- 28 -
O dia amanhece cinza e mesmo tendo apagado a noite toda eu ainda me sinto um lixo essa manhã. O que me faz ter vontade de levantar é o cheiro agradável do café que vem da cozinha.
Mas eu deveria ter ficado na cama. O dia na delegacia foi insuportavelmente sombrio. E para completar tudo isso, o Coronel resolveu colar no meu pé e ficar me cobrando por respostas. Se eu tivesse alguma ele acha que eu estaria escondendo?
O dia foi difícil e para completar ainda tive que fazer um discurso no enterro do prefeito. Depois disso, fui direto para casa e estava esgotada, não tanto física, mas psicologicamente.
- Dia difícil? - Vanessa pergunta e já vai me estendendo o pote de sorvete de chocolate com menta que estava comendo.
- Muito. Só quero tomar um banho e juntar forças para levantar amanhã - aceito o sorvete e como uma grande colherada. - Você não se importa não é?
- Claro que não Viv. E se precisar de alguém pra conversar...
- Obrigada Van. Agora, deixa eu ir tomar um banho. Estou com cheiro de cemitério.
Retiro as minhas roupas e jogo no cesto de roupas sujas. Vou para debaixo dos jatos de água e me esfrego bem. Lavo meu cabelo e tudo mais. Saindo do banho escuto o meu celular tocar. E um nome conhecido que está no identificador.
- Nicolau? - atendo.
- Olá Vivian. Como vai a minha Tenente predileta?
- Nick, juro por Deus que eu hoje não estou para brincadeiras...
- Vou ignorar o seu mau humor só porque você me chamou de Nick, e eu gostei disso... Mas eu estou ligando para você para uma surpresa.
Coro, não tinha me tocado que eu tinha chamado ele de algum apelido. Aquilo era resultado de toda a intimidade que estávamos experimentando. Mas eu também tinha gostado de chamar ele assim, de uma forma mais informal.
- Não sei sobre surpresas Nick...
- Ah não fala assim Vivian, deu trabalho organizar tudo. Vamos lá. Eu prometo que eu você vai gostar...
- Como é que você tem tanta certeza que eu vou gostar?
- Porque eu sei que você gosta disso. Não seja uma estraga prazeres. Eu passo aí na sua casa em quinze minutos. Fique pronta.
- Quinze minutos? E pra onde a gente vai?
- Eu já disse que é uma surpresa, vista uma roupa confortável. Nos vemos em quinze minutos Viv - ele desliga e nem me dá o direito de resposta.
Sorrio para o telefone. Ele só quer me animar. Que mal tem isso? Então coloco um short jeans, uma camisa de mangas longas branca e uma sapatilha vermelha. Pego a minha bolsa e nem me preocupo em passar alguma coisa de maquiagem.
Ele não queria que eu ficasse confortável? Então não vou passar nada.
- Ué Viv, eu pensei que você fosse ficar em casa... Mudou de ideia foi?
- Foi mana. Vou dar uma saidinha rápida com o Nicolau, mas não devo demorar muito para voltar.
- Huuuuum, saidinha rápida como um encontro mana? - ela sorri e fica mexendo as suas sobrancelhas sugestivamente.
- Na verdade nem eu sei Van. Mas ele deve estar passando aqui em breve. Acho que eu to precisando espairecer um pouco...
- Você merece Viv! Vai lá esquecer até do nome com aquele gatão!
- Vanessa!
- Ai mana, deixa de ser assim, o homem é lindo, e está na sua, você tem mais é que aproveitar mesmo...
- Vou deixar pra lá e colocar esses seus pensamentos com os hormônios da gravidez! - escuto uma buzina do lado de fora. Quinze minutos é uma ova! - Se precisar de alguma coisa, pode me ligar Van.
- Quero saber dos detalhes sórdidos depois! - ela dá uma gargalhada e sei que ela já está avacalhando.
O carro dele está estacionado na frente da minha casa e assim que eu me aproximo, ele já abre a porta do passageiro e eu me sento. Pelas suas roupas, dá pra perceber que ele tinha acabado de sair do trabalho. Seu blazer estava jogado no bando detrás e os dois primeiros botões de sua camisa estavam abertos. As mangas arregaçadas. Lindo.
- Você vai me dizer para onde estamos indo?
- E qual seria a graça nisso? Guarde a sua curiosidade um pouco, prometo que vai valer a pena.
- E se não valer?
- Hum, isso parece interessante. Se você não gostar da minha surpresa, você pode pedir qualquer coisa para mim.
