Capítulo 2
Quase um mês se passou e eu não consegui emprego, já enviei currículo para todos os lugares inimagináveis. Bati de agência em agência procurando uma vaga, qualquer vaga servia, eu não tinha preferência no momento. Sabia que não conseguiria uma colocação tão boa quanto a anterior, devido a minha falta de diploma.
Pois é, eu não era formada ainda, e isso dificultava uma nova posição no mercado. Certo, eu estava começando a me desesperar, por isso não tinha preferência por hora, desde que pudesse manter alguma dignidade, é claro. Na real, só queria pagar minhas contas, garantir um teto sobre minha cabeça e ajudar minha família.
Caramba!
Sakura me ofereceu o apartamento dela, para eu ficar por uns tempos, até eu me reerguer. Dessa forma eu teria algumas despesas a menos, que seriam: aluguel, condomínio, conta de água e luz. Esses detalhes que faziam toda a diferença para o jovem proletariado. Contudo, eu não queria ser um peso e Saky também não ganhava rios de dinheiro para que eu ficasse lá sem me sentir mal. Ou seja, minhas esperanças estavam descendo pelo ralo. Assim como meu dinheiro.
Eu tinha sim uma reserva no banco, além dos direitos por ter sido demitida sem justa causa, pequenas economias que fiz durante meus longos vinte e quatro anos, renderam-me uma certa segurança. Entretanto, minhas faturas do cartão de crédito eram astronômicas, graças ao tratamento do meu pai. Após a morte da minha mãe, ele mergulhou em uma depressão profunda, fora os problemas no coração. E, obviamente, os remédios eram caríssimos. Assim sendo, eu precisava urgentemente de uma ocupação, ou minha reserva iria embora mais rápido do que eu poderia gritar "emprego".
Papai morava com minha irmã no interior e como ela não trabalhava, eu quem enviava dinheiro para as despesas da casa e tudo o mais que ambos precisavam. Era penoso, mas não tinha outra solução, não havia muitas opções de trabalho onde eles moravam e como papai precisava de supervisão constante. Hanabi ficava impossibilitada de trabalhar fora.
Por este motivo, eu lutava tanto para conseguir trazê-los para São Paulo, assim ficaríamos juntos e minha aflição diminuiria. Eu estava tão perto de conseguir, tão perto que quase podia tocá-los. Infelizmente após a minha demissão, todos os meus planos foram por água abaixo. Inclusive, ainda nem havia contado que perdi o emprego para Hanabi, porque ela já se sentia um peso morto, — apesar do trabalho de cuidar do nosso pai — e eu não queria preocupá-la. Mantinha a fé de que em breve conseguiria encontrar uma saída, antes de decretar falência. Eu sentia tanta saudade deles, da família que me restou. Às vezes pensava que meu coração sucumbiria à tristeza.
Com tudo isso em mente, bati na última agência do dia, após aquela tentativa eu iria para casa. Meus pés estavam em carne viva, por causa do sapato um número menor e eu suava embaixo do sol.
Umas duas horas depois, eu finalmente cheguei no segundo andar do meu prédio e abri a bolsa em busca da chave. Eu me jogaria no sofá, aí que delícia! Mas... como uma desgraça nunca vinha desacompanhada.
Droga.
Eu tinha certeza de que estava com ela, a tirei da bolsa para pegar a carteira e pagar o café que comprei apenas. Ué, será que deixei a chave em cima da mesa da lanchonete? Não, não, não. Eu precisava de um banho e de tirar aquelas sapatos urgentemente, ou ficaria sem as unhas dos pés.
— Caramba, cadê você. — murmurei para a chave, como se ela fosse ouvir e vir correndo em minha direção.
Percebendo que não ocorreria, já me encontrava a ponto de abrir o berreiro, quando a porta atrás de mim destrancou com um clique.
— Boa tarde, Hinata — a voz um tanto rouca de Naruto soou pelo corredor.
— Oi — escondi o rosto, para que ele não visse meus olhos marejados.
Não foi possível disfarçar a voz trêmula.
— Ei, o que houve? — em um instante Naruto estava ao meu lado, com uma das grandes mãos em meu ombro. — Por que está chorando?
— Eu não estou chorando. — funguei, sentindo as lágrimas finalmente escorrerem sem empecilho algum pelo meu rosto.
