Stigma
Dia 11 - Tema: Relacionamento Falso
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Agora chore, é só que eu realmente lamento muito por você
Mais uma vez, chore, porque eu não consegui protegê-la
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GATILHO: CAPACITISMO, DEFICIÊNCIA FÍSICA.
Choi Ji Yoon, 24 anos, a pessoa mais inteligente e corajosa que eu conheço. E a mais encantadora também. Apesar dessa última coisa eu nunca ter dito a ela. E agora como ex-amigos seria difícil dizer sem que ela achasse que eu quero algo ou levar vantagem. E a culpa era minha mesmo. Pra ficar com a menina mais bonita da escola e andar com os populares, eu ri dela publicamente, usando da sua deficiência. Me arrependo amargamente, mas até eu sabia que o perdão que eu pedi depois foi insuficiente. Agora são cinco anos sem ela e andando com os trogloditas acéfalos, como ela mesma os chamou. E não estava errada, como sempre. Acho que só aguentei esses quatro anos da faculdade porque comecei esse plano de denúncias e porque posso ver a Ji Yoon todos os dias. Se não, já tinha mandado todos meus pseudo amigos tomar no cú. Mas aí não teria visto um por um saírem ou expulsos ou depois de pressão popular da faculdade, só ficando mesmo os puxa-sacos inofensivos de sempre e eu mesmo. E agora era a vez do reitor. Seriam os melhores dois meses da minha graduação. Eu estava certo disso.
-- Ele falou isso é?
-- Sim. Falou também que era por isso que eu te defendia do bullying.
-- Obrigada de verdade, oh magnânino Taehyung, por ter dito a eles que minha vida de deficiente já era patética o suficiente e que não precisavam me zuar.
Ela tinha ouvido aquilo? Que merda! Pensei em me defender, mas provavelmente sairia pior.
Ela olhou para os lados e soltou minha mão. Peguei-a de novo.
-- Não precisa mais segurar minha mão. Já saímos de perto da faculdade.
-- Melhor não arriscar. Vai que encontramos alguém por aí?
-- Tenho certeza que você consegue inventar mais alguma desculpa. -- Disse soltando a mão da minha novamente agora a enfiando no bolso. Pensei em usar a velha desculpa de que queria ajudá-la a se deslocar melhor, contudo sabia que seria xingado e ouviria que ela não era incapaz.
-- Eu ainda não entendi porque vamos no hotel da sua prima.
-- Você me falou que precisava de um álibi. É onde vamos conseguir um pra você. Lá eu te explico melhor.
Eu sabia onde ficava esse hotel. A prima de Ji Yoon era bem mais velha e quando crianças costumávamos brincar por lá. Quando estávamos chegando perto do lugar, Ji Yoon voltou a pegar na minha mão.
-- Mas o quê?
-- Fique quieto e sorria pra mim. -- Ela mesma disse isso com um sorriso no rosto. Sorriso um pouco maníaco, porém um sorriso, o que me fez sorrir de verdade pra ela.
Entramos no hotel e na recepção estava Choi Gi Rin, a prima dela, que pela minhas contas estava com 40 anos ou quase. Sorriu pra gente.
-- Olá meninos! Muito bom te ver de novo Taehyung! O quarto de vocês está pronto. -- Entregou pra Ji Yoon uma chave, enquanto a mim, tentei manter a aparência de normalidade, como se sempre fosse a hotéis com a Ji Yoon depois de adultos, entretanto minha cabeça gritava: que caralhos está acontecendo aqui?
A segui pelos corredores do hotel e paramos na frente do quarto de número 15. Ela olhou discretamente para todos os lados antes de me perguntar:
-- Tem alguém atrás de mim?
-- Não.
-- Certo, agora me beije. -- Ela pediu sorrindo.
-- Quê?
-- Vamos lá Taehyung... Talvez seja difícil pra você, mas faz parte do plano. -- Ela disse aquilo quase sem movimentar os lábios, ainda sorrindo.
Finalmente compreendi que era um tipo de encenação, assim como tínhamos feito na faculdade naqueles últimos dias. Só não entendia porquê ali, se não havia ninguém vendo. O sorriso de Ji Yoon começou a esmorecer em meio a minha hesitação. Ela abaixou a cabeça.
-- Tudo bem... -- Desistiu, se virando para abrir a porta.
Nessa hora, algo deu um clique na minha cabeça e levantando o rosto dela eu a beijei. E algo inesperado pra mim, mas parece que pra ela também, aconteceu. Uma fagulha. Meu coração disparou, como a muito não acontecia.
Ji Yoon tropeçou ao meu encontro e eu a amparei, interrompendo o beijo fake mais real que já tinha visto. Ela parecia um pouco assustada me olhando agora. Deu um pequeno soluço antes de dizer:
-- Vamos. -- Abrindo a porta. Entramos no quarto e ficamos em silêncio um tempo, no meu caso pensando no que acabara de acontecer.
