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Capítulo 17

Because maybe
You're gonna be the one that saves me
And after all
You're my wonderwall

Wonderwall, Oasis

      Só solistas boas dançam o Pas de Quatre. 

      Foi com essa frase que papai me animou quando contei que eu dançaria esse papel no espetáculo de encerramento do Curso de Verão da Promoarte. Eu estava bem triste por não ter sido escolhida para o papel do Cisne Branco, me sentindo derrotada. Tudo porque acharam que eu não tinha maturidade pra ser a estrela principal do espetáculo.

      Não tiro a razão da direção artística. Eu quase agredi a Antonella Carrascosa na audição, tudo porque a argentina me deu um pontapé covarde na aula. Eu entrei em parafuso, chamei-a de vaca e quase fui expulsa da aula pela Manuela Almeida.

      Tive de me recompor a fim de não pôr minha aula a perder, e no fim, ser um dos quatro pequenos cisnes do Ato 2 de Lago dos Cisnes estava de bom tamanho, apesar de eu querer mais. Eu sempre exijo mais do pôr do sol.

      A lição que eu tirei daquele incidente foi: uma bailarina sempre se equilibra numa corda bamba, e simples detalhes podem pôr a perder todo um trabalho de semanas.

      Mesmo achando que eu merecia uma segunda chance, acabei me apegando ao papel. O coração de uma bailarina é tão receptivo a novidades, ao desafio, que passei a não me importar de não ser a estrela. Eu tinha certeza que minha hora chegaria.

      Duda acabou se machucando. A fratura incompleta em seu pé a tirou do espetáculo e fui escolhida para substituí-la, fazendo par com Vítor Hugo. A noite do espetáculo foi uma das noites mais felizes da minha vida, a realização de um sonho. Nunca chorei tanto. Mas eram lágrimas de felicidade.

      Faltam duas horas para o espetáculo. Já fizemos as marcações de palco e a equipe técnica terminou os ajustes dos canhões de luz.

      O palco está pronto para acolher um grupo de jovens cheios de sonhos, e entre eles, acho que sou a mais ansiosa. Não por estar debutando como bailarina do Ballet Imperial, junto com os melhores bailarinos do Brasil. A verdade é que eu quero chegar ao íntimo de cada uma daquelas pessoas.

      As cortinas se fecham para um longo intervalo até o início da apresentação. Os bailarinos vão um a um, ou em duplas, ou em grupos, em direção aos camarins. 

      Permaneço olhando para as cortinas, imaginando todas as cadeiras do outro lado. Daqui a pouco elas estarão todas ocupadas por velhos, jovens e crianças, e se apenas um deles decidir entrar numa escola de balé e aprender a dançar porque viu a gente dançando, me sentirei a garota mais feliz do mundo.

      Um sorriso quer surgir no meu rosto. Tento controlar as batidas do meu coração, mas não adianta. É mais forte do que eu. 

      Inclino meu corpo, apoio as mãos nos joelhos. Toco minha polaina, dedilho a superfície da minha meia calça, que é o véu que cobre minhas pernas. Conto com vocês, digo a elas.

      Fechando os olhos, suspiro profundamente e endireito meu corpo. Olho em volta como se tudo isso tivesse sido feito pra mim, e dando um sorriso, sigo atrás dos outros bailarinos, começando a tirar pelo ombro a alça do collant.

                               …

      Visto o figurino. Ponho na cabeça a tiara em forma de plumas se cisne, começo a me maquiar em frente ao espelho retangular, diante do qual boa parte das garotas caracterizadas como cisnes estão prestando um culto coletivo à vaidade. 

      Passo pó de arroz no rosto, delineio sombra em volta dos olhos, conseguindo em instantes o efeito que quero, de parecer um ser encantado, uma garota enfeitiçada e que dança sob a lua pálida.

      Fico em pé e tiro uma selfie minha, postando a seguir no Instagram. As vozes das meninas, que à todo momento perguntam se a gente viu sua sapatilha, caixa de grampos ou batom, não chegam a me irritar. Todo mundo fica assim, desorientado, quando está pronto pra entrar no palco. 

      Faço o sinal da cruz, me aproximo, sorrindo, de uma das garotas que vai dançar comigo. Nastia não retribui ao sorriso, mas seu semblante é tranquilo, e seus olhos azuis se conectam aos meus, buscando meu íntimo. Abaixando a cabeça e prestando atenção na tatuagem floral que eu tenho no pulso esquerdo, ela semiabre a boca. Segura minha mão, faz um movimento sutil com a cabeça.

      — Tatuagem bonita — ela faz um elogio.

