Carlos Eduardo
A Máscara
Uma noite quente de verão e uma confraternização em uma mansão luxuosa. O que poderia dar errado? Tudo, é claro. A mansão Baxter, futuro palco de uma tragédia, sediava um evento, um pequeno jantar privado. Presentes estavam os membros da família, Richard (Dick para os íntimos), CEO e pai amoroso de família, Martha, querida mãe e advogada, Jacob, o caçula e Melody, a mais velha, que visitava com seu noivo, Taylor Wilhelm, um médico de renome. Além deles, havia também o comissário de polícia, John Hansen, um grande amigo de Dick. O coronel William Turks, com quem ambos serviram no exército, o casal Kevin e Helena Beck, sócios dos Baxter e Yuri Petrov, amigo do colégio do caçula. Bom, mas havia alguém que se atrasara.
Enquanto todos conversavam em um clima agradável sentados nos sofás da sala espaçosa, a campainha é tocada. Martha se levantou prontamente para atender, o clima agradável de antes deu lugar a um silêncio estranho, ninguém ousou dizer uma única palavra até que o último convidado adentrasse. Do outro lado, estava um jovem em torno de seus 25 anos, moreno, alto e dos olhos claros. Abriu um sorriso e se apresentou:
—Boa noite, meu nome é Kurt Allen, peço perdão pelo atraso.—Ambos apertaram as mãos e o homem se apressou a entrar, uma tempestade se formava do lado de fora.
—Kurt, que demora rapaz!—O comissário foi o primeiro a cumprimentá-lo.
—O trânsito do centro está uma loucura, pelo jeito teve um acidente bem feio.
—Deixa eu apresentar esse é Kurt Allen, o melhor detetive do país.—Alguns olhares, antes desinteressados, se viraram com interesse renovado, Kurt parecia sem jeito com o comentário.
—Espera, é você? O cara que pegou aquele assassino, como era mesmo que o chamavam?
A idade do coronel o deixara um tanto esquecido, enquanto ele ruminava sobre a alcunha atribuída ao serial killer, Kurt respondeu:
—O assassino da mancha?
—Esse mesmo! Como você conseguiu? O país todo estava atrás desse patife a anos!
—Nenhum crime é perfeito coronel, e ninguém tem um plano pra tudo, ninguém consegue fugir da própria psique. Veja o próprio Patrick por exemplo, os vários anos de fuga o deixaram confiante, inflaram seu ego. Quando eu comecei a destrinchar seus crimes pista por pista, ele viu como um desafio e eventualmente cometeu o erro que me levou a sua identidade.—Kurt disse se sentando entre o coronel e o comissário
A mais velha, Melody, soltou alguns resmungos após a fala do detetive. Seu noivo, que repousava uma das mãos em sua coxa, lhe deu um aperto no local um tanto forte, forte demais, o detetive notou.
—Não importa a farda ou cargo, homens continuam todos iguais, você vê todo caso como uma competição?
—Perdoe-me se minhas palavras causaram essa impressão, mas terá que perdoar minha curiosidade, senhorita. A quanto tempo não usa sua aliança de compromisso?
—O-O que...?
—A marca de sol no seu dedo anelar esquerdo, a senhorita preferiu não usá-la hoje?
—E-Eu... nós...
—Há, ele te pegou direitinho, Melody!—O caçula zombou antes da irmã lhe arremessar uma almofada em seu rosto.
Após os ânimos se acalmarem, o clima amigável retornou. Alguns ainda fizeram perguntas sobre seus casos, mas não demorou até todos se dirigirem até a sala de jantar onde uma boa refeição estava pronta e os esperava. Comida, bebida e uma boa conversa, aquela noite não podia melhorar! Apesar da hostilidade inicial, Melody não trocou nenhuma palavra sequer com o detetive, para o bem da convivência. Yuri contava histórias do tempo no colégio com Jacob e vez ou outra deixava uma palavra em russo lhe escapar, o casal de sócios tentava em vão discutir negócios, o coronel e o comissário lembravam os tempos no exército e Kurt e Taylor se mantinham mais em silêncio, enquanto os anfitriões caiam na gargalhada e mantinham-se na conversa.
Após o fim de um jantar calmo, os convidados se retiraram em dois grupos, os homens e as mulheres. Já o detetive, se retirou para o jardim com uma taça de vinho nas mãos. Uma mulher amargurada com o próprio relacionamento e um homem desinteressado na futura esposa, isso antes mesmo de sequer se casarem... pensou. Não querendo analisar demais a situação do jovem casal. Isso até avistar a jovem sozinha na outra extremidade do jardim, um cigarro entre os dedos. Parecia desconsolada.
—Não está tento uma noite boa, senhorita?—A jovem se assustou e se virou com a mão no peito.
—Você sempre chega de fininho nas pessoas?
—Perdão, não quis assusta-la.—A menina suspirou.
—Não, eu quem deveria me desculpar, tenho estado com os nervos à flor da pele recentemente.
—Problemas no casamento?
—Como você...
—Seu marido não parece a pessoa mais interessada em você madame, bem, certamente não no que tenha a dizer.—O Detetive ainda se lembrava da cena da mão possessiva de Taylor sobre sua coxa.
—É verdade, Taylor não é o homem mais apaixonado do mundo, nos comprometemos muito por interesse de nossos pais, mas eu achei que algum dia poderia ganhar seu coração. Infelizmente ele só se interessa pelo dinheiro e pelo meu corpo, aparentemente.
—Aparentemente? A quanto tempo estão juntos?
—A pouco tempo, as vezes eu penso que nosso conjugue seria um erro, mas faço isso por minha família.
—Ninguém deveria se submeter a uma pessoa que não ama por interesse de terceiros, madame. Mantenha isso em mente quando estiver diante do altar.
Kurt terminou seu vinho e se retirou para dentro. Deixando-a com os próprios pensamentos. Sentou-se à mesa de jantar e o olhou para o relógio, marcavam oito e meia nos ponteiros quando um grito ecoou por toda a mansão, vinha do segundo andar. Kurt saltou de seu acento e pôs-se a correr, subiu as escadas, passou por Jacob e Yuri saindo de um quarto perguntando o que estava acontecendo e encontrou Richard parado na porta de um quarto.
—O que aconteceu!? Está tudo bem!?
O CEO nada respondeu e Kurt olhou para dentro do quarto. Estatelada no piso de madeira envernizada estava Martha, sangue manchava o chão e suas roupas, e uma máscara sorridente cobrindo seu rosto, à alguns metros, também coberta de sangue, estava uma faca de cozinha, a possível arma do crime. Nessa hora chegaram também o coronel apoiado em sua bengala e o comissário de polícia, ambos ofegantes e pararam horrorizados com a cena.
—Comissário, mande todos aguardarem no salão e chame a polícia. Coronel, acompanhe o senhor Baxter, por favor.
Assim, todos se retiram, ainda atônitos. Kurt tirou um par de luvas e se aproximou do corpo. Martha possuía duas facadas na barriga e uma nas costas, esse último aparentando ser o golpe fatal, retirou-lhe a máscara, encontrando uma expressão fria e morta por baixo. O objeto não aparentava ter digitais e muito menos a arma, o corpo não aparentava ter sinais de resistência. Com isso, o detetive tirou algumas conclusões: pelo angulo das facadas, o assassino era canhoto, ele deve tê-la pego de surpresa, e deve ter fugido pelo corredor, já que a janela do quarto se encontrava fechada. Ainda ali, Kurt buscou qualquer detalhe que fosse no quarto, mas não encontrou mais nada.
Com um suspiro de pesar, o detetive se retirou e foi de encontro aos outros. Viu na sala as expressões de choque nos rostos dos convidados e ainda mais de dor da família. Mas algo acabou chamando sua atenção: os noivos estavam consolando um ao outro. Algo que ele não esperava. O primeiro a vir ao seu encontro foi o comissário.
—O acidente no centro e a tempestade estão dificultando as coisas, só chegaram amanhã cedo, até o assassino já vai estar do outro lado do estado.
—O assassino não saiu, ele está entre nós.
Sua certeza chocou os demais convidados, que se olharam desconfiados.
—Como pode ter certeza que foi algum dos convidados?
—A segurança da casa é pesada, se tivesse invadido no meio da noite seria pego pelos seguranças de ronda lá fora, quem quer que seja, provavelmente queria esperar a polícia chegar e fugir enquanto estão todos ocupados.
O comissário ficou calado por um momento, pensativo.
—Kurt, só tem um jeito então.—O homem o pegou pelo braço e o tirou da sala.—Vamos ter que investigar à moda antiga.
—Pensei o mesmo, Hansen. Isole um dos quartos, farei os interrogatórios e descobrirei quem é esse monstro, enquanto isso, peça ao bom doutor Taylor para analisar o corpo, precisamos determinar a hora da morte.
E assim foi feito. Kurt pediu uma planta segundo e terceiro andar e as levou até o dito quarto, que havia sido preparado com uma mesa e três cadeiras, e abriu as plantas sobre elas. O segundo andar possuía quatro quartos principais e três de hóspedes possuía também um sótão e banheiros em cada uma das suítes. O corpo havia sido encontrado no quarto de hóspedes mais afastado do corredor. Por que Martha foi até aquele quarto? Ou melhor, com quem? Descobrir a resposta para esta pergunta poderia resolver o caso. Após alguns minutos, Taylor chegou abriu a porta.
—Analisei o corpo e posso constatar, a senhora Baxter morreu há pouco tempo. Eu diria uns vinte ou trinta minutos.
—Ótimo, então comecemos por seu depoimento, sim? Sente-se.—O noivo obedeceu.—O que fez depois do jantar.
—Sai com os rapazes para o pátio, como o senhor bem viu. Não fiquei muito tempo, apenas troquei algumas palavras com o coronel e voltei para a cozinha, para tomar um pouco mais de vinho.
—Você conhecia a senhora Baxter bem? Sabe se haviam motivos para quererem matá-la?
—Nossas famílias sempre tiveram boas relações, não acho que Martha tivesse inimigos, se tinha, talvez o senhor Baxter possa lhe dizer.
—Viu ou ouviu algo vindo do andar de cima enquanto estava na cozinha?
—Bem, ouvi passos e vozes passando pelo corredor de cima, mas não consegui distinguir de quem era.
—Poderia escrever seu nome completo e endereço, por favor? É apenas uma formalidade, não se preocupe.—Taylor obedeceu, recebendo um pedaço de papel e caneta.—Agradeço a cooperação, se precisarmos do senhor, o chamaremos.
Taylor saiu, fechando a porta atrás de si.
—Para que escrever o nome e endereço? Não fazemos isso.
—O assassino é canhoto, comissário. Se descobrirmos quem dos convidados também é, descobriremos quem é quem matou Martha.
—Percebeu isso pelos golpes?
—Exatamente, poderia chamar a senhorita Melody? E enquanto o faz, veja se não está faltando uma faca no suporte da cozinha, sim?
O comissário saiu.
Se eu estiver certo, quem matou Martha passou primeiro pela cozinha para pegar uma faca.
Após algum tempo, a mais velha dos Baxter entrou na sala. Sua maquiagem estava borrada pelo choro.
—Peço perdão por incomoda-la em um momento de fragilidade como esse, mas é imperativo que determinemos os fatos.
—Tudo bem, quanto mais cedo isso acabar, mais cedo estarei livre.
—Muito bem, o que a senhorita fez depois do jantar?
—Me retirei junto às mulheres, não fiquei muito tempo e desci para a cozinha, acabei me encontrando com meu noivo e acabamos discutindo, foi quando fui ao jardim e nos encontramos.
—A senhora ouviu algo vindo do andar de cima enquanto estava na cozinha?
—Passos e vozes, mas não prestei atenção.
—Sabe se alguém teria motivos para querer matá-la?
—Minha mãe era procuradora antes de decidir se tornar advogada, talvez alguém que ela tenha colocado atrás das grades tenha ficado com rancor.
—Entendi, enfim, poderia escrever seu nome e endereço?—Melody o fez sem pestanejar.—Obrigado, se precisar da senhora a chamarei.
Nenhuma reação ao meu pedido de escrita repentino? Pelo jeito, Melody e seu noivo andam trocando palavras.
