Capítulo Dez: Presentes, bolos de glacê azul e bonecos de areia
Presentes, bolos de glacê azul e bonecos de areia, mas antes, bem vindo de volta
Sábado, 27 de abril de 2024
Seungmin apontou o dedo no meio da cara de Kevin e esbravejou:
— Porra vira gente, cara. Quase trinta anos nas costas e não sabe nem viver em sociedade?! Caralho, aí é foda né.
Bangchan massageou sua têmpora, como se pudesse afastar a dor de cabeça que seria seu melhor amigo discutindo com aquele homem. E sinceramente? Nem era culpa do Kim. Kevin e ele naturalmente não se bicavam, e Seungmin hoje estava com o temperamento semelhante ao de uma bomba relógio, com a infernal visão do outro transformando o dormitório antes muito equilibrado num verdadeiro retrato do antepenúltimo inferno de Dante, as coisas com certeza iriam sair de seu controle.
— Seungmin... — o australiano tentou alertar, mas foi ignorado.
— Tu nem é desse dormitório e tá procurando briga — Kevin foi para cima do estudante de arquitetura, alterando a voz. — O que é que tu quer, em porra? Tá mordidinho é? Vai querer brigar?
Bangchan se meteu entre os dois antes que fosse tarde demais, sua mão afastando levemente Kevin pelo peito. O que ele menos precisava era de uma briga no meio do apartamento.
— Ou, tão ficando doido? — seu outro braço afastou seu melhor amigo, sua voz alertava aos dois — Seungmin, sai por favor e Kevin, dá uma maneirada ai que realmente tá difícil te aguentar.
— Isso, obedece o teu namoradinho aí — cuspiu Kevin com todo o desdém, o erro de Bangchan foi dar um passo para o lado e achar que Seungmin não cederia a provocação.
Os olhos do moreno se estreitaram em puro ódio enquanto sibilava, apertando o punho ao lado do corpo. Bangchan conhecia aquela reação...
— Pera. Repete aí que eu não escutei...
— Claro que não escutou — sorriu, cheio de dentes a mostra. — Seu viadinho nojento!
Kevin cuspiu no chão bem na frente dos pés de Seungmin.
Bangchan foi empurrado para trás. Seungmin avançou com um soco na cara de Kevin, antes que a reação piorasse Chan se equilibra e corre para segurar os braços de Kevin, os colocando para trás do corpo enquanto ele se debate em suas mãos. Chan era mais forte, sabia disso.
— Seungmin sai da porra do apartamento! Pelo amor de Deus!
O moreno ia sair, mas antes olhou para Kevin com todo o desdém do mundo. Ele se retirou batendo a porta. Kevin se debateu, logo tendo os braços soltos.
Estava irado.
Nem Bangchan entendeu ao certo como aqueles dois se desentenderam tão rápido, mas o fato é, aquela briga com certeza ainda iria render mais socos.
Juntando sua bolsa do sofá ele calçou os sapatos, vendo Kevin desaparecer em direção ao seu quarto enquanto a mão massageava onde foi golpeado. A porta de seu quarto bateu, houve barulho de alguma coisa caindo e então silêncio. A oração calada que o australiano fez após sair deveria ser suficiente para manter suas coisas vivas.
Lee Minho [02:16pm]
Oi estou aqui embaixo
Chan visualizou, mas não respondeu.
Seu peito estava doendo onde o Kim lhe empurrou.
Ao fechar a porta do apartamento viu seu melhor amigo encostado na parede. Aquele corpo magro escondido em roupas largas mentia o tanto de força e sede de briga que o estudante de arquitetura tinha. O australiano suspirou.
— Vem — ele passou as mãos pelos ombros de Seungmin, o empurrando consigo —, o Minho chegou.
O tempo no elevador foi silencioso, na saída só houve um educado tchau ao porteiro – que dessa vez não era o senhor Xian – e ao entrar no carro Chan fez as devidas apresentações, mas o clima nitidamente estava pesado.
— Minho esse é o Seungmin, meu melhor amigo. Seungmin, esse é o Minho. Meu noivo.
— Oi, boa tarde. Prazer em conhecê-lo.
Eles trocaram um aperto de mão enquanto Minho desejava boa tarde, não evitando observar que os nós do dedos do rapaz estavam vermelhos. Ele era mais alto que Chan, cabelos pretos e roupas largas, seu rosto lembrava o de um cachorrinho, ele parecia irritado com algo.
Minho não insistiu no pensamento, passando o celular para a perna de Chan enquanto o mesmo colocava o cinto.
— Bom, — o Lee bateu os dedos no volante — para onde vamos primeiro?
— Minha consulta — Chan colocou para tocar Caso Sério, de Rita Lee. Seus olhos voltaram para Minho num puxar de lábios amigável — De lá nós vamos rodopiar nos armarinhos que tem por perto. Que acha Seungminnie?
— É bom — respondeu com a voz distraída.
Os noivos trocaram uma conversa silenciosa de que ali havia algo errado enquanto as sobrancelhas franzidas de Chan e o leve balançar de cabeça pediam a Minho para não falar nada.
— Você devia ter deixado eu socar o Kevin mais uma vez — resmungou, os braços cruzados como quem foi impedido de lançar o maior tratado de paz do mundo. — Tenho raiva acumulada, agora vou ter que ir treinar senão vou virar uma bomba daqui pra amanhã.
Bangchan coçou entre as sobrancelhas.
— Olha, vocês poderiam ter caído no soco e se matado, mas não dentro do apartamento, sabe?
— Queria não saber.
Minho deu uma risadinha.
— É aquele seu colega de quarto? — perguntou a Chan. — Sabia que dei a ele uma solução, Seungmin? Eu o chamei para ficar em minha casa. Ele negou.
Aí porra, agora o inferno tá montado!
— Veja bem, eu não quero
— O Bango tem síndrome de não querer atrapalhar — Seungmin interrompeu seu melhor amigo, o olhar que Bangchan recebeu da parte de Minho foi acusatório —, aí ele prefere morrer do que aceitar ajuda. Por isso eu fico com a parte de sair no soco pelos direitos dele.
— Vocês são dois boca de praia!
— Mas veja bem — Minho ignorou o bico de Chris, se direcionando ao melhor amigo de seu noivo — os preparativos do casamento vão começar e ele vai precisar ficar comigo. Irei convencê-lo a sair daquele inferno, conto com seu apoio Seungmin.