-- Então... Qual o plano? -- Quebrei o silêncio que já se prolongara demais. E ela começou a me contar o plano mais insano que já tinha ouvido, e olha que eu entendia de planos insanos.
-- Você precisava de um álibi pro dia em que gravou o reitor oferecendo as alunas para aqueles figurões certo? E seus amigos inúteis já tinham espalhado pra todo mundo que você não tinha ido na festa que seria seu álibi inicial e você resolveu me colocar nessa. Pois então, a assistente do reitor me procurou ontem pra perguntar se eu estava realmente com você no dia. Estão mesmo desconfiando de você.
-- Eu te disse!
-- Ok. Contei que a gente tinha vindo para o hotel naquele dia. Por isso te segurei na faculdade hoje até aquele horário, pra gente estar aqui agora...
-- A mesma hora do "jantar de negócios" do reitor sábado passado...
-- Sim. -- Ela se sentou na poltrona no canto do quarto. -- Já entendeu o resto?
-- Não.
Ela suspirou.
-- Depois da minha conversa com a assistente pensei em um plano para caso eles não acreditem na minha palavra.
-- É possível, porque você é uma péssima mentirosa.
-- Ah cala a boca! Voltando ao plano: você é um cara extremamente sortudo porque analisando as câmeras de segurança aqui do hotel e o livro de registro daquele dia, não havia nenhuma movimentação aqui no corredor do quarto 15, o que vai ser fácil pra mim trocar as imagens daquele dia pelas de hoje. Minha prima já está ciente, aliás. Só trocar o dia do frame de hoje e colá-lo no do último sábado. Qualquer amador consegue fazer isso. E eu não sou amadora.
Só pude sorrir.
-- Pensou tudo isso pra me ajudar?
-- Não. Eu também quero que o reitor se foda. Aquele escroto. E também fazendo isso, se vierem procurar essas imagens, como desconfio que vão, verão que realmente estivemos aqui e aí você nem precisa continuar com essa farsa de namoro. Só falar que sentiu pena da aleijada e resolveu fazer um favor pra ela. -- Ela já tinha começado a jogar algum joguinho no celular ao me falar aquelas coisas
-- Não fala assim...
-- É mais crível do que falar que você está apaixonado por mim, ou algo assim. Quem vai acreditar nisso? -- Deu um sorriso sarcástico.
-- Ji Yoon... -- Ela me ignorou. -- Ji Yoon... -- Insisti, mas ela continuou me ignorando. Levantei da beira da cama e fui até ela, lhe tirando o celular da mão.
-- Hei! Me devolve! -- Tinha finalmente a atenção dela, que se levantou da poltrona e tentou tirar o celular da minha mão, sem sucesso, pois eu era bem mais alto. O passo dela vacilou tentando recuperar o celular, sua perna esquerda era meio travada, assim como todo o lado esquerdo do seu corpo, e isso só depois de muitos anos de fisioterapia por causa da paralisia cerebral, e agora ela só tinha um leve manquejar, mas que em situações como essa em que a coloquei poderia acontecer um acidente. E foi o que aconteceu. Ela se desequilibrou e se eu não tivesse sido rápido ela teria caído.
-- Me solta Taehyung... -- O rosto dela começou a ficar muito vermelho e os olhos dela olhavam tudo menos o meu rosto.
-- Você quase caiu...
-- Por sua culpa, mas agora eu tô bem. Me larga.
-- Algum dia você vai me perdoar? -- Disse, soltando-a enfim.
-- Eu não tenho nada contra você... -- Tirou o celular da minha mão e o colocou no bolso.
-- Mentira!
-- Eu prometi pra mim mesma que não ia deixar o que você falou pra mim continuar me afetando, mas sabe que você me procurar só pra pedir ajuda, me fez ver que isso é muito difícil. E eu sou tão trouxa que te ajudei, então eu acho que posso escolher o desfecho de tudo isso, certo?
-- Mas eu nunca achei tudo aquilo que disse de você verdade...
-- O que é pior. -- Agora ela chorava. -- Quer dizer que mesmo não achando aquilo tudo de mim, a minha amizade podia ser descartada pra sua ascensão social. Ah não, como poderia esquecer? Você me pediu perdão e queria ser meu amigo escondido, o que mostra que você achava sim tudo aquilo de mim... -- Ela limpou os olhos. -- Pode ser estranho pra você, mas mesmo não sendo o padrão estético eu gosto de mim. Mesmo acima do peso, mesmo com os cabelos curtos, mesmo com uma deficiência, eu gosto de mim. E você não vai tirar isso de mim de novo. Eu não vou deixar.
-- Eu sinto muito.
-- Isso é pouco.
-- Eu sei. E nunca soube como me aproximar de você de novo. Ainda mais que aquelas pessoas com quem comecei a andar eram péssimas. Eu nunca me senti tão sozinho como nos últimos anos.
-- Coitadinho.
Ignorei o comentário sarcástico.
