III - H a n n a
Eu disse que todo Natal algo de ruim acontece comigo e por que nesse seria diferente? Há uma nevasca acontecendo e estou presa com o nerd número 1 da escola.
Nate parece muito feliz em me julgar por estar na biblioteca no Natal, mas ele também está aqui! De certo por eu ser líder de torcida ele ache que meu lugar é numa das festas chatas que acontecem todos finais de ano.
Desbloqueio meu smartphone rapidamente e pesquiso a previsão do tempo. Há um alerta vermelho para a área. Caminho até a grande janela que deveria estar iluminada pelas luzes coloridas, agora apagadas. Na rua, não enxergo ninguém. Ouço apenas o barulho das árvores e do vento, assobiando.
Dou um suspiro de frustração e guardo o celular na bolsa. Quando viro-me para voltar até onde estava, dou de cara com Nate.
O gritinho que dou é tão agudo que me sinto humilhada! Meu rosto esquenta instantaneamente e, com muita dificuldade, tento fingir que meu coração não está acelerado.
━Não apareça assim do nada!
━Sou bom em ser invisível, não é? Vim ver como está na rua.
A luz baixa deixa a biblioteca num breu. Invisível. Eu me senti assim quando minha mãe faleceu.
Nate espia através da janela. Os olhos cor de mel dele se estreitam e, com vergonha, reparo no quanto ele mudou.
Nunca falei com Nate direito e nunca o conheci de verdade, mesmo que sejamos colegas. Mas vê-lo tão... desenvolvido, muito mais alto do que eu, com costas largas, tocando piano... É estranho.
Um dia ele foi o menino que se acidentou e para o qual eu levava meus cadernos.
Ele também foi o menino que mancou por meses e nunca contou para ninguém o que aconteceu.
Nate nunca teve muitos amigos, então ele ainda é um mistério para mim. E pensar que há tantas pessoas a minha volta as quais eu nunca conheci... Nunca soube que ele tocava piano, por exemplo. Não sei por que, mas essa revelação, de momentos atrás, me incomoda.
━Parece que ficaremos presos aqui, ele murmura e vira-se para mim com um sorrisinho enigmático.
Meu coração dá um salto esquisito. Ainda estou em choque com o susto e com o ambiente escuro, certo?
Os olhos cor de mel me encaram de um jeito profundo e curioso. Tenho que admitir, há algo de... bom e ingênuo nesse garoto com o qual nunca tive oportunidade de conversar. Ou melhor, com o qual nunca quis conversar. Isso me torna uma má pessoa?
Finalmente entendo o que ele disse e digo:
━Presos? Mas é Natal!
Nate passa uma mão na nuca, enrolando alguns cachinhos castanhos. Tento não olhar, mas isso chama demais a minha atenção. Os cabelos dele são negros e tão bonitos... Paro de encará-lo como uma lunática.
Estou comparando-o com os personagens pelos quais me apaixonei todos os Natais desde os 10 anos, nessa biblioteca. O ambiente não está ajudando. A beleza de Nate também não. Como ninguém nunca reparou nele?
━A nevasca vai passar logo, então poderemos ir embora, ele fala de uma maneira otimista que eu odeio.
Com certeza ele é o tipo de pessoa que ama o Natal.
━Você ama o Natal, não é? -a pergunta sai da minha boca antes que eu possa contê-la
Ele faz uma careta e me encara com um semblante curioso.
━Como descobriu?
Meu rosto esquenta, afundo mais minhas mãos nos bolsos do casaco e ajeito meus ombros antes de responder:
━Pessoas felizes geralmente amam o Natal.
━Você não parece gostar dessa data, ele diz com humor.
━Quem disse que eu sou feliz?
Merda. Eu sou muito boa nos contra-argumentos e nas réplicas em projetos escolares, mas tenho que manter minha boca fechada quando se trata de dar respostas que podem destruir minha dignidade!
Ele parece chocado. A boca forma um "O". Em seguida, essa reação passa e vira confusão. Seria uma ótima hora para sair da biblioteca e ir para casa se o mundo não estivesse caindo lá fora.
━O que faz você pensar que eu sou feliz?
A pergunta me pega desprevenida. Ajeito os cabelos para trás das orelhas, sentindo frio nas pernas. Péssima escolha de roupas. Uma minissaia e uma meia-calça grossa. Logo eu, que sinto frio até no verão!
Com um suspiro, tiro minha bolsa do ombro e a jogo na poltrona. Não sei quanto tempo ficaremos aqui, então decido ficar o mais confortável possível enquanto a nevasca não passa. Nate senta-se no tapete vermelho, com as costas encostadas na poltrona a minha frente.
━Você parece feliz, eu digo.
━Passou muito tempo reparando em mim para chegar a essa conclusão? -ele pergunta baixinho, parecendo genuinamente surpreso.
Suas bochechas estão vermelhas. Deus.
Eu rio um pouco alto demais, como se aquela hipótese fosse hilária.
━Claro que não!
Paro de rir assim que vejo algo cruzar seu olhar, uma mágoa escondida. Engulo em seco. Não ri para ofendê-lo. Mas o que ele achava, que eu realmente passava o tempo reparando nele? Absurdo!
Tenho muitos garotos nos quais reparar, por que olharia para um que se esconde atrás dos moletons e fones de ouvido?
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