VI - N a t e
Sei que eu deveria escolher os livros mais próximos, mas gosto do simbolismo, por isso escolho livros dos quais gosto.
O primeiro que pego é Frankestein, da Mary Shelley. Além de ela ter sido a inventora da ficção científica, é a autora favorita da minha mãe. Eu cresci ouvindo-a falar sobre esse livro, da genialidade de uma garota de 17 anos.
A mãe de Mary, que também se chama Mary, é outra favorita da minha mãe, pois ela escreveu um livro chamado "A Reivindicação dos Direitos da Mulher". Crescer com uma feminista é assim, fui obrigado a ler certas coisas para não agir como um completo babaca.
Será que Hanna já leu Frankestein? Pior, será que ela sabe que Frankestein é o cientista e não a criatura? Será que ela sabe que o monstro, a criatura, não se chama Frankestein? Será que ela entende que o verdadeiro monstro sempre foi o Victor?
As perguntas são tantas que me deixam ansioso. Quase tropeço nos meus próprios pés caminhando no corredor da ficção científica. Os livros estão distribuídos por ordem alfabética e demoro até achar o M.
Me pergunto quais livros ela escolherá e espio entre as prateleiras. Romances, claro. Ela está fazendo o mesmo que eu, escolhendo seus livros favoritos?
No final da prateleira encontro Frankestein, uma edição surrada, com páginas amarelas e lombada gasta. Do jeito que eu gosto.
Então começo a pegar outros livros que já li, conheço e gosto.
Volto assobiando até a poltrona e vejo-a puxar uma edição bonita da estante. Não consigo ler o título.
As luzinhas iluminam seus cabelos cor de chocolate. A pele escura dela brilha em diferentes cores e o sorrisinho que Hanna dá para mim, como se fosse mais esperta e eu apenas um garoto idiota, me mostra exatamente que é isso que eu sou: apenas um garoto idiota.
Sou idiota por pensar que tenho uma chance com essa garota linda e inteligente que nunca trocou uma palavra comigo.
Mas estamos presos nessa biblioteca por mais duas horas e, minutos atrás, eu estava tão otimista... Só porque ela é a menina mais bonita que eu já conheci e por quem eu sou apaixonado desde sempre, não significa que eu não tenha chances.
Me comparo, inevitavelmente, com Justin. Ele é irritantemente alto e bonito, além de atlético.
O desânimo toma conta de mim, mas agora preciso terminar o que comecei. Não vou desistir e planejo ganhar esse desafio.
Volto para a poltrona antes dela e largo os livros ali.
Caminho até a mesa da sra. Weiss e abro a primeira gaveta dela. Ali ela guarda chocolate em pó e copinhos descartáveis. Pego dois e os encho de água quente da garrafa térmica, então misturo o chocolate na água, criando uma mistura cremosa.
Caminho até onde Hanna está e o celular toca, encerrando o cronômetro. Hanna carrega uma pilha de livros, são tantos que ela quase tropeça nos próprios pés.
Está prestes a cair quando deixo os copos em cima do piano e corro para ajudá-la. Um livro cai em meu pé e grunho alto de dor. Para piorar, tropeço no tapete e derrubo-a no chão.
O baque é alto e afasto-me com pavor, com medo de tê-la machucado.
Hanna parece zonza. Toco-a no couro cabeludo, buscando algum machucado e não encontro nada. Suspiro com alívio. Ela faz uma expressão confusa e dá um tapa na minha mão. Só então dou-me conta da proximidade do corpo dela.
Estou praticamente em cima de Hanna. A pele dela é macia, quente e tem cheiro de chocolate.
Afasto-me e me levanto rapidamente, sentindo o rosto esquentar como um idiota. Estendo-lhe a mão e, quando ela segura meus dedos, tenho a certeza de que nossos dedos são perfeitos uns para os outros.
O vento zumbe em meus ouvidos e lá fora tudo continua branco.
Entrego um copo de chocolate para Hanna e ela parece surpresa com a bebida. Leva-a até o nariz com ceticismo e eu faço uma careta.
━Acha que coloquei veneno aí?
━Pode ter cuspido.
Balanço a cabeça, incrédulo com a acusação. Dou uma risada surpresa e digo:
━Por qual motivo eu faria isso?
━Não sei. Geralmente os nerds odeiam as líderes de torcida e os jogadores de futebol.
Ela estreita os olhos como se estivesse me desafiando. Deus, ela tem um nariz arrebitado e um olhar tão intenso que me desestabilizam.
━Acho idiota essa divisão.
Olho para o relógio, que marca 5 horas.
━Vamos começar?
Hanna assente e ajeita o cronômetro. Espio os livros dela. No topo está Orgulho e Preconceito. Um clássico que, obviamente, eu li.
Se eu tivesse que compararmos aos personagens, diria que ela é o Sr. Darcy e eu a Elizabeth.
Mostro Frankestein. Ela dá um sorriso e olha para o chão. Misteriosa.
Quero tanto conhecê-la que um nervosismo desconcertante sobe por minha barriga.
Deixo o pessimismo de momentos atrás de lado. Essa é a minha chance.
━Um, dois, três.
Ela dá play no cronômetro e começo a me mexer, tentando não reparar no quão bonita ela fica quando está concentrada. Se eu continuar assim ela ganhará.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro