03 - Trocada na maternidade
Entro em casa, encontrando Hellen e o noivo sentados no tapete cercados por papéis.
- Muito feio, Amor, prefiro aquele - ele aponta para um papel que está sobre a mesinha de centro, ao lado do notebook.
Me aproximo e vejo que os papéis são impressões de coisas relacionadas ao casamento. Buquês, decorações, bolos e etc.
- Concorda que é feio, sogra? - JP me mostra o papel com a foto de um buquê muito colorido e muito, muito feio.
- É... Exótico.
Minha filha faz careta e meu genro rebate, afirmando que é outra palavra para feio.
- Você acha que estão chamando uma praia de feia quando dizem que ela é exótica? - Sua voz sai impaciente e me pergunto há quanto tempo estão nesse chão. - Então, seja clara, mãe, o que achou?
- É bem... diferente.
- Ela quis dizer feio.
- Cala a boca, João Paulo!
- Ihh, chamou pelo nome completo,lp vou até sair de perto - levanta, seguindo para a cozinha e me abandonando sozinha com a fera.
- A senhora também achou feio?
- Sim - confesso com uma careta. - É muito colorido. E o pior é que nem as cores nem as flores harmonizam entre si.
Suspira e joga a cabeça para trás, repousando-a sobre o sofá.
- Eu não quero algo muito batido, mãe. Quero que seja único e que combine com JP e eu.
- Garanto que esse não combina com a gente, Amor - fala voltando com a boca cheia e um pedaço gigante de torta alemã no prato. - Acho que você deveria escolher o vestido antes de decidir por um buquê, os dois devem estar em harmoni... O quê? - Questiona diante de nossos olhares surpresos. - Andei pesquisando, ué, é meu casamento também. E você me fazia assistir Fábrica de Casamentos todo sábado, além de todos os outros programas sobre o tema, prestei atenção em uma coisinha ou outra.
Hellen sobe no sofá sorridente e agarra o pescoço do noivo, enchendo sua bochecha de beijos.
- Eu realmente não poderia ter escolhido homem melhor pra casar, sabia? Toda vez que você faz e fala essas coisas eu te amo um pouquinho mais. A maioria dos homens não estão nem aí pra o casamento, mas você fez até pesquisa.
Dá de ombros, meio envergonhado.
- Acho que todo homem que diz casar por amor deveria dar o mínimo de atenção a um momento que é tão importante para ele e a mulher que diz amar.
Minha menina deita a cabeça no ombro de seu noivo e sorri, toda apaixonada.
Peço internamente que Deus seja bom com ela e a permita viver plenamente essa história de amor.
- Bem, crianças, estou indo tomar um banho - beijo as testas dos dois e vou para meu quarto, deixando os pombinhos em paz.
Tomo um banho rápido, pensando no evento de hoje a tarde, um chá revelação para lá de cansativo. Eu não costumo ir para os eventos, quase sempre a responsável é Patrícia ou Juliano porque eles é que são responsáveis pela cozinha, ajudo às vezes, mas, no geral, fico responsável pela parte administrativa.
Além de que, doces são minha preferência e costumo assumir com mais frequência a cozinha da confeitaria.
Sendo bem sincera, eu amo muito mais a confeitaria do que o Buffet, mas eu criei ele justamente porque começaram a chegar muitas encomendas de doces para festas e casamentos dos meus clientes mais fiéis, então, após muita insistência por parte deles, e uma intensa pesquisa de mercado, resolvi atender os muitos pedidos e montar o Buffet.
Levei seis meses organizando tudo, desde contratação de pessoal até escolha da decoração do local, precisei até pegar um pequeno empréstimo porque minha renda não era o suficiente para o investimento.
Foi puxado e cansativo, mas fiquei orgulhosa quando tudo ficou pronto. Temos ido muito bem desde então, temos sempre muitas encomendas e nossa agenda vive lotada, principalmente aos fins de semana, quando ocorrem a maioria dos eventos.
