Capítulo 19
Asterin passava o remédio no machucado fazendo milhares de barulhos estranhos, Marlon estava pensando seriamente em atirá-la para fora da casa.
- Acabou? - ele disse bufando.
- Sim... - ela disse solta do o ar aliviada - Dói muito!
- Sério? Nem fui capaz de ouvir.
- Que cruel! - ela riu se levantando da cadeira e indo para o canto pegar, pela primeira vez a bolsa.
Sem muita cerimônia ela começou a ver o que exatamente Jhon havia colocado ali dentro. Mudas de roupas, mas todos vestidos ou saias, dinheiro, algumas facas de luta e... seu ar falhou no peito, ali no meio de tudo estava um desenho seu de Aires, Akanta e Vincent, aquilo tinha sido feito há muitos anos atrás, deveria estava no meio das roupas. Sentia falta...
Bem, não era só o desenho que estava ali para lembrar do seu passado e aumentar sua dor de cabeça enquanto tentava refletir o que deveria fazer, mas também havia o escudo, o machado e o anel de noivado. O anel!
Assustada a moça olhou para o seu dedo e engoliu seco. Não tinha se livrado daquilo?
- Asterin, tudo bem? - o rapaz disse sentando na cama ao seu lado - Sua respiração está estranha.
- Eu... - ela começou a falar, mas se surpreendeu com a voz de choro.
Passando a mão pela sua bochecha sentiu o molhado. Merda!
- Eu... - ela tentou continuar, mas não conseguia, as lágrimas tomavam conta dela.
Sentia falta do castelo, das pessoas de lá, mas não podia voltar. Agora, aquelas lágrimas que deixavam seus olhos eram de Gayla, lutando pela última vez em voltar para a sua casa.
- Ei... - Marlon disse levantando sua mão e quase acertando a dela - Calma. O que foi?
- É tão frustrante não se lembrar de algo... - ela disse engolindo seco e pegando na mão dele - Só isso.
O rapaz ficou em silêncio por um tempo, refletindo um pouco, mas abriu um sorriso.
- Vamos sair um pouco? - ele disse se levantando e puxando a sua mão de leve - Você ficou presa nessa casa durante duas semanas, acho que isso possa está deixando sua mente ociosa e...
- Me enlouquecendo? - ela disse sorrindo - Concordo com você.
O rapaz decidiu manter sua mão na dela, pegou o cajado e assoviou para que Oto viesse até seu ombro. Asterin observava isso achando uma certa graça nessas preocupações para sair de casa, mas chegou a conclusão que isso era um rotina dele, a qual nunca antes sonhou em se preocupar.
Assim os dois saíram da casa, Marlon batendo o cajado no chão para saber por onde ia e Oto vez ou outra fazendo alguns barulhos, sinalizando o caminho.
- Para onde estamos indo?
- Há três vilarejos por aqui. - ele disse apertando a sua mão na dela - O que Genoveva mora é o maior deles por aqui, mas os outros dois só tem casas e um salão comunal, sem comércio ou pessoas de fora.
- Isso parece bom... - ela disse caminhando ao seu lado e observando as árvores que cresciam para todos os lados.
Foi assim durante boa parte do caminho, vez ou outra sentia uma pontada nos pontos, mas nada preocupante ou insuportável, até que uma música chegou a eles. Eram flautas, violinos, alaúdes e tambores, um ritmo único e delicioso, o coração de Asterin se animou imaginando aquela festa.
Com os passos um pouco mais velozes a floresta foi pouco a pouco abrindo espaço para algumas casas criadas quase que uma clareira grande com uma praça central e uma enorme construção de madeira pintada de azul e verde. A moça quase que saiu correndo em direção de uma pequena fogueira feita no centro de tudo e algumas pessoas dançando em uma pequena festa, mas Marlon parou no limiar da floresta de uma vez.
- O que foi? - Asterin disse se virando para ele, curiosa pela hesitação.
- Apenas isso... - ele disse tirando uma faixa branca do bolso e colocando cuidadosamente sobre o rosto - Pode me ajudar?
Um pouco assustada pela imagem do Marlon assim a menina se aproximou dando a volta nele. Sussurrando, ela pediu para abaixar um pouco, quando fez isso a garota sorriu de canto de boca, um pouco constrangida.
- Preciso que você abaixe mais.
- Olha, eu sei que você é baixa, mas...
- Você tem dois metros! - ela riu enquanto ele quase ajoelhava no chão - Eu tenho um metro e sessenta, quem é o esquisito aqui não sou eu.
- Obrigado por me chamar de esquisito. - ele riu se levantando com a faixa bem posta - E obrigado por isso, normalmente meu cabelo fica enrolado na faixa.
- Por que dela? - Asterin disse vendo o rapaz, era assustador.
- Na frente de muitas pessoas é melhor deixar claro que eu sou cego. - ele deu de ombros - Evita explicações complicadas.
A moça ficou em silêncio enquanto ele saia na frente em direção da música, de costas indo por ali sentiu que havia peso em seus ombros. Suspirando Asterin começou a seguí-lo até o meio daquelas pessoas que já o comprimentavam animadamente.
- Marlon! - um homem com uma pele mais dourada do grupo disse rindo - Veio pela festa!
- Nem lembrava que havia festa hoje, Dylan. - ele respondeu rindo - Qual é a ocasião?
- Nascimento de uma nova criança. A família está em casa babando em cima do chorão. - um homem mais velho e com cabelos brancos sorria - Mais uma nova vida se iniciam entre nós. Quem é a garota?
- Ancião... - Marlon disse pedido a mão da moça com a sua, assim saber onde ela estava.
- Asterin. - ela disse sorrindo - Marlon me salvou de ladrões e estou me recuperando de um ferimento na casa dele.
- E o que fez nosso amigo trazer tal dama a nossa vila? - Dylan disse já se levantando e beijando a mão da moça.
- Gastar a energia dela... - ele sorriu - Mas não demais! Seus pontos!
- Sim, senhor! - ela disse já mexendo seus pés por causa da música.
- Mas já está pronta para dançar... - o velho disse - Vá, criança!
Sem mais palavras, a garota que ansiava dançar algum tempo sentiu seu corpo movimentar até o grupo de mulheres próximas a fogueira para seguir seu ritmo. Recebeu olhares de curiosidade pela sua presença nova e esquisita, mas ao verem Marlon, apenas sorriam e mantiveram o seguimento da festividade.
- O que ela foi fazer? - ele disse para os dois sentados ali.
- Dançar... - o velho disse rindo - Muito animadamente para quem tem pontos no corpo.
- Droga... - Marlon disse bufando e se sentando em um lugar indicado por Oto, sorria discretamente.
Mais tarde, enquanto voltavam para a casa de Marlon, Asterin sentia os pontos completamente doloridos, junto com seus pés e panturrilha. De tempos em tempos ela olhava para seu ferimento, temerosa em ver aquela costura tão bem feita aberta, mas esse limite do corpo não chegou a passar.
- Você chegou a tocar em algum momento... - ela observou isso calmamente.
- Sim e você não parou de dançar um segundo. - ele sorriu de volta - Se sente mais tranquila?
- Completamente! - ela riu, quase rodopiando - O que é aquela vila? Não parece que muitas pessoas passam por ali ou que algum nobre tenha controle.
- Aquele lugare existem há anos. Muitos lugares são assim. - ele observou calmamente - São descendentes de pessoas que vieram com Celina e tinham hábitos mais tradicionais do que o resto.
- Mais tradicionais? - ela riu - Do que o povo de Zaark em geral?
- Bem... - ele deu de ombro - Somos a mistura de dois povos e um deles tinham hábitos nômades, então ter culturas completamente diferentes não é surpresa.
A moça pensou um pouco refletindo sobre essa informação nova.
- Então... - ela molhou os lábios - Há várias vilas que comemoram e agem de forma completamente diferente do que essa?
- Sim. A vila de Genoveva e a outra não comemoram nascimento, mas a maior delas sempre faz enormes festas de casamento. - ele sorriu - Na cidade onde meu irmão vive existe uma festa que bate no mesmo dia que a de Avalon. Você vai ver...
- As divisões das terras de Zaark e com os lordes seguem essa lógica?
- Sim. - ele sorriu - Festas, união com os nativos e até valores são diferentes de cada região. Pequenos países dentro de um.
- Mas isso não daria problema?
- A rainha existe para evitar isso.
Essas palavras chamaram a atenção de Asterin, então seria aquilo que Avalon faria, cuidar em manter unidade entre todos. Isso soou em seus ouvidos algo mais atrativo do que simplesmente o que Aires estava destinado a fazer... talvez, só talvez, ser rainha de Zaark não fosse algo ruim, ainda mais se fosse para unir pessoas como a daquela vila.
Na capital, Liam andava pela cidade com uma certa melancólia, nesses últimos dias a falta da irmã estava fazendo o seu peito doer e achou que fazer um passeio sozinho pelos locais, os quais ela gostava, talvez o ajudaria no processo. De certa forma, brincar de se pendurar nas árvores da floresta, como ela fazia, e observar alguns instantes o povo andando pela praça por cima parecia fazer tudo desaparecer.
Agora, caminhar pela feira e perceber que em nenhum momento ia encontrar um cabelo ruivo com um rapaz alto ao lado, seja observando algo, ou simplesmente rindo, fazia a saudades apertar. Não, sua irmã não estava morta, mas estava nas mãos do inimigo e isso fazia com que ele a enterrase em seu íntimo.
Claro que ele poderia ser positivo, só que ele não estava disposto a decepção. Já havia perdido muita coisa nessa vida e a única que ele jamais sonhou em ser retirada dele estava por um fio, enfim, mais algo na lista para poder lidar.
Um raio caiu no horizonte, estavam chegando no ápice da primavera e isso significa iniciar os preparativos para o aniversário de Avalon. Internamente, Liam pensou se aquela princesa iria, finalmente, comemorar seu aniversário em casa, como a futura rainha ou se até mesmo a própria guerra não estaria acabada.
Mais um sonho em sua mente. Talvez ele devesse sonhar mais, era apenas um adolescente!
Vendo as pessoas começarem a temer a chuva, pensou em como os olhares delas, apesar de alegres, tinham medo perante aos soldados que pareciam aumentar cada dia mais na capital. Bufou ao ver os cartazes com a sua rainha espalhados em todos os lugares com aquele nome dado pelo rei de Catalan. Será que ela sentia raiva dela? O que a fez lembrar e fugir?
Torcia que quando a moça chegasse pudesse perguntar esse tipo de coisa para ela. Quem sabe, por não ter sido criada como realeza, esse ar sonele que alguns dos nobres ainda mantinha e que afasta todos de perto não existe nela. Esses pensamentos o fez parar na frente do cartaz durante um longo tempo, observando o rosto da garota, o qual lhe parecia tão comum que dificilmente olharia para ela de novo se tivesse passado por ele anteriormente.
- Essa garota insolente está causando um monte de problema. - uma voz do seu lado chamou sua atenção.
Apesar do rapaz não ter mudado nada em sua expressão, sentiu o sangue gelar e seu corpo tensionar igual fazia antes de atirar uma flecha ou atacar com as novas armas que sabia mexer. Ali estava, ao seu lado, Alec.
Guarda nojento de Catalan tinha uma expressão de desgosto para a imagem da rainha e casualmente tinha seus braços cruzados sobre o peito, alheio aos olhares assustados dos cidadãos que se afastavam dele como se tivesse uma doença contagiosa. Aquele homem tinha causado muitas mortes naquela cidade e havia mandado matar mais por toda a extensão das terras dos Breindal. O que queria com Liam?
Os olhos do homem cruzaram com o do menino. Primeiro, Alec ficou surpreso por encontrar uma expressão neutra, quase tranquila na sua frente, gostava de ver as pessoas se encolherem na sua frente e evitar seus olhos a todo custo. Depois, percebeu que estava conversando apenas com um menino.
- Quanto anos tem? - ele disse virando seu corpo na direção de Liam.
- Treze... - ele respondeu, mais uma vez calmo, sem gaguejar ou hesitar - Nasci um pouco antes de Catalan atacar.
- Então não conhece a antiga Zaark? - o homem sorriu satisfeito - Melhor assim. Caso o contrário estaria com a cabeça cheia de sonhos como esses velhos que não param de reclamar.
Liam analisou o homem por mais um tempo, assim de perto ele não era mais tão assustador. Fedia a vinho e parecia está de ressaca, mais distraído do que um homem com tantos inimigos deveria, principalmente exposto assim na rua.
- Você é bem alto para idade... - Alec continuou conversando - Achei que estava conversando com um daqueles caras musculosos que suas mulheres parecem ser tão boas para criar. Quando chegar aos seus vinte anos vai ser assustador!
- Obrigado. - Liam disse dando de ombros.
- Já pensou em servir Catalan? Daria um excelente soldado. Talvez o mais forte dessa década! - ele disse mais animado - Tenho certeza que ninguém teria nenhuma objeção de você ser de Zaark com esse tamanho...
- Sou apenas um simples artesão. - ele o interrompeu, causando mais espanto - Não pretendo segurar em nada além da minha faca para entalhar madeira.
- Uma pena... - ele disse com um sorriso mais preocupado - É um desperdício de força!
- Deveria procurar soldados inteligentes, não fortes. - o garoto disse, já se virando para sair - Tenho certeza de que são mais eficazes.
- Talvez... - Alec agora estava completamente espantado com a criança - Garoto, conhece uma garota ruiva como você? Não há vejo mais pela cidade, ela andava com uma capa prateada.
- O que gostaria com ela? - Liam disse pensando na irmã, assustado por Alec a procurar, mesmo que ela esteja mantida refém de Catalan.
- Saber se ela está bem. Ela era a moça mais bonita dessa cidade e é uma flor que gostava de admirar.
- Flor? - a ideia de que alguém pudesse comparar a sua irmã com algo tão frágil e efêmero quando uma flor gerou risadas em Liam - Duvido que ela seja isso, senhor.
- Bem, então a conhece?
- Sim... - ele engoliu seco, talvez não devesse falar muita coisa - Minha família é toda ruiva como nós dois. Ela está fora da cidade por hora.
- Quando irá voltar?
- Por que desse interesse? - isso soou mais rude do que pretendia, mas não gostava que alguém estivesse perguntando tanto da sua irmã.
- Bem... - ele riu - Já disse, ela é bonita.
Aquelas palavras fizeram com que o rosto do menino endurecesse. Liam era novo, mas já havia percebido os olhares que alguns soldados de Catalan tinham para as moças de Zaark, não só isso, mas também de algumas brigas e problemas que eles geravam para elas. Imaginar sua irmã sendo assediada por aquele homem na sua frente fez seu sangue ferver, a única coisa que poderia acalmá-la era lembrar que ela estivesse ali, provavelmente Alec estaria nocauteado.
- Não acho que isso irá ser produtivo para você. - ele deu de ombros - Não perca seu tempo com ela.
- Bem, estou observando a cidade de qualquer maneira. Quando ela voltar eu vou ver.
Dando as costas para aquele homem, Liam sentiu quem haveria muitos problemas ainda com ele. Assim que Avalon chegasse esperava que a primeira coisa que fizesse era acabar com aqueles invasores.
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