      Não é a primeira vez que ela toca e olha minhas tatuagens. Nastia tem o hábito de puxar assuntos e retomá-los no dia seguinte, e no dia seguinte, até se cansar. Ontem mesmo, depois do meu primeiro ensaio, ela comentou sobre minha tatuagem floral, dizendo que ela é bonita e combina comigo. Eu nunca faria uma tatuagem que não combinasse comigo.

      — Obrigada — agradeço.

      A ruiva dá um sorriso discreto. 

      — Tô muito feliz de dançar com você — confesso. 

      Nastia não responde. Continua a me avaliar, sem jamais se desconectar dos meus olhos.

      — Ato 2 em dez minutos! — um dos assistentes põe a cabeça e o braço dentro do camarim.

      O caos atinge seu ponto máximo com bailarinas dando gritinhos e ofegando enquanto terminam de se produzir. Corremos para o palco. As cortinas se abrem e algo mágico acontece. 

      Todas nós entramos serpenteando no palco, saltitando com graça e leveza, sendo observadas de longe por Yuri, lindo em seu figurino de Príncipe Siegfried. O russo tem um olhar impressionado, olha para todas nós com fascínio, e não demora para que aviste o objeto de seu desejo: a triste Princesa Odette.

      Dominique está assustada, ao mesmo tempo que quer se entregar ao amor. Os dois se olham. Ele tenta se aproximar, mas ela foge. O amor é um animal arisco.

      As meninas e eu entramos dançando de mãos dadas, começando com uma movimentação das nossas cabeças para o lado. Executamos pas de chats, damos chutes para frente com as pernas alternadas e esticadas. Meu medo inicial (de não conseguir acompanhar o grupo, de errar) se mostra infundado, porque consigo o que quero, e quando fazemos a pose final (com uma das pernas dobradas à frente, o outro joelho no chão, as mãos cruzadas diante do peito), meu coração estremece de alegria sob os aplausos da plateia.

      Não há sensação mais gratificante do que ser aplaudida. Isso nos faz sentir especiais, incute na gente a certeza de que, apesar de estarmos entre pessoas comuns, não pertencemos ao mundo em que elas vivem.

      — Bravo! Bravo! — as pessoas gritam em catarse.

      No desdobramento final do balé, quando o amor do casal atinge seu clímax e a música fica intensa, Dominique cai nos braços de Yuri, e o Cisne Branco morre junto de seu amado.

      Nós corremos em volta dos dois, agitando nossos braços como cisnes batendo desesperadamente suas asas por causa do triste destino dos dois, e posso sentir meus olhos se inundando de lágrimas por causa da emoção. 

      O maestro faz com a batuta um movimento duro, a orquestra para de tocar, as cortinas se fecham enquanto nós, os 32 cisnes, também tombamos sem vida.

      Os instantes que se seguem são de uma explosão de sentimentos. Nos abraçamos, chorando como crianças. As pessoas continuam a gritar e a assobiar, batendo palmas. A acústica do teatro faz o eco destes sons tão bem vindos se inserirem dentro de todos nós, fazendo com que nos sintamos fora do chão.

      — Foi perfeito, gente. Parabéns! — Luna dá um forte abraço em mim e em Nastia, que segurava minha mão desde que saímos do palco após reverenciarmos a plateia.

      A russa não entende a euforia da minha colega de quarto, e tenho medo de que ela reaja de um jeito agressivo. O meio sorriso que a ruiva dá por uma fração de segundo, no entanto, me deixa aliviada.

      — Spaceeba — Nastia murmura.

      Outras garotas se aproximam de nós, e eu sou a mais assediada. 

      — Mandou bem, Danny — Kauane fala, alegre. 

      — É mesmo — Nádia, ao lado dela, concorda. — Foi escolhida na última hora pra substituir a Manuela, e dançou igual uma princesa.

      — Você é foda, garota — a índia segura minhas mãos.

      Sorrio encabulada, embora eu não possa esconder que estou lisonjeada pelos elogios.

      Nastia fecha seu semblante com tantas garotas quase apertando nós duas e olha para os lados como que procurando uma saída, seja dali, seja de si mesma, se sua bolha de autoproteção contra estranhos.

      Talvez ela não esteja pronta para interagir com tantas pessoas ao mesmo tempo. Talvez ela precise de mais tempo para aceitar dividir algo mais do que sua dança e encanto de bailarina. Penso em puxá-la pela mão, tirá-la daqui, levá-la pra um lugar onde ela possa respirar.

      Mas o olhar dela se ilumina de repente.

      — Yurochka¹! — sua voz quase sai num grito. 

      Olho para a direção em que ela mira. Yuri está vindo em nossa direção, elegante em sua casaca e tentador em sua calça justa de Príncipe Siegfried. Nastia vai ao seu encontro, e ele a abraça, beijando-lhe a testa.

