Capítulo 3: Kang Seulgi
Depois de muitos abraços, sorrisos, vídeos para o Snapchat, áudio para o grupo do Whatsapp e fotos para o Instagram, as meninas me deixam sozinha novamente. Algo mudou, na verdade. Começo a pensar em uma delas, que havia pedido para que eu enviasse um áudio para o grupo do fã-clube. Uma de suas amigas está passando por um período difícil no hospital e, segundo ela, os meus vídeos ajudam na recuperação. Quase chorei enquanto enviava palavras positivas e agradecia todo o carinho e apoio.
São coisas como essa que me fazem seguir em frente, acreditar nos meus sonhos. Confiar que o que faço não é bobagem ou perda de tempo, como muitos dizem. Várias vezes já tive vontade de desistir e simplesmente jogar tudo para o alto. É tentador demais apenas deixar o mundo virtual de lado e seguir o que as pessoas esperam de mim.
Minha mãe vive me falando de como minhas irmãs vão se dar bem na vida: estudaram, encontraram um emprego, jamais deixaram Ilsan e possuem tudo para ter bons casamentos. Terão famílias maravilhosas e serão felizes. Enquanto eu estou sendo a louca, arriscando o futuro em "algo que obviamente não dará certo" ou "será passageiro".
Essas pessoas podem até estar certas sobre o meu futuro. Mas sei que não nasci para esse tipo de vida, com os mesmos planos insossos, e é cansativo demais tentar convencer a todos o tempo todo. É por isso que eu me esqueço das coisas ruins quando percebo que faço a diferença na vida de alguém.
Olho para os lados e vejo um aeroporto ainda mais cheio do que quando eu havia passado pela segurança. As pessoas estão agitadas e algumas até gritam e vociferam com funcionários do aeroporto. Pelas janelas de vidro, percebo que a chuva aumentou bastante. o céu está cinza-escuro. Isso me lembra do que as fiscais dos raios x disseram. Parece que elas estavam certas, e eu, cada vez mais azarada. Um job atrasado, uma agente brava, uma mãe insatisfeita e uma viagem pela frente que demoraria um bom tempo porque a cereja do bolo havia acabado de ser adicionada: aeroporto fechado.
Resolvo ligar para os meus pais para avisar do atraso antes que eles comecem a me ligar. Meu pai pode ser a pessoa mais tranquila do mundo, mas minha mãe é outra história. Melhor acalmá-los antes que acabem brigando. O difícil será encontrar algum lugar que não esteja ocupado. Se já tinha sido difícil mais cedo, imagina agora.
Uma movimentação que começa a se formar em um dos balcões da companhia aérea do voo chama a minha atenção. Uma mulher bem vestida gesticula e grita para uma das atendentes que, não sei como, permanece imóvel ouvindo com muita calma. Agradeço mentalmente por aquilo ter me chamado atenção, porque naquela direção localizo um milagre: um assento vazio.
Um pouquinho de sorte finalmente, já era hora!
Apressadamente, caminho em direção ao lugar vazio antes que qualquer pessoa pense em fazer o mesmo. Suspiro de alívio ao sentar e reparo que o cara do assento à direita parece bem ocupado enquanto lê algo no celular. Que bom, pelo menos não parece do tipo que conversa. Preciso fazer uma ligação para os meus pais e tentar bolar algo para o vídeo.
Procuro o celular na bolsa e, quando o encontro, torço para que a tempestade não tenha bloqueado o sinal também. Com a minha sorte, não seria impossível.
A chamada se completa e alívio e apreensão se misturam quando começa a chamar. Alívio por poder avisar a minha mãe e evitar algum transtorno, e apreensão porque falar com ela por telefone é sempre muito exaustivo.
— Seulgi? — Uma voz feminina atende no segundo toque, mas não é a minha mãe. — Já chegou?
— Annyeong! — Respondo, animada. É a minha irmã mais velha. — Ainda não, vou ficar presa no aeroporto por causa de uma tempestade. Devo chegar bem mais tarde.
— Ah, não acredito! — Lamenta ela. — Você vai furar comigo de novo! Estava esperando que você chegasse a tempo de conhecer o Taehyung.
Taehyung. O novo namorado da Joo. Ela não para de falar dele desde que se conheceram na faculdade.
— Mas eu não tenho culpa. — Tento amenizar a situação. — Tenho certeza de que a gente pode se conhecer amanhã, né?
— Terei que ver, porque ele vive para esse trabalho. — Responde ela, incerta. — Mas acho que consigo ser convincente. — Tenho quase certeza que ela está sorrindo de forma apaixonada do outro lado da linha.
Antes que eu diga qualquer coisa escuto minha mãe pedindo para Joohyun passar o telefone para ela.
— Fala com a nossa mãe, senão ela me mata! — Minha irmã se justifica. — A gente combina tudo depois!
Não consigo responder dessa vez, porque minha mãe logo vocifera:
— Seulgi! Que história é essa de você chegar mais tarde?
— Tô presa no aeroporto de Tóquio. — Prefiro explicar tudo logo. — Acabaram de fechar por causa da tempestade. Liguei só pra avisar e preciso desligar por causa da bateria.
Eu mordo a língua pela mentira, já que estou sentada ao lado de uma torre de tomadas.
— Minha filha, poderia ter mandado mensagem se fosse só para avisar e não querer conversar com a própria mãe!
Tenho quase certeza de que a voz exasperada dela havia sido ouvida pelas pessoas a minha volta, então dou uma olhada insegura para o-cara-do-celular. Ele com certeza ouviu, pois desvia rapidamente o olhar com a testa franzida. Era só o que me faltava!
Certo, eu deveria ter previsto a reação, mas sabia que se mandasse apenas uma mensagem, seria taxada de insensível do mesmo jeito, ou pior, a mensagem poderia nem mesmo chegar, aí sim eu iria escutar.
A confusão no balcão da companhia aérea começa a ficar mais tensa, e assim eu arrumo um bom motivo para desligar.
— Mãe, tá uma confusão enorme aqui e eu realmente preciso desligar.
— O QUÊ? Você não vai fazer isso comigo. — Grita mais uma vez. — Além disso, preciso contar as novidades sobre o filho do primo do seu pai, que vai passar o final de semana aqui também. Ele é muito rico, sabe?
Ela continua a falar sobre o cara solteiro querendo conhecer a cidade e que eu poderia ser a guia, mas paro de prestar atenção.
— Mãe! Não sou guia turística e preciso trabalhar também, ok?
— Mas querida, ele é um gato! Vai herdar toda aquela fábrica de cerveja do seu tio. — Conta, maravilhada.
Reviro os olhos com o comentário. Seria um longo final de semana com mais uma tentativa de empurrar um cara rico para cima de mim. Como se eu realmente precisasse de mais essa.
— Tá, a gente conversa depois. Preciso desligar. Beijo, tchau — não espero que ela responda e encerro a ligação.
Suspiro massageando as têmporas enquanto me jogo no encosto. É cansativo demais.
— Você não deveria falar com a sua mãe desse jeito.
É o-cara-do-celular.
Olho para ele sem acreditar em tamanha audácia. Quem ele pensa que é para dar conselho? Será que ele me conhece? Eu realmente não preciso de mais rumores sobre a minha vida na internet. Já estou acostumada com mensagens nas redes sociais falando sobre como eu deveria me vestir, falar ou fazer, mas isso é na internet. Ninguém tem o direito de falar sobre a minha vida pessoal, ainda mais um cara totalmente desconhecido e bem inconveniente.
— O quê!? — Digo sem ter condições de falar qualquer outra coisa para o intrometido. Quem ele pensa que é?
Enquanto ele estuda o que vai responder, eu observo mais atentamente dessa vez. Ele não deve ter mais do que 25 anos, mas carrega um ar de cansaço; as roupas de escritório não combinam com ele. Os cabelos negros e olhos cinzas que, por mais que ele se mantenha neutro, denunciam um sentimento de preocupação e tristeza. Os olhos destoam da imagem que ele quer passar e isso me confunde, até mesmo me distrai.
— Sua mãe. Você não deveria falar com ela desse jeito — repete ele.
Eu olho confusa, pois por alguns segundos havia me esquecido do que estávamos falando.
— E o que você tem a ver com isso mesmo? — Pergunto sem esperar por uma resposta. — Ah, é! NADA!
Os olhos cinzas, que até pouco tempo transmitiam algum conforto, ficam opacos.
— Não tenho nada a ver com isso — admite. — Só achei que... — Ele encara as mãos por alguns segundos, endurece o maxilar e completa: — Quer saber? Esquece.
Fico tão confusa com o comentário pela metade, que minha irritação pela intromissão é substituída por irritação de curiosidade. Se tem uma coisa que eu não gosto é que comecem a falar e não terminem.
Ameaço responder, mas as palavras não saem da minha boca. Quando percebo que ele já voltou a mexer no celular, não me parece mais uma boa ideia continuar aquela conversa. Nem pela curiosidade.
Ficamos em silêncio. Eu pensando no que poderia dizer, mas orgulhosa demais para voltar a falar qualquer coisa.
Continua...
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