I. A sad freedom
21 de julho de 1993 – Azkaban
Quatro mil duzentos e oitenta dias.
Cento e quarenta e dois meses.
Quase doze anos.
Esse era o tempo que Sirius Orion Black, o primogênito da mui nobre Casa Black, permanecera preso em Azkaban. Sem julgamento, sem chance de defesa; apenas trancafiado em uma cela e cercado por vários dementadores, atormentado pela dor dos eventos do dia 31 de Outubro de 1981 e da culpa.
Ali, sentado no canto de uma cela escura sobre um chão imundo, Sirius lamentava há quase doze anos a perda de tudo que ele amava e carregava a culpa por isso. Ele perdeu absolutamente tudo. Poucas coisas doíam mais que o arrependimento por ter confiado em alguém que chamava de amigo, mas apunhalou-o pelas costas.
James e Lily estavam mortos porque ele confiou em Peter Pettrigrew. Remus estava sozinho durante a lua cheia porque ele confiou que Peter era a melhor escolha. Seus filhos e Harry cresceriam sem os pais por sua culpa.
Se não tivesse confiado para Peter ser o Fiel do Segredo dos Potter, nada disso teria acontecido.
Ele poderia estar com seus filhos e Remus, vivendo felizes juntos e sendo uma família. Ele finalmente estaria aproveitando com Lupin uma nova chance de viver um amor, e veriam os gêmeos crescerem juntos.
Mas agora, eles certamente o odiavam. Não os culparia por isso, ele dava total razão. Ele próprio se odiava pelo que houve.
O que o mantinha são naquele lugar era ter esperança de que, apesar de tudo, seus filhos estavam bem com Remus, e não nas garras de sua mãe; tendo uma infância boa e feliz, diferente da sua própria. E também esperava que Harry estivesse bem com eles, sendo amado e cuidado com o carinho que merecia.
Além, é claro, de saber que era inocente. Ele sentia sua parcela de culpa, mas sabia que a maior parte dela era de Peter Pettigrew.
Após todos aqueles anos, já estava habituado a permanecer ali sozinho em sua cela, preso em seus próprios pensamentos. Durante o dia, por vezes, ele sentia os dementadores sugando toda sua energia, alimentando-se de suas memórias felizes e trazendo a tona as piores de todas: as maldições que recebia como castigo de sua mãe, as brigas com seu irmão, a morte da mãe de seus filhos, a morte de seu melhor amigo… Péssimas lembranças é o que não faltava para Black.
Porém, ao menos a noite, algumas vezes, ele se transformava em sua forma animaga para escapar de seus carcereiros. Sabia que os dementadores não reconheciam emoções animais tão bem quanto as humanas e, assim, ignoravam-no, e ele poderia ter um pouco de paz. Quando era noite de lua cheia, ele assumia aquela forma também apenas para sentir-se mais próximo de Remus.
Odiava pensar que Lupin estivesse sofrendo sozinho naquelas noites.
Sirius estava, como sempre, sentado ao chão com seus pensamentos. Cantarolava baixinho, como fazia certas vezes para fugir do silêncio tenebroso ou dos murmúrios sofridos de alguns de seus colegas das celas ao lado. Entonava a canção de ninar em francês que costumava cantar para os filhos dormirem, a mesma que seu Tio Alphard cantava para si quando pequeno e pedia para que ele o colocasse na cama no lugar de seus pais.
Também sentia muita falta do tio, que morrera um tempo após sua formatura em Hogwarts. Ele era uma das únicas pessoas de sua família com quem realmente se importava, junto de seu irmão.
Ah… Seu irmão… Regulus.
Também teve tempo o bastante para pensar nele e refletir ainda mais sobre sua perda, o que poderia ter feito, o arrependimento por não ter se esforçado mais para ajudá-lo. Ele queria tanto poder ter protegido o seu irmãozinho de toda a crueldade daquela Guerra…
Infelizmente, seu orgulho e rancor falaram mais alto, e isso custou a vida de Regulus.
— Ora, se este não é Sirius Black agraciando-nos com sua voz. — A voz repentina assustou Sirius por alguns instantes. Ele parou de cantarolar e voltou sua atenção para o lado de fora de sua cela.