Juliano é o chefe de cozinha que normalmente fica encarregado dos jantares de noivado e casamentos. Patrícia é a chefe confeiteira e normalmente fica responsável por essa parte. Juliano tem dois auxiliares de cozinha e Paty tem três auxiliares de confeitaria. Na confeitaria também tenho três garçonetes. Uma que fica das 6:30 às 14:30 e outras duas que pegam de 13:30 até 21:30.
Já na parte administrativa, tenho o apoio de Eliane que fica responsável pelo financeiro dos dois estabelecimentos. Eu, por minha vez, controlo as agendas de pedidos, faço contato com os fornecedores, cuido das redes sociais e do site, entre outras coisas. Resumindo, a parte chata é toda minha, infelizmente.
Após o banho, enrolo uma toalha nos cabelos, mesmo sabendo que irá deixá-lo cheio de frizz, e deito na cama. Abro meu Instagram e o primeiro story que vejo é de Gustavo, ele está agarrado a uma garota, cujo rosto não está visível, e beija seu pescoço, antes do vídeo mudar para outro.
Reviro os olhos.
É óbvio que esse moleque não flertou comigo, foi coisa da minha cabeça.
Passo ainda muitos minutos na rede social antes de me render ao sono.
Hellen entra quase saltitando na loja de tecidos. Minha filha colocou na cabeça que quer mandar fazer o vestido, não quer alugar um que já foi usado por outras noivas, nem um que vá ser usado por outras noivas. Quer o vestido pra ela. Afirma que daqui há dez anos irão renovar os votos e ela usará o mesmo vestido.
A vizinha do final do corredor, que é próxima a Hellen, é recém-formada em design de moda, porém muito talentosa, topou fazer o vestido.
Viemos na loja de tecidos porque minha indecisa filha quer conhecer os tipos de tecido antes de decidir o modelo do vestido. Alana, a estilista, já tem alguns croquis prontos e concordou em mostrar os tecidos para Hellen ter uma noção mais ou menos de como vai ficar. Ela tinha sugerido uma loja de noivas, mas Hellen preferiu a de tecidos.
Após quase uma hora dentro da loja, voltamos para o apartamento e minha filha informa que irá olhar os croquis novamente, fazer mais alguns buscas na internet e até amanhã dá uma resposta para Alana. A menina assente e sorri compreensiva.
Reviro os olhos quando entramos no apartamento.
- Tem certeza que é minha filha, Hellen? Nunca fui indecisa assim não, nem teu pai.
- Talvez eu tenha sido trocada na maternidade - brinca.
- Se tu não fosse tão parecida com Enrique, eu bem que acreditaria nisso.
Sua alegria se esvai um pouco.
- Queria tanto ter conhecido ele.
- Oh, meu amor... - Envolvo-a em meus braços. - Também queria que você tivesse conhecido ele. Enrique era um homem incrível, teria sido um pai maravilhoso. Mesmo sem ter te conhecido, ele já te amava muito.
Seus braços se apertam mais ao meu redor.
- Mas pelo menos tive uma mãe maravilhosa - sorrio, beijando sua testa.
- E eu tive uma filha incrível.
Beija minha bochecha e se afasta, jogando-se no sofá.
- Bora pegar uma prainha hoje?
Faço careta.
- Vamos, mãe! A gente mora de frente para a praia mas mal vamos lá. Por favor, diz que sim - faz biquinho e reviro os olhos.
- Você tem dezenove anos, Hellen. Dezenove. Agora levanta e vai se arrumar - falo sem animação nenhuma. - Não demora.
Dez minutos depois encontro-a na sala, saltitante como uma criança. Seu grito de animação me arranca mais uma careta.
- Partiu praia!
- A moças aceitam companhia?
Viro a cabeça, sorrindo para Gustavo. Não me passa despercebido seu olhar lento e demorado por meu corpo.
Estou deitada em uma espreguiçadeira, com um pequeno biquíni pink que ganhei de Hellen no meu aniversário. Tiro os óculos, erguendo uma sobrancelha e ele desvia os olhos, um pouco envergonhado.
