Acordei com o som de uma notificação chegando no meu computador. O volume não estava muito alto, mas estava alto o suficiente para me fazer pular da cadeira. Sim, da cadeira. Estava tão entretido - porém, cansado - hoje de madrugada que acabei por dormir na frente do PC.

- Mas eu não estava de fone enquanto estava usando o computador? - Me perguntei completamente sem forças.

Vi o fone de ouvidos em cima da mesa na minha frente, provavelmente acabei os tirando enquanto dormia, pois é bastante incômodo dormir com eles ainda no ouvido, afinal, não era a primeira vez que eu dormia naquela situação, então eu sabia bem qual era a sensação de deitar para um lado e ter um fone te machucando.

- Se o fone não estava no meu ouvido, então como eu ouvi o som da notificação? - Aos poucos eu ia acordando e olhando mais tudo ao meu redor.

Percebi o fio do fone desconectado do PC, provavelmente ao me mexer durante a noite, acabei esbarrando nele. Provavelmente foi quase agora, pois só ouvi uma notificação, ao invés das 67 que haviam na minha tela.

- Sessenta-e-sete notificações?! - Falei com espanto, tanto espanto que minha mãe devia ter ouvido do lado de fora do quarto.

Analisei o quarto rapidamente. Eram 6:22 da manhã, apenas poucos minutos antes do horário que minha mãe normalmente me acorda. Me acorda na cama, aliás, não na frente do PC. Se ela descobrisse que eu deixei tudo ligado a noite inteira, ela me faria dormir de novo... talvez pela eternidade. Desliguei boa parte das coisas o mais rápido possível, escondi o que não dava pra desligar rápido e me joguei na cama - que eu já havia deixado preparada - e fingi estar dormindo.

Poucos segundos depois, ela adentrou o quarto e pude ouvir ela parada perto da porta, com certeza procurando por algum vestígio de que eu havia feito algo errado, mas pareceu que ela não obteve sucesso. Ela me chamou, ainda desconfiada, mas fingi alguma voz de quem havia acabado de acordar e ela saiu do quarto. Havia sobrevivido mais um dia.

Após terminar de desligar o que faltava, fui tomar um banho e me arrumar para a escola. Quase cochilei durante o banho, eu havia ido dormir perto das quatro da manhã, conversando em alguns fóruns da internet dos assuntos mais variados. Espero que vocês saibam como é... As pesquisas na internet depois das duas da manhã não são das mais produtivas, muito menos das mais sãs.

Estava curioso sobre o porquê de tantas notificações, mas eu tinha que me arrumar para a escola fingir que estava bem acordado para a minha mãe, então eu não teria tempo para aquilo naquela hora, mas eu com certeza veria quando for intervalo na escola.

Minhas manhãs se baseavam nisso em quase todas as vezes: acordava cedo depois de ir dormir tarde, tomava banho para tentar acordar e acabava ficando mais sonolento, me arrumava e descia para a sala de jantar, onde eu encontrava minha mãe e minha irmã mais nova. Já que estou apresentando as minhas manhãs, acho justo me apresentar também.

Meu nome é Luis Titor, dezesseis anos, estudante do segundo ano do ensino médio e um viciado na internet. Não tenho vergonha de admitir isso, pois realmente sou. Não sou um recluso da sociedade e que só fica na frente do computador porque não tem amigos no mundo real, eu tenho amigos e converso com as pessoas numa boa, só gosto muito de tantas coisas que se pode ter na internet, das coisas úteis às mais bizarras, por isso passo tantas horas na frente da tela.

Hoje eu precisava ir para a escola um pouco mais cedo, precisava tratar algumas coisas à cerca de um trabalho com alguns amigos, então não parei para tomar café com a minha família, apenas peguei um lanche e sai.