Eu não me permitia chorar, somente em situações extremas, pois quando o fazia eu perdia totalmente o controle de mim. E eu odiava perder o controle. Sobretudo quando já estava praticamente no fundo do poço, sem ter mais para onde cair.
— Certo, e por que então você está... ahn...
— Tá, eu estou chorando. — assumi, me encolhendo. — Não se preocupe.
— Vem, você precisa tomar alguma coisa para se acalmar e depois pode me contar o que houve, se quiser. — propôs todo solícito e eu quase cedi, visando me sentar em um sofá confortável por um momento.
Meus pés estavam realmente latejando, se eu não tirasse aqueles sapatos capaz de meus dedos caírem, sem brincadeira.
— Preciso entrar no meu apê e tirar esses sapatos. — resmunguei mais para mim do que para o meu vizinho.
— Tudo bem, só queria ajudar.
Comecei a chorar ainda mais, ao fuçar novamente a bolsa, constatando que de fato perdi minha chave e a reserva estava dentro do apartamento.
— E-eu pe-perdi minha chave! — choraminguei, jogando-me nos braços de Naruto.
Meu rosto se chocou contra seu peito, deixando uma mancha de lágrimas em sua camiseta azul.
Senti quando braços fortes envolveram meu corpo e eu até solucei. Acho que eu chorava por tudo o que vinha acontecendo comigo de alguns meses para cá. Desde a morte da minha mãe para um infarto ridículo, à minha demissão injusta. Por isso, quando Naruto me apertou contra si, mesmo que não fossemos tão próximos, eu senti como se tivesse encontrado o caminho de casa.
Foi bom.
— De-desculpe. — mas durou apenas alguns segundos, pois logo eu recobrei a sanidade e me afastei.
O que ele iria pensar de mim? A desesperada que saia abraçando quem visse pela frente.
— Tudo bem. — afirmou, mantendo uma das mãos espalmada em meu braço. — Entra um pouco, você precisa se acalmar. — e, muito gentilmente, Naruto me guiou até o seu apartamento.
Ele me sentou com delicadeza e disparou para outro cômodo, onde eu imaginava ser a cozinha. Voltando com um copo de suco amarelo clarinho, chutei ser de maracujá.
— Fiz esse suco hoje cedo, tá bem doce, acho que vai te fazer bem. — anunciou, me entregando o copo.
Entretanto, como minhas mãos estavam um pouco trêmulas, graças ao choro, fiquei com medo de derrubar e sujar o tapete felpudo abaixo dos meus pés. Segurei o copo com ainda mais firmeza e o levei à boca, sorvendo um longo gole. O suco realmente era de maracujá e está bem adocicado, como eu gostava. Conjecturei em pensamento se Naruto havia adoçado com açúcar ou adoçante. Mas deixei pra lá, tinha preocupações maiores para lidar agora.
— Obrigada. — agradeci, quando já me sentia um pouco melhor. — Eu perdi o controle, me desculpe. — baixei os olhos para o chão, sem querer encará-lo nos olhos.
Eu interpretei uma cena vergonhosa diante do meu vizinho, pelo amor de Deus!
— Que isso, eu ouvi o barulho da porta e... bem... quis saber se estava tudo certo. — respondeu, meio vago e senti seu olhar me queimando.
— Acho que já vou indo. — levantei-me num átimo e fiz uma careta imediatamente, meus dedinhos estavam dilacerados.
— Calma. — Naruto tocou meus braços, na tentativa de me convencer a ficar sentada. — Você mencionou que perdeu a chave, tem a cópia em algum lugar?
— Dentro do meu apartamento. — me ouvi dizer. — Preciso ver se o porteiro tem uma cópia ou sei lá...
Meu rosto estava grudando, devido ao choro e minha maquiagem devia estar toda estropiada. Eu precisava de um banho e da minha cama macia para sentir-me melhor.
Mas até isso me foi negado.
— Vou ligar para a portaria e ver se consigo a cópia.
Apenas fiz que sim com a cabeça, agradecendo mentalmente pela solidariedade do meu vizinho. Mesmo que meus pés estivessem queimando dentro daqueles sapatos malditos. Afinal, Naruto não tinha culpa de nada. Alguns segundos após, ele retornou e sua expressão não era das melhores.
— Infelizmente eles não têm autorização para guardarem cópia das chaves dos apartamentos. — suprimi um gemido de tristeza e dor. — Se quiser pode tomar um banho aqui e depois acionamos um chaveiro ou talvez possamos arrombar a porta. — brincou e não consegui evitar o sorriso que curvou os meus lábios.
Naruto era legal, como não notei antes? Talvez fosse porque ele era praticamente casado com a Shion? Ou pelo fato de eu trabalhar muito e não ter tempo de socializar com meus vizinhos? Podia ser ambas as hipóteses. Espera, cadê a mulher dele?
— Shion não vai se importar de me ver aqui? — indaguei, um pouco receosa de que ela interpretasse erroneamente minha visita inesperada.
— Ah, bom... Ela não está aqui hoje. — respondeu calmamente.
— Não quero incomodar, Naruto. — fiz menção de me levantar outra vez. — Já tomei muito seu tempo.
— Não esquenta, somos vizinhos. Eu não iria te deixar chorando no corredor daquele jeito. — abriu um sorriso preguiçoso que me surpreendeu.
Era um sorriso bonito, muito bonito.
— Aí... — resmunguei, já não aguentando os sapatos e isso não passou despercebido pelo olhar atento de Naruto.
— Está sentindo dor? — ele correu até mim e tocou minha cabeça, na sequência meus braços; e, por fim, minha testa.
— Meus pés. — falei, sem conseguir esconder minha cara de desespero.
— Machucou? — questionou ajoelhando-se na minha frente, quando cai no sofá, com os dedos implorando que eu os salvasse daquele sapato torturador.
— É que esse sapato é um número menor. — abri um sorriso sem graça, sentindo minhas bochechas queimarem.
— Então tira. — pediu, como se fosse a coisa mais óbvia a se fazer.
Eu iria tirar os sapatos no apartamento do meu vizinho? Se bem que eu tinha pisado no tapete claro da sala com os sapatos sujos. O que era pior?
— Desculpe, pisei seu tapete. — fiz uma careta de desgosto e Naruto riu.
— Esse tapete é da Shion, digamos que eu não ligo se você pisar nele agora. — seu tom soou brincalhão e eu estreitei os olhos.
— Não entendi. — pisquei várias vezes, buscando alguma informação que deixei passar.
Shion sumiu do prédio há algumas semanas, o que não me liguei muito. Com tantas preocupações, era de se imaginar que a mulher do meu vizinho não necessariamente encabeçasse o topo da minha lista de prioridades.
— Ah... — deixei escapar, finalmente entendo do que se tratava.
O relacionamento acabou.
— Tudo bem, minha irmã se muda daqui pelo menos quatro vezes ao ano, quando o aluguel do apartamento que ela alugou atrasar, ela pede perdão e volta pra cá. — Naruto correu os dedos pelos cabelos dourados e um cacho solitário escapou por entre seus dedos.
Que adorável.
Eita, volta, eu não podia achar meu vizinho adorável. Espera, eu ouvi o que acho que ouvi?
— Co-como assim sua irmã? — indaguei, congelando uma expressão de descrença no rosto, enquanto tentava assimilar a notícia.
Eu pensava que eles eram um casal! Um muito estranho, precisava admitir, mas todo casal possuía suas peculiaridades, não é?
— Você achava que ela era o que minha? — devolveu e abriu um sorriso travesso, fazendo com que eu me sentisse uma completa idiota.
— Sua mulher. — falei baixinho, mal pude ouvir minha voz.
— Você não é a única, não sei como ninguém percebe nossa semelhança. A gente é cara de um focinho do outro. — observou, sem nenhum resquício de chateação por minha gafe ridícula.
— Parando para a analisar, vocês realmente se parecem mesmo, exceto pelos olhos. — refleti com o rosto queimando de vergonha. — Desculpe pelo equívoco.
Eu era uma piada!
— Relaxa, Hinata. Você não foi a primeira a comentar esse tipo de coisa. — tranquilizou-me. — Vai tirar o sapato? Quer um pouco de água para molhar os pés? — mudou de assunto e eu quase o beijei por ser tão gentil comigo.
— Seria bom, meus pés estão me matando. — eu achava que tinha respondido com clareza, mas acredito que apenas resmunguei.
Tamanha a dor que eu sentia.
— Dia ruim?
— Muito — afirmei, e a constatação de que fracassei na missão de conseguir um emprego atingiu-me com força, piorando meu ânimo.
— As coisas vão melhorar, Hinata. — Seu tom soou tão sincero e caloroso — Não perca a fé.
Por um instante, diante daquelas palavras de Naruto, eu realmente acreditei que às coisas iriam melhorar.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro