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Capítulo 20

A passos lerdos, seguimos até o quadriciclo azul-marinho, estacionado no meio de uma clareira que foi formada graças à extração de pinheiros nesse natal – não imagino Brie sentada nessa coisa.

O cheiro de seu sangue, encapsulado em suas veias, parece cada vez mais forte.

Me sinto como um alcoolatra que acabou de fazer um tratamento para se desvirtuar da bebida: é difícil suportar a tentação quando todo mundo parece sempre lhe oferecer, de repente, um copo de whisky, outro de vodka... Então você luta contra si mesmo para não tornar-se um bêbado outra vez. É isso que a Senhorita Mountain está fazendo comigo. No dia menos propicio, ela me surge do nada, como se acabasse de brotar no meio da neve, e me obriga a inalar seu cheiro de primavera e chocolate e sangue humano quente.

– Obrigado por se importar... – digo, arrumando uma mecha incrivelmente negra e revolta de cabelo que caia, um tanto úmida, sobre meus olhos que tenho certeza que ainda estão negros e imutáveis (como queria que estivessem sempre).

– Não foi nada – sua voz parece acalmar ainda mais a floresta vazia, ecoando infinitas vezes. Ou são só meus devaneios me pregando peças? – Eu estava mesmo preocupada, e... Curiosa.

– Curiosa? – meu sorriso parece o de uma criança que acaba de embarcar numa montanha russa: um tanto quanto doentio, tentando disfarçar o nervosismo com um grande sorriso trêmulo.

– É... – uma mistura de torpor e agonia beliscaram minha pele.

Procurei seus olhos, pela primeira vez. Ela aceitou a "conexão" com o estreitar de seus próprios olhos.

– Com o que?

– Você – ela pensou um pouco antes de responder, parecia não ter certeza se a resposta me agradaria.

– Eu?

– Yeah, você – seu sorriso se desfez numa mescla de sentimentos diminutos. – Você é como um... Como um scrip incompleto para um filme arcano. Parece fácil de ler, no início, mas... então, se torna complexo, pois a agonia de entender a história nos cega. E não há fim, está incompleto afinal, e se torna desesperador.

Meus dedos tremularam.

Ela é como um "Completo", um "Original", um "Nascido", um vampiro que nasceu vampiro, que pode ler qualquer mente, de qualquer criatura existente e até mesmo inexistente.

Ouço estalidos, percebo ser meu próprio sobressalto e tento me prender ao chão. Mas o solo sob meus pés está declinando como areia movediça, me deixando tonto e desesperado.

– Você tem... Medo? De mim? – perguntou com incerteza. Tentei vasculhar sua mente, verificando se ela não é um vampiro, se ela estava tentando me bloquear de sua mente. Mas tudo o que encontro é um espaço oco e esverdeado, o que vejo sempre que tento ler a mente humana.

– Não... – sussurro notando que seus olhos ainda estão atrás de respostas.

– Ah.

Foi tudo o que ela disse, mas não é, ao certo, tudo o que queria dizer. Eu bem sei.

– Desculpa se a fiz pensar assim, é só que... Não estou habituado com humanos... Quer dizer, com pessoas – ótimo Ace. É melhor dizer que você não é um humano. Idiota! Quer estragar tudo? Não sabia que isso seria tão difícil.

– Há quanto tempo você vive assim?

– Hum, décadas... Muitas e muitas décadas.

A julgar pelo sorriso doce pincelado em seus lábios, acho que minha velhice lhe parece uma relés piada. Talvez a aparência de um garoto de dezoito anos não entregue meus olhos centenários.

– Tchau, Ace – ela iria esticar uma mão nua para que eu a apertasse, mas notou seu corte, e, talvez, que um toque, a essa altura, é cedo de mais, ou que eu estava trêmulo apenas por pensar em fazê-la provar do meu frio, ou tudo isso junto.

Não sou capaz de descrever quão grande fora o alívio de vê-la baixar a mão e caminhar mais ou menos três passos até o trenó motorizado e ligar o motor para partir. Sem toques. Sem impasses. Sem problemas.

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