- Qualquer coisa? - isso está começando a ficar interessante.
- Sim. O que você quiser... É só dizer - ele dá de ombros.
- Bem confiante você não é?
- Tenho certeza disso, pode pedir o que você quiser, que eu sei que você vai gostar. Só se você tiver mentido para mim... Mas sei que não mentiu, pelo menos não sobre isso.
- Eu não menti para você - falo com um pouquinho de raiva. Uma das qualidades que eu me orgulhava em ter era ser sincera. Se bem que muitas vezes a verdade não era uma qualidade, mas mesmo assim...
- Eu sei. Por isso mesmo que eu estou tão confiante.
- Deixe-me pensar sobre o que eu quero que você faça quando eu desbancar toda essa sua confiança... - penso mesmo. Tem alguma coisa que eu desejo muito que ele faça, mas que eu sei que ele não iria fazer?
- Pode pensar com calma. Seja o que for, eu aceito. Eu faço.
- Ah Nick, você pode acabar se arrependendo de falar isso para mim.
- Eu me arrependo de muitas coisas, mas de conhecer e falar com você não é uma delas Vivian... - ele sorri descontraído, como se tivesse acabado de falar para mim que horas eram.
Ele tinha esse dom de me fazer perder as palavras muitas vezes. Era irritante, mas eu amava quando isso acontecia. Eu viro o meu rosto disfarçadamente para que ele não me veja ficando envergonhada.
- Mas isso parece muito injusto... Só eu que estou em desvantagem aqui... Que tal equilibramos o jogo Viv? - sua sobrancelha ergue quando ele para num sinal vermelho.
- Que tipo de equilíbrio você está pensando?
- O meu favorito. Se você pode pedir que eu faça qualquer coisa, quero receber a mesma cortesia. Se você gostar da minha surpresa, você fica me devendo uma.
- Feito - sorrio e sinto um arrepio de excitação. Não sei o que seria melhor, se eu ganhasse e tivesse ele na palma da minha mão ou se eu gostasse da surpresa e ele me pedisse algo.
Definitivamente era excitante.
- Maravilha. Agora, para a surpresa ser completa, abra o porta luvas - quando abri tinha uma venda preta ali dentro.
- Você carrega uma venda dentro do seu porta luvas?
- Um cara tem que ser preparado não é? - ele me dá um sorriso malicioso. - Brincadeira, eu peguei porque quero manter a surpresa até o final.
- Engraçadinho.
- Você pode colocar a venda agora. Não devo demorar muito mais para chegar.
Não sei como ele faz isso, mas é fácil para eu atender os seus pedidos. Eu estava curiosa para saber qual seria a minha surpresa, e acho que não saber qual será ela até o último momento traz um sabor todo especial à espera.
Passo o tecido macio pelos meus olhos e aquele pequeno pedaço de tecido cheira como ele. Mas é claro que não falo isso para ele. Descanso as minhas mãos no meu colo e tento não pensar em muita coisa enquanto o carro ainda está em movimento.
Toda parada que dava, eu me enchia um pouco mais de curiosidade. Até que finalmente ela acaba.
- Chegamos - ele fala baixo e perto demais do meu ouvido. Eu arrepio toda, mas tenho a certeza que ele fez isso só para provocar.
Elevo a mão para retirar a venda, mas sua mão cobre a minha e me impede de ver.
- Ainda não Vivian. Ainda temos um pequeno trecho para percorrer, mas pode deixar que eu levo você - escuto o barulho da porta abrir. - Sem espiar... - e então a sua porta fecha e a minha poucos momentos depois abre.
Sempre me impressiono quando um dos nossos sentidos é limitado, os outros aguçam com vontade. Os sons, os cheiros, os toques. Não sei onde estava, mas era um lugar silencioso. Tudo o que eu conseguia sentir era o cheiro dele e também de asfalto, mas era muito pouco. E a mão dele apoiada na base da minha coluna para me orientar era todo o toque que eu queria.
Andamos poucos metros e Nicolau foi atencioso em me dizer onde tinham desníveis e escadas. Até que paramos e ele fica imediatamente atrás de mim. Suas mãos seguram a venda e mais uma vez ele me tortura com sua voz no meu ouvido.
- E voilá... - sinto o seu sorriso na minha orelha e pisco algumas vezes para me adaptar com a luz. Os holofotes eram grandes e iluminavam bem como o dia a pista. Olho ao meu redor, e a poucos passos de mim vejo um carro de corrida. Estávamos no autódromo da cidade. Então era por isso que senti cheiro de asfalto.
- Certo, estamos no autódromo da cidade... E então? - pergunto, mas no fundo fico torcendo para que ele fale o que eu estou pensando.
- Sei que você ama velocidade, e então arranjei a pista para você...
- Como? - viro em sua direção para encará-lo e mal consigo conter a minha empolgação.
- A pista é toda sua Vivian. Aquele carro ali está com o tanque cheio e só esperando que você pise fundo - ele aponta para aquela belezoca vermelha me esperando.
- Isso é sério Nicolau? Você não está brincando comigo não está?
- Por qual motivo eu brincaria com isso Vivian? - ele se encosta perto de uma coluna e pego ele de surpresa quando eu o puxo para um abraço. Não satisfeita apenas com o abraço eu puxo seus lábios nos meus e dou um beijo com o máximo de carinho que consigo reunir.
- Obrigada - falo sincera e ele sorri ao me estender as chaves do carro.
Mal posso acreditar quando eu coloco as chaves na ignição e o motor ruge para vida. Ao lado do banco, tinha um capacete e nem penso duas vezes antes de colocá-lo. Acelero um pouco e meu corpo treme com o poder do motor. E eu tenho a pista livre para pisar fundo o quanto eu quiser.
Dou a primeira volta somente para conhecer a pista, saber os locais onde posso acelerar sem problemas. Já na segunda me solto e deixo a velocidade me levar. Nem sei quantas voltas eu dou, só paro mesmo quando o carro acende a luz da gasolina. Estou mais leve, mais feliz. Não consigo tirar o sorriso bobo dos lábios.
- Você tinha razão Nick. Eu amei a surpresa - não me importo de ficar devendo um favor à ele. Ele tinha feito aquilo por mim e eu estava imensamente grata. O peso dos meus ombros ficaram para trás em alguma dessas curvas.
- Sabia que você ia gostar - ele me olhava com pura satisfação. - E o melhor de tudo é que você ainda me deve uma.
- Devo mesmo. Nem sabia que estava precisando tanto disso - devolvo as chaves em suas mãos. - Você acertou na mosca nessa surpresa. Mas como foi que você conseguiu isso?
- Só cobrei alguns favores, nada demais... Quando se empresta dinheiro para as pessoas certas, coisas assim ficam fáceis de acontecer.
- Já sabe o que vai pedir? - admito, estou ansiosa para saber a resposta.
- Ainda não sei... Não pode ser uma coisa simples demais... Tenho que ter uma boa ideia, não é todo dia que me deparo com uma oportunidade dessas.
- Olha lá o que vai pedir hein?
- Pode deixar, vou ser completamente maluco e irracional no meu pedido - ele entrega as chaves numa pequena recepção na frente do autódromo e é só então que eu percebo quantas horas tinham passado. Vanessa deve estar preocupada. Vamos em direção ao seu carro.
- Você pode me preparar uma surpresa dessas sempre que quiser ouviu Nick?
- Em alto e bom som.
Ainda conseguia sentir a adrenalina pulsando em minhas veias quando entrei no carro. Tive uma vontade grande de subir em cima dele e ter uma sessão de sexo quente no carro dele. Mas me contive e amarrei aqueles pensamentos.
Quando me deixou em casa, ele me dá um beijo de boa noite. Não quero pôr rótulos em nós, gosto do modo como estamos interagindo e não quero que mude por conta de um rótulo de namorado, ou amante, ou amigos coloridos, ou qualquer coisa assim.
Vanessa já estava dormindo, então escapei de um monte de perguntas que ela iria fazer. Então só troco de roupa e vou direto para cama, sorrindo e me sentido aliviada.
Hoje é sexta feira e dia de quê? Sim, de Principal Suspeito :D Uma pequena pausa nas mortes, por que enfim, nós merecemos não é? E só o Nicolau mesmo para me distrair num momento assim... Ainda bem que ele está por aqui.
Mais de oito mil leituras e quase mil votos. Tenho que agradecer muito a todos vocês que não me abandonaram e continuam aqui firmes e fortes acompanhando o nosso Nick e a Viv. Obrigada a todos. De coração.
Próximo capítulo as intrigas vão voltar com força total, e vamos ter que dar muitas voltas na pista se quisermos deixar para trás. Nos vemos na próxima sexta. ;** E aguardem, que fortes emoções estão à caminho. Beijos e até lá ;**
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