O próximo foi Jacob, seguido de Yuri, ambos estavam no quarto do caçula, jogando videogame com um volume alto, ambos não viram ou ouviram coisa alguma, o que foi confirmado pelo comissário, que os viu pela janela do quarto. Logo após, veio então o coronel. Os Beck vieram logo após, a esposa acompanhou Martha enquanto a advogada mostrava renovações na casa, Helena a seguiu até precisar ir ao banheiro e então se distraiu a conversa dos homens no lado de fora e foi quando ouviu o grito de Richard, já Kevin ficou o tempo todo do lado de fora conversando com William e Richard, até que o coronel se retirou para dentro. E falando nele, chagava a vez do coronel Turks.
O velho adentrou a sala já levantando as suspeitas de Kurt, a bengala que o detetive viu William usar com a mão esquerda, estava agora na mão direita. O homem respondeu às perguntas, obviamente se esquivando de qualquer culpa, e na hora de assinar seu nome, escreveu com a mão direita também. Kurt o havia visto segurando um garfo com a direita. Após o velho sair, Kurt chamou o comissário.
—Com que mão o coronel atirava no seu tempo no exército?
—A esquerda, mas ele sabia atirar com as duas mãos, por que? Acha que ele é o assassino? Que motivos ele teria pra isso?
—Eu não sei, mas é possível, vamos interrogar o senhor Baxter agora, pode chama-lo?
O comissário saiu. Porém, dessa vez, não voltou por um bom tempo e quando voltou, tinha uma expressão preocupada no rosto.
—Kurt, temos um problema.—O detetive se levantou de supetão.—Richard está morto.
Kurt seguiu o comissário às pressas, o corpo do CEO estava no sótão, um único tiro no lado de sua cabeça. Em seu rosto estava outra máscara, dessa vez uma triste, fazendo par com a máscara no corpo de Martha, a comédia e a tragédia. Pelo visto aquelas mortes foram premeditadas, mas por quem?
—Eu sei quem foi, sei quem são os assassinos!
No momento em que Kurt se virou para correr pra fora do sótão, se viu na mira de uma arma. A sua frente estavam Taylor, Melody e William, todos armados. Nesse momento, o detetive começou a pegar discretamente a arma escondida em suas costas.
—Perdão detetive, mas o caso está encerrado.—Taylor era o único que apontava a arma para ele e nenhum deles sabia que estava armado, se fosse rápido, poderia derrubar o médico e sua noiva enquanto o comissário pegava o coronel.—Por acaso já sabia que tínhamos matado Martha?
—Já, me diga Melody, o choro por sua mãe era verdadeiro? Ou aquilo era falso também?
—Você não tem ideia do que nós passamos, tentamos de tudo, mas eles não iam mudar de ideia! Tivemos que tomar medidas drásticas!
—Tudo isso pra não se casar? Então para que eram as máscaras?
—Ideia minha, para desviar a atenção da polícia, enquanto eles perdiam tempo tentando entende-las, nós iriamos escapar das acusações, Melody nos ofereceu o dinheiro dos pais pra que ajudássemos a tira-los do caminho e desfazer nossa união, não tinha como recusar.—Taylor já estava distraído, bastava um único movimento rápido para desarma-lo.
—E você coronel? Por que entrou nessa?—Kurt já tinha a arma em mãos, bastava esperar o momento certo.
—Digamos que ser um veterano não paga as contas, era pra eu sujar as mãos, mas já que você quis se intrometer, vamos ter que derramar o seu sangue também.
—O que está acontecendo!?—A voz de Kevin soou repentinamente, distraindo os outros dois, era chegada a hora.
Kurt sacou sua arma e disparou contra a perna do médico, o fazendo cair e largar a arma, repetiu a mesma coisa com Melody enquanto o comissário derrubava o coronel.
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Marcava 6:30 quando a polícia enfim chegou, os três criminosos foram algemados enquanto os corpos eram levados. John Hansen se aproximou de Kurt encarando o coronel enquanto o mesmo era enfiando dentro da viatura sem cerimônia alguma.
—Como pode uma coisa dessa? Eu achava que conhecia o Turks...
—Não se pode confiar nos olhos ou no coração, comissário, essa noite foi uma tragédia sem precedentes.—Kurt caminhou pela casa, até que parou diante a mesa de centro, um anel dourado com um diamante repousava nela.
Acho que no fim vocês eram mesmo um par perfeito.
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