Ali por entre as barras, ele avistou o Ministro da Magia, Cornelius Fudge. O homem estava vestido bem como Sirius se lembrava: o terno bem alinhado, a capa longa quase arrastando pelo chão e o chapéu coco no topo da cabeça, de onde saíam fios grisalhos. Não era a primeira vez que ele visitava Azkaban, mas não mudara nada desde a última.
Black olhou-o com uma expressão neutra em seu rosto e uma postura que deixaria sua mãe orgulhosa.
— Olá, Senhor Ministro — cumprimentou, com a voz um pouco rouca e arranhada, pois não fazia muito uso dela para falar. — Veio visitar seus pobres prisioneiros mais uma vez?
— Vejo que ainda está bastante… São, Black — comentou o Ministro, apertando o jornal em sua mão.
— O melhor que posso estar. É um pouco difícil manter a mente no lugar em Azkaban, como pode imaginar.
— Sim, imagino.
O Ministro analisou Black da cabeça aos pés. Estava visivelmente abalado e maltrapilho, é verdade, porém, ainda mais aparentemente estável que outros prisioneiros tão antigos quanto ele. Depois de tanto tempo, surpreendia-se que conseguia formular frases coerentes e não parecesse tão afetado pela ação dos dementadores.
Obviamente, não fazia a menor ideia de que Sirius era um animago ilegal e isso o dava a liberdade de fugir um pouco dos efeitos dos guardas de Azkaban.
Os olhos de Sirius recaíram sobre o jornal nas mãos do homem. Ele nunca foi um leitor assíduo, ao menos não tanto quanto Remus, ou seu irmão, mas nunca dispensou um Profeta Diário, e fazia muito tempo que não possuía distrações.
Antes que o Ministro pudesse se afastar, perguntou:
— Posso ficar com o jornal?
— Perdão? — Fudge encarou-o confuso.
— O jornal — Sirius repetiu e apontou para o exemplar do Profeta Diário. — Faz muito tempo que não vejo nenhuma notícia ou tenho algo para me distrair. O senhor se importaria?
— Ah, bom… — ponderou o homem. — Certo, não vejo porque negar. Aproveite a leitura.
Fudge entregou o jornal, passando-o pelas barras. Afastou-se um tanto intrigado da cela de Sirius, continuando sua visita pela prisão. Enquanto isso, Black pegava o exemplar e lia as últimas notícias do mundo bruxo.
Ao passar os olhos pelas manchetes, sua visão fixou-se na fotografia em movimento de uma família em frente às Pirâmides no Egito. Era a notícia sobre o ganhador de um prêmio da loteria do Profeta Diário e como ele usou o dinheiro, dentre os usos uma viagem em família para visitar um filho no exterior.
Arthur Weasley, reconheceu. Funcionário do Ministério, cunhado de Fabian e Gideon Prewett, membros da Ordem da Fênix.
Lembrava-se vagamente dos irmãos Prewett. Não era fácil buscar memórias em sua mente que não fossem as piores possíveis quando se está tão perto de dementadores constantemente, mas ainda conseguia pensar em algumas coisas. Eram caras legais. Estavam ansiosos para tornar seus sobrinhos gêmeos os próximos criadores de caos de Hogwarts, assim como eles.
Após o nascimento de seus filhos, Sirius costumava dizer que eles derrotariam os gêmeos Weasley facilmente e causariam caos muito maiores em Hogwarts, pois eles eram descendentes dos Marotos. Ninguém estaria páreo aos gêmeos Black.
Pensar nos seus filhos era doloroso. Não sabia exatamente quanto tempo se passou, mas aquela foto era um indicativo de que certamente muito tempo. Eles deveriam estar do tamanho do garoto mais novo dos Weasley agora, já que possuíam apenas alguns meses de diferença.
Qualquer um que olhasse para aquela foto veria apenas uma grande família unida e feliz, mas não para Sirius. Haviam nove pessoas na foto, dentre elas crianças e adolescentes; e sobre o ombro do garoto mais novo estava um rato. Poderia ser apenas um ratinho de estimação, é claro. No entanto, não era isso.
Sirius conhecia aquele rato.