      — Você esteve maravilhosa, Nastia — ele elogia a irmã, com voz serena.

      Nastia balança a cabeça e traz o irmão pela mão para perto de mim.

      — O que achou da Danielle? — ela indaga.

      Surpreendida pela pergunta da russa, parece que um braseiro é posto no meu rosto, e posso senti-lo se tingindo de vermelho. Intercalo um olhar entre Yuri e a irmã, perguntando com um olhar a ela por que você tá fazendo isso comigo?

      — Ela dança maravilhosamente — o bailarino dá um sorriso para Nastia. E se volta para mim: — Parabéns, Danielle.

      — Você é muito gentil, Yuri — agradeço, encabulada.

      Ele assente com gravidade, ainda sorrindo. Consigo ver que está tão feliz quanto todos nós, embora seu semblante o mostre com discrição, como se seu calor humano estivesse oculto por uma couraça (e que ele não gosta de mostrar fora dos palcos).

      — Vamos? — pergunta à irmã, que acena concordando. — Até amanhã, Danny — diz, olhando para mim.

      — Paka paka² — Nastia acena com os dedos.

      — Tchau!

      Tento disfarçar meu encabulamento direcionando meu rosto para outra direção, e como por provocação, avisto Dominique  recebendo, sorridente, uma caixinha das mãos da prefeita do Rio de Janeiro e também um abraço da mesma. A secretária de Cultura também cumprimenta a Odette negra, que exibe às duas um sorriso agradecido e orgulhoso.

      — Parabéns, estamos todos orgulhosos — esta última diz. — Você será uma estrela da dança um dia.

       O ego de Dominique se infla com tanto assédio, tantos elogios. É uma pena que uma garota tão gata e uma artista tão talentosa tenha prazer em pisar nas pessoas.

      Quando ela finalmente é deixada em paz, percebe que estou vendo-a. Não tento fugir ao seu olhar altivo. Mantenho meu queixo empinado, encarando-a em desafio. Ela ri enquanto caminha em nossa direção.

      — Você dança bem, Danielle — sibila com voz venenosa, mas forçadamente gentil. — Achei que você ia cair de bunda, mas impressionou todo mundo. Foi só por uma noite, mas a pata choca virou um cisne.

      — Fico contente que a primeira bailarina júnior tenha gostado do meu balé — sorrio com ironia.

      Queria poder jogar na cara dela: e pra uma garota que toma antidepressivo, você expressa doçura e encanto muito bem. Mas não sou esse tipo de pessoa.

      — Eu tô sem tempo agora, porque estou cansada e amanhã vou viajar para a Bélgica. Vou disputar uma competição — ela fala com o habitual orgulho —, mas quando eu voltar, quero ter uma conversa com você. Podemos?

      Não sei o que essa garota pode querer tratar comigo, e muito menos se quero conversar com ela. De pessoas de quem não quero ser amiga, quero manter uma distância segura, e Dominique parece ser capaz de qualquer tipo de maldade. 

      Porém, ela é primeira bailarina. E eu respeito a hierarquia da escola.

      — Tudo bem — concordo.

      — Fechou, então — a garota caracterizada de Princesa Odette me dá as costas e se retira. 

      Fico olhando para sua bunda bem feita, mal coberta pela saia bandeja do figurino branco com detalhes prateados. 

      Que desperdício, murmuro. Se eu não tivesse namorado e ela não fosse tão cuzona…

       Eu e meu incontrolável fascínio por mulheres negras! Nicole diria que eu tenho fogo na xoxota, que eu preciso de terapia. Ela não escolhe as palavras. 

      Irritada comigo mesma, fecho os olhos, inspiro e expiro. Abro-os de novo.

      Olga, elegante em seu blazer preto, passa cumprimentando todos os seus alunos. Com seu jeito fechado, austero, diz apenas parabéns, você fez uma boa apresentação e se dirige para o próximo bailarino. E para a próxima. Até chegar em mim.

      Põe a mão no meu ombro, me avaliando com seus olhos sempre observadores e que captam os detalhes mínimos dos passos e movimentos de seus alunos. Seus lábios murchos não se movem. São justamente seus olhos cinzas que falam por si. Por mais surpreendente que pareçam, eles sorriem.

      — Você se leva ao limite e se desnuda para seu público. Isso bom — ela fala.

      Observo de soslaio a mão dessa mulher enigmática no meu ombro, e me fixo nos olhos dela. Meu atrevimento a incomoda; ela não espera ser desafiada assim.

      — Eu não vim ao Rio de Janeiro só pra ver o Cristo Redentor — respondo. — Vim pra ser uma estrela da dança.

      Olga Fiodorovna assente em silêncio e sai.

