IX - Pandora Duncan
Pandora Duncan
Subi as pressas a escada de casa.
Eu precisava dele. Precisava desesperadamente apenas ouvir a sua voz — mesmo que fizesse apenas alguns dias que eu não o via.
Abri a porta do meu quarto como se ele estivesse em chamas e eu tivesse apenas cinco segundos para pegar o que eu precisava.
Nicole estava dormindo ali, porém seu sono era tão pesado que eu sabia que ela não acordaria mesmo que eu derrubasse um piano ao seu lado.
Retirei meus sapatos e abri minha gaveta, pegando um papel.
Não, não era nada extremamente importante para a bruxaria, porém era importante para mim naquele instante. Eu só queria me sentir segura e agora, sem Daniel, eu só tinha um homem em quem confiava.
Disquei o número com dedos trêmulos. Aquele papel deveria estar com minha mãe, porém ela pensa que o perdeu.
— O que aconteceu? Estão todas bem? — a voz do outro lado da linha me inundou de esperanças. Esperanças de que tudo poderia ficar bem.
— Pai, sou eu — eu comentei, respirando com força.
Aquela era a linha de emergência que apenas nós tínhamos. Era a linha para acionar apenas quando algo realmente estivesse acontecendo. E estava.
— O que houve, filha? — ele estava preocupado e sonolento.
— Eu... — parei de falar sentindo lágrimas em meu rosto.
— Pandora, o que houve?
— Eu descobri minha magia hoje... foi horrível, papi! Eu senti toda essa energia fluindo dentro de mim, querendo sair e de repente eu estava machucando pessoas! Eu queria machucá-las, mas não de verdade, entende? Apenas estava com raiva e agora eu não sei o que eu faço!
— Já falou com sua mãe sobre isso?
— Não. Eu tenho medo do que ela possa falar, afinal ela nunca pareceu muito animada com o fato de eu, eventualmente, descobrir minha magia.
— Fale com ela, não pode tentar entender isso por si só.
— Você acha que eu vou ficar bem?
— Sempre, minha menina, você é uma guerreira, sempre batalhando pelo que quer e fazendo o que é certo. Eu sempre vou te apoiar, em qualquer momento e situação — ele suspirou — sinto mundo não estar tão presente em sua vida.
— Tudo bem, o importante é que você ainda está aqui e você ainda é meu pai. Eu te amo, papi.
— Eu também e não se esqueça, pode me ligar a qualquer momento.
— Mesmo?
— A qualquer momento, pequena.
Eu desliguei o celular e amassei o papel contra a minha mão.
Eu estava apavorada, mas isso não significava que fosse acabar aqui, pois, infelizmente, estava apenas começando.
Começando o que?
Ouvi uma tosse forte vinda do corredor.
Oh não.
Eu queria correr, abrir a porta em um estouro e abraçar minha avó como se ela fosse a parte de mim que estava prestes a me deixar, pois ela estava.
Eu fiquei alguns segundos na porta apenas ouvindo sua respiração, ouvindo seu coração batendo, os passos de minha mãe, a cama ranger, a tosse seca... era como se eu estivesse lá e ao mesmo tempo não.
Coloquei minha mão na porta e respirei fundo quase a abrindo.
— Luna, filha, promete-me que dirá a verdade a minha pequena Viajante?
— Eu não posso...
— Você precisa! Como acha que ela viverá se não souber quem é?
— Do mesmo jeito que viveu anos de sua vida!
— Ela precisa se preparar para o futuro.
— E ele não pertence a nós.
— Sinto que está começando.
— O que?
— O fim.
Eu entrei, não aguentando mais aquele suspense.
O que estava começando? O fim? O fim do que estava começando?
— O que está fazendo aqui? — minha mãe perguntou irritadiça, principalmente quando viu minhas roupas.
— Ela está morrendo, não está? — eu indaguei, mas não completamente incerta da verdade. Eu sabia o que estava vendo.
— Pandora...
— Está, não está? — lágrimas escorreram de meus olhos.
Incapaz de mentir para mim, Luna assentiu com a cabeça e eu desabei no chão.
Não desabei por estar fraca ou por me sentir tonta. Não foi porque minhas pernas não aguentavam mais o peso de meu corpo ou que, de repente, minhas mãos pesavam chumbo. Não desabei por causa de vulnerabilidade ou de arrependimentos. Eu desabei porque Ambrose Duncan sempre foi uma figura imortal para mim e, agora, ela estava morrendo.
Ela estava morrendo quando a minha magia começou a aflorar. Será que ela estava morrendo porque a minha magia havia aflorado?
— Mãe... a culpa é minha? — perguntei com tremor em minha voz.
— O que? — ela não conseguiu acreditar em minhas palavras.
— Vovó está morrendo por minha culpa? — eu verbalizei meus pensamentos e senti as lágrimas inundarem a minha visão.
— Por que você pensaria neste absurdo? — ela colocou a mão em seus quadris me olhando com surpresa.
— Eu não sei, apenas sinto isso — deixei duas lágrimas rolarem pelo seu rosto.
— Sente errado.
Eu não respondi, apenas fechei meus olhos e quis que ela dissesse que eu estava enlouquecendo, que era mentira, que tudo estaria bem quando eu acordasse pela manhã e que tudo o que eu imaginei ter acontecido foi apenas um infindável pesadelo, mas ela não o fez.
Era mesmo minha culpa. Minha e só minha culpa.
De que adiantava ser uma bruxa se eu não poderia salvar quem eu amo? Se eu não poderia me salvar de alguém que quer me fazer mal? Se eu não tinha capacidade de impedir contratempos de ocorrerem? Se eu não conseguia apenas curar uma queimadura de cigarro?
De que adiantava ter toda essa magia que diziam que eu tinha, se, no final, eu não a controlaria? Ela não me pertencia, não de verdade.
Talvez... talvez eu devesse ser a Tate, e Aponi ser Duncan.
— Pandora! — minha mãe disse exasperada e eu olhei para cima.
Os objetos estavam convulsionando em cima da mesa assim como os quadros pareciam prestes a se jogar da parede e o tapete a minha frente queria me engolir.
Eu prendi minha respiração e levei a mão sobre minha boca.
Eu? Eu estava fazendo aquilo?
Mais algum sinal que eu estava descontrolada?
— Mamãe, o que está acontecendo comigo? — eu perguntei chorosamente.
— Tu... Tu — a voz de minha avó era quieta e falha — eu sinto muito, minha menina, é tudo minha culpa.
Eu me levantei do chão as pressas e os objetos pararam de se mover, caindo, quebrando, cortando, destruindo o quarto um dia foi um refúgio para mim.
— Pandora, eu sinto tanto por tudo o que vais sofrer daqui em diante — ela murmurou com um sorriso culpado nos lábios.
— Não diga isso, não se desculpe pelo que ainda não aconteceu! Estamos juntas nisso, como uma família — eu segurei a mão dela e de minha mãe desejando que Aponi aparecesse, como ela sempre fazia, e fechasse o círculo de nossa família.
— Tu não és apenas uma Duncan, minha menina, és mais! Bem mais...
— Mamãe... — minha mãe interveio.
— Não, Luna, ela precisa saber! — minha avó tossiu — tu és meu tesouro, meu segredo mais precioso, meu maior pesar.
— Como assim...?
— Eu nunca me arrependi de minhas escolhas até hoje. Nunca me arrependi de ter amado teu avô ou ter tido minha filha, porém eu só me arrependo de... — ela começou a soluçar enquanto chorava.
Meu coração contraiu.
— Tu nasceste com mais privilégios e responsabilidades que pessoas normais. Isso pode ser uma benção Divina ou uma maldição Infernal. Cuidado com pessoas que terão todos os argumentos do mundo para te convencerem que colocar a sua mão no fogo é o certo, mas, ouça com atenção, ainda mais cuidado com a pessoa que fores amar.
— Por quê?
— Porque o amor faz com que o mundo gire e fique de ponta cabeça e você nem perceberá isso. Não estarei contigo, porém...
— Mas eu tenho você, vovó! Você estará sempre aqui para me ajudar, não é?
— Não, não estarei, mas tu estás pronta para lidar com o mundo. Apenas... apenas saiba que terás companhia nesta jornada.
— Quem?
— Ah, minha Viajante, teu céu é mais nebuloso do que eu pensei que seria.
A/N: Segredos, segredos e mais segredos! O que elas tanto escondem?
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