— Conte com o apoio e os punhos, Minho.
— Melhor ainda.
— Pelo visto — Bangchan cruzou os braços — meu direito de escolha morreu, né?
Seungmin deu de ombros, Minho guardava um sorrisinho convencido nos lábios.
A sincronia dos três era um pouco estranha, Minho e Seungmin se deram bem com facilidade, porque o Kim é alguém naturalmente ácido e muito brincalhão, parecido com o jeito de Minho. Bangchan gostava disso. De ter Minho conhecendo seus amigos, as pessoas que significavam uma parte de si.
Já na clínica, os dois aguardavam por Chan na recepção quando Seungmin, após grandes minutos refletindo em silêncio, falou:
— O Chan é alguém difícil de realmente adentrar no coração. Ele é querido e educado, tem esse jeito de manteiga derretida, mas leva tempo até ele deixar você cuidar dele de fato. Sabe a pessoa falsamente aberta? — ele inclina a cabeça como quem analisa seus próprios pensamentos — Nós levamos tempo para conseguir fazer ele se abrir de verdade e deixar desabar. Ele é alguém fantástico, carinhoso, criativo, prudente e calculista. Eu espero que vocês saibam conviver. E que isso se torne algo bem fundado e duradouro.
Minho considerou essas palavras, todas elas, e quando ele achou que havia acabado, Seungmin continuou:
— Saiba amar até as partes mais feias e problemáticas dele, todos os surtos ansiosos e as cobranças excessivas. Se você não puder amá-lo, não importa o contrato, nem nada que vocês acordaram, se você não pode se dar totalmente por ele, não dê nada. É oito ou oitenta.
— Por quê diz isso?
Seungmin dá de ombros, como se a resposta estivesse em caixa alta na parede branca à frente deles e Minho insistisse em não enxergá-la.
— Porque todos merecemos ser amados por completo. Você. Ele. Não significa que amores passados não deixaram feridas — ele diz, brincando com a capa do próprio celular, desenhando as bordas do rostinho de Pochacco —, mas que você saiba valorizar o seu amor que virá. O Bango tem ultrapassado alguns limites por você, um dia você vai conseguir enxergar isso e eu espero não me arrepender de apoiar vocês nesse casamento.
Minho assentiu, guardando com sinceridade os conselhos de Kim Seungmin. Ele fala como um velho sábio, os olhos detentores de uma vida para além dessa. Lee Minho achou fascinante.
— Você é um excelente amigo, Seungmin. Um excelente amigo.
Ele deu de ombros novamente, como quem diz "Eu tento", e nada mais falou.
Após a conversa e os resultados, os três saíram da consulta com o óculos devidamente escolhido e encomendado, levaria no máximo três dias para chegar. A caminhada até uma pequena loja armarinho próxima ao consultório foi rapidinha, logo eles estavam perdidos entre prateleiras de miçangas e rolos de lã, até que uma questão coçou a mente de Minho, que estava pertinho de seu noivo.
— Chan, quando seu óculos quebrou? — perguntou ao australiano, que olhou para si com três grandes interrogações na cabeça. Minho explicou: — Lembro que foi desde aquele dia em que você teve aula em campo com as crianças, vocês até estavam vestidos de verde. Você estava sem óculos naquele dia.
Os ombros do rapaz tencionaram levemente, seus dedos escorregaram pela prateleira e ele desviou o olhar.
— Caiu na rua e eu pisei sem querer. Foi uma sequência de azar, bem que a mamãe diz que a gente não pode deixar vidro quebrar.
Minho tinha a sensação de que ainda havia mais.
— Foi só isso que aconteceu?
Bangchan riu, mas não havia alegria e sim incredulidade, ele viu seus olhos ficando gradativamente mais vermelhos.
— Foi só a ponta do iceberg. Eu me atrasei por causa da chuva e porque meu óculos quebrou, coisa de segundos. E o desgraçado do Dongwoo — ele coloca um saco de miçangas vermelhas na cestinha que Minho levava —, meu ex chefe, tava igual um urubu na porta da merda do café me esperando chegar. Juro por Deus, sinto ódio só de lembrar! Ele me demitiu no final do expediente, eu me estressei xinguei ele, lavei a alma! Desde então estou sem emprego e sem óculos. Mas, de alma lavada de não aguentar aquele encosto, em compensação, veio o encosto do Kevin de volta pro dormitório.
— E diante de todo o exposto você não quer ficar comigo. Sendo que seria menos desgastante ficar lá em casa?
— Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa — ele separa dois sacos de estrelinhas e conchinhas e os mostra a Minho. — Qual delas é mais bonita?
— As duas. Leve as duas — ele vê o australiano obedecer e voltar a garimpar cacarecos. Ele tenta novamente — Mas meu bem, me ouça, nós vamos precisar que você fique lá em casa. Quanto antes você se acostumar, melhor. Teremos muitos assuntos a resolver e eu quero você do meu lado pra decidir, é o nosso casamento.
Chan olha para ele, aquele um centímetro de diferença de altura sendo muito engraçado aos seus olhos, porque Minho é bonito neste ângulo levemente mais alto. Ele desviou os olhos e suspirou meio cansado, porque voltar para casa e encontrar Kevin seria, de longe, a pior coisa do mundo. Talvez Seungmin esteja certo.
— Vou dormir lá hoje.
— Sério?!
Minho está sorrindo, andando aqui e ali, carregando a cesta de Chan, trocando piadas com Seungmin, sorrindo e sorrindo. Ele está feliz por convencer o outro a se acostumar com sua casa, porque veja bem, ele mandou arrumar a decoração do quarto para algo mais confortável e quente, colocou luzes de led coloridas na parede da mesa de estudo, trocou a antiga mesa única por uma anexada a uma estante em "L" e colocou cortinas novas no quarto. O carpete novo era preto e fofinho, haviam pantufas na porta da casa no número que Chan calça, um guarda roupa com pijamas e moletons, algumas camisas, bermudas, ternos e calças – talvez haja algum exagero mas veja, é de todo o coração! –, ele colocou luminárias de cores quentes nas mesas e mesinhas ao lado da cama, fones de ouvidos e computador na mesa de estudo, há blocos de notas novinhos, apostilas e folhas juntos de uma impressora.
Certo, ele provavelmente exagerou.
