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Capítulo 19

Deitei-me no chão, no meio de uma pequena clareira, observando o céu cinzento e carregado de nuvens.

Os sons que a floresta emite são como bateristas frenéticos e distantes, de modo que suas baquetas tamborilam tão baixo que chega a ser confortante.

Ouço os passos de Nicholas dentro de casa, um tanto quanto distante.

Se resfriando, boneco de neve? — cantarolou alegremente em minha mente.

Estou só sentindo a natureza — sorri, alongando-me desajeitadamente.

Ótimo. Tente não virar parte desse chão — emitiu um sibilo. — Ainda preciso de você para os biscoitos de gengibre.

Pode deixar que vou ter bastante cuidado quanto a isso. Ah e... pode deixar os biscoitos comigo!

Ok Senhor Sabichão.

Pisquei.

Faz um bolo!?

Bolo? — ponderou, o senti cogitar sobre meu pedido. — De chocolate, outra vez?

Não, quer dizer, sim! Faz um Super Lincolns Cake!

Um super o quê?

Bolo de baunilha com recheio super exagerado de chocolate e calda de chocolate para completar!

Sim senhor! — sorriu. — Açúcar é tudo o que você precisa... para morrer de diabetes!

Ouvir a risada de Nicholas é reconfortante.

Ele logo se pôs a procurar os ingredientes na despensa e a bloquear minha tentativa de continuar em sua mente.

Sorri e continuei deitado, observando mais nuvens se acumular no alto e longínquo céu. Ergui os braços como se pudesse tocá-las com as pontas dos dedos.

O cheiro de primavera parece saltar dos meus pensamentos... Este assunto estava tão bem guardado.

O som de passos pareceu espremer-me contra o chão.

— Nicholas? — sussurrei baixando os braços. Não retendo resposta, me ergui assustado, procurando o que quer que tenha se movido.

O cheiro... C-como ela chegou até aqui?

Corri até um pinheiro e me mantive ali, ouvindo os passos aproximando-se, mas não estava vindo em minha direção, estavam caminhando desordeiros, em busca de qualquer coisa ou coisa nenhuma.

Corri até outro pinheiro e fui seguindo até conseguir ver o rosto ávido e quase triste da Senhorita Mountain, ou Brie.

Sua mão tem uma faixa branca, amarrada onde antes eu só via sangue.

— Tem alguém aí? — sussurrou ela, olhando ao redor, apoiando-se em um pinheiro.

Vá embora!, sussurrei no ar para fazê-la seguir. Meu desespero agora está tão aparente que chega a fazer-me tremular.

— Quem está aí? Ace? É você?

Ace? Ela está me procurando? O que? Porque? Como?

— Espero que seja você — inspirou profundamente, como nas outras vezes em que ela tentava interpretar o que tinha em seu script. — Eu queria lhe dizer obrigada por ter levado a Tesse e o Gustav para casa aquele dia. Se não fosse por você, supostamente, Tesse não estaria tão bem quanto está agora. Obrigada. De verdade. — seu rosto, tateando entre as árvores, me deixa atônito. — Ah, o Gustav também agradece. Muito.

Bloqueando minha mente para o caso de Nicholas aparecer frenético em desespero, continuei observando e ouvindo-a conversar comigo, sem saber que eu estou realmente aqui.

— Acho que estou ficando louca, de verdade — sorriu olhando para seus pés e movendo-os para expulsar o gelo. Senti seus passos tentarem sair dali.

— Brie? — eu não deveria estar fazendo isso, não deveria estar me aproximando, tentando inibir a dor que o cheiro de seu sangue ainda me causa, me tornando um falso humano e simplesmente... Definitivamente, não deveria falar com ela.

— Ace? — Senhorita Mountain se tornou ereta, uma bola vermelha de tenção derretendo o gelo ao seu redor.

— Aqui... — corri para mais perto, discretamente, e então sai de trás de um Pinheiro, como se eu estivesse ali por todo o tempo.

— Oi! — flocos de alegria mancharam seus olhos. Suspirei. Esses flocos de alegria foram causados por mim. POR MIM? Dá pra imaginar?

