Gotas Gélidas
Um novo nascer do dia se inicia, o brilho penumbroso do Sol sobre o vasto céu começa a perfurar o azul-escuro da noite, clareando as árvores, campos e cidades. O clima gélido da manhã é abafado pelo princípio do calor, as neblinas pesadas que encostam ao solo dissipam-se conforme sua presença já não se torna mais tão impactante.
Sua umidade é absorvida pelas gramíneas e folhas dos pequenos arbóreos, que em seus folíolos transpiram as pequenas gotas d'água, suspensas em um ar friorento.
Essas gotas caem justamente sobre a estrada de terra e, principalmente, sobre o rosto de Baal, que demonstra uma nítida cara de irritação com isso.
Aurora também sente uma leve gota gélida do transpirar das folhas cair em sua bochecha. Aos poucos, acorda de um profundo e cansativo sono. Sua visão embaçada é intimidada por frestas da luz do Sol que batem no solo da floresta.
Ela percebe que havia dormido no colo de Baal, que a carregou durante horas para longe do vilarejo. Revendo seus dentes afiados, todas as cenas da morte de seus avós e da violência de seu protetor vieram em sua cabeça como uma pancada sorrateira.
Seu rosto mostra uma expressividade triste, e ela dá um delicado encostar no peito de Baal, descendo de seus braços para poder caminhar.
Na estrada de terra, Aurora andeja silenciosamente ao lado de seu companheiro, evitando encostar na criatura por causa do medo. Baal percebe a intimidação que causa à garota, mas não se incomoda com a repulsa.
— Para onde está me levando? — pergunta Aurora com uma voz baixa e recuada.
— Para o reino mais próximo. — Ele mexe suas orelhas. — Pelo barulho não devemos estar muito longe. — Quando Baal fala, Aurora para de caminhar.
— O reino mais próximo da vila de Alzaia é o Império Myan. Você vai me entregar?
— Te entregar? — questiona confuso.
— Os soldados de Myan foram os homens que nos atacaram ontem e mataram meus...
— Nunca te entregaria — diz Baal com um tom sério. A garota foca em seu olhar amarelo agressivo. — Você é neta da minha amiga, quero protegê-la.
— Me proteger?
— Obviamente os soldados voltarão àquele vilarejo, as pessoas de lá estariam condenadas se você ficasse, e isso é o menor dos problemas. Te observando de perto, entendo o porquê Frederico e Sophia moravam tão longe da capital. — Ele funga com seu nariz de maneira suave. — Você fede a magia de uma forma absurda, além de que sua aura espiritual é muito emissiva.
— Quê? — A garota não entende nada.
— Sou péssimo para explicar isso, o que você precisa saber agora é que sou sua família daqui em diante. — As palavras ríspidas da voz adolescente de Baal transmitem a confiança que Aurora nunca presenciou em muitos humanos. Talvez porque ele não fosse um.
— Então me diga, o que você é?
— Você sofre de amnésia ou esqueceu o que eu te disse ontem? Cruzes! Vocês humanos parecem cachorros às vezes. — Na reclamação de Baal, Aurora se segura para não rir da ironia. — Sou um Hast.
— Eu me lembro que me disseste isso, seu fedido! Eu não sei nada a respeito do que é um Hassst. — Ela faz questão de arrastar a palavra por sua boca.
— Fedido? Isso é cheiro natural, sua pirralha. Tenho culpa de você ser leiga? É Hast! — Seus rostos ficam próximos enquanto se encaram. — Bem... Explicando... Hast é uma raça, sou um dos seres que os humanos chamam de animália. Somos seres místicos que possuem tais características misturadas entre o ser humano e os animais, como você bem pode perceber em mim. Não apenas isso, mas raças assim são profundamente ligadas à natureza e espiritualidade. Somos espécies mágicas poderosas, basicamente.
Ao fim da explicação, Aurora sente-se maravilhada, é como se tivesse descoberto um novo mundo bem à sua frente.
Baal continua a falar ao ver o olhar curioso da jovem:
— Sua avó viajava comigo quando mais nova, julgo que na sua idade, talvez. Ela conheceu praticamente três continentes enquanto nos metíamos em algumas aventuras. — Os olhos de Aurora brilham de orgulho.
— Pensei que minha avó fosse muito apegada à casa, não consigo imaginá-la vivendo aventuras pelo mundo. — Enquanto caminham, ela se põe a pensar. — Um momento, você não parece ser tão mais velho que eu, como a conheceu jovem?
— Nós, os Hast, temos um tempo de vida diferente de vocês humanos. Eu tinha talvez uns doze anos nas estimativas de vocês quando conheci Sophia, agora devo ter uns dezoito.
— E quantos você tem de verdade?
— Cento e vinte anos. — A resposta de Baal deixa Aurora boquiaberta.
— Você é mais velho que meus avós!
— Sim! — Baal para a conversa, olhando para frente. — Chegamos.
Muralhas imensas guardam um enorme portal aberto e, dentro das enormes construções, habita o povo de Myan. Pequenos, porém, variados comércios se estendem na rua de entrada, as pessoas compram armas, comida, artefatos, joias e roupas.
Contudo, o ambiente de euforia e animação aos poucos muda conforme os dois estrangeiros caminham pela rua, as pessoas lançam murmúrios e expressões de nojo e medo enquanto observam os jovens.
— Eles estão com medo da gente? — questiona Aurora.
— De mim... — responde Baal.
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