Talvez comprando perfumes que viu Chan gostar na única vez que foram às compras, uns cremes faciais e produtos de skincare após receber por email a avaliação de Chan um dia após a ida deles ao SPA, porque sim, ele guardou aquele email em sua conta pessoal para caso precisasse. Ele pode ter mandado fazer um roupão escrito "Sr Bang" numa grafia bonita e cursiva, mal sabia seu noivo que Minho tomou algumas reuniões corporativas mega importantes pensando se seus nomes seriam melhores sendo Lee-Bang ou Bang-Lee, como ficariam os nomes dos seus gatinhos: Lee-Bang Sonnie ou Bang-Lee Doongie ele seria Lee-Bang Minho e Chan seria Lee-Bang Christopher Chan.
A sonoridade de Bang Minho o fez refletir se era hora de aposentar o popular e inescrupuloso sobrenome de sua família, ele não viu problemas em ser o CEO Bang Know ou Bang-Lee Know, casado com o Senhor Bang-Lee Christopher Chan.
Talvez isso tenha tomado um bom tempo de seus pensamentos, coisa séria, ao ponto de ele anotar como ficaria e riscar o que não gostou em uma folha de reunião provavelmente muito importante.
— Ei — Bangchan o chamou, ele já estava noutra ponta da prateleira com uma sobrancelha erguida para o homem estagnado — não vem?
— Oh, vou sim — ele se apressa até o Bang, que escolhia alguma cor de lã, na verdade, o novelo mudava de cor entre rosa branco e alaranjado, ele separou este na cestinha. — Estive planejando com Hyunjin, acho que os preparativos pro casamento começam depois que voltarmos de viagem, só preciso fechar um contrato e começaremos. Aliás, você consegue falar bem o inglês formal?
— Sim, não tem grandes mistérios, ele lembra muito o latim, corta boa parte das abreviações e cuidado na entoação. Por quê?
— Vou receber uns clientes americanos, eu odeio falar inglês mas sei um pouco, talvez eu precise de intérprete na reunião, prometo repassar a ata antes e te inserir no contexto da coisa. Acha que consegue me ajudar?
Bangchan assentiu, já acostumado com formalidades.
— Vai ser de grande estima, venho negociando a um bom tempo com eles, espero que dê certo.
Minho sorriu, ele queria fazer alguma coisa por Chan, em agradecimento, então após as compras eles estavam assim: Seungmin comprou um kit de montar chaveiros para Hannah e uma pelúcia de dinossauro para Lucas, Chan pegou um amontoado de pedrarias aleatórias e bonitinhas para compor o kit de Seungmin, para sua Mãe Haeri ele separou alguns novelos muito bonitos e diferentes, já para Jéssica ele comprou uma bonita cerâmica em formato de vaso, para Lucas ele levou umas roupinhas de frio e um baldinho de brinquedos de praia. Minho levou um óculos de Sol para Hannah com uma correntinha de pedrinhas e bolinhas coloridas que era ajustável caso desejasse colocar o colar em outro óculos e para Lucas um teclado de brinquedo e um porco de pelúcia rosa.
Presentes devidamente escolhidos, eles esticaram a tarde para um restaurante, onde se empanturram de carne fresquinha e ensopado. Após a comilança deixam Seungmin em casa enquanto o telefone de Minho descansava no colo de Chan e Kendrick Lamar e SZA cantavam em Luther sobre tudo o que fariam pela pessoa amada se o mundo fosse seu.
O australiano estava nervoso, mesmo que sua mente ainda estivesse levemente relaxada contra as batidas leves da música, seu coração dançando ritmado contra a caixa torácica, apreciando os prédios correndo ao seu redor e a voz de Minho murmurando uma parte e outra da música.
Parece fácil. Certo. Estável.
Como estar em casa após um dia cansativo, ser abraçado e acariciado quando busca dengo numa noite de sábado para domingo.
Sua cabeça tomba para o outro lado, ele olha pra Minho indiscretamente, porque não sente que precisa de uma razão para observar o outro. Admira a linha bonita que forma de sua testa até o queixo, os cabelos presos atrás da orelha, um pouco grandes e aparentemente muito sedosos. Ele debate se deve lembrá-lo de cortar ou admirar como Minho fica fofo soprando a franja grande, balançando a cabeça para trás e todo e qualquer movimento gracioso que o coreano faz devido os longos fios. A decisão é: ele não vai falar.
— Não me olha assim — Minho reclamou, relaxando as mãos no volante e arrancando uma risada do mais novo. Chan desvia o olhar somente para admirar a aliança marcando o dedo alheio.
— Não estou olhando, se chama admirar. É completamente diferente.
Minho gostaria de explodir em mil pedacinhos, Bangchan juntaria todos eles e o remontaria somente para admirá-lo novamente.
— Bom, já que você vai ser chato o suficiente para continuar me encarando, vou perguntar. Você quer passar no dormitório para pegar alguma roupa? Eu literalmente equipei o quarto inteiro pra ti.
Chan deu de ombros — Acho que vou pegar uma escova de dentes e um carregador.
— Tem tudo.
— Minho, Jesus. Só falta dizer que também me comprou cuecas... — Chan cruzou os braços desacreditado, o coreano se manteve em silêncio, Bangchan arregalou os olhos — Minho!?
— Espero que não fiquem apertadas — ele piscou ao lhe oferecer um sorrisinho zombeteiro, vendo as orelhas de Chan ficarem vermelhas.
Após alguns minutos em silêncio, as bochechas já menos vermelhas e o coração mais calmo, Bangchan coloca para tocar Prá Rua Me Levar, de Ana Carolina e Seu Jorge, algo sobre continuar a vida ainda lembrando de um amor antigo. Um suspiro escapa de seus lábios enquanto a melodia do violão relaxa seus músculos.
— Hoje o Seungmin e o Kevin tiveram um estranhamento — comentou após deixar o celular de volta na sua coxa — O Minnie é cabeça quente por natureza e nunca se deu bem com o Kevin, acho que ele foi querer encher o saco do Seungmin por ele não ser do nosso dormitório mas estar sempre por lá. Resumindo: eles tiveram uma discussão rápida e o Seung enfiou um socão na cara do Kevin. Foi bonito ver, mas aquela briga ainda vai render mais alguma coisa.
— Quando quiser fugir do tumulto me chame, você dorme na minha casa e todo esse inferno fica da porta pra fora.
Bangchan agradeceu mas sinceramente, ele não pediria ajuda tão cedo. O lar é algo... íntimo. Seu. Os seus costumes, o momento que você não tem que respirar fundo, e sim respirar, é quando não precisamos de máscaras, andamos descalços e damos uma flexionadinha para tirar a roupa íntima da bunda. É o ser no seu eu mais cru.