— O que faz aqui? — vá embora! Era o que eu queria ter dito.

— Você praticamente voou de casa aquele dia — Brie fez um movimento estranho com as mãos, como a imitação de uma onda. — Estava se contorcendo e... Eu achei que deveria verificar se estava bem. Você está bem?

Sorri meio débil. O simples pensamento de que ela está aqui para saber se estou bem, criou uma bolha multicolorida de emoções estrambólicas.

— E-estou. Estou bem. E você? — apontei para o curativo em sua mão, tomando a divisão entre seu polegar e o indicador.

— Ah — murmurou como se acabasse de notar aquela atadura. — Isso? Está bem, sim. Está quase cicatrizado! — entrelaçou os braços em frente do corpo. — Estou feliz por você estar bem.

Sorriu como se fosse a primeira vez que faz isso na vida: um sorriso bonito e brilhante.

— Como chegou aqui? — perguntei.

— Demorou um pouco, mas eu vim num quadriciclo que está numa clareira não tão longe... — ela apontou para trás. Supostamente esse quadriciclo não pode ser muito grande ou ficaria preso entre algumas árvores, mas não sei como ela poderia ter chegado aqui sozinha.

— Há alguém com você? — agucei os ouvidos para ouvir se haviam mais passos.

— Não. Sou só eu. Mas acho que devo voltar. Está ficando frio de mais aqui... — alisou os próprios braços, fazendo seu cheiro se espalhar pelo ar como um veneno sufocante. Desejei morrer, secretamente, inalando aquela droga deliciosa e doce. Seria uma bela forma de morrer.

Realmente não há mais ninguém, só ela, apenas a menina estranha. A linda Mountain.

— Ah — retirei a jaqueta que punha sobre três camadas de pullovers. Sempre vejo isso nos filmes. — Aqui, pode ficar com isso — cuidadosamente pedi passagem para aproximar-me. Ela concedeu, prendendo a respiração descaradamente, como se eu fosse matá-la. Eis meu medo.

Acomodei a jaqueta em seus ombros. Brie agradeceu-me com um sorriso terno, expirando sonoramente quando me afastei, quatro curtos passos, de seu corpo quente e delicado.

— Obrigada — suspirou.

Seus olhos se entrelaçaram com os meus e a senti trocar o peso de uma perna para a outra, dando um passo para frente.

— Quem é você, Ace? — sua frase surtiu como um assobio. — Você não me parece um garoto de Internacional Falls — seus olhos se comprimiram. — Você não frequenta a escola, nem o vejo pela cidade...

— O-o que? — engoli em seco, interrompendo-a. O que ela quer saber? Se eu sou um vampiro? Sim eu sou.

— Quem, em sana consciência, vive aqui? No meio da floresta? Com esse frio incessante?

Ela parecia extremamente indiferente.

— Eu, eu vivo aqui — me afastei nervosamente, enquanto ela continua procurando meus olhos e respostas indesejáveis.

— Hum — não parecia confortável, mas aproximou-se um pouco mais, ainda assim. — É um belo lugar para se morar — olhou ao redor, largando meus olhos no espaço vazio.

— Yeah — concordo ainda nervoso. Por que a Brie, por um momento, não me parece tanto assim a verdadeira Brie? Tão curiosa para saber mais sobre mim.

— Bem. Eu preciso ir — sussurrou envergonhada com sua própria intromissão. — Desculpa... — a Senhorita Mountain brilhou novamente em seus olhos, só então percebi o quão nervosa ela está por estarmos apenas nós, um estranho e a garota indefesa, no meio de um nada silencioso e vazio.

Fiquei feliz por vê-la novamente. Tão feliz que quase quis abraçá-la. Quase.

É. Se ela soubesse o quão louco está me deixando.

Sorri, pouco a vontade com sua presença. No entanto, estou feliz por poder vê-la outra vez, mesmo sem ela estar lendo seu script para as árvores, mesmo que ela tenha o consentimento de que eu estou aqui.

— Eu te levo até seu... Hum... Veículo.

Ainda assim, torci para ela negar minha companhia, para que eu possa sentir outro cheiro e não só o odor tóxico de seu doce e quente sangue.

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