Ele o viu centenas de vezes ao longo dos anos desde que se tornou um animago. Toda lua cheia a partir de seu quinto ano em Hogwarts ele via aquele mesmo rato apertar o nó do Salgueiro Lutador para que pudesse usar a passagem para acompanharem Remus.
Wormtail.
Sirius encarou a imagem fixamente, paralisado, as mãos calejadas apertando o jornal com força. Sua mente vagou para o dia de sua prisão, flashes rápidos e desconexos.
James caído aos pés da escada. Lily caída ao lado do berço. Peter gritando dramaticamente consigo e acusando-o de trair seus amigos. Harry chorando com um grande corte na testa. Uma explosão. Aurores.
O ar deixou os pulmões de Sirius. Respirar, de repente, pareceu uma missão quase impossível. Um nó pesava em sua garganta, as lágrimas inundaram seus olhos. Não conseguia se mexer, nem um único som saía de sua boca. Ele apenas encarava aquele jornal, os olhos vagando entre a fotografia e a manchete.
Leu repetidas vezes uma frase ao final da notícia.
“A família Weasley vai passar um mês no Egito, de onde voltará no início do ano letivo em Hogwarts, escola que cinco dos seus filhos ainda frequentam.”
Peter estava disfarçado, infiltrado na família Weasley. A maioria dos Weasley ainda estavam em Hogwarts. Peter estaria em Hogwarts.
Aquela informação martelou na mente de Sirius. Ao mesmo tempo que encontrava-se confuso e atordoado, ele parecia mais são do que nunca, com plena ciência do que significava Peter estar vivo, disfarçado provavelmente de um simples rato de estimação e prestes a retornar para Hogwarts.
Seus filhos tinham a idade próxima aos caçulas Weasley. Seus filhos já estavam em Hogwarts. Harry já estava em Hogwarts.
Peter estaria perto deles.
O silêncio dominava a cela do Black enquanto ele refletia aquela informação por mais de uma hora, talvez duas. Ele não possuía nenhum tipo de marcação temporal ali dentro.
E então, suas mãos amassaram o jornal. A confusão dando lugar ao ressentimento, a raiva. Peter estava livre, enquanto ali estava ele pagando por um crime que não cometeu. Nem toda a culpa que sentia pela morte dos amigos poderia ultrapassar a raiva que começou a crescer dentro de seu peito.
A cela até então silenciosa foi tomada pelo eco de um alto grito de fúria.
Os pés descalços tocando o gelado chão de pedra começaram a caminhar por todo o local de um lado a outro. As mãos calejadas puxavam cabelos negros tão longos que chegavam a cintura do homem que estava em pleno momento de caos, uma loucura furiosa que ardia em seu ser como um incêndio.
Sirius socou a parede repetidas vezes, até seu punho sangrar. Gritou enraivecido. Assumiu sua forma animaga e arranhou as paredes, destruiu o fino e miserável cobertor de sua cama.
Acalmou-se apenas muito tempo depois, mas a raiva ainda estava ali presente junto ao desejo de vingança.
Por culpa daquele maldito rato ele perdeu tudo. Se Peter aparecesse na sua frente naquele momento, ele o destruiria em milhares de pedaços, assim como todos acreditavam que havia o feito.
Por culpa dele esteve trancafiado ali nos últimos anos. Ele perdeu o amor da sua vida, a infância dos seus filhos…
Sirius mal conseguia se lembrar do rosto deles depois de tanto tempo sob influência dos dementadores. Encolhido no chão de sua cela, desabando em lágrimas após o surto de raiva, agarrou-se às imagens que ainda possuía em sua mente dos dois pequenos garotos, tentando imaginar como estariam agora.
Canopus ainda continuava tão sensível quanto antes? Sempre lhe partia o coração ver o filho começar a chorar quando saía para uma missão da Ordem da Fênix e deixava-o aos cuidados de Remus, ou quando ele não queria sair de seu colo. Ele certamente era o mais apegado a si, não o largava por nada.
Therion ainda continuava agitado? Em questão de palavras, ele falava menos que o irmão, mas possuía a energia digna de um Maroto, sempre correndo pela casa desde que deu os primeiros passos. Quando voltava para casa de uma missão ou simples ida ao mercado, ele sempre vinha rapidamente até seus braços para logo depois chorar para voltar pro chão e continuar a bagunçar.
