Capítulo 11 - Imprudência
Sentiu que todos olhavam para ela, até Gastão, que tinha ido ao encontro deles.
De repente suas pernas não a sustentaram mais e ela apenas percebeu vagamente que alguém a segurou por trás, impedindo-a de estatelar-se no chão.
— Gastão, vá preparar o sofá-cama, depressa. Por enquanto vou pô-la na minha cabana. Ela precisa descansar, e uma rede não vai adiantar.
A voz autoritária só podia ser de Nick.
— Eu... eu... estou bem... — Balbuciou Catherine, com esforço.
A vertigem passara, embora ainda se sentisse muito fraca. Tentou se desvencilhar, mas mal conseguiu se movimentar.
— Catherine, você está branca como uma folha de papel! — Disse Paulo. — Por que não disse que estava passando mal?
Catherine sentiu-se carregada por braços fortes.
— Meu Deus! — Resmungou Nick. — Sua maluca! O que estava querendo provar?
Ele estava bravo e olhava-a furioso. Os olhos de Catherine encheram-se de lágrimas.
— Espere aí, Nick, você não pode carregá-la com tudo isso que está levando nas costas... deixe que eu ajudo.
Nick esquivou-se de Paulo com impaciência.
— Não acha que já fez o bastante? — Seu tom de voz fez com que Paulo se retraísse. — Se a tivesse deixado dormir e descansar ontem à noite, ela não estaria nessas condições hoje! Saia de perto! Ela não precisa de um amante agora, precisa de um médico. Deixe que cuido dela. Se encostar a mão nela vai se arrepender para o resto da vida. Agora saia do meu caminho!
Nick encaminhou-se para sua cabana, com Catherine, e Paulo ainda disse, em voz mais alta.
— Mas que diabo deu em você, Nick? Já lhe dissemos que a história foi inventada! Não houve nada, eu estava na minha barraca, sozinho! E, mesmo que tivesse acontecido algo entre nós, não seria da sua conta. Catherine é dona da vida dela!
Nos braços dele, Catherine lamentava que suas forças a tivessem abandonado ali, tão perto da chegada.
Nick abriu a porta de tela com um chute impaciente e entrou na cabana.
Catherine, agora que não estava fazendo esforço, começava a respirar normalmente outra vez, mas ainda estava fraca e atordoada. Nick a amparava enquanto Gastão arrumava a cama às pressas.
— Não é tão confortável quanto uma rede. — Disse ele, — Mas o doutor mandou...
— Não posso... aceitar... sua cama. — Protestou ela, com dificuldade de falar.
— Eu não a uso nunca. — Contou ele, impassível, e olhou para Gastão. — Muito bem, agora deixe mais um lençol nos pés da cama e pode ir.
Nick acrescentou mais algumas instruções e Catherine percebeu vagamente que ele estava pedindo o equipamento médico. Gastão saiu e, enquanto não voltava com a maleta, Nick colocou-a na cama, sentou-se a seu lado e pôs-se a tirar-lhe as botas.
— Estão apertadas demais. Então cortando a circulação sanguínea... — Disse ele. — Bem que eu desconfiei. Você amarrou muito apertado esses cordões!
Ele ergueu a perna da calça dela e examinou-lhe o tornozelo, apalpando-o com dedos firmes e delicados.
— Meu Deus! Em que estado está isso!
Catherine olhou de relance e desviou o olhar depressa. Não tinha visto ainda como estava, pois dormira de roupas e botas e não tinha se trocado para fazer a caminhada de volta. Ficou horrorizada com o que viu, tudo vermelho e inchado.
— Eu... eu... estava bem... até hoje. — A respiração estava difícil.
Nick comprimiu os lábios e não fez nenhuma censura.
— Quando notou essa urticária pela primeira vez?
— Terça-feira... à noite.
— Sua primeira noite aqui. Sei, e essa falta de ar, você é asmática?
— N... não.
— E quando surgiu esse sintoma?
— Naquela mesma... tarde. — Falar era um esforço muito grande. — Não estava... tão ruim... assim.
— Já vou dar um jeito nisso, logo que descobrir a causa.
Ele continuou lhe fazendo perguntas sucintas e incisivas e Catherine foi respondendo a verdade.
— A urticária... surgiu... depois que... as picadas de pium... melhoraram.
Ele ergueu as mangas da blusa para examinar-lhe os braços. A expressão dele era imparcial e clínica, e o toque de seus dedos sem nada de pessoal.
— Eu não lhe disse que qualquer problema médico era para ser comunicado a mim, antes da viagem à aldeia? Por que ignorou minha ordem?
— Porque... as picadas melhoraram... — Mentiu. — Eu estava... ótima, ontem...
Ele colocou a mão na testa dela.
— Você não devia ter escondido de mim, desde o primeiro sintoma, mesmo que parecesse sem importância. O médico aqui sou eu, e sou eu quem decide o que é grave ou não. Se isso foi uma infecção...