Minha irmã tem doze anos e estuda em uma escola diferente da minha, então dificilmente saímos juntos de todo modo, já minha mãe só trabalha na parte da tarde, então ela aproveita a manhã para arrumar a casa. Somos uma ótima família, sem nenhum grande problema, temos um financeiro aceitável e vivemos em uma boa casa. A cidade em que vivemos é relativamente grande, há um grande centro de comércios que é um ótimo lugar para se arrumar emprego, eu mesmo arrumei um durante as férias para poder comprar o meu novo PC. Não posso negar, eu tenho uma vida legal.

Por mais que moremos um pouco longe do centro, eu moro perto da minha escola, apenas dez minutos de caminhada. Estudo em uma escola vertical, um prédio de dez andares no topo de uma pequena colina. Claro que a ideia de uma escola vertical é estranha de início, mas se não me engano, nossa escola é assim porque a empresa que havia construído aquele prédio faliu e o governo achou melhor ao invés de demolir, transformar em uma nova escola. O que foi uma ótima ideia, pois por ser grande, temos laboratórios de tudo que precisamos e na cobertura temos uma vista incrível da cidade toda.

Meus amigos estavam no saguão da escola - o térreo do prédio - me esperando. Eram dois: Camila e Mike, ambos da minha idade e grandes amigos meus. Conheci os dois no quinto ano da escola, de início não nos falávamos muito, mas logo a amizade começou, tanto que cheguei à namorar a Camila por cinco meses, mas acabamos por decidir que nossa amizade era bem melhor. Foi uma decisão de ambos.

Mas antes de me encontrar com eles, percebi algo diferente do comum. Havia muita gente no saguão para aquele horário. Mesmo as pessoas que chegam antes do horário normalmente vão para a própria sala ao invés de ficarem conversando por aqui. Haviam vários grupos de pessoas, o saguão até parecia um pouco menor que o normal com aquele número de pessoas. E todos os grupos haviam algo em comum: pelo menos duas pessoas em cada grupo estava com seu celular em mãos. Claro que usar o celular é algo comum entre adolescentes, mas não quando se está apenas conversando com amigos, há não ser que estavam querendo mostrar algo no celular, o que me fez lembrar rapidamente das 67 notificações de hoje cedo.

Talvez o resto dos acontecimentos seriam um pouco diferentes, caso eu tivesse visto aquelas notificações antes de ir para escola.

Enquanto eu estava indo em direção aos meus amigos, tentei prestar atenção no que todos estavam conversando sobre, mas como imaginei, era impossível entender, exceto por uma palavra que todos estavam repetindo várias vezes: sorriso.

- Estava te esperando chegar como se não houvesse amanhã! - Gritou Mike assim que me aproximei um pouco. - Quero muito saber sua opinião sobre "O Sorriso".

"O Sorriso", a mesma coisa que todos aqui estão falando sobre e que está deixando todo mundo bastante animado, pelo o que posso ver. Mas o que seria tão grandioso assim que eu não ficaria sabendo antes de eu ter ido dormir? É realmente possível uma notícia ter crescido tanto assim em poucas horas, horas em que a maioria das pessoas aqui ainda estariam dormindo?

- É sobre isso que todos aqui estão falando, certo? - Perguntei na hora.

- Quando vimos o saguão enchendo de pessoas, na hora sabíamos que você ia analisar todo o lugar e chegar em uma conclusão antes mesmo de falarmos algo. - Camila dizia com um sorriso no rosto.

- Mas agora quero saber o que analisou d'O Sorriso, você com certeza percebeu mais coisas que nós! - Mike estava bastante animado, quase pulando em cima de mim.

- Eu não sei qual é a desse "sorriso". - Fui sincero. - Fui dormir bem tarde e assim que acordei, tive que me arrumar para que minha mãe não descobrisse que deixei tudo ligado, por isso que nem vi o que me mandaram.

Camila e Mike estavam boquiabertos. Eles estavam realmente contanto com o meu parecer sobre aquilo.

- Eu sei que precisamos conversar sobre o nosso trabalho, mas eu poderia... - Antes que eu terminasse de pedir, os dois me interromperam.