E a magia deles? Estava mais controlada? Eles sempre tiveram grandes demonstrações mágicas desde antes mesmo de completar um ano de idade. Ele próprio demorou mais para isso, mas quando o fez eram magias fortes demais e sua mãe certamente não era a melhor em ensiná-lo a controlar. Remus faria um trabalho melhor, sem dúvida alguma.
Remus… Será que ele ainda era o mesmo Remus que amava? Será que ainda existia algum sentimento bom em relação a si?
Se soubesse que todos aqueles beijos antes de Remus partir naquela missão seriam os últimos, teria aproveitado ainda mais o momento. Se soubesse que aquela última noite antes que ele partisse seria realmente a última deles juntos, a última vez que dormiria em seus braços, a última vez que sentiria o calor dos toques por seu corpo…
Será que Remus encontrou a aliança escondida?
Sirius lamentou até sua cabeça doer e seu corpo clamar por descanso. Ele dormiu na forma de cachorro, como sempre fazia.
Ao acordar, ainda estava tão acabado quanto esteve nos últimos anos, porém, com uma nova chama em seu peito. Era difícil saber se sanidade ou loucura total, mas uma ideia havia começado a se formar em sua mente, algo que mudaria tudo.
Peter estava em Hogwarts. Um servo de Voldemort estava em Hogwarts, perto de seus filhos e de Harry. Ele não faria nada debaixo do nariz de Dumbledore, claro, mas ainda era um risco.
A qualquer sinal de que teria aliados, mínima esperança de Voldemort retornar, ele não perderia tempo de tentar voltar com as melhores honrarias por ajudar a capturar quem seu velho mestre tanto queria.
Harry estava em perigo. Seus filhos estavam em perigo.
Ele precisava fazer alguma coisa. Precisava impedir Pettigrew e mostrar a todos o rato sujo que ele era.
Sirius mal percebeu quando o plano começou a se formar em sua mente. Ele sabia que os dementadores vinham lhe entregar sua comida nas horas das refeições e que eles não reconheciam emoções animais tão bem. Sabia que estava tão magro que passaria facilmente pelas grades em forma de cachorro. Sabia que estava em uma ilha ainda dentro do domínios britânico. Ainda se lembrava de quando James lhe ensinou a nadar num lago em Hogsmeade.
A mente de um Maroto insano entrava em ação. O plano estava formado.
Ele encarava o jornal, imaginando-se agarrando aquele rato entre as mãos e esmagando-o como um inseto. Rasgou o Profeta Diário e recortou a imagem, a fotografia que estava lhe dando forças. Guardou a foto consigo e aguardou.
Apenas aguardou.
Transformado em cachorro, esperava sentado. Quando os dementadores vieram trazer seu jantar, Sirius já não estava pensando em mais nada além do seu objetivo.
O cão extremamente magro passou por eles e por entre as grades. Caminhou por aquela prisão pelo caminho inverso ao que chegou mais de uma década antes até alcançar a saída.
Sua primeira visão ao sair foi a lua.
Início da lua crescente, rodeada de estrelas, brilhando alto no céu. A lua e as estrelas o recepcionaram após tanto tempo longe junto ao vento.
Agora ele precisava voltar para a sua lua e suas estrelas.
A primeira vez que sentiu o ar livre contra os pelos foi quase como voar em uma vassoura outra vez, a sensação de liberdade consumindo-o por inteiro. Sentir a terra sob as patas foi como transformar-se em Padfoot pela primeira vez. Sentir a água gelada do oceano foi como o frio no estômago no dia que fugiu do Largo Grimmauld para a casa dos Potter, um misto de aflição e ansiedade com o impulso nervoso da necessidade de ser livre.
Ele nadou. Sob a lua e as estrelas, ele nadou para sua liberdade em um oceano gelado e turbulento. Por horas. Dias.
Talvez a adrenalina correndo em suas veias não permitisse que o cansaço ou as dores nas juntas o vencessem. A vontade de lutar para fazer a merecida justiça. O anseio para ver sua família outra vez. O que restou dela.