— Não é tão... grave assim... não estou doente.
— Talvez não, mas o diagnóstico tinha que ser feito por mim, não por você. Será que não pensou nas possíveis consequências... — Interrompeu-se e mudou de tom. — Vou examiná-la melhor quando Gastão chegar com a minha maleta. Ontem você estava bem, até dormiu com seu amigo...
— Eu... não dormi...
Gastão chegou trazendo as coisas e desculpando-se pela demora. Puxou uma mesinha para perto da cama, colocou toalhas, depois saiu e voltou com uma bacia d'água, que deixou lá também.
Nick mediu a pressão e tomou a temperatura, contou a pulsação. Catherine submeteu-se em silêncio. Ele relaxou um pouco a tensão ao ler o termômetro.
— Estou... com febre?
— Temperatura normal. — O tom de voz era de alívio.
— Acho que... sou alérgica... ao Amazonas...
— Acho que é alérgica a outra coisa. — Enquanto falava, puxou-lhe a gola da blusa para examinar o pescoço.
Quando ele começou a desabotoar-lhe a blusa, ela se retraiu, sem querer, e virou o rosto para a parede, os olhos cheios de lágrimas.
— Lembre-se de que sou um médico. — Havia um certo sarcasmo no seu tom de voz.
Catherine cobriu o rosto com a mão. Devia ser de fraqueza que estava se sentindo tão confusa. Não entendia suas reações, só sentia vagamente vergonha do que Nick pudesse perceber.
— Não me diga que é sempre tão recatada assim. — Catherine ficou furiosa.
— Não é isso... não queria que... me visse assim... estou horrorosa. Desculpe, Nick...
Ele não fez nenhum comentário.
— É só pensar em mim como médico e não como homem.
Mas isso era impossível. Ela se sentia humilhada de ser vista naquele estado.
Comprimiu os lábios com as mãos enquanto ele terminava de desabotoar-lhe a blusa, abrindo-a. Felizmente estava de sutiã.
Nick pegou a pedra verde, que se aninhara entre os seios dela.
— Onde arranjou isto? Não, não me diga nada. Amanhã você me conta.
Os dedos dele percorriam sua pele, apalpando, sentindo as glândulas atrás das orelhas. O contato era impessoal e não se prolongava mais do que o necessário.
— Não se preocupe, você vai sobreviver. — Explicou ele, depois do exame detalhado, enquanto guardava o estetoscópio. — Amanhã já vai estar bem, vou lhe dar um antialérgico para combater o efeito dos piuns. Você é alérgica a eles.
— Então é isso o que eu tenho?
— É. Se tivesse me contado antes, eu já teria lhe dado o remédio e você não teria ficado nesse estado. Agora vou lhe dar duas injeções...
Catherine teve vontade de chorar de alívio. Ainda bem que não era nada de grave!
Nick aplicou-lhe as duas injeções, no braço, depois deu-lhe dois comprimidos.
Agora que sabia o que tinha e que estava sendo tratada, começava até a se sentir mais forte. Ou será que as injeções já estavam fazendo efeito? Até a respiração já estava melhorando.
— Agora quero que tire essa roupa e que se lave com essa esponja. — Ordenou Nick.
— Você pode fazer isso sozinha. Depois passe esta pomada aqui.
Ela se ergueu na cama, bem mais controlada.
— Vou ter esse tipo de problema cada vez que um piuns* me picar? — A voz voltara ao normal.
— Não, se seguir as instruções médicas direito e tomar anti-histamínico quando houver predisposição.
Catherine suspirou aliviada. Como iria passar um mês no Amazonas, se fosse ter sempre aquele tipo de problema?
— Fique deitada, repousando até amanhã. Daqui a pouco Gastão vai lhe trazer o jantar. — Ele saiu sem dizer nada e voltou pouco depois com uma de suas camisas. — Tome, use isto, ou prefere que eu vá buscar suas coisas?
— Não, não é preciso. Aliás, seria melhor eu voltar para a minha cabana, antes da hora de dormir.
Nick parou, com a mão no trinco da porta, e virou-se, encarando-a pela primeira vez diretamente, por um longo instante.
— Não. Eu não vou permitir isso.
— Então, talvez fosse melhor colocar-me no hospital.
— De jeito nenhum. Você não está doente, está só com uma reação alérgica. Só precisa de um pouco de repouso.
— Mas...
— Vai ficar dormindo aqui o tempo que eu determinar.
Com essas palavras, Nick saiu, e Catherine deitou a cabeça no travesseiro, olhando para a porta de tela, pensativa.
Será que ele ia dormir no hospital?
Naturalmente não ia pretender ficar ali enquanto ela estivesse! Ou ia?
1484 Palavras
Piuns*: Conhecidos como piuns na região norte do Brasil e borrachudos no resto do nosso país, estes insetos fazem parte da família Simuliidae, ordem Diptera, subordem Nematocera.
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