
23 - Turbilhão de Sentimentos
O ar continuava ameno e com uma característica mista de clima temperado.
Zahra e Hector caminhavam juntos, espreitando o caminho, na espera de surpresas desagradáveis.
Não imaginavam quantas horas haviam dormido, pois não possuíam relógio.
Hector desejava muito ter um relógio de sol para poder se intuir, mas imaginava que haviam dormido, sim, longas horas.
Enquanto buscavam por Nefertiti e Bóris, o olhar amedrontado de Zahra percorria o ambiente a sua volta, de maneira ininterrupta. Contudo, o que latejava na sua mente, tentando arrastá-la para bem longe, era saber o que Petrus fazia naquele instante.
E calafrios lhe percorriam a espinha só de imaginar que ele pudesse lidar tranquilamente com a sua ausência.
Porém, a sensação de Hector apertando a sua cintura, a fizera se exasperar.
Virou-se irritada, como se aquela atitude insolente, que acabava de interromper a sua viagem para um instante que ela acreditava estar paralelo àquele, lhe fosse um insulto. Todavia, ao observar a expressão na face bem esculpida do rapaz ao seu lado, percebeu que ele apenas queria a sua atenção, quando ela parecia totalmente absorta da realidade.
— O que está acontecendo? — Zahra exaltou um pouco a voz, pois, ainda sim, estava bastante chateada com o retorno à realidade.
— Eu ouvi algo que parece não se enquadrar em nada do nosso conjunto léxico — Hector sussurrou ao ouvido dela, lhe inundando a nuca com o seu hálito e lhe provocando um calafrio. — Suspeito que tenha alguém aqui por perto e que não fale o nosso idioma. Então vamos com calma!
— Como pode ter certeza que estão falando em outra língua?
Zahra colocou a mão na cintura e lhe lançou um olhar de represália. Estava claramente espavorida.
— Eu escutei, Zahra! — Hector lhe lançou um olhar incrédulo, por acabar de escutar fala tão estapafúrdia.
— Eu estava pensando em Petrus. Você me desconcentrou! — Ela fez um beicinho e o fitou imóvel, como uma pedra.
— Não deixe Petrus se tornar rival à conquista dos nossos ideais aqui! — Hector puxou-a para outro lado em um arranco, fazendo-a acordar. — Sua vida não pode se basear somente em pensar e agradar o seu namorado, pois isso é pequeno e vazio demais!
— Tudo bem, senhor coração de gelo — ela ironizou, irritadiça.
— Se diz… — Hector deixou escapar uma gargalhada descontente e desgraciosa.
Se encostaram em uma das paredes que erguiam aquela estranha cabana no meio do nada. Havia somente natureza e mais natureza ao redor. Contudo, estavam desconfiados dos ruídos humanos que ouviam.
Havia rumores ali, que não vinham deles, porém, antes mesmo que pudessem novamente se manifestar, as pessoas cruzaram os seus caminhos de uma maneira supersônica.
E não era nenhum perseguidor pronto para mais uma batalha de fúria corpo-a-corpo.
Era nada mais, nada menos, que Nefertiti e Bóris, aproveitando a manhã para anunciarem bons presságios uns aos outros, em linguagens estranhas; Hector suspeitou que fossem planos bons, ao vistoriar a expressão incontida e apaixonada de ambos.
Menos mal.
Na verdade, bastante bom.
Zahra instantaneamente desprendeu o braço das mãos cuidadosas de Hector. Parecia bastante indignada e até pasmada com o que acontecia.
O rapaz sorriu atônito àquela atitude, que não parecia em nada com a companheira.
Ela que era sempre dócil, agora estava esbaforida e injuriada. Contudo, em apenas um segundo, ele concluiu que ela deveria estar no seu período pré-menstrual, o que causava um grande desconforto e destempero nas mulheres.
Era normal.
Ele observava o tempo inteiro aquela atitude enjoada nas irmãs e na mãe. Mas não por sorte, e sim, por azar, sua avó Nailah, se encontrava na menopausa, o que parecia ser um período ainda mais conturbado na vida feminina.
Porém, aquele não era o fato. Hector havia pisado no calo de Zahra, acordando-a de pensamentos que ela não queria perder. Pensamentos que na verdade, a moça queria transmutar para a sua vida e viver, bem ao lado de Petrus.
Enquanto Hector dava de ombros para os modos da amiga, o recém-unido casal, parecia se preparar para emendar uma despedida e partir sem rumo. Hector suspeitou ao observar os olhares urgentes por liberdade, e também por um pouco mais de privacidade.
— Estamos partindo — Bóris anunciou, enlaçando sua ninfa pela cintura. — Foi muito bom conhecer vocês. E graças a vocês é que estamos juntos e vivos! — Os olhos do rapaz se amiudaram por conta do sol, mas ele não hesitou em encarar com apreço o par de viajantes. — E você, amigo — se aproximou exclusivamente de Hector — me ajudou muito a enfrentar os meus medos. Obrigado!
Apertou a mão de Hector de maneira totalmente masculina e seguiu de novo para Nefertiti, pronto pra uma nova rota.
— Muito obrigada! — A voz de Nefertiti estava embasada por um lirismo tão melódico, quanto o toque suave de clarins e cítaras.
— Apenas sigam em paz! — concluiu Hector, com alívio por acabar com aquela primeira etapa.
Os quatro ali presentes, acenaram com a cabeça e logo o casal iniciou a partida, compartilhando um sorriso que parecia emendar no lábio um do outro, formando uma linha una de felicidade.
Porém, ao vê-los sumir no horizonte, Hector sentiu a ira de Zahra lhe acrescer de maneira intermitente.
Aquilo era estranho para Hector e quase gozado. Ele gargalhou, balançado a cabeça e fazendo com que os seus fios negros e despenteados, bailassem no ar.
— Do que está rindo, hein? — As piscinas quase ouro dos olhos de Zahra se apertaram em reprovação. — Está zombando de mim, é?
A garota começara a estapear o peitoral de Hector, tentando buscar um equilíbrio emocional, que não encontrava.
Começava a se desesperar ao pensar no que poderia acontecer com o romance dela e de Petrus, depois daquela jornada. O medo era tão desumano, que a deixava enlouquecida.
Enquanto as lágrimas iam jorrando pela sua face, ela ia se deixando deslizar pelo escorregadio peitoral do rapaz a sua frente.
Estava desesperada como nunca estivera e aquilo assustou Hector, de maneira a deixá-lo quase sem reação.
— Acalme-se! — Ele a reconforto em seus braços, fazendo com que o barco quase náufrago de Zahra, atracasse em seu porto seguro. Fazia o acesso nervoso que se irrompia dela, abrandar, devolvendo a harmonia para o estado anímico da garota. — Eu não sabia que esse estado do mês poderia causar todo esse turbilhão em você, garota. Mas se acalme, por favor!
— Que estado do mês? — Zahra ergueu os olhos, como se suas piscinas fossem tobogãs prontos para desaguar. — Do que está falando, Hector?
— Não está em regras? — Ele a encarou, confuso.
A menina abriu a boca, estupefata.
— Mas que despautério, Hector! — Ela limpava as lágrimas, pronta para lhe passar um sermão sobre decoro. — Não se fala dessas coisas íntimas com garotas!
— Perdoe-me! — Coçou o queixo, encabulado. — Mas foi a única coisa que me veio em mente. E, poxa, eu estou preocupado!
Ele a encarou com seriedade. O licor negro de seus olhos, tinha um brilho embriagante naquele instante.
— Eu só estou com medo. — Ela terminou de enxugar o molhado de sua face. — Estou com medo de que ele me troque por qualquer coisa!
— Esse papo furado novamente, Zahra? — Hector bateu com as duas mãos na perna em indignação. — Preciso repetir quantas vezes que Petrus te ama fervorosamente? Eu estou cansando de te mimar já! — brincou.
— Quantas vezes forem necessárias pra me convencer! — Ela mordeu os lábios, um pouco sem jeito. — Estamos juntos nessa. E eu sou uma garota sensível e insegura!
— Está bem, Zahra! — Hector se apoiou com as mãos nos ombros dela, encarando-a de perto e mostrando a veracidade dos fatos com o seu olhar. — Mas ele te ama mais que qualquer coisa ou pessoa. E não vai te deixar por nada!
Era mais fácil Zahra deixá-lo, do que Petrus cogitar, ao menos a ideia, de se separar dela. Daquilo Hector sabia piamente.
— Ah, obrigada Hector! — Aproximou-se dele, dando um apertado abraço no amigo e enterrando a face em seu peitoral esguio. — Muito obrigada!
— Estamos juntos nessa, Zahra!
Hector recostou o queixo sobre o topo da cabeça da garota, pensando em todo aquele estado confuso, que vivenciavam.
Não raciocinava somente sobre toda a conturbação de sentimentos e acontecimentos, mas também sobre todo o estado anômico de seu vilarejo, que os fazia não se encaixar nem nos parâmetros modernos e nem antigos do mundo.
Em segundos era como se tivessem fechado os olhos para piscar, buscando um novo clique da vida. Porém, no instante seguinte, a visão que tinham os fazia duvidar de tudo.
O que estava acontecendo?
Aquela primeira missão parecia ser apenas a sinopse de todo maremoto que teriam que enfrentar, pois, de alguma forma, as coisas ficavam mais complicadas e inexplicáveis, porque naquele exato momento, sem pluralidade de instantes, eles se viam de volta na singular Epimoni.
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