      Yuri e Nastia estão saindo juntos. Antes de passarem pela porta de saída, ele me olha uma última vez por sobre seu ombro. Acompanho com o olhar os dois se afastando, o sorriso tímido ainda em em meu rosto. É um amor entre irmãos, mas um dos mais lindos que existe, porque eles se importam de verdade um com o outro.

      Ainda estou olhando para a porta por onde os gêmeos saíram, quando sinto minha cintura ser envolvida por um par de braços musculosos por trás, ao mesmo tempo que sou beijada no pescoço. Os pelinhos dos meus braços e nuca se arrepiam; abro um sorriso e fecho os olhos.

      — Você esteve linda, gata — Odin sussurra com voz sedutora ao meu ouvido.

      Deixo que ele dê outro beijo em em meu pescoço, e só virando a cabeça para olhá-lo nos olhos, selamos nossos lábios com um beijo mais prolongado, sem nenhum pudor.

      — Adoro quando você chega assim por trás de mim e me segura pela cintura — descolo minha boca da dele e murmuro em tom malicioso.

      — Eu sei. Gosto de pegar desprevenida. — Odin toca meu rosto com o dorso do indicador, o passa na minha tiara branca feita de pluma de cisne.

      Me viro toda para ele e passo meus braços em torno de seu pescoço. Meu corpo começa a sentir calor. Cada célula do meu corpo vibra com o contato do seu corpo no meu. Nossos instintos nos chamam a um contato mais íntimo.

      — Vamos sair daqui? — proponho. — Isso aqui já ficou chato.

      — Pra onde quer que eu te leve? — Odin me puxa para si.

      — Pra qualquer lugar. 

      Pouco depois, Odin e eu estamos jantando num restaurante de comida japonesa, conversando e trocando beijos espaçados. Ele está feliz pelo desfile em São Paulo ter sido um sucesso e também feliz por eu estar sorridente.

      — Gosto de te ver assim, alegre — seus dedos tocam meu rosto com suavidade. 

      Correspondo ao seu gesto de carinho segurando sua mão, olhando-o dentro dos olhos. Mordo o lábio inferior, ainda sorrindo. Agradecida, pego com o hashi um pedaço de salmão, e molhando-o no shoyo, o ponho em sua boca.

      — Hmmmmmmm! — o louro faz com satisfação.

      Dou risada de sua expressão exagerada. Também levo à boca um pedaço de peixe, mas sempre estou conectada aos olhos azuis escuros que estudam cada movimento meu. São olhos sedutores, com um desejo cáustico e latente, esperando que eu o provoque.

      E como gosto de provocá-lo.

      — Fiquei contente por você ter vindo me ver — abro meu coração para ele.

      Odin revira os olhos.

      — Não podia deixar de vir — sua voz se suaviza. — É um momento especial pra você, e eu quero participar dele.

      Aceno a cabeça. Meu sorriso se expande, sinto meu rosto ganhando um tom luminoso de felicidade. Qual garota não quer ouvir uma frase tão bonita de seu namorado?

      — Você sempre vai ter um lugar especial dentro de mim — confesso. Falo tão baixinho que quase não consigo me ouvir. Mas ele entende que não estou falando só de sexo e que já passamos juntos por outra etapa do nosso relacionamento.

      O sorriso do louro, porém, se desvanece como um sol que se recolhe no poente. 

      — Falando assim, parece que está se despedindo de mim — olha para seu copo de saquê como se estivesse olhando para o vazio.

      Balanço a cabeça em negativa.

      — Eu não quero ir a lugar algum. Não sem você.

      Minha resposta o deixa tranquilo e o sorriso confiante volta ao seu semblante. Seu rosto perfeito, de um dos rapazes mais cobiçados do mundo da moda, e de cujo coração eu sou dona.

      As luzes do apartamento estão apagadas quando entramos. Odin me disse que o pai foi a uma casa noturna, de música eletrônica, e que o único pedido que Alberto lhe fez foi: se previnam. Sempre.

      Odin praticamente me arrasta para dentro do quarto e me envolve pela cintura, puxando minha intimidade contra seu pênis ereto, ainda dentro da calça. Sorrio, ofegando, sentindo um incêndio começando em mim de dentro pra fora. Passo meus braços em volta de seu pescoço, também o puxo pra mim. Nossos lábios se tocam.

      Num gesto atrevido, a mão esquerda dele ergue minha saia por trás, até um pouco acima do meu quadril, e expõe minha bunda. Estou usando um micro fio dental preto. Como a saia fica presa a minha cintura, a mão dele desliza pela minha lombar e ele brinca, esticando o elástico da minha peça íntima e acomodando o indicador entre o tecido fino e o meu bumbum, prometendo abaixá-lo a qualquer momento até às minhas botas de cano alto.