- Você DEVE ver O Sorriso! - Os dois gritaram.

- Duvido muito que alguém vá conseguir dar aula hoje, já que todo mundo vai estar falando apenas disso... - Comentou Camila.

Peguei meu celular e conectei na internet. Haviam tantas notificações para carregarem, que meu celular chegou à travar em algum momento. Dentro de tantas notificações, eu precisava escolher qual deles realmente seria dinâmico e útil sobre o assunto. Escolhi a notificação de um amigo que faz matérias sobre notícias que fazem sucesso na internet, mas diferente da mídia normal, ele realmente ia atrás da verdade, verdade essa que muitos não sabia. Porém, para meu espanto, sobre O Sorriso só haveriam perguntas.

Assim que cliquei na notificação, uma foto apareceu na parte superior da notícia. Era uma foto normal, um homem em uma calçada que parecia estar movimentada, pois dava pra ver algumas pessoas em movimento, a foto devia ter sido tirada da calçada oposta, já que partes da rua estavam visíveis. O homem parecia estar sozinho, quase que sendo ignorado pelo resto das pessoas que passavam ao redor dele. Ele vestia uma blusa pesada, mesmo estando sol na foto. Haviam dois pássaros no chão e dava para ver o vulto de um levantando voo. Fora tudo isso, havia o sorriso estampado no rosto do homem, um sorriso um tanto bizarro, inclusive estando tão fora de lugar assim. Os dentes do rapaz pareciam podres, mas não dava para ver com tantos detalhes, exceto isso, o rapaz estava com óculos escuros, sendo impossível ver o rosto completo dele.

De início, isso era tudo que dava para ser visto naquela foto, mas com certeza o sorriso podre de um homem não seria motivo para chamar a atenção de todos na escola, havia algo mais ali, algo nas entrelinhas, então decidi olhar mais uma vez.

Ao invés de olhar o óbvio, decidi olhar para o que estava ao redor do homem. Acima do homem, havia parte do nome da loja da qual ele estava em frente, mas mesmo com apenas parte visível, consegui reconhecer que era a Eletrônicos Vision, uma loja que ficava no centro da nossa cidade. Para ter certeza que aquela Vision era realmente a do centro da cidade, no reflexo dos vidros atrás do homem dava para ver a logo de uma loja que eu conhecia muito bem. Era o logo do Restaurante Aureo, o restaurante em que trabalhei por um tempo. Já que ele estava em frente à Vision, tudo que havia atrás dele eram televisores passando exatamente a mesma coisa em cada um e foi aí que percebi a primeira coisa bizarra: pelo cenário do programa, dava pra perceber que era um programa ao vivo que passa às 9 horas da manhã todos os dias, o que explicaria o horário no qual aquela foto foi tirada, mas na foto, dava pra ver que uma certa banda estava naquele programa... Uma banda que estava convidada para se apresentar no programa de hoje. Eu tinha certeza sobre aquilo, era uma banda famosa entre as pessoas da minha sala, então todos estavam tristes porque iriam perder a participação deles nesse programa, mas mesmo assim, a foto tinha o homem na frente de televisões passando esse exato programa, o que devia ser impossível, já que ainda era apenas 7 da manhã. No momento em que percebi isso, corri o olho pela foto, procurando qualquer tipo de relógio na foto e percebi um na ponta da foto, não dava para ver ele completo, mas eu conseguia ver o importante. O horário da foto era às 9:46 do dia 21 de Abril, ou seja, daqui duas horas e quarenta-e-dois minutos.

- A foto foi tirada no futuro? - Perguntei para Camila e Mike.

- Caramba, você já percebeu tudo isso?! - Mike estava bastante espantado.

- Você só clicou na notificação fazem quase 5 segundos. - Camila também mostrava espanto. - Você já leu a matéria?

Assim que Camila disse isso, resolvi ler a matéria que meu outro amigo escreveu. Boa parte dela dizia tudo que eu percebi na foto, sem nenhum detalhe adicional sobre a foto em si, mas falava um pouco sobre a origem dela. A foto foi originalmente postada num site chamado Purson, que havia sido criado no mesmo momento que a foto havia sido postada. O horário da postagem era 4:31 da madrugada de hoje. Não havia descrição alguma na foto, até mesmo o nome "O Sorriso" foi dado pelas pessoas que viram a imagem, mas a postagem havia um nome: "59". Não se sabe quem foi o primeiro à perceber que a foto supostamente havia sido tirada no futuro, mas depois que isso foi dito, a foto viralizou em poucos minutos, inclusive para as pessoas da minha cidade, já que a foto foi tirada aqui. Ainda era incerto como uma coisa podia viralizar tão rápido em um horário complicado para a maioria das pessoas, mas isso não impediu ninguém de compartilhar ainda mais a imagem.

- Tirou alguma conclusão? - Mike perguntou.

Era muita coisa à se pensar, de verdade, mas...

- Provavelmente é falso. - Eu disse de uma vez. - A foto em si poderia ter sido tirada à qualquer momento, o horário do relógio poderia ser aquele mesmo, mas a data deve ter sido editada, o mesmo sobre as imagens nas TVs, talvez era de alguma outra vez que aquele grupo foi no programa ou coisa assim...

- Já pensaram em tudo isso... - Camila dizia. - E vários especialistas dizem na internet que não é montagem, até porque, esse grupo nunca foi nesse programa antes, hoje será a primeira vez.

- Eu não estava acreditando de início, mas antes de você chegar a Camila me disse algo que me fez reconsiderar... - Mike dizia.

- "Se eliminarmos o impossível, tudo o que resta, por mais que improvável, deve ser a verdade". - Camila recitou. - É a frase favorita dos nossos sabichões.

Camila se referia à eu e um outro amigo, Dave.

- Falando em Dave, não me diga que... - Ele também devia estar na escola nesse horário, mas o conhecendo...

- Sim, ele cabulou aula para ir até o lugar onde a foto foi ou vai ser tirada. - Mike dizia. - Ele me ligou hoje cedo avisando. Ele também disse que tentou te avisar, mas parece que você não visualizou nada do que ele mandou.

- Sei que está com vontade de ir também... - Camila dizia com um sorriso no rosto. - Vocês dois são loucos por coisas assim.

Não era bem assim. Desde que eu era mais novo, consigo analisar as coisas ao meu redor com uma velocidade, de acordo com as palavras de minha mãe: "Isso é porque você não saia da frente do video-game quando era mais novo, quando eu tava com preguiça de cuidar de você era só eu ligar a TV e pronto, você saia desse mundo". Graças à isso, percebo coisas que podem vir à acontecer com um pouco mais de facilidade que os outros, mas nada tão magnífico assim. Por acaso, certo dia eu percebi que um homem mais velho estava perseguindo a Camila pela rua, mas como eu sou bastante fraco, eu não sabia como enfrentar como aquele homem, afinal, poderia ser só um mal entendido, mas naquele momento Dave apareceu e disse: "Pode deixar que eu resolvo" e foi falar com o homem. No fim, o homem estava realmente perseguindo a Camila, ele estava tão bêbado que confessou o crime achando que Dave era da polícia. Desde então eu e Dave nos juntamos as vezes em casos assim. Eu sou os olhos e ele as presas.

- Admita Luis, você quer estar lá junto com ele. - Dizia Camila se aproximando de mim. - Vocês são a "dupla maravilhosa", hahaha.

"Dupla maravilhosa" foi o nome que a diretora de nossa escola deu para Dave e eu. No início desse ano, acabamos por perceber e deter um garoto do último ano que estava tentando uma câmera escondida no banheiro das meninas. Após o entregarmos para a diretoria, fomos recompensados com medalhas - na qual nem lembro onde coloquei - e "eterna gratidão" da nossa diretora.

Não somos "detetives" e nem tentamos ser algo assim. Tanto eu quanto Dave temos notas abaixo da média, sou péssimo em quase todos os esporter - mas sou um ótimo jogador de vôlei - e Dave tem mais animação no corpo do que força de verdade.

Infelizmente, as portas do prédio já estavam se fechando e eu não conseguiria sair de lá à tempo e eu pude perceber que mesmo enquanto todos subiam para suas respectivas salas, o assunto ainda era sobre "o sorriso".

Eram tantas coisas estranhas sobre a foto que eu nem sabia por onde começar. Qual o propósito dela? Apenas mostrar que alguém tirou uma foto de um momento futuro? Claro, se isso for real, muita coisa pode mudar no mundo, mas com certeza a pessoa que postou a foto saberia que seria difícil alguém acreditar naquilo... Não é?

Durante a primeira aula, por mais que eu tentasse, eu não conseguia me concentrar na aula, minha cabeça estava em todos esses acontecimentos. Toda essa ideia de um viajante no tempo é interessante demais e exatamente por ser tão interessante... Também parece tão falso.

- Luis, eu copio a lição e te passo depois, não se preocupe. - Camila susurrou para mim da carteira de trás. - Dave está fazendo a parte física da investigação de vocês e você precisa fazer a parte intelectual.

"Investigação". Eu nem sei do que tudo isso se trata, mas mesmo assim, estou tão interessado...

- A vida seria tão mais interessante se coisas "anormais" acontecessem, não é? - Dave me disse alguns meses atrás. - Mas não, tudo é sempre tão normal, tão comum... Por isso me animo tanto com rumores na internet, por mais falsos que sejam, gosto de tentar pesquisar sobre, mesmo tendo que recorrer à você na maioria das vezes, hahaha. - Dave mostrou um sorriso triste. - "Se eliminarmos o impossível, tudo o que resta, por mais que improvável, deve ser a verdade"... Isso é tão chato.

Por causa dessa personalidade dele acabei pensando do mesmo modo. "Coisas anormais" começaram à me chamar mais a atenção. Essa madrugada mesmo, acabei indo dormir tarde, pois várias pessoas de um país distante afirmaram terem visto um OVNI em várias partes diferentes do país, acabei por me animar com a ideia de que aquilo poderia ser real e pesquisei inúmeros sites, até chegar na conclusão de que eram apenas o exército testando aviões de combate novos.

Essa foto era diferente de qualquer outro rumor que já vi antes. Inúmeras explicações para ela vinham na minha cabeça. Talvez fosse apenas algo para divulgar algum filme novo, talvez algo para algum jogo, talvez fosse realmente um viajante do tempo. Talvez, talvez, talvez. Eu não sabia o que eu poderia considerar "impossível" para que eu pudesse eliminar. Pensar tanto assim não ajudaria em nada, eu tinha que pensar aos poucos sobre as informações que eu tinha e tentar organizar tudo.

O que mais ficou na minha cabeça, foi como essa foto pôde ter viralizado tão rápido. O site em que ela foi postada - purson.gt - havia sido criado poucos minutos antes da postagem mesmo que tivessem pago para divulgar o site, eu acho difícil que teria alcançado tanta gente que normalmente estaria dormindo. O site em questão era completamente simples, não havia absolutamente nada nele: o fundo do site era preto, não havia nomes de quem havia feito a publicação e nenhuma outra postagem havia sido feita, a única coisa um pouco fora de comum - fora "O Sorriso" - era o topo do site, onde havia o nome "Purson" escrito e logo ao lado havia um desenho que mais parecia um emoji, mas nenhum que eu já havia visto antes. O emoji era simples: um sorriso com a língua de fora, mas ao invés de dois, haviam 3 olhos. É incrível como até numa situação daquelas, um emoji pode se tornar algo bizarro. Também há a questão do "nome" da postagem: "59". Um número pode ter vários significados, inclusive numa circunstância dessas. Talvez foi a 59ª foto tirada, ou o homem tem 59 anos, ou é a 59ª tentativa de tirar uma "foto do futuro", não faço ideia nessa questão.

- E então, como está indo? - Perguntou Mike do meu lado.

Só então voltei para o mundo real e percebi que a professora já havia saído da sala. A primeira aula já havia acabado.

- Péssimo. - Fui sincero. - Tenho mais perguntas do que respostas, ou melhor, não tenho nenhuma resposta.

- Isso que você só ficou sabendo disso agora, eu vi assim que acordei e já fiquei fascinada. - Camila dizia. - Eu tinha trinta e duas notificações quando vi, até fiquei preocupada achando que eu havia feito alguma coisa errada, hahaha.

- Comigo foi parecido, mas eram só vinte e sete. - Mike disse. - E você, Luis?

- Sessenta e sete. - Eu disse de uma vez.

Nenhum dos dois mostrou algum espanto.

- Eu esperava mais... - Disse Camila.

- Admito estar decepcionado. - Mike fez cara de desgosto.

- Calem-se. - Eu disse tentando segurar o riso.

Agora que disseram... Há ainda uma outra coisa estranha em tudo isso: isso realmente seria algo que chamaria tanto a atenção de adolescentes assim? Eu entendo que algo assim pode chamar a atenção, mas com tantas notícias falsas na internet, como é possível que uma foto de um cara sorrindo pode fazer tanto sucesso?

- Ah! - Camila nos chamou a atenção. - Dave acabou de me mandar uma mensagem dizendo que ele vai tentar fazer uma stream de quando ele chegar lá.

- Por que uma stream ao invés de gravar? - Mike perguntou.

- Porque é ao vivo. - Eu respondi. - Caso algo aconteça, veremos na hora, já se ele gravar, teremos que ver só quando nos encontrarmos, isso se nada acontecer com o celular dele...

- Ele também disse que "O Luis sabe o que fazer com a stream". - Camila terminou de dizer.

Durante as aulas, caso ou eu ou Dave faltasse, o outro nunca mandaria mensagens diretamente para o celular do outro. Nos conhecemos bem o suficiente para sabermos que não podemos nos distrair no meio de uma aula, já que não temos uma nota tão boa.

Um dos nossos intervalos da escola era das 9:40 às 10:00, então se fossemos rápidos e considerando que Dave não perca o horário, talvez conseguiremos assistir a stream sem nenhum problema.

Mas se eu soubesse o que teria naquela stream naquela hora, eu à evitaria ao máximo.

A próxima professora já havia chego na sala, dessa vez era de uma matéria que eu não poderia perder, então teria que deixar "O Sorriso" de lado por um pouco mais de tempo.

Em momentos aleatórias da aula, eu ouvia alguém sussurrando sobre "o sorriso" para alguma outra pessoa e novamente comecei à pensar. Uma foto como essas pode realmente ter conseguido a atenção de tantas pessoas assim de uma hora para a outra, literalmente? Talvez eu esteja só preocupado demais... Já que a foto se passa na nossa cidade, é normal que todos estejam animados assim, eu acho.

"A vida seria tão mais interessante se coisas "anormais" acontecessem, não é?". Será que muitos pensam assim?

Mais uma vez, a aula passou rápido. Ao menos consegui entender as partes da matéria em que eu mais estava com dificuldade. Um dia insano esse em que eu entendi mais física do que sobre um mistério da internet.

- O que você desenhou na sua mesa, Luís? - Mike apontou para alguns desenhos na minha mesa, que nem eu havia percebido.

Assim que olhei para minha mesa, percebi que havia alguns desenhos na minha mesa. Eram os emojis do site Purson, mesmo tentando não pensar nisso tudo, acho que meu subconsciente não pensou do mesmo modo.

- Dave mandou outra coisa. - Camila mostrou seu celular para nós. - Ele disse que acabou se atrasando por que passou na casa da vó dele antes, ela segurou ele e ele disse que vai tentar ir o mais rápido possível para o local da foto.

- Mas a casa da vó dele não fica do outro lado da cidade? - Perguntou Mike.

- Ele nunca perde uma chance de ver a avó dele... - Respondi. - Ele sempre foi assim.

- Outra coisa, de novo para o Luis. - Disse Camila. - A mensagem diz: "Estou confiante de que hoje acharemos o "impossível"".

Ler aquilo me deixou ainda mais animado para tentar descobrir tudo que eu poderia sobre aquilo. O momento da verdade estava próximo, mas mesmo assim, eu queria descobrir por eu mesmo, ver o que aquilo era de fato ou o que poderia ser...

- Nem pense em continuar "analisando" tudo isso, Luis. - Gritou Camila. - A próxima aula é prova de História, matéria que eu sei bem que você não tem ido muito bem, então nem ouse se distrair com outras coisas!

Infelizmente, era verdade. Por causa de Dave, acabei perdendo parte do meu interesse por História, já que lá só aconteciam coisas "normais".

Se eu soubesse tudo que aconteceria, eu seria grato por todas aquelas coisas normais que haviam no mundo.

Enfrentar a prova foi mais difícil que o comum. Não só ela estava difícil, como deixar de pensar em tudo aquilo estava complicado demais. Eu sentia meu coração batendo mais rápido, eu estava realmente ansioso para aquilo, mas por que?

Terminei a prova poucos segundos antes do sinal tocar. Finalmente era hora.

Assim que a professora saiu da sala, peguei meu celular e tentei entrar no site de stream que Dave usava, só para ver que ele ainda estava offline.

- Será que ele ainda não chegou? - Perguntou Mike. - Foi tempo o suficiente para ele ir da casa da vó dele até o centro, não foi?

Devia ter sido tempo de sobra, mas mesmo assim ele ainda não estava pronto. Aquilo estava me preocupando.

Olhei rapidamente ao redor da sala de aula e percebi que os pequenos grupos voltaram à se juntar. Todos olhando para o celular de alguém. Eu iria desconsiderá-los, quando ouvi alguém dizendo:

- É sério que tem alguém fazendo um stream do local?!

Era claro que mais pessoas haviam pensado na mesma coisa. Se fosse falso, todo mundo só teria perdido um pouco de tempo indo lá, mas se fosse real, presenciar aquilo seria algo que acontece apenas uma vez na vida. Eu gostaria tanto de poder ter ido.

Finalmente a stream do Dave havia começado, ele ainda não havia chego no local exato, mas já estava na rua certa.

- Espero que todos estejam me vendo e me ouvindo bem. - Disse Dave pela stream.

Ele não podia nos ouvir, então apenas escrevi:

- A stream está perfeita. Por que se atrasou?

- Minha vó me prendeu por mais um tempo, sabe como ela é... - Dave parecia estar sorrindo ao pensar em sua vó. - Mas já estou aqui perto, percebi que não sou o único, já até consigo ver algumas pessoas no local onde o fotógrafo deveria estar.

A imagem mostrava uma calçada cheia de gente, mas consegui reconhecer a faixada do Restaurante Aureo. Dave estava do lado oposto do qual "O Sorriso" estaria, como ele disse, do lado em que o fotógrafo deveria estar. Algumas pessoas já estavam lá filmando o outro lado da rua e então algo passou pela minha cabeça: e se uma daquelas pessoas fosse o real fotógrafo que apenas se juntou com a multidão, já que com certeza haveriam várias pessoas filmando ou tirando fotos naquele momento.

- Ok, estou no local certo e estou filmando quase que exatamente o local da foto, mas como pode ver... - Dave dizia.

Não havia ninguém que sequer parecia "O Sorriso" do outro lado da rua. O programa que passava na TV era realmente o mesmo que estava na foto e a banda que todos estavam esperando estava mesmo se apresentando, mas o principal...

- Ainda faltam 2 minutos de todo modo, então vamos esperar... - Dave dizia. - Ei Luis, acredita? Há uma chance de eu ver o "impossível" aqui, gostaria que estivesse aqui, deveríamos estar passando por isso juntos, mesmo que fosse apenas para nos desapontar, hahaha.

- Me prenderam antes que eu pudesse sair. - Digitei.

Pude ouvir Dave rindo, antes de perceber algo... Três pássaros haviam acabado de pousar na calçada oposta da que Dave estava, dois deles estava exatamente no mesmo lugar que havia dois pássaros na foto...

- Ei Luis, você percebeu isso? - Dave dizia, quando algo ainda mais incrível aconteceu.

De trás da multidão, um homem apareceu, vestido exatamente igual o homem da foto, mas diferente de estar sorrindo, ele estava tampando o rosto com as duas mãos. Parecia até... Que estava chorando.

Todos na sala pareciam animados com aquilo. Só o fato de o homem já estar ali queria dizer que teríamos respostas, mesmo que não fosse sobre a foto ter sido tirada no futuro.

- Está acontecendo! Está acontecendo! - Dizia alguém perto de Dave.

Havia um grande falatório na stream, assim como dentro da sala. Havia apenas um minuto para o momento da foto, mas tudo já estava ali: a banda tocando no programa, os passáros no chão e o homem. O que me fez perceber de novo a blusa pesada que o homem usava e o porque de agora ele talvez estar chorando ao invés de sorrindo. Mesmo num dia de calor desses, porque alguém usaria uma...

E então percebi.

- DAVE, SAÍA DAÍ AGORA! - Digitei o mais rápido que pude.

- Por que eu sairia? - Dave parecia bastante confuso. - Falta só segundos antes de chegar no momento certo.

- DAVID, SAÍA AGORA! - Digitei repetidamente, até que recebi uma mensagem dizendo que eu não podia mais comentar naquela stream, devido ao spam.

- ME EMPRESTE SEU CELULAR AGORA! - Gritei enquanto arrancava o celular da Camila das mãos dela.

Tentei ligar para Dave, mas nenhuma das vezes conectava. Nem sequer chamava.

- O que foi, Luis? - Camila estava assustada.

Antes que eu pudesse explicar, alguém da sala gritou.

- É agora! O Sorriso!

Quando olhei de novo para a stream, vi que o homem estava tirando as mãos de seu rosto, revelando seu sorriso podre, assim como todos haviam visto na foto.

Assim que as mãos do homem se abaixaram, houve um flash, o que fez um dos passáros se assustar e levantar... O cenário da foto estava pronto.

- Isso... Isso realmente aconteceu... Ele realmente veio do...

Antes que Dave pudesse falar, houve um barulho imenso saindo do celular de todos que estavam assistindo alguma stream. No mesmo momento, a stream de Dave e de todos saiu do ar...

- O que aconteceu? - Foi a pergunta que várias pessoas na minha sala fizeram ao mesmo tempo.

Poucos segundos depois, pudemos ouvir o barulho de algo parecido com uma explosão vindo do lado de fora da escola e eu já sabia o que aquilo queria dizer.

Sem olhar para trás, saí correndo da sala, deixando muitos confusos e alguns me seguindo, inclusive Camila e Mike. O barulho que ouvimos poderia ter sido de uma grande explosão longe da escola, ou uma bomba pequena próxima da escola, mas com o modo que todas as streams foram encerradas do mesmo modo, eu já conseguia imaginar o que havia acontecido.

Chegando na cobertura, o que eu mais temia, aconteceu. Do topo da escola podíamos ver todo o centro da cidade, mesmo que longe e de lá, exatamente da rua onde todos estavam, havia um grande incêndio e uma imensa fumaça negra saindo de lá...

- Mas, mas, isso é impossível... - Camila dizia ao mesmo tempo que começava à chorar.

"Se eliminarmos o impossível, tudo o que resta, por mais que improvável, deve ser a verdade".

E foi naquela hora que o impossível se tornou possível. Dave havia morrido na explosão.