Ele viu Remus em sua mente. Viu Canopus. Viu Therion. Viu Harry.
Não poderia permitir que Peter fizesse mal a eles. Precisava impedi-lo. E assim quem sabe provaria sua inocência e recuperaria sua vida.
Pagou anos pela morte de seus amigos. Pettigrew não sairia impune.
Não saberia dizer por quanto tempo nadou até achar a primeira boia no meio do oceano, daquelas que os trouxas colocavam na água por algum motivo. O sol já estava raiando no céu e os membros de seu corpo doloridos, cada vez mais ameaçando afundar.
Voltou à sua forma humana para agarrar-se à enorme coisa vermelha e conseguir subir. Tossiu e cuspiu água, sua respiração ofegante. Estava exausto. A bóia balançava agitada com o movimento da água e o seu peso repentino sobre ela, porém ele não largou as barras que havia ali, encolhendo-se entre elas e tremendo.
As lágrimas que vieram misturaram-se às gotas salgadas do mar em seu rosto. Ele desabou em prantos, banhado pelo sol pela primeira vez em doze anos. Os soluços eram tantos que chegava a engasgar-se com a própria saliva.
Sirius sentia falta do sol tanto quanto da lua e das estrelas.
Ele estava livre.
Livre e vivo.
Admirou o céu com os olhos semicerrados pela luz, sem acreditar. Ele poderia sorrir, mas não tinha forças para isso. Apenas chorou, com sua garganta doendo infernalmente.
Estava com frio, com fome e com sede. Água salgada do mar com certeza não ajudaria com a última tanto quanto gostaria.
Seria arriscado ficar parado ali por muito tempo também. Quando perceberem que ele não estava mais em sua cela, um esquadrão de aurores atravessará aquele mar a sua procura. Precisava seguir em frente.
Ele ainda ficou um tempo se recuperando. Sua mente estava um pouco confusa devido a exaustão.
Ao seu redor não era visível nada além do mar. Apenas o mar e o céu em qualquer direção para a qual olhasse.
Nunca poderia calcular quanto tempo demoraria para chegar à costa, muito menos arriscar aparatar sem sua varinha naquelas condições. O máximo que poderia fazer seria torcer para não estar tão longe de terra firme.
Sabia que Azkaban ficava no meio do Mar do Norte, que separava o Reino Unido do restante do continente europeu. Aproximadamente, entre 100 e 200km da costa britânica. Uma distância muito longa para percorrer nadando, mas não impossível de se fazer.
Não para Sirius Black.
Se os trouxas tiverem colocado mais daquelas coisas no meio do caminho, ele teria um lugar para um pequeno descanso para evitar câimbras.
Sirius fora um exímio jogador de quadribol em Hogwarts, ele entendia ao menos o básico sobre os efeitos de muito esforço físico e como se precaver de maiores dores e esgotamento.
Não impediria a dor, a distância seria sua maior inimiga nisso. Contudo, evitaria que ela e a exaustão o afogassem naquele mar infinito.
Sirius respirou fundo antes de assumir a forma animaga mais uma vez e pular de volta para a água, voltando a nadar. Considerava muito mais fácil naquela forma. O corpo era mais pesado, sim. Padfoot era um belo cão enorme. Porém, ser maior também lhe garantia mais força, por mais magro e desnutrido que estivesse.
O sol se pôs e nasceu novamente durante o trajeto. Encontrou mais duas boias no meio do caminho. Ele não ousou dormir em suas pausas para descanso, muito arriscado e adrenalina muito alta para isso.
A lua e as estrelas já brilhavam novamente quando ele chegou à costa, recepcionando-o de volta para casa.
Ele estava livre.
***
A primeira coisa que Sirius pensou após acordar naquela praia ao amanhecer foi em seu lar.
Ele não pensou no quanto seu corpo estava dolorido, no quão faminto e com sede estava. Não. A primeira coisa que veio a sua mente foi seus filhos e Remus. Seu lar.
Ainda como Padfoot, ele caminhou pela praia até encontrar algo que identificasse onde estava e o quão longe estaria de sua casa. Encontrou uma placa.
Sandsend beach. Whitby.
Cidade litorânea da Inglaterra. Muito longe de casa.
Sua primeira refeição foi um sanduíche que roubou na praia de um casal que fazia um piquenique na areia e estavam muito ocupados se beijando. A primeira água doce que bebeu veio de uma caridosa senhora trouxa que passeava com seu cachorrinho e compadeceu-se ao vê-lo num estado tão deplorável e claramente morrendo de sede. Ele correu antes que ela decidisse adotá-lo e colocar uma coleira em seu pescoço.
E então, ele foi para casa.
Roubou um mapa de um turista e o analisou em um beco, escondido atrás de uma caçamba de lixo para não ser avistado em sua forma humana. Dali seguiu como Padfoot pelos próximos dias, agindo como apenas um pobre cão de rua de uma raça absurdamente grande. Algumas vezes, conseguiu que alguns trouxas lhe dessem comida. Outras, precisou se contentar em caçar ratos ou ficar com fome.
Preferiu seguir caminho próximo às margens do Rio Derwent até York e de lá partiu para Doncaster pelo Rio Ouse. Um dia inteiro de viagem e fez sua primeira pausa para descanso pela noite, admirando a lua e as estrelas no céu.
Sua próxima parada foi apenas em Worcester. Lá, precisou ousar mais. Com muito esforço, conseguiu usar magia de convocação para furtar comida. Era extremamente complicado sem uma varinha, porém conseguiu, depois de já começar a tentar desde que passou por Birmingham.
O Ministério da Magia ainda estava em posse de sua varinha. Sirius não saberia dizer se a mantinham guardada ou a quebraram, ou quebraram e guardaram. De qualquer forma, não iria recuperá-la tão cedo e não ousaria roubar de um bruxo naquele momento. Isso chamaria muito a atenção do Ministério.
Sua melhor alternativa era treinar alguns feitiços sem varinha que o ajudasse a sobreviver.
Foram cinco dias até chegar em Rowen's Valley, embora ele não estivesse contando o tempo.
Assim como Godric's Hollow, era um vilarejo habitado tanto por bruxo quanto por trouxas e nomeado em homenagem a um dos fundadores de Hogwarts, Rowena Ravenclaw. Ficava extremamente próximo a Godric's Hollow, aliás, ligados por uma estrada que cortava uma floresta.
Foi ali que ele se estabeleceu desde que Karina, uma bruxa nascida-trouxa da Corvinal com quem se relacionou, revelou estar grávida, numa casa que recebeu de herança de seu tio Alphard. Um vale calmo e tranquilo onde seus filhos poderiam crescer.
Desde aquela época Remus já passava tanto tempo lá que poderia também chamar de sua casa. Ele quem fazia companhia a Karina quando Sirius precisava ir para missões para a Ordem da Fênix, muitas vezes junto de Lily, pois além de serem velhos amigos desde Hogwarts, não ousariam deixá-la sozinha.
Na única vez em que ela esteve sozinha, embarcou numa missão para invadir uma reunião de Comensais da Morte para conseguir informações importantes e roubar algo que supostamente poderia revelar como derrotar Voldemort. Isso estando grávida de quase cinco meses e uma barriga consideravelmente grande.
Sirius só tinha ido ver como James estava depois de sair ferido de um duelo com comensais. Não demorou mais que duas ou três horas. Quando voltou, ela já não estava lá. Remus quem precisou apartar a grande briga que tiveram naquele dia após ela retornar.
Remus e ela eram amigos. Sirius conheceu os dois no mesmo dia ao entrar correndo na loja da Madame Malkin para comprar seu uniforme e esbarrar nos dois, derrubando-os no chão. Diria que aquele foi seu grande despertar bissexual, pois não conseguiu parar de encará-los por um longo tempo, enquanto eles resmungavam incomodados.
Sirius já se relacionou com muitas pessoas. Muitas mesmo. Mas ninguém se compararia aqueles dois malditos obcecados por livros que adoravam lembrá-lo do quão inconsequente era na maior parte do tempo.
As coisas com Remus foram mais complicadas, mesmo eles tendo se beijado durante uma festa da Grifinória. A amizade que tinham era algo muito importante que não queriam estragar.
Mas o destino é traiçoeiro demais.
Depois que Karina foi assassinada por Comensais da Morte, apenas pouco menos de dois meses depois de dar a luz a gêmeos, Remus foi seu porto seguro. Com James e Lily sem poder sair de casa com a revelação da profecia que poderia ser sobre o filho que ela esperava, via o amigo com bem menos frequência. Remus sempre esteve lá.
Ele era o padrinho de Therion, então estava teoricamente fazendo seu papel apenas. Porém, obviamente, acabou se tornando algo muito maior. Aconteceu naturalmente.
Quando Sirius percebeu, ele já estava comprando uma aliança para Remus, uma que nunca foi entregue.
E os garotos o amavam. Sirius adorava ver Remus entretido com os gêmeos, cuidando deles com tanto zelo. Eles acompanharam juntos o crescimento deles naqueles dois anos que se seguiram.
Dois anos sendo uma família.
E inicialmente deveriam ser apenas algumas semanas.
Retornar para o vilarejo trouxe muitas lembranças para Sirius. O dia que seus filhos nasceram; os passeios pela praça principal; o dia que os garotos deram os primeiros passos; as primeiras palavras; os beijos de Remus…
Era madrugada quando Padfoot sentou-se em frente a casa. Continuava exatamente igual. Não vinha nenhuma luz das janelas fechadas ou qualquer barulho de dentro da residência.
Eles poderiam estar dormindo.
Entrar não parecia uma boa ideia. Definitivamente, não era.
Sirius tocou a maçaneta e abriu a porta cautelosamente. Já era tarde para voltar atrás.
Espiou lá dentro sem fazer nenhum barulho, sequer respirava. Pequenos passos silenciosos foram dados até ele adentrar a residência e fechar novamente a porta. Estava escuro.
E igual.
Tudo. Absolutamente tudo estava exatamente como ele havia deixado, exceto pelo piano que já não estava mais na sala de estar.
E a poeira.
Havia muita poeira. Algumas teias de aranha também.
O coração de Sirius desfez-se em pedaços. Ele não disse uma única palavra enquanto seus passos cautelosos quase ecoavam naquele silêncio ensurdecedor. As lágrimas voltaram aos seus olhos sem que percebesse.
Subiu as escadas no automático, seus pés agindo sozinhos e guiando-o até o último quarto do corredor. Os berços ainda estavam lá. Velhos e empoeirados.
A cama que ele outrora dividiu com Remus não se encontrava diferente.
Sirius desabou de joelhos, o soluço que escapou de sua garganta ecoando pela casa vazia.
Eles foram embora.
Os três. As pessoas que Sirius mais amava em todo o mundo.
Seu lar.
A casa continuava ali, mas não era o seu lar. Seu lar era onde quem ele amava estava. Remus, Canopus e Therion não estavam lá.
Ele não ficou por muito mais tempo.
Sua mente não estava funcionando direito. Estava repleto de perguntas, questionando-se para onde haviam ido, como os encontraria.
Sirius tinha uma missão ao sair daquela prisão, mas não poderia iniciá-la antes de ter certeza que sua família estava bem. Ele precisava vê-los.
Quando deu-se conta, ele estava em Godric's Hollow, parado diante do túmulo de seus amigos.
Ver os nomes de James e Lily naquelas lápides apenas trouxe de volta a imagem de seus corpos ao chão a sua mente.
E assim, Padfoot deitou-se junto a Prongs novamente, doze anos depois. Ele estava livre e de volta para sua família, mas isso estava longe de ser um pensamento feliz.
Os dementadores poderiam vir capturá-lo novamente naquele mesmo instante e não teriam efeito sobre ele, pois não havia felicidade alguma que pudessem sugar.
————————————
Olá, meus amores!
Tudo bem?
E aqui começamos uma jornada pelo ponto de vista do Sirius sobre todo o terceiro ano.
O que acharam da fuga? Espero que tenham gostado!
Será uma história bem melancólica em muitas partes, mas garanto que a felicidade virá, principalmente nos flashbacks da vida que Sirius tinha com Remus e os gêmeos.
O que vocês mais aguardam ver?
Não esqueçam de comentar bastante!!
Em breve retornarei com mais!
Até a próxima!
Beijinhos,
Bye bye 😘👋
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