      — Já te disse que você é muito atiradinho? — o provoco.

      Meu fio dental é abaixado até meus joelhos, onde começa minhas botas.

      — Já. Mas você é muito mais — ele responde, irônico.

      Mordo o lábio inferior, rio baixinho, e num movimento brusco, usando sua força e experiência de transar com garotas, ele me nega chance de reagir e tira meu suéter e minha camiseta por cima da minha cabeça, e me deitando com cuidado na cama, tira minha saia e se livra dela e do fio dental. A próxima coisa de que se livra é de sua própria roupa.

      Seu corpo musculoso se debruça sobre meu corpo de bailarina, enfim me dando o contato íntimo que tanto quero e preciso. Nossas bocas se juntam bem devagar, pra não se descolarem, enquanto minha língua se insinua para dentro de sua boca. Uso sem pudor algum todos os meus atributos a fim de ter o máximo dele e de fazê-lo me querer mais, até se viciar em meu corpo e não querer ficar um dia longe de mim. Mas o contrário também é verdadeiro. Estou perdendo minhas estruturas pouco a pouco, ofegando cada vez mais, até me transformar em um ser de puro instinto, que não pensa em consequências de seus atos, mas se joga num caminho sem volta. 

      — Como se sente? — ele me pergunta algum tempo depois, suado.

      Olho para meu namorado sorrindo com malícia e gratidão. Toco seu rosto úmido e quente.

      — Como se tivesse ido à lua e voltado — respondo.

                            …

      Imagine que num dia qualquer (num sábado de muito sol, ótimo para ir à praia com meu namorado), meu pai desembarca no Rio de Janeiro.

      Enquanto lhe mostro todos os cômodos da república, não sei conjecturar se Daniel Răducan acha que os mil reais que ele paga por mês para que eu tenha um teto sob o qual viver até que eu me profissionalize (e possa pagar o aluguel de um apartamento com meu próprio dinheiro) estão sendo bem aplicados.

      Meu pai não é exatamente um homem que demonstra emoções. Não que ele seja frio (nunca tive dúvida que ele me ama e que é capaz de tudo pra me ver feliz), mas se expressar com muitas palavras não é bem a sua especialidade.

      — Quantas garotas moram aqui? — ele pergunta.

      — Oito — informo.

      — Elas são comportadas? Se dá bem com elas?

      — São, pai.

      — Bom.

      Mostro aos dois a área de serviço, onde lavamos nossas roupas. Meus collants, meias calça e algumas peças de roupa estão pendurados no varal junto das roupas das outras garotas. Ele fica mais tempo olhando para a máquina de lavar tremendo e fazendo barulho.

      — Cuidado para não se cortar — aponta para a ferrugem solta próxima aos pés do eletrodoméstico.

      — Estou tomando muito cuidado, pai. Não quero tomar injeção contra tétano.

      Na noite anterior, contei às meninas que meu pai viria com meu futuro padrasto para me visitar e trazer meus tutus de dança, e pedi-lhes (implorei é o termo correto), fazendo um gesto de súplica para que não ficassem só de camiseta e calcinha pela casa enquanto ele estivesse aqui.

      As sete se olharam abismadas e Luna, sardônica, cruzou os braços e me desafiou com um sorriso sarcástico.

      — Não é melhor a gente usar saias igual as crentes, pra ele ter uma boa impressão?

      — Boa ideia — Tiffany fez um high five com a morena.

      — Gente, é sério — respirei fundo, uni as mãos em frente aos lábios e o levei à testa. — Não quero que meu pai pense que fiquei desinibida só porque não estou mais morando com ele.

      Não é porque eu sou uma das poucas garotas a ter um pai gay, que ele não pensa como um pai tradicional, um policial de costumes e vocabulário das filhas. E todos os dias, quando me liga, pergunta se estou me comportando.

      — Você até ofende a gente assim — Roberta fez uma carranca de tristeza. — Mas tudo bem.

      A carranca dos rostos dela desapareceram, dando lugar à risadas. Luna disse que nem precisava ter feito esse pedido, já que eram moças respeitosas, e além disso, o visitante era meu pai bailarino.

      — Tudo muito limpo e bem cuidado — Daniel passa o dedo na superfície do mármore da bancada onde fazemos as refeições. — Quem se responsabiliza pela limpeza?

      — A Paloma faz faxina toda semana. Nós só lavamos nossas roupas, cozinhamos (quando não pedimos comida pelo aplicativo) e mantemos nossos quartos arrumados — sorrio ao informá-lo como funciona a distribuição de tarefas.

      — Bom.

      Odeio quando meu pai diz essa palavra, por ser reticente demais. Ela deixa um gancho para muitas interpretações, nunca sei se bom é bom mesmo ou menos mal.

      Ele põe uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha. Aos poucos seu ar sério suaviza e ele me dá um sorriso.

      — Você está feliz aqui? Não sente falta de sua antiga escola?

      — Estou, pai. Muito. Tô aprendendo muita coisa. Novas modalidades, técnicas de linguagem facial. Até aula de stilleto a gente tem.

      — Sempre gostei de fazer stilleto. Comprei um par de botas de salto fino pra fazer aula, talvez eu e um grupo de bailarinos (todos rapazes) nos apresentemos num festival da Promoarte como convidados.

      — Puxa, que legal. Pede pra alguém gravar um vídeo, aí tu me envia.

      — Claro.

      Ele bagunça meu cabelo e aperta minha bochecha. Mostro meu sorriso com aparelho.

      — Está na hora de trocar as pedrinhas do aparelho.

      — Eu gosto do azul. Combina com meus olhos.

      Daniel balança a cabeça.

      — A vó Vitória me ligou ontem, depois da nossa apresentação em Copacabana. Ela assistiu pelo canal do Ballet Imperial de Petrópolis no YouTube, e disse que eu parecia um cisne de verdade.

      — Sua vó sempre teve uma visão apurada para reconhecer uma bailarina talentosa quando via uma.

      — Será? Acho que ela disse isso porque sou sua única neta.

      Papai ri da minha resposta.

      — Uma mulher de sobrenome Shushunova, elogiar alguém sem que este mereça? 

      Dou de ombros. Realmente, não combina com minha avó. Ela não é russa, mas minha bisavó, Ludmila Shushunova, nasceu em São Petersburgo, e como boa russa, era sincera e sem meios termos. Claro que a filha aprendeu os costumes da bailarina brava e sempre séria.

      — E o vô Nicolae e a vó Raluca? — me ocorre que não liguei para meus avós paternos desde que cheguei. O motivo: eles ODEIAM celulares.

      — Estão bem. Pediram para eu te dizer que estão com saudade de ti, e que quando você entrar de férias e for a São Paulo, faça-lhes uma visita.

      Meus avós paternos são as pessoas mais gentis que conheço, e só Deus sabe o quanto sinto saudade de quando meu pai me levava para visitá-los. Vovó é mais séria (meu pai a puxou), mas tem um coração generoso. Ela tem na parede do quarto uma parede cheia de ícones de santos russos, gregos e antioquinos, além de um crucifixo e uma lamparina. É sua igreja ortodoxa particular. Mas sua fé cristã não consiste só em orações. Ela ajuda a quem precisa, sem nada pedir em troca. Dá comida a moradores de rua, visita orfanatos. Ela diz que consegue ver o rosto de Nosso Senhor Jesus Cristo em cada criança, cada velho, cada jovem. Vovô é mais expansivo, um senhor romeno cheio de histórias e superstições. Quando eu pernoitava em sua casa com meus primos e primas, nos proibia de dormir com a janela aberta (não só por causa de ladrões [São Paulo não é exatamente uma cidade segura], mas porque os espíritos da noite podiam entrar). Uma de suas frases comuns era: Cu un kilogram de carne nu mi-e foame. Și cu un litru de lapte nu mi-e sete³.

      À medida que o tempo passa, toda a minha vida de menina, as brincadeiras com meus primos, os domingos que íamos à igreja ortodoxa com véus, vão ficando para trás. Não me lembro de muita coisa. Mas as lembranças mais vívidas e tangíveis sempre vão estar comigo. E mesmo tendo perdido minha mãe muito cedo, eu sou uma garota feliz. Do meu jeito, mas feliz.

      — A Stefany me liga sempre. Não é todo dia, mas com frequência. A cada dois, três dias. Um intervalo bom. Conversamos bastante. Também ligo para a Letícia, a Duda, a Nicole, a Jordana.

      Papai me fita. Penso que dirá algo, porém só assente com a cabeça, o que me estimula a continuar.

      — Não é porque sou aluna da melhor escola de balé do Brasil que vou ser uma artista arrogante, que só tem ouvidos para elogios e tem vergonha do passado. Eu quero ser diferente. Sempre vou me orgulhar das minhas raízes.

      Daniel enfim abre um sorriso e me puxa para um abraço apertado. Consigo ver que seus olhos irradiam um brilho de orgulho.

      — Eu sei que vai — ele beija minha testa e bagunça meu cabelo.

      Também sorrio e o abraço. Afundo meu rosto em seu ombro, fecho os olhos. A familiaridade deste abraço, o calor dele, faz com que eu me lembre de coisas boas, faz eu me sentir protegida e faz com que eu me lembre de infância. 