Bangchan não se sente no direito de tirar esse momento do Lee.
— O que foi? — perguntou o mais velho, como quem ouve as engrenagens desgastadas de Chan.
— A mamãe sempre disse que dormir na casa de alguém é como se intrometer numa rotina muito já estabelecida, é muito íntimo e... íntimo, porque eu não sei se outra palavra consegue demonstrar isso melhor do que essa.
Minho viu como Chan brincava com as pontas de sua camisa, seus olhos são atraídos pelo anel de noivado e então se afastam de volta para o trânsito. Ele considera.
— Ela não tá errada, mas sendo assim eu também tenho direito de abrir minha intimidade pra ti. Você não invade se eu é quem estou te chamando pra vir até mim.
— Mas tu vai estranhar.
— Faz parte.
Chan desiste de discordar e afastar a ideia, agora cutucando o metal de sua pulseira enquanto olha a vista da cidade em suas muitas luzes coloridas pela janela.
Minho sente um pequeno aperto na garganta, letra por letra se acumulando na porta, as palavras se juntando de forma errada e embaralhada é difícil de significar, mas ele tenta.
— Eu quero — Minho para abruptamente, recalcula. Os dedos raspam o volante sentindo as pequenas ondulações do seu desenho, o ar entra e sai. — Eu queria que você se acostumasse com a minha casa. Porque você está vivendo um inferno no seu dormitório, podendo ter paz na minha casa. E seria bom vir antes e se acostumar. Se sentir em casa. Quando os preparativos do casamento começarem você ficaria comigo. Vai ser mais fácil para nós ter você perto. Precisamos nos adaptar um ao outro, Chan.
A frase em questão deixa um eco muito grande na cabeça do australiano, batendo nas paredes de seu cérebro e avançando cada vez mais distorcida até se perder. O contrato, ele lembra, falava sobre morarem juntos, ele ainda vê nitidamente Minho lhe dizendo que poderia tomar tal decisão, mas que Chan deveria ter em mente de que ele não queria seus envolvimentos amorosos na casa dele. É uma questão de respeitar o espaço comum e Chan nunca viu problema na cláusula, ele mesmo não era dado a relacionamentos.
E agora, lá estava ele na casa de Minho...
Existe uma sensação universal que nos domina quando estamos num lugar que não é nosso, como uma timidez e polidez, entre outras coisas com "ez" no final... você senta aqui quando lhe mandam sentar, aceita algo que lhe oferecem, isso se você não for do tipo "Não, obrigada! Estou bem!". Essa é a segunda vez de Chan na casa de Minho, e agora o dono desse lar está o levando até a segunda porta do corredor e abrindo-a.
— Eu mudei algumas coisas — então Minho esfrega as mãos no cabelo como quem se repreendeu pela sua própria mentira —, minto, eu mudei tudo. Queria que você ficasse confortável. Eu... espero que goste. Entre, entre — ele dá tapinhas ansiosos no ombro de Chan. — Meu quarto é o último, vou tomar banho e depois cozinhar alguma coisa bem gostosa para nós, o que acha? Se gostar de visitas, portas entreabertas convidam gatinhos. O Doongie e o Sonnie gostam de passear pela casa, talvez levem um bom tempo até aceitar você, mas não custa tentar...
O australiano se vira para ele, que se perde em sua fala, naqueles olhos, poços fundos que refletiam todo o brilho das estrelas.
— Obrigado, Minho. Por me deixar entrar, pelo cuidado e carinho.
— Eu. Sim, Deus do céu— Minho está gaguejando, atrapalhado naquele sentimento caloroso que acolheu seu peito como um edredom quente — claro. Não tem de quê.
Ele se enrola mais um pouco, as orelhas parecendo pintadas de tinta vermelha, — Gaon talvez esteja certo, pode ser que elas explodam – e as mãos firmes do lado do corpo. Chan dá uma risada quando Minho se vira e anda rápido pelo corredor, parece exatamente como um gato retesado.
Num momento para a admiração, Bangchan traça o caminho na mesinha ao lado da cama, o abajur amarelado, os lençóis brancos e cinzas, a mesa de estudos, a estante com decorações de personagens de heróis e com alguns mangás. Ele passa os dedos na lombadas de algumas edições de Banana Fish e Solo Leveling com uma pergunta, como Minho sabia de seus gostos? A resposta mais cabível era, ele ter observado os mangás e coisas que haviam no dormitório. Algo insistente e vaidoso se move em seu coração, ele afasta e continua explorando o quarto.
O guarda roupa totalmente espelhado realmente tem roupas, perfumes, maquiagens e cuecas. Porque Minho não mente quando fala sobre e o mais engraçado, ele acertou o tamanho de Chan.
Abandonando suas orelhas vermelhas com a ideia de Minho pensando fervorosamente sobre que tamanho ele vestiria – aqui ele também teria que considerar a forma avantajada de sua bunda –, Chan abre a porta do banheiro e se permite uma ducha para acalmar os nervos. Tudo é perfeitamente alinhado, pensado e colocado, para a melhor funcionalidade de Chan naquele lugar.
Pantufas na porta, uma sandália extra, escova de dente, cremes de pele, um roupão com seu nome – a qual ele passou um tempo contornando as letras com o dedo, pensando que Minho também deve ter uma –, o cheiro de comida vindo lá de fora, o secador de cabelo, cremes para cabelo ondulado e cacheado, prestobarba, pijamas, moletons, livros, luzes de led e tiaras de cabelo. Ele experimenta um creme, passa nos cabelos e os deixa unidos penteados para trás, a missão é que seque sozinho. O pijama é vestido, o roupão estendido, a pantufa está de volta nos pés. Um, dois, três segundos respirando fundo, ele abre a porta e a cena seguinte invade sua mente como um estranho afago no coração.
Minho está na cozinha, o vapor cheiroso de algo cozinhando adentra em suas narinas, atiçando a fome que ele fingia não sentir, os gatos estão aqui e ali, miando, exigindo atenção, um pedaço, uma provinha daquele tempero tão bom. É bonito, Chan observa, é ele. Em natura, sem terno, de cabelo desgrenhado, mangas arregaçadas, olhos afiados e atentos, mas felizes, murmurando uma música que só canta em sua mente mas oferece ao mundo um vislumbre da beleza desta.