-- A única coisa que consegui pensar pra me redimir foram as denúncias e não deixar eles te envolverem no bullying, mesmo sendo cruéis algumas coisas que eu falei. Perdão de novo. Imaginei que seriam coisas que você aprovaria se soubesse.
-- Quando percebi que podia ser você fazendo um rebuliço por semestre, só pensei que você era muito burro, se metendo em confusão que nem era sua.
Comecei a ficar triste pela amargura na voz de Ji Yoon, até que ouvi:
-- Mas era uma burrice boa.
-- Você acha? -- Uma ponta de esperança.
-- Só digo que não fez mais que a sua obrigação. Andar com aquele pessoal e deixar eles fazendo o que queriam seria demais de mau caráter.
-- Sim... -- Concordei. -- Eu errei Ji Yoon, fui um escroto filho da puta, mereço tudo isso que você falou pra mim e mais ainda, só que não quero terminar nosso namoro falso desse jeito que você falou. Eu não vou conseguir...
-- Então você quer fingir que somos namorados por dois meses? Pra quê?
Ela tinha chegado na pergunta que revelava o meu verdadeiro grande plano.
-- Pra gente voltar a ser amigo. -- E talvez algo mais, uma idéia que começava a se formar no fundo do meu cérebro depois do beijo trocado. -- Porque eu sinto muito a sua falta, porque eu ainda quero fazer o melhor jogo de videogame do mundo, mas tem que ser com você, a pessoa mais inteligente, corajosa e encantadora que eu conheço. Eu podia ter pedido a ajuda da minha mãe a respeito do álibi, acho até que seria mais simples. Meu verdadeiro plano quando soube que eles estavam desconfiando de mim, foi você voltar a falar comigo.
Um olhar incrédulo.
-- O quê?!
-- Sim, as aulas estão acabando, me bateu uma tristeza de saber que talvez eu nunca mais te veria, por isso usei essa história toda pra você me ajudar. Assim como você me ajudava na escola... -- Porque essa era a verdade, era ela quem me ajudava, sempre. E não o contrário.
Sentar depois de ouvir aquilo foi a reação dela. Silêncio. Silêncio. Silêncio.
-- Não vai dizer nada?
-- Você é maluco Taehyung...
A resposta dela me deixou cabisbaixo.
-- Mas se você quer voltar a ser meu amigo, não precisa dessa história de namoro...
Me sentei na frente de Ji Yoon.
-- Aí é que está. Para o plano da faculdade precisava que fosse, pois eu não tenho amigas mulheres, mas pro grande plano só a amizade de volta estava ótimo, até hoje...
Ao ouvir aquilo ela levantou a cabeça e me olhou.
-- Do que você está falando?
-- Do beijo lá fora. Você não sentiu?
Num pulo, ela se colocou de pé, quase perdendo o equilíbrio de novo.
-- Não sei do que você está falando... -- Se afastou de mim.
-- Não mesmo? -- Me levantei também. -- Então te desafio a nos beijarmos de novo. -- Desafios eram o ponto fraco de Ji Yoon.
-- Você é maluco. Esse desafio não tem propósito. Diferente do beijo de lá de fora, que era um fingimento pro vídeo.
-- Se foi somente fingimento, é só a gente se beijar de novo pra tirar a teima. Tem lógica. -- Dei de ombros, reparando no nervosismo dela, que já me dizia muito.
-- Certo. -- Ela veio marchando na minha direção e se colocando na ponta do pé direito encostou os lábios rapidamente nos meus, me pegando de surpresa. -- Viu? Nada aqui. Isso é louc...
Interrompi a frase dela quando segurei o seu rosto novamente entre as mãos e encaixei meus lábios nos dela. De novo a fagulha e os olhos arregalados da minha amiga, que capitularam um segundo depois fechando-se e levando os meus com eles. E o beijo que havia começado doce como o outro se transformou em uma exploração lenta não só dos nossos lábios, mas de toda a extensão interna das bocas e das línguas. Puxei Ji Yoon mais pra perto de mim pela cintura e ela enfiou sua mão direita nos cabelos grandes da minha nuca, me acariciando com os dedos e me puxando mais pra perto também.
Parei de beijá-la só pra recuperar um pouco de fôlego, mas ela me impediu de continuar beijando-a. Foquei meus olhos nos dela. E pela primeira vez vi aquilo nos olhos de Ji Yoon. Medo.
-- Isso é loucura Taehyung...
-- Eu sei... -- Contudo, disse a única coisa que sentia naquele momento. -- Mas parece a evolução certa pra isso que sentimos um pelo outro. Se eu não tivesse sido um cuzão com você, era isso que teria acontecido, só que mais cedo. Eu não sou mais um menino Ji Yoon-ah, agora eu sei bem o que eu quero. E é você.
A abracei também sentindo medo, mas de uma natureza diferente do medo dela. Meu único medo era perde-la de novo.
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Mudei o nome desse. Stigma combina mais com essa estória. E é mais antiga também. Aliás, caso realmente consiga escrever uma long ou short fic dela, será esse o nome, Stigma.
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