Isso é algo raro de se ver.
- Difícil acreditar que você é mãe de uma mulher de vinte anos - comenta casualmente.
- Às vezes nem eu acredito - Hellen fala se pendurando no pescoço dele. - Tá fazendo o que por aqui?
- Vim com Bruno, mas aquele zé ruela me trocou por um rabo de saia. Estava indo embora quando vi vocês, posso ficar por aqui?
- Que qualidade de amigo é você, hein, Gustavo! Vem pra praia, perto da minha casa, e nem pra me chamar.
- Achei que tu ia resolver alguma coisa sobre o vestido de noiva.
- Fui, mas terminou rápido. E não te custava nada me ligar pra perguntar.
- E você, ao menos pensou em me chamar?
Hesita.
- Não... mas você mora longe.
- Não tem desculpa, tu poderia muito bem ter me chamado. Mas nem pensou nisso, né?
Hellen fica sem resposta e ele sorri.
- Acabou o drama?
- Acabei - responde na maior cara de pau.
Volta a deitar na espreguiçadeira e ele senta na areia ao lado dela.
- Você é tão drama queen, não sei como meu primo te aguenta. Não sei nem o que ele viu em você - provoca.
- Viu meus olhos azul esverdeado e minhas covinhas. Mas eu sempre questiono o que as garotas veem em você.
- Ué, veem meus olhos verdes e minhas covinhas, e como adicional tem o gigantesco volume na minha calça.
- Volume de ovo, né?! É só o que deve ter aí. E eu só vejo sua idiotice.
- Só vê minha idiotice porque é apaixonada pelo meu primo - vira para mim. E você, Bia, o que vê quando me olha? Meus olhos verdes ou... - pisca um olho - Cê sabe.
Sorrio.
- Vejo o menino magricelo que mijou no meu sofá porque tomou muito refrigerante antes de dormir.
Ele fica muito, muito vermelho.
Junto as sobrancelhas.
Isso é novo. Gustavo é uma das pessoas mais cara de pau que conheço, nunca fica envergonhado por nada, no entanto, só hoje já ficou vermelho duas vezes.
Um alerta liga na minha cabeça.
Eu não posso estar certa.
Por volta das 14:00 horas, decidimos voltar para casa e comer alguma coisa que não seja petisco.
Esquento o almoço que deixei pronto ontem à noite e comemos conversando. Ao final da refeição, Gustavo se voluntaria a lavar os pratos e minha filha, que de besta não tem nada, aproveita para fugir. Essa é a obrigação oficial dela desde que tinha uns dez anos.
Apesar de ser filha de uma exímia cozinheira, modéstia à parte, e das minhas inúmeras tentativas em ensina-la a cozinhar, Hellen não tem talento nenhum para a cozinha. Consegue deixar até água fervida com gosto de queimado, sorte dela o noivo ter mãos de fada.
Então, desde que ela completou dez anos e começamos a dividir as tarefas domésticas, eu cozinho e os pratos sujos são responsabilidade dela. Hellen adora quando Gustavo ou JP estão por aqui, pois os dois sempre tomam essa tarefa para si.
Hellen volta para a cozinha minutos depois, para se despedir do amigo. Avisa que está cansada e vai dormir, mas que ele pode se sentir à vontade. Gustavo nem liga, já está acostumado com esse jeito pouco hospitaleiro da melhor amiga.
- Não vai enxugar esse chão? - Reclamo após ela molhar o piso com a água que escorre de seus longos cachos.
Meu celular toca na sala e saio para atendê-lo. Minutos depois volto para a cozinha cheia de ódio.
Não sei porque ainda atendo esses números com DDD de São Paulo. É sempre a mesma palhaçada: eu atendo e eles desligam.
Estou tão distraída reclamando internamente que não percebo que o piso ainda está molhado. Meu pés escorregam para frente, meu corpo se inclina para trás e aperto os olhos, esperando a queda.