      — Mas não é fácil, pai — lágrimas brotam dos meus olhos. — Toda hora tenho que provar pra todo mundo que eu não sou uma garota mimada. Tem dia que eu chego no meu limite.

      — Eu sei. 

      Passamos toda a manhã e toda a tarde juntos. Passeamos pelo calçadão, tomamos água de côco. Conversamos sobre tudo, como um pai e uma filha fazem, e tiramos fotos em frente ao mar, que ele dividiu com seus muitos seguidores nas redes sociais.

      Ele pernoitou num hotel. Partiu de volta para São Paulo na manhã seguinte.

                             …

      — Vai ficar aí o dia inteiro? — atiro um travesseiro no rosto de Luna.

      A morena pega o travesseiro que atirei e, irritada, arremessa de volta contra mim, atingindo minhas costas. Me viro para ela e mostro a língua, feito uma criança travessa.

      Dou risada e saio no terraço do quarto. Aspiro o ar desse começo de manhã, fechando os olhos. As janelas dos apartamentos à frente estão fechados, não há sinal de vida. Pudera. É domingo e cariocas acordam tarde. Por isso não vejo problema em estar só de baby look e calcinha.

      É um ótimo dia para desbravar e conhecer mais coisas dessa cidade que merece ser chamada de Maravilhosa.

      — Você não vai à praia? — volto para dentro do quarto.

      Luna, de olhos fechados e resmungando, aperta seu travesseiro contra a barriga e geme baixinho, sentada na cama. Ela também está só de calcinha e camiseta.

      — Bem que eu queria — responde num tom duro —, mas estou com CÓ-LI-CAS.

      Reviro os olhos. Não que eu esteja tendo um orgasmo por ver minha amiga com dores que, infelizmente, só mulheres tem, mas porque é a primeira vez que vejo Luna de cara emburrada. 

      — Tu sobrevive, amiga — abro o armário e tiro uma camiseta branca com um micro short jeans.

      — Que animação é essa? — Luna pergunta com voz amarga.

      Olho para ela por sobre o ombro.

      — Não tá vendo? É domingo, está um céu azul lá fora, sem nenhuma nuvem; quer dia mais perfeito?

      — Só se for perfeito pra torrar no sol.

      — Luna, deixa de ser azeda.

      — É porque não é você que está com cólica.

      — E só porque você está com dor, eu não posso sair e curtir o dia?

      — Claro que pode. Ai, ai, ai…!

      Mordo o lábio inferior, pondo o dedo mínimo na boca. Eu devia ser uma boa amiga e me comover com o drama da morena, mas é inevitável não achar divertida sua cara de sofrimento.

      Usando minha habilidade de bailarina (a de me despir e me vestir em segundos), logo estou de short e camiseta, e depois de me olhar por sobre o ombro no espelho e ver meu bumbum exposto, me sento na cama em que Roberta dorme e calço um par de tênis brancos.

      — Vai ao calçadão? — a paraibana pergunta com voz lamentosa.

      — Vou — olho para meu bumbum no espelho. Eu o empino, dou dois tapas nele, satisfeita por ele estar de fora. — Quero ver o mar. Depois vou à lagoa, onde Odin vai me encontrar pra gente caminhar um pouco e tomar sorvete.

      — Legal.

      Luna se debruça, empinando a bunda e apertando o travesseiro ainda mais contra a barriga.

      — É tão difícil ser mulher — desabafa com voz esganiçada.

      Passo protetor solar no meu rosto, braços, pernas e bumbum. Decidi levar a sério me manter com a pele bronzeada, embora eu não pretenda ficar tomando sol a manhã toda. Para quem parece uma vampira da Transilvânia, como é o meu caso, nunca é demais se cuidar.

      — Como eu tô? — dou uma volta em torno de mim mesa. Luna me avalia, os olhos atentos.

      — Se eu fosse gay, te pegava, amiga — ela brinca e eu rio.

      — Não precisa ser gay. Basta ser bissexual, como eu — dou de ombros, pondo as mãos na cintura, desafiando minha amiga a se permitir. Claro que estou brincando.

      — Tô fora — Luna oculta seu rosto sofrido no travesseiro.

      Abano a cabeça. Guardo meu celular dentro do short, num ponto entre meu umbigo e minha vagina, e antes de sair, ponho uma par de óculos de sol no alto da cabeça.

      — Tchau, Luna.

      — Danny…

      — Sim?

      — Traz um Buscopan pra mim?

      — Claro. Mais alguma coisa?

      — Só um lembrete: o programa que a Paloma dança começa às 14 horas.

      — Ok. Eu volto à tempo. Beijo.

