Capítulo 9 - Uma Nova Realidade
Na aldeia, as mulheres cozinhavam em fogueiras, diante das ocas, e os carregadores. Supervisionados por Augusto, armavam as barracas ao lado do rio.
Eranê já havia dado permissão para as filmagens, pois Catherine viu Henry às voltas com o equipamento, filmando o cacique, que brandia uma lança, e fingia estar furioso. Era realmente um homem bonito, saudável cheio de dignidade, e capaz de despertar amor numa mulher como Joana.
Os outros homens da tribo estavam com Paulo, tão entretidos ouvindo suas vozes gravadas, que nem percebiam estarem sendo filmados.
Eranê interrompeu o que estava fazendo para ouvir o relatório de Joana, que falava baixo e com timidez. Enquanto isso, Catherine aproveitou para se aproximar de Henry.
— Onde está o dr. Curran, Henry?
— Naquela oca ali... — Respondeu sem olhá-la, enquanto trocava as lentes da filmadora. — Agora há pouco estava lá, tirando o gesso da perna de um paciente.
Catherine olhou na direção indicada e viu que Nick estava cercado de crianças, com as quais falava.
— Será que você e Paulo podem se arranjar sem a minha ajuda por algum tempo?
— Claro... — Henry ergueu o olhar, afinal. — Mas o que houve? Está se sentindo mal?
— Não. Estou ótima, é que os meus pés estão um pouco inchados pela caminhada. Achei que seria melhor eu me deitar um pouco na minha barraca. Mas não diga nada a Nick!
— E o que vou dizer, então?
— Que fui retocar a maquilagem. Mas só se ele perguntar, porque provavelmente nem vai notar a minha ausência.
— Espero que não se atrase para o jantar, parece que a refeição vai sair logo. Nick falou que é uma indígena anciã é que cozinha para o cacique. É feia de doer, mas cozinha muito bem. Hoje vai ter ovos de tartaruga. Ia ter macaco, em homenagem a nós, mas não conseguiram caçar nenhum.
— Ainda bem. Pobre do macaco!...
— Nick disse que a maioria deles comem tudo quanto é bicho, até larvas. Não se assuste se encontrar algumas em algum pote por aí.
Catherine sentiu o estômago revirar.
— Acho que não vou jantar, Henry. Não estou mesmo com fome. Se me der fome mais tarde, como chocolate e uns biscoitos que tenho na mala.
— Quem sabe tem algum outro prato que você goste...
Catherine estava louca para se esconder em sua barraca e dormir até o dia seguinte.
— Chega, Henry, eu entrego os pontos. Não vou conseguir comer nada dessas coisas esquisitas. Não dá para você arranjar alguma desculpa para mim? Invente qualquer coisa para Nick.
— Invente você... — Disse ele, com uma piscada de provocação, e concentrou a atenção de novo na filmadora. — Vocês dois que são brancos que se entendam.
Catherine sentiu, nesse momento, que mãos firmes seguraram-lhe o braço.
— Você vai comer, sim, queira ou não. — Disse a voz de comando, bem perto de seu ouvido. — Seria uma indelicadeza sem tamanho, o mesmo que recusar a hospitalidade de Eranê. Eles se esforçaram muito para nos oferecer uma refeição boa. Agora não vai querer estragar tudo só porque não acha os pratos apetitosos, não é?
Virou-se e deparou com o olhar frio e autoritário de Nick.
— Quem mandou ter estômago delicado! — Disse ele. Henry ouviu e virou-se para ele, franzindo a testa.
— Catherine nunca teve estômago delicado. Talvez ela não esteja se sentindo bem, apesar de dizer que está.
— Eu estou ótima e se é esse o caso, posso comer qualquer coisa!
— Ainda bem. — Nick largou o braço dela. — Porque se houver o menor indício de mal-estar vou ter que tirar você da aldeia imediatamente. Mas já que não é assim, esteja pronta daqui a meia hora para a refeição.
Resolveu então ficar ajudando Henry, desistindo da ideia de ir para a barraca dormir. Não queria estragar os planos da expedição. Fazia tudo para demonstrar estar bem disposta, já que Nick a observava de longe.
Pouco depois, guardaram o equipamento. Henry e Paulo resolveram dar um mergulho rápido, para se refrescarem antes do jantar. Estavam suados e cansados, depois da longa caminhada pela selva. Catherine resolveu tomar um banho de caneca, com a água que Augusto lhe trouxera do rio.
Isso a reanimou de certa forma, e quando Paulo apareceu para chamá-la, ela estava diante do espelho, passando um batom nos lábios, para dar um pouco de colorido à palidez do rosto.
— Puxa vida! — Exclamou ele, olhando para o batom. — Isso é exatamente o que eu precisava. Esqueci de trazer o marcador para meus rolos de tape! Esse batom é permanente?
— É.
— Pode me emprestar?
Catherine fechou o tubo e jogou-o para Paulo, depois ajeitou de novo os cabelos, agora brilhantes.
— Use à vontade e não precisa me devolver, eu tenho outro.
Paulo guardou o batom no bolso da camisa e sorriu, agradecido.
— Agora vamos indo, chefinha. Nick mandou uma escolta para nos levar até a oca de Eranê. Eles estão lá, esperando, e já estou ficando nervoso. Eu escorreguei e quase me espetei sem querer numa daquelas lanças deles, cheias de curare! Nick que me salvou.
Catherine arrepiou-se toda e saíram os dois da barraca.
— Aqui não se pode dar um passo em falso de jeito nenhum. — Disse ela, com duplo sentido.
Com muito esforço, conseguiu portar-se bem nas duas horas seguintes.
Felizmente as mulheres comiam separado dos homens e isso evitou um confronto com Nick. Foi uma refeição silenciosa, em companhia da anciã da tribo, que cozinhava para Eranê.
Os homens estavam tomando kashiri quando Catherine voltou, afinal, para a sua barraca. Tinham colocado lá uma cama, com colchão de palha, e um travesseiro, que, segundo Augusto, pertenciam a Nick.
Largou a lanterna e acendeu o lampião, conforme a tinham instruído, e deixou-se cair sobre a cama, sem nem mesmo descalçar as botas. Essa noite os macacos podiam gritar à vontade que ela não iria escutar...
980 Palavras
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