Minho olha para ele, aquela sua típica sobrancelha se ergueu em zombaria ou questionamento, os dois numa linha tênue ao ilegível.
— Gostaria de juntar-se a nós? — oferece de braços abertos, fazendo menção a si e aos gatos — Não sou um mago dos doces como você, mas tenho meus encantos na cozinha tradicional, sabia?
— Sério? Poderia me mostrar?
Chan sorri entrando na brincadeira e caminhando até eles, os gatos reconhecem a ele com uma olhada rápida, voltando a seu mestre. Chan oferece ajuda, mas Minho nega, pedindo apenas que ele sente e aprecie o processo. Ele obedece, seus sentidos sendo acariciados pelos aromas maravilhosos e a bonita imagem de Minho na sua forma mais confortável.
Aquela noite fica em sua memória como um momento agradável e cheio de risadas bobas. Ele nem evita pensar, com a cabeça apoiada no travesseiro, embrulhado e com as mãozinhas cruzadas sobre o peito, sobre como sua vida... na verdade, sobre como seus momentos com Minho são uma gota de alívio em meio ao caos de sua mente jovem.
É como a madrugada de um sábado para domingo, desabar na cama após um banho relaxante e se deixar consumir pelo sono.
Quarta-feira, 01 de maio de 2024
Minho desliga o computador e checa seu celular, há algumas mensagens soltas aqui e ali, acumuladas durante o começo da semana considerando que ele estava sem saco para interagir com ninguém. Este é o seu momento de se redimir!
Eu [05:26pm]
Oi gente muito texto não quero ler
Como estão??
Jeong Yuyu [05:26pm]
oi hyuuuung por aqui estamos bem, e você como que vai? cê sumiu
Eu [05:26pm]
Ah eu andei fazendo as coisas aqui da principal e umas outras das filiais
Vou fazer uma viagem hoje e volto na segunda-feira, é aniversário do irmão do Chris, ele me convidou
Hirai Momo [05:27pm]
uiiiii 🤭 conhecerá os sogros!!
diga que mandamos parabéns pro aniversariante!!
Hyunjin hyung [05:27pm]
traz bolo pra mim, esqueci de pedir ao Chan
Eu [5:27pm]
Não
Hyunjin hyung [05:27pm]
🖕🖕🖕🖕
Aliás vocês viajam mais tarde? Ele não tem aula? Trabalho?
Eu [05:28pm]
vamos hoje, vou buscar ele assim que pegar minhas coisas em casa e o carro
ele disse que uns amigos iriam cobrir ele nos conteúdos que perderia
tá tudo alinhado hyung, não esquenta
aliás, o EASYuni tem um dormitório próprio né? pesquisa pra mim por um veterano chamado Kevin Zhang e dá uma pressão indireta na coordenação do dormitório sobre as condutas dele
Jeong Yuyu [05:28pm]
Usando de influência pra pressionar quem mexe com seu namoradinho, Minho?
Eu [05:28pm]
Noivo***
Hirai Momo [05:28pm]
SÃO OQUE
puta. Que. Pariu.
MINHO VOCE FICOU NOIVO E NAO NOS CONTOU??????? meu deus
@Hyunjin hyung você sabia dessa pachorra???????
Hyunjin hyung [05:29pm]
😴😴
Han [05:29pm]
se casem e me chame pro casamento, amo cerimônias de casamento! me esbaldo de comer!!
Minho fechou a conversa com uma risadinha calorosa e o coração apertado.
Ele sente falta dos seus amigos, de sair do nada para beber, se juntar para jogar e colocar a conversa em dia. A vida adulta costuma ser muito tumultuada, as agendas muito divergentes, ou quando um pode vir outro não, de forma que acabam se esquecendo de continuar tentando se encontrar.
E, por incrível que pareça, a vinda de Chan para sua vida o relembrou que nem tudo é sobre se afundar em relatórios, planejar transações e estudar o crescimento da empresa. Os dias tem mais cores, os fins de semana mais ainda, como um desenho infantil com linhas absurdamente coloridas e meio tremidas. Minho se viu entre o verde da grama, bolos, massagens, gansos e aulas de inglês.
Ele viu a parte mais densa disso quando o australiano dormiu em sua casa. Minho fez questão de acordar mais cedo, fazer um café reforçado, tão cheiroso que acordou o outro só com aquele cheirinho bom. A timidez com que Bangchan apareceu na cozinha, andando a passinhos lentos e sendo recebido por Sonnie andando entre as pernas alheias foi cativante, eles sentaram juntos e conversaram sobre asneiras, como foi o sono, quais os planos para a semana, como fariam a viagem e de que forma. No fim eles estavam rindo contra as xícaras semi vazias e pratos limpos.
Foi calmo, como respirar fundo em casa depois de um dia caótico. Minho nunca achou que algum dia teria essa sensação, e ousa dizer que, quando Chan se mudar para seu apartamento, talvez ela resolva visitá-lo mais vezes.
Mas hoje ainda acontecerão muitas coisas, então fechando a cortina de seus pensamentos, Minho coloca seu celular no bolso e junta seu casaco.
O caminho seguinte é rápido, o senhor Choi o deixa em casa, a sua mochila está pronta no sofá, ele toma um banho, dá comida aos gatos, prepara lanches para a viagem e arruma uma lancheira para beliscar durante o caminho.
Seriam algumas boas horas de viagem, e Minho não nega a saudade que sente de pegar a estrada, somente uma rua larga de mão dupla, vegetações e o vento frio contra seu braço apoiado na janela.
Junto de sua saudade ele coloca suas coisas na mala do SUV preto, a cuba com lanches vai no branco de trás, tem cobertores e uma sacola para colocar os lixos que quiserem descartar. Quase prestes a sair, ele se lembra de pegar seu carregador e colar uma lista de avisos na geladeira de casa para quando Hyunjin viesse.
Agora devidamente arrumado, ele dirige até o dormitório de Chan, mas, ao invés de ligar ou mandar mensagem ele desce, vestido em sua calça clara bem folgadinha, uma camisa preta e casacos de mesma cor que por um acaso roubou do guarda roupa de Hyunjin, óculos escuros pendurados na cabeça e um sorriso cheio de dentes de coelho quando encontrou o Senhor Xian na recepção.
— Filho! Nossa, há quanto tempo não o via?! Sempre no carro, nunca descendo para cumprimentar este velho, em? — ele sorriu largamente, o coração de Minho se apertou ao lembrar dos raros sorrisos de seu pai — Como você está, criança?