      Pulo os degraus da escada de dois em dois e giro uma pirouette assim que piso na calçada. Um homem de cerca de quarenta anos, atlético, se aproxima em sentido contrário ao que estou seguindo e me olha com encantamento. Atrevida, pisco para ele e mando um beijinho, fazendo um aceno com os dedos.

      Olho para ele, por sobre meu ombro, quase tendo um orgasmo logo no começo dessa manhã ao vê-lo desviar de uma árvore e ir de encontro a um grupo de pessoas de sunga e biquíni que estão indo para a praia.

      — Idiota! Não olha por onde anda? — uma moça se exaspera.

      Apresso o passo, rindo, feliz por minha primeira maldade do dia, e chego ao calçadão. Há poucos banhistas, por ainda ser cedo. Alguns quiosques estão fechados, e o único movimento intenso é o de pessoas correndo com cronômetros nos pulsos e ciclistas na pista a eles destinada.

      O mar azul à minha frente, com suas ondas brancas se impactando contra a areia de tonalidade dourada, trazem de repente à minha alma um sentimento de paz, um bálsamo para as minhas tristezas, angústias que toda adolescente tem. Dá vontade de me perder em sua imensidão. Me esquecer que não posso ser a todo momento a princesa cujo papel danço nos palcos, que minha vida não é um conto de fadas.

      Por mais que nos últimos dias eu esteja sorridente, brincalhona e feliz, tanto nas aulas de balé quanto no meu namoro, às vezes tenho medo desta nova Danielle não ser ela, mas uma intrusa em sua alma. E quando reservo tempo pra ficar sozinha comigo mesma, sem namorado ou amigas por perto, quando me pergunto sobre tanta coisa, a única resposta que obtenho é: eu não pertenço ao mundo destas pessoas. Mas não sei porquê.

      Baixo os óculos de sol e ofereço um sorriso ao casal dono do quiosque que guardou nossos pertences na semana passada e compro uma água de côco. Por saberem que sou namorada do Odin, eles cobram o preço justo, e satisfeita, saio caminhando sorvendo o líquido refrescante pelo canudinho.

      Espero o sinal abrir e atravesso em direção ao canal de Alah. Não levo dez minutos para chegar à Lagoa Rodrigo de Freitas, onde a pista está disputada palmo a palmo por ciclistas, pedestres em caminhada e corredores. Encontro um espaço, me direcionando para o píer de madeira. 

      Que lugar incrível, digo a mim mesma, sem deixar de sorrir.

      Pessoas estão olhando para a água escura, crianças estão brincando e rindo alto enquanto seus pais as filmam com celulares e grupos de amigos tiram fotos e selfies. Elas sim, são felizes, porque não se preocupam com o tempo, e podem vir aqui todos os dias, sem jamais se cansarem de olhar para a mesma paisagem.

      Me debruço na murada de madeira, olho meu reflexo na água tomando o último gole de água de côco. Por instinto, me viro para meu lado esquerdo e vejo um rapaz alto, ruivo, descendo as escadas e vindo diretamente em minha direção. 

      Yuri crava em mim seus olhos azuis e desafiadores, um sorriso querendo surgir cauteloso em seu rosto com sardas. 

      — Oi — sorrio, amigável.

      — Oi — ele retribui.

      Um rapaz costuma cumprimentar uma garota com um beijo no rosto, se eles forem amigos. Não acho que Yuri me considere ainda uma amiga, mesmo a gente sendo parceiros de dança. Temos uma conexão gostosa no balé e nada mais que isso.

      Ele passa ao meu lado, me olhando. Ergo meus óculos de sol até o alto da cabeça. inclino a cabeça, olhando para minhas mãos segurando o côco já sem água. Mal percebo um suspiro fugir de mim.

      Quando levanto o olhar, busco o garoto ruivo, que se adiantou a mim e está olhando para a imensidão da lagoa, as mãos apoiadas na mureta de madeira. Noto que sua respiração está pesada, como se todas as angústias do mundo tivessem feito morada em seu peito e ele estivesse se esforçando para que eu não as percebesse.

      Mas eu percebi.

      Capítulo de 5,7k de palavras

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Yurochka¹: diminutivo de Yuri. Os russos têm o hábito de pôr apelidos carinhosos nas pessoas. Um nome pode ter dois ou até mais apelidos. Ex: Aleksander/ Aleksandra se torna Sacha, Sachenka, Sachiuchka; Ivan vira Vania, Vanka; Dmitri vira Mítia, Dima…

Paka paka (пока пока)²: tchau tchau.

Cu un kilogram de carne nu mi-e foame. Și cu un litru de lapte nu mi-e sete³: Com um quilo de carne não passo fome. E com um litro de leite não passo sede.

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