No entanto, ela não vem. Ao contrário, ouço passos apressados e segundos depois mãos fortes envolvem meu corpo. Eu vi que Gustavo estava vindo em direção a saída da cozinha, mas não achei que ele conseguiria me segurar. Seu movimento foi até arriscado, ele poderia ter escorregado também e, ao invés de ajudar, iríamos os dois ao chão.
Abro os olhos.
A respiração irregular, devido ao susto, reflete a dele. Seu peito sobe e desce rapidamente contra o meu. Nossos olhos fixam-se um no outro.
De repente o ar a nossa volta parece mudar. Seu olhar tão profundo e intenso que me faz sentir como se estivesse nua. Exposta. Não do jeito sexual, é mais uma coisa emocional mesmo. Como se ele tentasse enxergar minha alma.
Engulo seco, sentindo meu coração bater acelerado, e acho que não é mais por causa do susto. Passo a língua sobre os lábios, repentinamente secos, seus intensos olhos verdes, acompanham cada movimento.
A parte de cima do meu corpo está coberta apenas pelo biquíni e seus olhos descem do meu rosto para os seios. Desejo domina as orbes esverdeadas. Morde o lábio inferior, destacando as covinhas profundas em suas bochechas.
Sua mão grande e macia desce lentamente pelas minhas costas, arrepiando meus pelos no percurso, até o meu bumbum, ele o agarra e me puxa em ainda mais em direção ao seu corpo. Não que seja possível ficar mais colado do que já estamos. Ao menos não vestidos.
Seus olhos verdes como esmeraldas me envolvem.
Me hipnotizam.
Sugam toda minha racionalidade.
Por alguns segundos, fico em transe. Em um lapso de insensatez, pergunto-me se seria tão ruim assim, deixá-lo me apresentar sua sétima maravilha do mundo.
Percebo seu rosto se aproximar lentamente do meu, sinto meu corpo vibrar em ansiedade por algo que, até esse momento, nunca sequer cogitei ou almejei: seus lábios nos meus. Apenas quando sua boca está muito próxima a minha, me dou conta da loucura que estou prestes a fazer.
Sobressaltada, afasto-me.
Ele pisca os olhos, meio atordoado.
- Eu... Me desculpa. Eu não devia... Me desculpa - balanço a cabeça, entendendo sua confusão - Eu já vou.
Pega o celular sobre a mesa e passa por mim como o flash. Permaneço paralisada, me perguntando que merda aconteceu aqui.
Eu desejei mesmo beijar o melhor amigo da minha filha? Pensei mesmo que não era tão louca a ideia de dormir com ele.
Até poucas horas atrás desejei estar errada sobre seu interesse por mim, e agora quase beijo ele?
Jesus! Acho que estou enlouquecendo.
Enxugo novamente o chão, que Hellen tinha enxugado igual limpa o rabo dela, e vou para meu quarto.
Saio do banho bem mais relaxada, porém não menos preocupada com meus pensamentos recentes. Visto um baby doll confortável de algodão e me jogo na cama.
Assim que abro o Instagram, como uma pegadinha da vida, o primeiro post que aparece no meu feed é uma foto de Gustavo apenas de sunga mostrando bem seu... volume. Volume esse que eu senti contra mim há poucos minutos. Um óculos de sol esconde seus olhos verdes e um sorriso gigante estampa seus lábios volumosos e rosados.
Dou um zoom na foto, analisando cuidadosamente seu corpo bem definido. Abdômen malhado e braços fortes de quem vai regularmente a academia, não é nada muito exagerado apenas...
Arregalo os olhos ao perceber o que estou fazendo.
Assustada, jogo o telefone de lado e enfio o rosto no travesseiro.
- Arrgh!!! Enlouqueceu, Beatriz? É um menino, e melhor amigo da sua filha ainda por cima. Não deixe ele entrar na sua cabeça.
É oficial, estou perdendo minha sanidade.
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