— Estou bem, e o senhor? Estava com saudades de vê-lo.
— Eu agradeço — ele sorriu, os cabelos grisalhos e as rugas no rosto o deixavam mais fofo e querido — Posso telefonar para o menino Bang, se quiser. Veio buscá-lo, sim?
Minho balançou as mãos.
— Não, não há necessidade. Vou subir, se me permitir. Queria... ver uma coisa.
— Ah pois não seja por isso, suba meu filho. Só... não se assuste caso sua ida seja desagradável para alguns, tem... um rapaz de volta ao dormitório do Chris, ele é... um problema! — o senhor bateu o punho levemente na bancada — Mas é impossível tirá-lo de lá!
Minho assentiu, ele sabia do que se tratava. Com um sorriso agradecido ele pediu o elevador e subiu. Não era novidade a situação desgastante que estava com o tal Kevin, e a certeza de que o estudante tinha panos quentes para o manter mesmo com todas as merdas que fazia só deixava Minho mais puto.
Ele caminhou, reconhecendo o corredor que estava até o apartamento 143 e dando leves batidinhas na porta. Então espera, a porta se abre e uma cabeça castanha aparece na sua frente uns bons centímetros mais alto, no entanto, com um sorriso muito querido ao dar espaço para si. Ele era bonito como os atores de drama e as pessoas que tiram fotos para propaganda de produtos de beleza.
— Você deve ser o Minho, né? Entra aí cara. Acho que o Chris já vem.
Ele não hesita, esticando a mão educadamente, que é recebida com um aperto amigável e firme.
— Você é?
— Yugyeom.
— Oh — ele tira as sandálias e segue Yugyeom —, o Chan já me falou sobre você.
— Falou?
— Ele não sabe negar bolos a você.
Yugyeom jogou a cabeça para trás e riu, Minho estava encantado com o quanto alguém conseguia ser divertido sem forçar intimidade ou perguntas inconvenientes. Ele perdeu o comentário de Yugyeom pois a porta do quarto que sabia pertencer a Chan se abriu, de dentro dele saiu um rapaz de traços orientais, só que levemente mascarados numa faceta tipicamente americana e sem graça, ele tinha um sorriso maldoso nos lábios que deixou Minho irritado.
Mas foi pior porque logo após a saída daquele energúmeno veio Bangchan, com uma mochila nos ombros e sacolas de presente em uma mão, seus cachos estavam bonitos mas seu olhos estavam levemente avermelhados, estes encontraram os de Minho e vacilaram entre uma bolha de alívio e ódio.
Então ele se lembra das palavras de Seungmin, "O Chan é alguém difícil de realmente adentrar no coração. Ele é querido e educado, tem esse jeito de manteiga derretida, mas leva tempo até ele deixar você cuidar dele de fato".
Minho odiava fazer o que estava prestes a fazer, mas ele sabia o que deveria ser feito, sabia usar seu sobrenome quando lhe convinha.
— Oi querido — ele disse ao Bang, indo até ele e solicitando sua mochila. Kevin, de trás do balcão da cozinha, olhou entre os dois, ele sabia que olharia — está pronto?
— Sim, acho que peguei tudo. Ah, não, droga, na verdade esqueci dos bolos — ele deixa os presentes na cadeira e se apressa para pegar uma boleira da geladeira e procurar uma vasilha.
Kevin não desviou o olhar de Minho, parecia em conflito, na verdade.
— Me faça lembrar seu nome — pediu ao rapaz.
Como um balão cheio de ar, o peito daquele idiota se estufou.
— Kevin Zhang, e eu sei quem você é — afirmou, ele parecia orgulhoso de se afundar em lama ao julgar estar no mesmo nível que Minho — Aproveitando carne jovem?
Minho sente nojo ao ponto de querer pisar naquela coisa e fazer com que todas as portas do mundo se fechem ao ouvir o nome dele. Mas, o Lee Know afasta-se, aquele olhar superior o qual Chan só viu uma única vez, voltando à face do mais velho.
— Seu nome estava na minha mesa hoje. Apenas de relance. Gosto de civilidade, consegue me entender? Minhas empresas só aceitam pessoas que sabem ter o mínimo de respeito e que se comportam como pessoas. Somos animais sociais. Conhece Aristóteles? — ele o olha de cima para baixo, Kevin se encolhe, sem ao menos perceber. O semblante de Minho retorce em algo semelhante ao desprezo — Não, acho que você não conhece.
Ele não se lembra de olhar para alguém com tanto escárnio, mas ao desviar para ver Chan fechando a vasilha que havia enchido de bolo seu olhar não se suaviza imediatamente, levando um tempo de cara fechada, ele o vê colocar a boleira na geladeira e pegar as sacolas de presente.
— Vamos?
— Vamos — Minho se vira para dar um leve aceno de cabeça para o rapaz no sofá — Foi bom conhecê-lo Yugyeom.
O mesmo dispensa a formalidade com um aceno e um sorriso de lado.
Seria muito mau caratismo de Minho mentir a informação de que o diabinho em seu ombro estava muito feliz pela forma como tratou Kevin, e levando em conta que Bangchan não lhe chamou atenção sobre nada, ele se deu o direito de desfrutar de seu ego inflado.
Com a mala de Chan devidamente colocada na traseira do automóvel, o desencadear de um hábito rapidamente construído veio até eles: Bangchan entrou no carro, Minho desbloqueou o celular e girou a chave na ignição para ligar o painel, colocou o telefone na perna de Chan e afivelou o cinto.
Samba de Verão, de Caetano Veloso, e outros grandes títulos da MPB embalaram sua saída nas movimentadas vias da cidade, falando sobre amor, beira mar e a boemia. Pouco a pouco o trânsito diminui, a temperatura baixa, o sol se põe, os corações se acalmam, Minho baixa os vidros e Bangchan relaxa no banco ao seu lado.
Não são necessárias conversas para preencher o ar. Nem todas as pessoas conseguem aceitar ou fazer uso disso, mas o silêncio por vezes constrói mais do que longas conversas. Ou o certo seria que ele constrói tanto quanto longas conversas. Talvez pelo silêncio ser um isolamento em seus mundos enquanto respiram o mesmo ar e a conversa ser uma troca de informações sobre seus mundos enquanto dividem o mesmo ar.
É um espaço doce junto a brisa enquanto a música dança com um violão e relaxando seus músculos cansados.
— Me sinto um pouco nervoso — Minho assumiu, a mão segurando o volante, o braço na janela e a outra descansando no câmbio de marcha — será que suas mães vão gostar de mim? Seus irmãos? Eles sabem sobre nós?
Bangchan deu uma risada descontraída às custas das interrogações alheias.
— Acho que não tem motivos pra não gostar. Só precisa ter bom coração.
Minho olhou para o volante de um jeito pensativo, seus lábios se torceram para baixo e suas sobrancelhas estavam franzidas.
— Será que eu tenho um bom coração?
— Por que não teria?
— Eu tenho?
Ele parecia um patinho triste apontando para si mesmo, Bangchan queria engoli-lo.
— Mas quanto à notícia do casamento — trocou de assunto, raspando os dedos na borda de sua bermuda jeans —, eles ainda não sabem. Até onde eu imagino, pelo menos a mãe Jessica vai relutar um pouco já que... — ele suspira — o único casamento que ela viveu não foi lá um dos mais saudáveis.
— Poxa...
— É. Mas não acho que vá ser de todo ruim você é um bom homem, Minho. No fundo o que importa é isso. — Chan sorriu, aquelas petecas em forma de olhos transpassando toda a tranquilidade que Minho deveria colocar em seu coração. — Você tem sim, um bom coração.
Os olhos do coreano arderam, ele se concentrou na estrada sussurrando um "Só sou eu mesmo. Mas obrigado" e deslizando para qualquer nuvem de pensamentos que viesse acalentar sua mente.
Horas mais tarde, Minho estava adentrando em Sejong, a tida como "capital administrativa" da Coréia. Mas o rumo deles era mais adiante da cidade, em Gobok-ri. Já com o céu totalmente escurecido e cansado como estava, Minho não se compromete em os levar com segurança.
Chan não questiona, somente passando para o banco do motorista e tentando relaxar os dedos no volante, estava nervoso, a coisa de dirigir ainda era algo delicado para si.
— Ei — o Lee chamou sua atenção, tombando a cabeça carinhosamente — calma. Respira e inspira, vai devagar. Você... tem medo?
— Tenho.
Foi sincero, e talvez fosse a primeira vez que não sentiu-se bobo pela confissão.
— Mas naquele dia, no jantar dos meus pais — Minho perdeu um pouco o ar, seu cérebro funcionando a todo vapor enquanto seu coração apertava-se no pequeno espaço de sua caixa torácica — você dirigiu e
— Você tinha que sair de lá — o Bang deu de ombros, os dedos cutucando a logo no volante enquanto evitava olhar para qualquer lugar que não para baixo — Eu fiz o que precisava fazer.
— Mesmo com medo — constatou o mais velho.
Ah...
Ah, Deus.
Ele entendia o que Seungmin queria dizer, talvez não tudo, mas uma pequena parte.
Minho ficou com isso em sua cabeça, observando Christopher Bang desenvolver o carro no seu próprio tempo, devagar e sempre. Ele não sabia se estava pronto para olhar a situação de seu pobre coração, mesmo que houvesse tido longas conversas com Hyunjin sobre como o australiano não é igual aos outros relacionamentos que teve.
Mesmo porque, este é limpo como águas cristalinas, o que olhando de cima enxerga-se o fundo, mesmo que seja só a mudança de uma pequena pedrinha devido a força das correntes, musgos ou peixinhos. É explícito e objetivo. Duas pessoas unidas por um contrato em busca de conforto. Por escolha delas, com termos sempre tirados a limpo, abertos a conversas e mudanças.
A diferença deles para os outros é que Bangchan não tem medo de ser sincero e desagradar a Minho, a gritante diferença é que aquele homem vê Minho como ele é.
Carne, ossos, sonhos, beleza e prazeres.
Ele é alguém, não títulos ou sobrenomes.
Em um mundo em que números de seguidores numa rede social e quantos zeros positivos há numa conta bancária vem primeiro, ele gostou de ter alguém que lhe oferecesse um bolo e um passeio no parque.
Minho relaxou no banco enquanto Rodrigo Alarcon cantava sobre um coração frágil e apaixonado, mas que precisava tentar se fechar para que seu dono continue bem, um coração cansado, talvez... Ele se permite uma soneca, sem notar que Chan diminui o volume do som para que ele não se assuste em seu descanso. As estrelas estavam espalhadas pelo céu sobre suas cabeças, o vento frio e a calmaria das ruas noturnas, lembrava ao australiano o cheiro de como era estar em casa.
O carro fez a rotatória, estavam adentrando em um bairro mais pacato, Minho iria adorar ver os gatos sobre lixeiras, sentados, observando o movimento com o rabo indo para cá e para lá. Lojinhas de artesanato, costura, mercearia e pequenos restaurantes de rua fechados, pois aquilo não era horas de se ter algo aberto, salvo pela farmácia 24h. Chan subiu a rua e dobrou na direita. Haviam longas quadras de casas divididas por muretas, as construções eram em base parecidas mas cada uma com seu charme.
Chan estacionou no acostamento, estavam na frente de uma casa de dois andares cheia de flores, o coração do rapaz se apertou ao se dar conta do quanto sentia saudades de casa.
Então olhou para o lado, vendo Minho cochilando todo encolhido no banco. Ele mais parecia um pequeno filhote de coelho perdido no meio de roupas humanas do que qualquer outra coisa. Bangchan queria tocar seu rosto, afofar suas bochechas, acariciar seus cabelos, talvez... beijar a ponta de seu nariz e...
Chris se recompõe, limpando a garganta, desligando o carro e tirando o cinto.
— Hyung — ele chama, carinhosamente — vamos arrumar uma cama pra você dormir, deve estar cansado, hm?
Minho resmunga, as sobrancelhas se franzindo e os olhos piscando lentamente.
Bangchan o ajuda a sair e pega suas mochilas no porta malas. Minho estava com uma carinha bagunçada e zangadinha segurando apenas a sacola de presentes, Chan não o deixou carregar mais que isso. No entanto, ele ficou fascinado pela caixa de correio em formato de fantasminha, mais ainda com um pequeno pinheiro crescendo ao lado da garagem parecia uma árvore de natal desengonçada banhada pela luz amarelada do poste.
— Talvez estejam dormindo — ele puxou o molho de chaves do homem aranha e procurou a correspondente —, imaginei que chegaríamos um pouco mais cedo. Acabei nos atrasando.
— Que besteira.
A porta destravou, o interior era quentinho, cheio de quadros de fotos em família, pinturas de pássaros e paisagens, arranjos de plantas e sofás com mantas de crochê, mesas de centro com cadernos de pintar, uma televisão em uma estante com mais fotos e gatinhos de porcelana, havia uma grande mesa ao lado da sala, apreciada por um janelão de vidro cheia de plantas no parapeito, o balcão estava limpo e as louças lavadas. Minho sentia cheiro de lavanda e mais alguma coisa que foi possivelmente cozinhada para o jantar. Por falar em comida, ele estava cheio de fome!
— Filho? — chamaram, uma figura toda enrolada em um xale marrom bordada com florzinha nas pontas veio do corredor que ficava depois da cozinha, à esquerda das escadas. Ela tinha cabelos ondulados repleto de luzes grisalhas, soltos na altura dos ombros, vestia uma calça de pijama cheia de flores e uma camisa com o triplo de seu tamanho, aqueles olhos eram idênticos aos de Chan, afiados mas carinhosos. — Oh, boa noite queridos!
— Oi mamãe, desculpa te acordar. Acabamos de chegar — Chan avisou, pendurando seus sapatos, apoiando as sacolas e mochilas no sofá.
— Boa noite — Minho se curvou respeitosamente. Seu noivo segurou uma risadinha ao notar as bochechas alheias super vermelhas — Senhora Bang, desculpe chegarmos sem avisar e em horário inapropriado.
Quando voltou a postura normal, foi ofuscado pelo sorriso mais materno que poderia receber em sua vida. Ela abraça seu filho e então volta para Minho, fazendo um afago em seu braço.
— Pra que toda essa formalidade? — diz, os braços se abrindo para receber aquela criança tímida — Ande. Venha aqui. Eu sabia que o Chan estava nos escondendo alguma coisa, só espero que me abra esta matraca logo e me conte tudo, estamos sedentos por novidades! — ela muda seu tom ameaçador direcionado a seu filho para um mais doce, agora para o outro homem. — Qual seu nome filho?
— Sou Lee Minho, é um prazer conhecê-la, senhora Bang — ele se curva novamente, ela lhe dá um tapinha no ombro.
— O que eu falei sobre formalidades?
Minho coloca as mãos no rosto, em pânico, sendo apreciado por um Bangchan sorridente com toda sua situação.
— Ele é meio quadrado, mamãe, nem se estressa — Chan abre a lancheira térmica, dando um beijo nos cabelos de sua mãe e caminhando até a cozinha, ele coloca as coisa de dentro dela na mesa —, com jeitinho ele se solta!
A senhora Bang olha pra Minho de forma analítica, ele nunca sentiu tanto medo de ser reprovado em sua vida, mas ela logo sorri largamente e aperta suas bochechas antes de fazer o mesmo com seu filho, que agora estava bem ali do ladinho deles.
— Fofinhos. Venham comer, guardei janta pra vocês, deve ter esfriado mas vou esquentar. Sente-se, criança.
Minho estava sonolento então só aceitou, sentando a mesa enquanto Chan colocava as coisas na geladeira, depois prometeu que já voltaria, ele sobe as escadas com todas as mochilas e presentes. A senhora Bang estava de costas para si, ligando o forno e aquecendo as panelas.
— Pegue os pratos para mim, criança. No escorredor de louça.
Ele fez, arrumando a mesa, ela o indicou os talheres e os trilhos de madeirinha para colocar embaixo das panelas, obediente como só, fez o que lhe foi ordenado, seu estômago revirando pelo delicioso cheiro de batatas gratinadas e mais alguma coisa que esquentava no forno.
— Não sei se você sabe disso — ela indicou que ele sentasse e colocou as panelas na mesa — mas o fato de estar aqui mostra que meu filho o tem em grande apreço. São amigos?
Minho ficou estático.
— Eu... é. Acho que sim. Somos novos amigos, na verdade — os dedos brincavam nervosamente com seu anel. Ela reparou, mas nada disse.
Ouviram-se passos na escada e logo Chan estava puxando a cadeira ao lado de Minho.
Jéssica Bang deu duas batidinhas na mesa e se levantou rodeando a mesa até seu mais velho para beijar os cabelos deste.
— Vou dormir, cuide de tudo. É bom ver você, filho — ela se afasta para apertar a mão levemente no ombro de Minho — Seja bem vindo, criança. Espero que sinta-se em casa.
Eles agradecem e retribuem com sorrisos sonolentos, ela sorri de volta e sai.
A comilança é silenciosa, mas maravilhosa. Minho lava as louças enquanto Chan arruma a mesa e depois ajuda Minho a colocar as panelas no escorredor de louças. Eles desligam as luzes e sobem. Minho fica admirado que em cada cômodo havia no mínimo dois tapetes e todos eles tinham uma combinação no mínimo colorida.
Chan abre a porta de seu quarto e o convida para entrar. Haviam pôsteres de livros e bandas nas paredes, capas de álbuns e alguns vinis sobre uma mesinha, uma caixa aberta ao seu lado, com CDs e álbuns de foto. A cama de casal estava feita, as mochilas apoiadas uma na cadeira de estudos próximo a janela, outra num puff redondo com travesseiros de heróis. Minho respirou devagar, processando todo o espaço, os livros na estante pequena, o guarda roupa espelhado, plaquinhas de "Like mate, stop procrastinating" penduradas próximo a mesa de estudos e alguns cata-ventos em espiral de crochê seguros no teto.
— Bem vindo ao meu quarto... — Chan coçou a nuca. — Você pode se trocar e tomar banho... Vou dar uma olhada na Hannah e no Luquinhas. Nós...
— Só temos uma cama — Minho ergueu uma sobrancelha brincalhona. Bangchan ficou todo vermelho, e se seu sangue não fosse vermelho, teria ficado nesse exato momento. — Espero que goste de dividir travesseiro com seu noivo!
— Tá falando muito pra quem tá com sono — Chan censurou, se preparando para sair. — Vou bater na porta quando entrar.
— Deveria só entrar.
— Se aquiete.
Minho sorriu com a retaliação, amando ver o outro de orelhas vermelhas.
Mesmo quando saiu, quando Minho estava no chuveiro ou escovando os dentes, havia um quentinho estranho se apossando de suas entranhas.
Talvez fosse culpa do sono.
Ele não sabe.
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