ir embora.
— Está bem. Meu pai pode te levar até em casa de carro.
— Não! — A ideia de ir para algum lugar sozinho com o Dr. Joaquim me causa um arrepio na espinha. — Eu vou sozinho, posso fazer isso, vai ficar tudo bem.
— Téo, você não parece em condições...
— Por favor, Cris. Eu só preciso chegar até em casa.
Ele parece travar uma intensa batalha interna até tomar uma decisão.
— Está bem. Mas me mande uma mensagem para eu saber que chegou bem.
Sua preocupação só piora ainda mais as coisas. Seria mais fácil se ele parasse de ser tão gentil e voltasse a brigar comigo como no começo do ano. Assim eu poderia continuar odiando-o e fazer o que Nicolas espera que eu faça.
Por puro milagre, consigo chegar vivo em casa.
E agora, minha gente? Como Téo lidará com a descoberta de seus sentimentos? E Cristiano, sentirá o mesmo ou isso só acarretará em mais sofrimento?
Antes de sair, deixe seu voto clicando na estrelinha para eu saber se estão gostando.
Beijos e até o próximo capítulo ;)
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro