Capítulo 5 - Bot0
Acordei no que parecia ser algum tipo de quarto. Na cama ao lado da minha, "O Anjo" ainda estava dormindo, eu provavelmente desmaiei depois que a salvei. Minha respiração ainda estava bastante pesada, mas já estava muito melhor que antes. Tentei me sentar na cama que eu estava, mas meu peito doía bastante, então continuei deitado por um tempo.
Tenho uma memória breve de quando desmaiei. No mesmo momento que ouvimos o som de um disparo, vi que Rick tinha chego na cobertura, seguido por mais duas ou três pessoas e então eu caí. Eles devem ter nos carregado até alguma ala especial ou um quarto vago do prédio, assim poderíamos descansar um pouco antes de nos questionarem sobre o que estávamos fazendo na cobertura e o porquê de eu ter fugido do saguão.
Não demorou muito para alguém entrar naquele quarto. Assim que entraram, fingi que ainda estava desmaiado, assim poderiam falar sem começar a me interrogar. Eram Rick e mais dois homens, talvez os que chegaram na cobertura junto com ele. Um deles parecia bastante irritado e chegou gritando:
- Eu não preciso me acalmar! - Ele parecia furioso. - Haviam dois jovens desmaiados na minha cobertura e eu nem sei o porquê!
- Mas senhor... - Dizia o outro homem, o menor deles.
- Nada de "mas"! - Ele não se importando de gritar, mesmo tendo "duas" pessoas desacordadas ali. - E você! Como deixou o seu "amiguinho" subir no prédio sem que você percebesse?!
- Eu não tive culpa! - Rick tentava se defender. - Eu não sabia que ele faria isso, muito menos que aquele outro garotinho apareceria no saguão, nada disso é culpa minha, eu nem ao menos conheço a garota!
- Pois trate de tirar informações deles, porque você é o responsável aqui!
- Não é culpa dele. - Eu disse, me levantando com dificuldade. - Eu fugir até a cobertura não estava planejado...
- Então conte logo! - Ele nem ao menos tentava falar baixo, para poupar "O Anjo".
- Ela faz parkour. - Eu inventei. - Ela estava treinando alguns saltos no topo de prédios por aqui, mas ela caiu e me ligou pedindo ajuda urgente, por isso eu subi correndo sem avisar ninguém, ela poderia ter se acidentado muito pior do que realmente aconteceu.
Criei a história na hora. Foi o máximo que eu pude fazer para que todos ali fossem liberados, inclusive Rick, que não tinha nada a ver com todo o resto. Como "O Anjo" ainda estava desmaiada, não poderiam perguntar para ela se a informação confere, por isso acabaram nos liberando.
- Eu não quero mais vocês aqui! - Gritou o maior, parecia ser o chefe. - Assim que a garota acordar, quero vocês fora!
- Mas senhor, talvez ela precise de ajuda médica... - Dizia o menor.
- Ela não precisa. - Eu dizia. - Ela não bateu a cabeça nem nada, a pressão dela deve ter caído e por isso ela desmaiou, logo logo ela deve estar de pé.
- Quando ela acordar, diga para que ela nunca mais treine esta porcaria de parkour no meu prédio. - Disse o maior enquanto saía do quarto seguido do menor. - Já não basta termos um homicídio ao lado do prédio e agora estão querendo me dar a morte acidental de uma adolescente.
Um homicídio? Então o disparo realmente matou alguém?
- Primeiramente, peço perdão por não ter subido de imediato, um garoto apareceu do nada dizendo que uma mulher havia sido baleada e chamou a atenção de todos ali... - Rick dizia bastante calmo.
O garoto apareceu enquanto eu estava subindo? Mas se o disparo só aconteceu quando eu já estava lá, o garoto devia estar falando de um outro caso.
- Em segundo, se eu for banido desse prédio por sua culpa, eu vou fazer da sua casa um salão de jogos e não estou nem aí para o que você falar. - A aparência de Rick havia mudado por completo. - Mas estou feliz que você esteja vivo... E que tenha trago ela com você.
Ambos olhamos para "O Anjo" ao mesmo tempo. Ali estava ela, viva, desafiando o que Purson havia postado. O número "2" na postagem, se realmente representava o número de mortos de novo, agora falhou. Uma mulher foi morta, mas apenas uma, desta vez o futuro foi alterado ou será mesmo que o caso que o garotinho falou sobre é diferente do caso do disparo que ouvimos?
De acordo com Bot0, "O Anjo" já devia estar morta, mas se é assim, quem é essa na minha frente?
- Já pode parar de fingir que está dormindo. - Eu disse para "O Anjo". - Eu percebi que sua respiração se alterou quando aquele grandão entrou, a gritaria dele deve ter te acordado, fora que eu te via tremendo toda vez que ele gritava mais, mostrando que você estava se assustando.
"O Anjo" se virou para nós, dessa vez com os olhos bem abertos. Sua aparência não parecia das melhores. Ela estava pálida e com os lábios secos, as olheiras dela estavam bastante perceptíveis e o olhar dela parecia o de alguém que não dormia há dias, mas mesmo assim, ela tinha um sorriso desafiador no rosto.
- Bem que eu ouvi falar que você é bom percebendo as coisas. - "O Anjo" disse. - Pena que errou em uma coisa... Eu estava acordada desde antes de você mesmo acordar. Você ronca bastante.
Ela ouviu falar de mim?
- Com uma personalidade dessas, era quase melhor deixar ela cair... - Rick dizia um pouco enojado.
- Não sei se lembra, mas fui eu quem te salvei. - Eu dizia. - Meu nome é Luis Titor.
- Como se eu quisesse ser "salva"... E esse é seu nome real? - "O Anjo" disse. - Eu gostava mais do outro, esse aí é muito "viagem no tempo".
Ela gostava mais do "outro nome"? Organizando tudo rapidamente na minha cabeça, consegui entender tudo.
- E qual seria o seu nome verdadeiro? - Perguntei.
- E não é que a moça realmente morreu? - "O Anjo" continuou me ignorando. - Eu falhei até mesmo nisso... Queria tanto que fosse eu lá.
- Atirando? - Perguntou Rick.
- Não. - Dizia "O Anjo". - Morrendo.
A personalidade dela me lembrava a de outra pessoa. O fato dela me conhecer de algum modo ainda não me dava muitas respostas, mas ela falar sobre um "outro nome" foi o que entregou tudo. As marcas de corte nela e as olheiras deixam claro que ela se corta e sofre de insônia. Ela acabou de dizer que não queria ser salva e que queria estar morta, o que mostra que ela realmente pensava em se matar, como eu imaginei quando vi a foto. Ela provavelmente gostaria de ser alguém sem sentimentos, talvez até um robô ou um programa de computador. Havia apenas uma pessoa que não tinha recebido nenhuma notificação sobre a foto do "Anjo", faria completo sentido essa pessoa ser o próprio anjo, então...
- Bot0 também não é um bom nome, é bastante vazio. - Eu dizia. - Tão vazio quanto a sua mentira.
- Que "O Anjo" estava morta? Mas eu estou mesmo... Por dentro.
Uma resposta foi alcançada, mas muitas perguntas surgiram e para elas, eu não podia ser atrapalhado.
- Poderia nos esperar lá fora um pouco? - Pedi para Rick. - Preciso conversar com ela sobre coisas que são complicadas demais...
- É, eu imagino, meu irmão falou que você iria ficar louco com aquela coisa das fotos do futuro. - Rick dizia se levantando e se retirando do quarto. - Admito que estou curioso também, mas vou deixar vocês aí, só tomem cuidado que não quero ouvir nenhuma reclamação chegando no meu ouvido...
Rick saiu do quarto e Bot0 não ligou nem um pouco para isso, ela apenas continuava lá sorrindo, como se não estivesse sã de si mesma.
- Ah, e não me chame de "Bot0" aqui, pode me chamar de Anna. - Bot0 disse. - Foi o nome que alguém me deu, nem lembro mais quem.
Por mais que partes da personalidade dela serem claramente parecidas com a versão dela online que eu conhecia, muitas coisas pareciam diferentes. A maior diferença era o quão desafiadora ela estava. A Bot0 online normalmente falava pouco e raramente brincava, a não ser sobre coisas que eram sobre "morrer". A Anna na minha frente já é bastante brincalhona e não tira esse sorriso do rosto, mesmo estando com uma aparência horrível. Durante a madrugada, quando ameacei falar sobre o significado do nome de usuário dela, ela se irritou e me disse que "O Anjo" estava morta, mas dessa vez, ela nem ao menos ligou. Algo havia acontecido com ela. Talvez...
- Estou bastante brava com você. - Anna disse. - Eu não estava sendo obrigada a me jogar de lá, eu realmente queria e você apareceu lá para dar uma de herói, mas mal conseguia ficar de pé...
- Ontem você dizia que a foto do "Anjo" era impossível, pois a garota na foto já estava morta... - Eu dizia, quando ela me interrompeu.
- Como pode ver, estou mesmo viva, mas a foto ainda era impossível. - Anna dizia brincando com o próprio cabelo. - Se eu sabia que eu estaria caindo de um prédio no futuro, era só eu evitar, não era? Por isso era impossível.
- Mas mesmo assim, lá estava você, posando para uma foto antes de finalmente cair para o seu tão esperado destino. - Eu dizia.
- Eu não esperava morrer... Ao menos não hoje. - Anna disse.
Haviam muitas perguntas à serem feitas. Finalmente eu estava com alguém que teve contato direto com quem tirou a foto. Eu podia conseguir um número imenso de respostas, mas eu precisava saber por onde começar. Se ela podia evitar estar ali, porque ela decidiu vir mesmo assim? Como ela e a mulher de preto foram até a cobertura sem que ninguém percebesse? Como ela sabia que haveria um disparo? Como ela sabia que eu era WGolding, mesmo sem nunca ter visto minha foto? Eram tantas perguntas, mas a que eu mais estava interessado, era sem dúvidas:
- Quem era aquela tirando a foto?
Aquela mulher não podia ser humana. Por mais que a aparência era com certeza humanóide, o fato dela ter desaparecido como fumaça era completamente anormal. Aquilo mudava muita coisa. Aquela mulher deixou claro uma coisa... Quem quer que esteja por trás do Purson, não é humano, é algo a mais.
Anna não se abalou pela pergunta, pelo contrário, abriu ainda mais o sorriso.
- Ela era quem realmente queria me "salvar". - Anna parou olhando para o teto. - Mas chegou um idiota e me tirou de lá.
- O que quer dizer com "salvar"? - Perguntei enquanto ainda prestava atenção em tudo que ela fazia.
- Já ouviu vozes, Luís? - Anna dizia um pouco mais séria. - Já ouviu tantas coisas na sua cabeça ao mesmo tempo, que a única coisa que você podia fazer para se manter no controle era bater a cabeça na parede até desmaiar?
A expressão de Anna ficava cada vez mais séria. Se o que ela dizia era real, então os problemas dela eram bem maiores do que eu imaginava...
- Está achando que sou louca, não é? Deve estar me "analisando", como se eu fosse um desses mistérios da internet. - Anna não tirava os olhos do teto. - Quem dera eu fosse um desses mistérios... Quem dera eu fosse qualquer coisa que não eu mesma.
- Então a "salvação" que ela te daria, era a morte? - Perguntei cada vez mais curioso.
- Por que ela me daria algo que já aconteceria comigo de todo modo? - O sorriso de Anna voltou. - Iremos todos morrer no fim, mas o que ela me daria... Era um significado para a minha morte, mas você estragou tudo.
- Eu não deixaria você morrer ali na minha frente. - Eu disse.
- Mas deixou a outra mulher morrer baleada, também na sua frente. - Anna dizia dando pequenas risadas. - Então que diferença faz? Só porque eu estava naquela foto? Ou só porque você se sentiria realizado em mudar o destino de uma foto que veio do futuro?
De fato a foto não havia sido alterada. A foto só mostrava a Anna começando a cair, mas ainda estava se segurando em alguém. Isso realmente aconteceu e eu vi a mulher de preto tirando a foto, então eu não pude mudar o destino da foto, mas...
- Eu consegui salvar uma das duas pessoas que morreriam... - Eu dizia. - Se você tivesse caído, não só ela, como você também estaria morta.
- Está falando do número na postagem do site? - Anna dizia. - Aquela moça me mostrou a verdade, Luís, ela me mostrou o futuro... E ele é absoluto.
- Pois ela mentiu para você. - Percebi meu tom de voz aumentando. - Eu consegui te salvar! Só uma pessoa morreu! Eu salvei alguém.
- Você só diz isso por causa do seu amigo. Por causa dele você sente que precisa salvar alguém, mas não é assim que as coisas funcionam. - Anna parou de olhar para o teto e se virou para mim. - Ela estava grávida.
As palavras dela pesaram demais. Era como se um enorme sentimento de culpa caísse sobre mim.
- Não adianta tentar, Luís, você não consegue superar o futuro. - Anna voltou a rir. As duas pessoas que deviam morrer, eram eu e o atirador, pois eu iria cair em cima dele... Eu iria me sacrificar para salvar aquela mulher, mas não, você teve que aparecer...
Agora que paro para pensar, na foto do "Anjo", havia duas coisas no chão, eu não tinha certeza do que eram e assumi que fossem sacos de lixo, mas então eram... Cabeças. Como a foto havia sido tirada de tão longe, não era possível ver com clareza, só a parte escura do cabelo, mas na verdade, eram eles a parte importante da foto.
- Mas ainda assim, consegui salvar alguém! - Gritei.
- Sim, agora quem estão vivos é um assassino e uma suicida, parabéns. - Anna voltou a olhar para o teto. - Não estou dizendo que você falhou na sua missão, afinal, você realmente conseguiu me salvar, o que já era o seu plano, mas... Seu plano era errado.
Eu estava completamente confuso e perplexo sobre tudo o que estava acontecendo. Já não bastavam tantos mistérios, eu ainda causei a morte de uma mulher inocente. Fui enganado completamente pela foto, assim como Dave foi enganado pela primeira. Ambas as fotos nos fez prestar atenção em algo, onde o foco era na verdade o fundo da foto. Com "O Sorriso", todos esperavam que o homem na foto era o foco e que ele faria algo, mas na verdade, o acidente aconteceu no restaurante em frente ao homem. Em "O Anjo", todos olhavam apenas para Anna caindo, onde na verdade o foco era as duas pessoas na parte de baixo do prédio.
Mesmo Anna dizendo que eu fiz o errado e que a atrapalhei, algumas coisas que ela fez durante a madrugada no chat ainda pareciam estranhas.
- Se eu não podia te atrapalhar... - Eu dizia, ainda cabisbaixo. - Por que me passou o endereço desse prédio?
Anna ficou sem reação.
- Você ainda esperava que alguém te salvasse, não é? - Eu dizia. - Você tem muitos cortes no punho, o que mostra que você realmente precisa desse tipo de dor, mas mesmo assim, você ainda está viva.
A risada de Anna havia parado. Ela agora estava séria enquanto olhava para o teto.
- Você preferia bater a cabeça na parede até desmaiar ao invés de simplesmente se matar. - Eu dizia cada vez mais sério. - Você disse que "não esperava morrer hoje", mas mesmo assim, de uma hora pra outra, você mudou de ideia e estava aqui prestes à se jogar, supostamente para salvar alguém, mas eu e você sabemos que isso não é verdade...
- Não precisa terminar... - Anna disse com uma voz triste.
- Você não queria morrer. - Continuei dizendo. - Por isso me enviou o endereço, você sabia que eu tentaria te salvar, assim mantendo você fora de perigo, pois você tem medo de morrer.
Lágrimas começaram a cair do rosto de Anna.
- Você disse que "O Anjo" já estava morto, pois você não se considera mais alguém viva, se considera uma máquina, que só vive para fazer o que lhe é obrigação. - Eu dizia sem me importante com as lágrimas no rosto dela. - Você sabia que era impossível que você estivesse aqui nesse prédio nesse horário, você sabia que não queria morrer, você deve ter tentado se esconder, mas assim que percebeu que alguém havia chego na sua casa, você me mandou o endereço e torceu para que eu chegasse à tempo. Você não estava preparada para isso, por isso ainda está de pijama, como se alguém tivesse te tirado de casa a força, ou pelo visto, te manipulado para sair...
Estava usando tudo que eu sabia, eu precisava fazer ela "quebrar", para assim conseguir as respostas que eu queria. Eu sabia que aquilo a estava machucando, mas eu não conseguia parar. Eu precisava daquelas respostas.
- As marcas de lágrimas no seu rosto mostram que você está chorando à muito tempo. Por mais que estivesse sorrindo, suas lágrimas eram de tristeza ou até mesmo de terror. Você percebeu que não conseguiria fugir daquele destino, pois te disseram coisas que lhe fizeram perceber isso, mas mesmo assim continuou chorando. Você não quer morrer, mas mesmo assim, está defendendo aquela mulher... Porque?!
- Anna Bochini. - Anna começou a dizer. - Nasci em uma família de classe média, sempre davam tudo que eu e meu irmão precisávamos. Éramos felizes, vivíamos festejando algo e rindo bastante, me lembro claramente quando meu irmão dizia que eu tinha um belo sorriso, mas sabe, dinheiro não pode comprar tudo... Há 4 anos atrás, devido à uma doença que eu tinha, precisava de um transplante de rim, nada muito anormal, mas por causa do meu tipo sanguíneo, eu precisava da doação de alguém da minha família ou de um daqueles sangues raros.
- E foi o seu irmão? - Perguntei.
- Ele se voluntariou assim que disseram que eu precisava do transplante, afinal, ele tinha uma saúde incrível e não custaria muita coisa para ele salvar a sua irmã, mas o destino me odeia. - Anna continuava a chorar enquanto falava. - Tantos transplantes de rins existem por aí, acontecem diariamente, mas mesmo assim, foi logo com o meu irmão que deu algumas complicações médicas e ele morreu. Ele havia acabado de ser aceito em uma das melhores universidades do país, havia acabado de comprar a continuação de um jogo que ele tanto gostava... Havia acabado de salvar a vida da irmã dele.
Anna saiu da cama dela e veio em minha direção, me segurando pela camisa com força. Os olhos dela não só mostravam tristeza, como uma raiva imensa. Todo o "bom humor" que ela havia mostrado à pouco desapareceu. Se eu pudesse me arriscar, eu diria que essa Anna na minha frente é a "verdadeira".
- Depois disso meus pais começaram a me culpar pela morte dele, porque ele sempre foi o favorito, ele era o mais inteligente, o que mais tinha chances de ser alguém na vida e ele tinha se sacrificado por mim. - Anna começava a gritar. - Se eu não quero morrer, é porque não quero que a morte dele seja em vão!
O sorriso aos poucos voltava para o rosto dela. O olhar dela se tornou distante, como se olhasse alguma outra coisa que não aquele quarto.
- Dois anos depois eu não aguentei o modo que me tratavam, então eu roubei dinheiro dos meus pais e fugi de casa... Até hoje não me acharam, ou sequer me procuraram. - Anna começava a rir. - Você acertou o significado do meu apelido no chat. "Bot0". Sou realmente algo inútil que só serve para gastar oxigênio que alguém melhor poderia ter, mas mesmo assim não posso me matar para não ser injusta com o sacrifício do meu irmão... E foi aí que ela apareceu.
Anna virou de costas para mim e levantou a parte de trás de seu pijama, revelando uma tatuagem: era o símbolo de Purson.
A tatuagem não parecia ser feita com tinta do jeito comum, afinal, Anna parecia ter seus 14 anos, mas também não parecia ser uma tatuagem de rena. Era como se a imagem tivesse nascido direto no corpo dela.
- Ela me mostrou o futuro, mostrou o que seria de mim caso eu continuasse com a vida que eu estivesse tendo... E me mostrou o destino que a criança que nasceria daquela mulher teria. Foi ali que percebi qual o meu propósito na vida: me sacrificar para que alguém melhor continuasse vivendo. - Anna finalmente me soltou. - O futuro dela era tão lindo, mas agora...
Eu sei que ela estava tentando fazer eu me sentir inútil, mas ela não iria conseguir. Sim, quando ela disse sobre a mulher estar grávida, eu realmente me espantei e me senti mal, mas depois percebi. Eu não consigo saber o futuro como aquela mulher que Anna fala sobre, então fiz o que eu podia... Eu consegui salvar alguém que deveria ter morrido, eu mudei o destino de alguém.
- Luís Titor. - Anna dizia. - Perdeu o pai quando mais novo, mas não se importou tanto, já que ele era divorciado da sua mãe. Acha ter uma vida boa, mas sabe que no fundo nada é tão bonito quanto você pensa. Você inveja a inteligência de Mike em diversas matérias e inveja as notas dele, você também finge não gostar mais de Camila, mas com certeza sente vontade de beijá-la novamente, inclusive ontem à noite, quando a levou para casa.
- Como sabe de tudo isso? - Perguntei à segurando pelos ombros.
- Dave era o seu melhor amigo, mas mesmo assim, você o caçoava às vezes por não ser tão inteligente e sempre agir mais pelo instinto. - O sorriso de Anna se tornava cada vez mais irritante. - Você só realmente se animou em investigar Purson depois que perdeu seu amigo, mas não faz isso para vingar Dave, você faz isso apenas para si mesmo... Você quer mostrar que é superior à ele.
Anna começou a se direcionar para a porta. Pensei em segurá-la, mas eu estava com tanta raiva naquele momento, que eu poderia acabar à machucando.
- "Luís começou a se esforçar quando perdeu David, mas só se esforçará mesmo após perder o seu segundo amigo". - Anna chegou até a porta. - Isso foi o que aquela moça me disse... Isso foi o que todos eles disseram.
Perder outro amigo? "Isso foi o que todos eles disseram"? Como ela sabia de todas aquelas coisas, coisas que só haviam na minha própria cabeça? Antes que eu pudesse chegar até ela e perguntar mais coisas, Rick abriu a porta e nos chamou.
- Melhor irmos embora logo, ouvi a voz do grandão agora à pouco e acho que ele virá para cá.
- Vamos, Luís. - Anna dizia saindo pela porta. - Você não quer deixar Camila esperando, não é?
E apenas aí me lembrei de Camila. Ela estava assistindo a stream. Achei meu celular no criado-mudo ao lado da cama em que eu estava. Ele estava desligado, provavelmente foi quando eu o joguei no chão enquanto corri para salvar Anna. Camila deve estar completamente preocupada... E isso era a última coisa que eu queria fazer para ela depois do que aconteceu com Dave.
Enquanto saiamos do quarto, percebi que Camila havia me ligado vinte-e-sete vezes. Ela com certeza estava morta de preocupação esperando que o pior teria acontecido.
- Não se preocupe. - Anna dizia. - Me falaram que ela está aqui.
- Como você sabia de tudo aquilo da minha vida? - Perguntei para Anna. - Como você sabia quem eu era, mesmo nunca tendo visto uma foto minha antes?
- São eles, Luís. - Anna dizia ainda sorrindo. - Eles me mostraram você... Me mostraram por completo.
- E quem são eles?! - Gritei segurando no braço de Anna.
- Calma lá nervosinho. - Rick dizia enquanto nos separava. - Não é porque você salvou a vida dela que você pode tratar ela do jeito que quiser...
Estávamos no segundo andar, então foi rápido chegar no saguão, onde de fato, Camila estava esperando. Camila veio correndo em minha direção com os braços abertos, ela com certeza iria me abraçar, mas Mike chegou até eu antes e me deu mais um soco, me fazendo cair no chão.
- Eu disse para você não fazer isso! - Mike gritou. - Camila chegou aqui tremendo de tanto chorar por sua causa!
O clima estava completamente pesado. Eu podia ver que Camila estava realmente chorando até pouco tempo. Depois que que a stream caiu, ela deve ter vindo para cá correndo, já que eu pude ver que ela estava soando um pouco.
- Eu sabia que ele faria isso, mas achei melhor não te dizer. - Anna cochichou no meu ouvido.
- Luís... - Camila dizia tentando se aproximar, mas Mike a interrompeu de novo.
- Melhor sairmos do saguão primeiro, ficar aqui só vai atrapalhar todos os outros. - Mike disse se retirando do saguão.
Todos concordamos e após Camila me ajudar a levantar, todos saímos do saguão e ficamos na calçada do lado de fora. Havia polícia por todo lado. Ainda não tinham achado o assassino, pelo o que deu para ouvir, os dois eram noivos, mas o homem descobriu que a mulher o traiu e que o filho provavelmente não era dele, então ele pegou a arma que ele tinha e à trouxe até aqui para que ela se explicasse, foi quando ela admitiu ter dormido com outro e então ele atirou.
- Então você é "O Anjo"... - Camila disse olhando para Anna. - O Luís realmente conseguiu te salvar...
- Você ainda precisa me responder muitas coisas! - Eu disse para Anna a segurando pelo braço. - Quem são os "eles" que falaram de mim para você?
O resto dos acontecimentos foram muito rápidos. Minha cabeça ainda doía, então foi difícil para acompanhar tudo. Mike estava discutindo com Rick ao nosso lado. Anna olhava para o alto novamente, sem tirar o sorriso do rosto. Camila limpava as lágrimas de felicidade. Os policiais ao lado continuavam investigando à cena e questionavam uma moça que dizia estar ali perto no momento do disparo. A moça tinha um filho pequeno, que estava segurando a mão dela e que estava querendo sair dali o mais rápido possível. Aquilo devia estar sendo chato para ele.
- O que leva uma mãe a deixar o filho ver uma cena de crime assim? - Mike dizia.
Nesse momento, Anna voltou a chorar, do mesmo modo que estava quando iria se jogar. Chorando, mas ainda com um sorriso no rosto.
- O seu destino é importante, Luís. - Anna dizia andando um pouco para frente. - O seu futuro é do interesse deles.
- Deles quem? - Perguntei.
- Eles estão observando tudo... - Anna dizia indo até a rua. - Os três olhos estão te observando.
A criança que a mulher estava segurando conseguiu se soltar da mão dela. Os policiais estavam tão concentrados na cena do crime, que não perceberam no momento. A mulher tentou segurá-lo, mas como ele era pequeno, conseguiu se esgueirar por meio dos carros de polícia e dos policiais ali, impossibilitando ela de o seguir na mesma velocidade.
Naquele momento, consegui entender o que aconteceria.
- Meus pêsames pelas suas perdas, Luís. - Anna disse antes de dar mais um passo para o meio da rua.
Tentei alcançá-la e segurá-la, mas Mike me segurou primeiro.
E com um sorriso no rosto, Anna foi atropelada, fazendo um carro parar e não atropelar o garotinho.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro