Capítulo Trinta e Quatro ── Mar de Mentiras
✧ Capítulo Trinta e Quatro ──
Mar de Mentiras
───────𓃠──────
Muitas coisas haviam acontecido em questão de poucos meses.
Celine vivia ultimamente, juntamente de Sirius Black, em uma constante disputa para ver quem se tornaria padrinho/madrinha do bebê de James e Lílian. Eles enchiam de presentes o pequeno bebê que nem ao menos havia nascido ainda. Celine adorava comprar roupinhas pequeninas de várias cores para o bebê, até mesmo os pequenos brinquedinhos para crianças. Ela os achava adoráveis demais e sempre se empolgava comprando todos por serem bastante fofos. Lílian se encantava com todos e as duas passavam tardes e mais tardes juntas conversando sobre a futura decoração do quarto do bebê.
Já Sirius, ele sempre aparecia com bolas, vassouras, uniformes, todos os presentes voltados para o quadribol, o que fazia James ficar com os olhos brilhantes feito dois vagalumes, como se os presentes fossem destinados a ele mesmo ao invés do bebê.
Na noite da morte de Marlene McKinnon, as coisas pareciam ser impossíveis de se levar adiante.
Apesar de Celine não conhecer Marlene a tanto tempo quanto Lílian, a mesma adorava a mulher. Elas duas costumavam se dar bem quando ainda estavam em Hogwarts e, depois que saíram de lá as duas ficaram ainda mais próximas. Marlene havia sido quem ensinou Celine Dorsey a beber, as duas costumavam sair para beber juntas todas as sextas-feiras, algumas vezes acompanhadas dos amigos e outras vezes havia apenas as duas e, apesar de Marlene ter confessado para Celine que gostaria de ter algo a mais com ela além da amizade, assim que Celine respondeu envergonhada que não via Marlene do mesmo jeito, mas que adorava a companhia e amizade da mulher, Marlene logo entendeu, ela não pediu tempo ou ficou chateada, não, na semana seguinte ela já tinha um romance novo, o que fez Celine invejar como Marlene conseguia lidar bem com sua própria vida amorosa, ela nunca se amarrava a nada, ela vivia sempre como um belo pássaro voando alto nos céus, livre.
Depois que a Ordem realmente se tornou ativa e todos eles começaram mesmo a participar de missões da mesma, as duas não costumavam mais se ver tanto, ainda mais às sextas-feiras, Marlene sempre aceitava qualquer tarefa que Dumbledore dava a ela.
Celine sabia bem que Marlene queria apenas o mesmo que ela, que tudo aquilo acabasse logo e de uma vez por todas.
Lílian e Celine choraram por semanas pela morte da amiga, aquilo havia as devastado, porém, logo Celine percebeu que chorar não traria sua amiga de volta e nem ao menos a estava aliviando de algo, então ela passou a tentar agir, ao mesmo tempo em que todos os dias visitava Lílian e tentava a distrair com seus presentes para o bebê ou com conversas animadas.
Depois da morte de Marlene McKinnon muitas coisas haviam mudado e, uma delas, era o fato de que Celine Dorsey agora estava trabalhando mais do que nunca.
Ela havia conseguido convencer Dumbledore. Celine agora aos poucos plantava sua semente cada vez mais próxima a Voldemort, porém, tudo tem seu preço e, se infiltrar no lado oposto estava lhe custando a sanidade.
Ninguém sabia sobre Celine ser uma infiltrada e Dumbledore e ela achavam melhor assim, porém, Celine odiava não ter com quem conversar.
Ela conversava com Dumbledore sobre a maioria das coisas, sempre o relatava tudo e ele maioria das vezes sempre parecia a entender, porém, Celine não conseguia falar para Dumbledore que se sentia muito mal em estar enganando quem um dia havia sido um de seus grandes amigos.
Celine se sentia corroendo por dentro por estar utilizando do desespero de Regulus em se sentir sozinho para conseguir o que queria, ela se odiava ainda mais quando o tocava com intimidade porque sabia que ele tinha sentimentos por ela e ela simplesmente usava aquilo a seu favor.
E, acima de tudo, ela tinha vontade de simplesmente deixar de existir quando percebia que não confiava nem um pouco nele, apesar de tudo.
Ela simplesmente não conseguia mais confiar em Regulus Black, o garoto que um dia havia sido seu grande amigo.
Regulus estava num torpor de desespero por ver que não havia ninguém ao seu lado, ele estava solitário em perceber que ninguém o via verdadeiramente como um amigo ou algo além de um objeto a ser usado, então, foi atrás de Celine, por que ela havia sido a única que se importou e realmente o considerou algum dia.
Sem segundas intenções.
Ele sempre contava como as pessoas ao redor dele o usavam de alguma maneira, seja por conta da sua família, dinheiro ou influência... eles sempre estavam ali por um motivo, mas esse motivo nunca era ele.
Celine se odiava por ter se tornado uma dessas pessoas, mas, mesmo assim, ela ainda continuava ali, o enganando, o fazendo acreditar que ela estava unicamente ali por ele e nada mais.
Pura e disfarçada mentira.
Mas parecia tudo tão verdadeiro aos olhos de Regulus.
Celine havia deixado tudo para trás para conseguir a confiança daqueles da qual precisava.
Uma farsa.
Um grande teatro.
Ela ainda se lembrava de quando convenceu seus pais a irem embora para a França e a deixarem ali para fazer o que tinha que ser feito.
É claro que devido a doença de seu pai estar em um estado alarmante e de toda a situação ao redor também estar da mesma forma, a mãe de Celine já cogitava a ideia da família se mudar para a França.
Um lugar mais tranquilo e onde a família de seu marido morava, porém, ela só não contava que sua única e preciosa filha fosse escolher ficar para trás.
— Não, Celine! — Bryane exclamou desesperada de frente à filha. — Você virá conosco e isso não é um pedido!
A senhora Dorsey não estava em um de seus melhores momentos, e isso era nítido tanto em sua aparência quanto em seu atual temperamento.
Ela, que costumava sempre se vestir o melhor possível e amava arrumar seus cabelos longos e vermelhos com alguns fios aqui e ali já grisalhos por conta de sua idade, encontrava-se agora com os mesmos fios presos no topo de sua cabeça de forma desengonçada e, as roupas, que outrora era escolhidas a dedo, no momento pareciam ter sido as primeiras que ela achou em sua frente e decidiu vestir.
As olheiras fundas no rosto pálido e fino demais de sua mãe não mentiam, Celine sabia que ela estava há poucos passos de cair em desespero e isso a fazia querer chorar, por que ela não sabia como fazer tudo ao redor dela melhorar.
Por mais que tentasse, as coisas sempre pareciam piorar.
Celine olhou nos olhos de sua mãe, que eram idênticos aos dela e soltou um trêmulo e profundo suspiro.
— Mãe — ela começou calmamente, não querendo fazer com que o estado de sua mãe piorasse —, eu juro que irei para vocês assim que tudo acabar. Eu não posso abandonar tudo por aqui assim. Não desse jeito.
Os olhos de Bryane se encheram de lágrimas e ela não as segurou, deixou que caíssem livremente por seu rosto fino e pálido, o que fez com que Celine desviasse a atenção para qualquer outro canto na casa por um instante, tentando não se entregar para as lágrimas também.
— Mas você não pode nos abandonar também, Celine! — a senhora Dorsey gritou desesperada.
A mulher fungou e respirou fundo, secando as lágrimas em seu rosto e olhando para o teto por um segundo, como se procurasse nele a resposta para todas aquelas provações, quando não as encontrou, ela voltou a olhar para sua filha, dessa vez, com um olhar que beirava ao desespero.
Um olhar suplicante.
— Celine, por favor, não faça isso — ela pediu. — Você precisa vir conosco, filha. O seu pai ele... o seu pai... — um enorme soluço escapou pela garganta da senhora Dorsey e ela não conseguiu aguentar mais, no momento seguinte, ela estava caída de joelhos no chão da sala de estar da velha e enorme casa que sempre foi dos Dorsey, chorando profundamente, num lamurio tão profundo que fez Celine correr até a mãe e se abaixar ao lado dela, a abraçando o mais forte que conseguia.
Enquanto abraçava a mãe, Celine reprimia os lábios um no outro tentando conter o próprio choro.
Se ela chorasse, então como iria consolar a própria mãe?
Ela tinha que tentar se manter calma.
Ainda com a mãe nos braços, Celine então começou a acariciar os cabelos longos de Bryane, os desprendendo de seu penteado, tentando passar conforto para a mãe do mesmo jeito que ela sempre costumava fazer com ela mesma quando era mais jovem.
Quando o choro se tornou mais suave e o corpo tenso pareceu relaxar, então Celine se afastou apenas um pouco para que conseguisse olhar nos olhos de sua mãe.
— Eu sei, mãe. Eu realmente sei — ela falou baixo, tão baixo que por um momento pensou que sua mãe não a teria escutado, mas o suspiro trêmulo que veio em seguida da mesma, fez Celine perceber que ela havia sim escutado. — Eu tenho que ajudar essas pessoas. As coisas podem acabar mais rápido comigo ajudando, eu realmente quero acreditar que sim — foi a vez de Celine soltar um suspiro profundo e limpar a garganta logo em seguida, tentando afastar dentro de si as coisas que podiam ser ditas das que não podiam ser ditas. — Mas você não vai estar sozinha, nenhum de vocês vai estar, eu prometo. Realmente prometo que irei até vocês o mais rapidamente que conseguir.
Celine assistiu a mãe se afastar de seus braços, apenas o suficiente para que as duas ficassem de frente para a outra no chão de madeira.
Bryane negou com a cabeça.
— Não estou preocupada em ficar sozinha. Não é comigo que estou preocupada. É com você. Sempre foi com você e sempre será com você — ela tomou um longo suspiro e começou a se levantar. — Você é minha preciosa e amada filha, Celine. Não posso ficar sem você e seu pai. Não consigo. Não vou conseguir.
Ela então se levantou do chão e tentou em vão arrumar as vestes amarrotadas.
— Vá falar com ele — disse, indicando as escadas com a cabeça. — Ele havia me dito mais cedo que gostaria de conversar com você.
Celine não sabia o que responder, então ela apenas acenou com a cabeça também e se levantou do chão de madeira, andando um passo atrás do outro, lentamente, em direção das escadas, até finalmente alcançar o topo delas e se virar em um dos corredores, indo em direção de onde ela sabia que ficava o quarto dos pais.
Ela fechou o punho e estava prestes a bater na madeira escura da porta, mas parou na metade de seu movimento e descansou a mão na maçaneta dourada.
Celine suspirou e tentou buscar toda sua coragem dentro de si mesma.
Ela não via o pai a algum tempo já. O motivo se devia unicamente à doença transmissível que o mesmo infelizmente carregava consigo, a mesma doença que acabou levando o senhor e a senhora Potter. Então, devido a isso, o senhor Calério Dorsey sempre deixava bem claro que queria sua única filha bem longe dali, deixando que entrassem em seu quarto apenas os medibruxos e sua esposa.
Ele temia por Celine e ela sabia disso, mas ela também sabia que o motivo de não ter entrado mesmo assim no quarto para ver seu pai antes foi por puro e unicamente medo.
Ela tinha medo do que iria ver e tinha ainda mais medo de como reagiria.
Calério Dorsey sempre foi um homem bastante inteligente, forte e respeitado. Celine, como sua única filha, nunca havia visto o mesmo de outro jeito.
Seu pai e sua mãe eram as figuras mais fortes em sua vida e mesmo com a idade já avançada deles, ambos sempre aparentavam e passavam a sensação de serem indestrutíveis, ou pelo menos Celine gostava de pensar assim, afinal, ela também sabia muito bem que ninguém era indestrutível, muito menos eterno.
Com mais um suspiro profundo, Celine finalmente bateu com os nós dos dedos na madeira dura da porta. Ela não esperou por uma resposta, sendo assim, alguns segundos depois, ela simplesmente girou a maçaneta e abriu a porta, dando um passo à frente e depois fechando a porta às suas costas.
Seus olhos se levantaram e se depararam com o quarto de cores claras de seu pai e sua mãe.
Amarelo e azul em sua maioria.
Ao centro, havia uma enorme cama de dossel com suas cortinas azuis fechadas, porém, uma brecha grande o suficiente nela ao lado esquerdo da cama dava a visão de seu pai deitado ali.
Os olhos escuros dele encaravam os claros de sua filha, um fino e pequeno sorriso nos lábios adornavam sua face pálida e um tanto amarelada.
Os cabelos e a barba enorme de seu pai, que sempre em seu habitual costumavam ser arrumados, estavam totalmente soltos e livres pela cama.
Não havia nós, Celine pôde perceber, provavelmente sua mãe sempre penteava os cabelos e barba de seu pai.
Calério estava deitado e quando Celine deu dois passos antes de ser impedida de chegar mais próximo ainda por uma das mãos esticada e esquelética dele, ela pela primeira vez reparou que não haviam apenas os dois ali naquele quarto. Também havia Esdras, em sua forma enorme de Matagot, deitado aos pés da cama, enrolado em seu próprio corpo, olhando atentamente para Celine e Calério.
Mais ao fundo do quarto, sentado em uma pequena poltrona amarelada, estava o medibruxo que vinha cuidando da saúde de Calério Dorsey, ele parecia ler algo quando Celine entrou ali, mas parou de supetão, surpreso pela súbita entrada da filha de seu paciente.
— Oh, me desculpe — Celine pediu enquanto se virava na direção do medibruxo. — Eu não havia visto o senhor aí.
O homem retirou os óculos quadrados do rosto, que parecia estar usando para leitura, e deixou de lado seu livro.
— Boa noite, senhorita Dorsey. Lamento, mas a senhorita não pode entrar aqui assim...
O medibruxo continuaria com sua frase, porém, um pigarro vindo da cama o fez parar e olhar para o senhor acamado.
— Está tudo bem, doutorr — Calério disse com uma voz rouca e bem baixa, como se não a usasse direito a um bom tempo. — Fui eu quem chamou Celine aqui. Preciso falarr com ela porr um pequeno instante, serrá que poderrria nos dar um pequeno momento a sós? Tenho algo imporrtante a tratarr com minha filha.
O medibruxo logo se aprontou em levantar da poltrona e concordar com a cabeça, pegando seus óculos e livro, ele se encaminhou em direção da porta de saída do quarto.
— Claro, claro — ele murmurou. — Apenas, por favor, não demorem muito. Para o bem de ambos, é claro — ele olhou de esguelha para Celine e depois para seu pai, como se estivesse envergonhado por dizer aquilo.
— Está tudo bem — Celine se adiantou em dizer. — Prometo que não iremos demorar muito.
Com um pequeno sorriso de entendimento, o medibruxo saiu porta afora, deixando apenas pai e filha sozinhos no quarto.
Celine tirou os olhos da porta e voltou a olhar para seu pai na cama.
Ele estava tão quieto e magro, era estranho.
Celine estava acostumada a vê-lo sempre andando de um lado ao outro da casa, de cima abaixo com suas poções e pergaminhos, não assim, tão quieto, tão frágil...
— Pai — ela chamou enquanto tentava mais uma vez se aproximar, mas dessa vez quem a parou foi Esdras, se enrolando delicadamente nas pernas dela e deitando ali perto, a fazendo ficar a uns seis passos de distância da cama onde seu pai estava.
— Nós vamos para a Frrança.
A voz era baixa e rouca, mas ainda continuava contendo o mesmo tom autoritário de sempre. Aquilo fez Celine sorrir diante de tudo.
— Pai, eu não posso-
— Eu e sua mãe vamos parra a Frrança — ele continuou, interrompendo Celine e a fazendo olhar surpresa na direção dele. — As pessoas prrrecisãm de você aqui. Eu entendo — ele parou por um momento, sugando ar para fundo em seus pulmões e lambendo os lábios ressecados. — Fui um aurror, Celine, não me agrrada em nada estar assim — ergueu uma das mãos trêmulas e apontou para si mesmo na cama. — Você se parrecé muito comigo quando mais jovem, só que mais bonita — aqui fez Celine rir baixinho enquanto secava um dos cantos do olho. — Há medo em você, mas não é tão grrrande quanto sua vontade de ajudar os outros e isso vem daqui — ele bateu com os dedos trêmulos em seu próprio peito —, mas a bondade, inteligência e sabedorria, elas vem de sua mãe.
"Eu ficarria decepcionado se soubesse que você não ajudarria, que não doarria um pouco de você nisso tudo. Você tem as melhorrres parrtes minhas e de sua mãe consigo, use-as. Seja sábia e inteligente e sinta medo. Isso mesmo, sinta medo. Não tem que se enverrgonhar de sentirr medo, todos nós sentimos o medo. O homem que se diz corrájoso e nunca sente medo está mentindo. Não há do que se envergonharr. Sentirr medo e mesmo assim fazerr o que é cerrto, faz de você uma pessoa muito corrájosa".
Celine se lembra de concordar veementemente com a cabeça enquanto chorava, concordando com tudo que seu pai a dizia.
Ela também se lembrava de murmurar muitas vezes o quanto o amava.
Ela se lembrava de sair do quarto ainda aos prantos e ir em direção de seu próprio quarto, entrando nele e começando a chorar como nunca chorou em toda sua vida.
Ela se lembrava de abafar os soluços altos no seu travesseiro e a última coisa que Celine Dorsey se lembrava de antes de ter que vestir uma grande máscara em seu rosto, foi de ver sua mãe e pai indo embora, depois disso tudo passou a ser uma grande mentira.
Aquela foi a última vez que Celine se deixou sentir de verdade, dali em diante, ela era outra pessoa.
Uma pessoa que frequentava com frequência a casa dos Black.
Uma pessoa que manipulava os sentimentos de Regulus o fazendo dizer tudo.
Uma pessoa que havia largado a família e amigos para viver o amor ao lado de quem ela dizia amar mais que tudo.
Uma pessoa que havia simplesmente sumido do lado de seus amigos e aliados e se unido ao outro lado repentinamente.
Uma pessoa acusada de traição.
Uma grande farsa.
. . .
Os dedos longos e finos corriam de um lado ao outro nas teclas frias de marfim, ela nem ao menos percebia mais o que tocava. Era automático, uma melodia muito antiga, ensinada por sua mãe ainda em sua infância.
Celine tocava aquela canção no piano de calda negro todos os dias, quase que como uma obrigação para consigo mesma.
A casa dos Black sempre foi muito silenciosa, mas ultimamente era lotada pelas notas hora suaves, hora agitadas das canções de Celine e ela gostava daquilo.
O silêncio costumava ser um grande incômodo.
A senhora Walburga e o senhor Orion Black não reclamavam, então a mesma continuava tocando todos os dias sem pausa.
Walburga até mesmo dizia gostar da melodia. "Uma melodia melancólica" era o que ela costumava sempre dizer, e isso de alguma forma parecia a deixar satisfeita.
Celine bateu raivosa nas teclas de marfim, chegando naquela parte da melodia onde tudo parecia retumbar.
Como uma noite de chuva muito densa.
Monstro, o elfo doméstico da família Black, sempre observava de canto no cômodo da cozinha enquanto sua mais nova senhora tocava o enorme piano na sala de estar.
Ele gostava daquela parte em particular da melodia, combinava com sua futura senhora.
Monstro gostava que Celine sempre fizesse bom uso do velho piano. Ele ficou por anos parado, nenhuma alma viva sentava-se ali, mas mesmo assim o elfo doméstico tirava sempre um momento de seu dia para manter o objeto limpo na sala de estar.
Muitas vezes ele não via o por que do piano velho continuar ali, mas lá estava sua futura senhora, utilizando do velho piano como se fosse um objeto raro.
Monstro ficava feliz de sempre ter o mantido limpo.
Ele gostava de sua senhora, gostava dela pois o senhor Regulus sempre falava da mesma.
A melodia então se deu por fim, calmamente e devagar, como uma grande chuva sempre tende a terminar.
Celine descansou as mãos no colo e então virou os pescoço para o lado, se deparando com os dois grandes olhos do pequeno elfo doméstico meio escondidos por detrás de uma parede próxima a sala de estar.
Ela deu um meio sorriso na direção de Monstro.
— Talvez eu devesse mudar de música, o que acha? — ela perguntou, mas não obteve resposta. — Estou falando com você, Monstro. Não acha que as paredes já devem estar cansadas de escutar sempre a mesma melodia?
Monstro arregalou os olhos e se escondeu um pouco mais na parede à sua frente.
A senhora Celine sempre parecia falar sobre assuntos triviais com Monstro e ele não estava acostumado com isso.
Mas ele também sabia que não responder costumava deixar sua senhora aborrecida.
— Monstro não sabe, minha senhora.
Celine ergueu uma sobrancelha na direção dele.
— Não sabe se devo mudar de música ou não sabe se as paredes já devem estar cansadas?
Monstro não soube o que responder, então apenas juntou as mãos em frente ao corpo e abaixou sua cabeça.
Celine suspirou.
— Acho que vou apenas tentar tocar outra coisa daqui em diante então.
Celine olhou de esguelha na direção de Monstro, mas novamente não viu nenhuma reação diferente da habitual.
Ela suspirou.
— Monstro.
— Sim, minha senhora?
— Olhe para mim.
Monstro ergueu a cabeça e mirou sua senhora ainda sentada no banco pequeno do grande piano.
Ela usava um longo vestido em cor branca de mangas longas e bufantes, apesar do frio, sua senhora parecia não gostar de vestir outras coisas sem serem seus vestidos.
Celine cruzou as pernas e apoiou um dos braços em uma delas, olhando para a pequena figura do elfo doméstico à sua frente.
— Você gosta da melodia? — os grandes olhos do elfo ficaram ainda maiores com a pergunta. — Parece gostar, afinal, sempre à escuta escondido no corredor do lado de fora da sala.
Celine sorriu com o rosto surpreso de Monstro.
— Perdoe Monstro, minha senhora. Monstro não deveria ter feito isso. Não deveria ter escutado sem a permissão da senhora.
Ela se levantou e ajeitou o longo vestido no corpo.
— Se sempre escuta é por que gosta, não? Sendo assim, acho que continuarei a tocar a mesma canção.
Monstro olhou ainda mais espantado na direção de Celine.
— O que acha? — ela voltou a perguntar.
— S-sim, minha senhora.
Celine soltou uma pequena risada quando viu que finalmente havia conseguido fazer o elfo doméstico demonstrar outro rosto sem ser o de sempre. Aquela pequena atividade sempre parecia fazer de seus dias menos monótonos, apesar de nem sempre o elfo doméstico ceder às tentativas dela de o fazer ficar sem suas palavras prontas e habituais.
Ela estava prestes a dizer algo mais, porém, o som de passos vindo da sala ao lado, indicavam que alguém havia retornado a casa, sendo assim, Monstro logo se adiantou para receber seus senhores, como o bom elfo doméstico que era.
Celine voltou a se sentar na banqueta do piano e esperou ali, até que um pequeno momento mais tarde, Regulus Black passou pelo arco da sala onde a mesma estava, porém, sozinho e aquilo a fez franzir as sobrancelhas.
— Onde estão o senhor e a senhora Black?
Regulus retirou o casaco e o entregou a monstro que estava próximo a ele.
— Ficaram por lá. Disseram que ficariam esperando por nós — explicou e Celine entendeu, concordando com a cabeça.
Regulus retirou as luvas e também as entregou a monstro, logo depois, ele foi em direção de Celine e com as pontas dos dedos, levantou o queixo dela em direção a ele.
Celine olhou no fundo dos olhos escuros de Regulus Black e deu um pequeno sorriso.
— Senti sua falta — ele sussurrou enquanto deslizava a ponta dos dedos gelados na linha do maxilar de Celine, de um lado ao outro.
— Também senti a sua — ela respondeu e, um segundo depois, Regulus se abaixou apenas o suficiente para beijar os lábios macios da mulher à sua frente.
Sorrindo, Celine correspondeu ao beijo enquanto acarinhava os cabelos do homem.
Regulus suspirou, apreciando o carinho em seus cabelos e quando apoiou sua testa na de Celine e olhou no fundo dos olhos da mulher que agora era sua noiva, ele sorriu em orgulho para ela.
— Ele vai adorar você — sussurrou. — Não há ninguém que não adore.
O coração de Celine saltou em seu peito e seu estômago revirou com aquelas palavras, mas mesmo assim, diante da reação óbvia de medo em seu corpo, Celine sorriu em resposta e se levantou da banqueta, ficando de frente para Regulus.
— Esperemos que sim — ela disse enquanto arrumava a blusa de gola alta que ele usava. — Agora, vá se arrumar. Não queremos deixar seus pais esperando, não é mesmo? Eu irei fazer o mesmo.
Regulus concordou com um acenar de cabeça e em seguida, deixou um beijo na testa de Celine antes de ir em direção às escadas e subi-las.
Celine o assistiu sumir escada acima sendo seguido fielmente por Monstro e depois, quando os dois já não estavam mais às suas vistas, ela soltou um longo e intenso suspiro.
Ela arrumou os cabelos que agora estavam mais longos, quase batendo em seus ombros, para trás das orelhas e molhou os lábios.
Ela estava nervosa.
Um nervosismo tão grande que ela até mesmo podia jurar que estava sentindo suas entranhas gelarem, mas mesmo assim ela tentou se manter o mais normalmente possível e se colocou a subir as escadas também.
Celine abriu a porta onde jazia o nome de Sirius Black e entrou no que costumava ser seu quarto.
Ela fechou a porta e a trancou, de costas na madeira maciça, Celine suspirou e escorregou até se ver sentada no chão do quarto.
Piscou os olhos e olhou ao redor, vendo o quarto do exato mesmo jeito que Sirius havia o deixado quando se foi daquela casa.
Ela estava ficando ali por enquanto e, Celine não negava que se sentia confortada naquele quarto, mesmo não tendo o amigo ao seu lado, ela ainda assim conseguia sentir que Sirius Black lhe incentivava de algum lugar, o que a fazia sorrir sozinha.
Celine sentia muito a falta de todos eles.
Era inverno e eles estavam no final do ano, o que significava que Regulus estava fora de Hogwarts por enquanto e também que Celine já estava por ali por um grande período de tempo, pelo menos para ela.
Estar sempre indo e vindo entre Comensais da Morte, em suas festas e depois reuniões, fez Celine ver e ouvir coisas que ela gostaria de nunca mais ver ou ouvir ou, melhor ainda seria se elas simplesmente sumissem para todo o sempre de sua cabeça, pois sempre que ela deitava sua cabeça no travesseiro, Celine podia jurar que aquelas vozes a seguiam na noite, sussurrando aquelas atrocidades em seu ouvido na calada da noite fria.
Ela não fechava os olhos enquanto estivesse naquela casa, Celine sempre acordava de momento em momento pela noite, até o amanhecer do sol, sempre agarrada a sua varinha de nogueira preta, pronta para que se alguém entrasse no quarto com o intuito de a matar depois de descobrir seus planos ela pelo menos conseguisse ser mais ágil do que a outra pessoa.
Celine se levantou do piso frio e sentou-se na cama, ela não conseguiu evitar de olhar para o pulso de seu braço esquerdo.
Ela esperava que tudo desse certo e ela não precisasse ganhar uma tatuagem horrorosa em sua pele também.
Celine também não conseguiu evitar quando começou a esfregar o pulso em repulsa apenas pensando naquela mera possibilidade.
A verdade até agora, era que eles pareciam confiar nela.
Não havia sido uma tarefa fácil, é claro. Nada naquilo tudo era, mas tudo os levava a acreditar em Celine.
Primeiro havia começado com o rumor de que os pais de Celine haviam deixado o país, mas a mesma havia optado por ficar para trás. Muitos acreditavam que ela havia ficado por conta de Dumbledore, mas quando ela apareceu com Regulus e contou sobre várias das diversas coisas que sabia sobre a Ordem e até mesmo do próprio Ministério da Magia, as coisas começaram a mudar.
É claro que muitos ainda assim não acreditaram nela, era tudo fácil demais, porém, depois de vários dos planos de Dumbledore e da Ordem serem completamente arruinados e com o Ministério a um passo de sua queda, além de alguns membros da Ordem da Fênix que também foram capturados, Celine havia conseguido finalmente mostrar sua lealdade e como ela estava séria naquilo. Como ela estava séria sobre o lado em que estava e em seu relacionamento com Regulus Black.
Era fácil fingir ser uma mulher completamente apaixonada além de tola, o difícil mesmo eram os resultados de seus atos em tudo aquilo.
Além de ela se sentir muito mal por Regulus, mesmo não confiando mais nele, ela ainda assim de momentos em momentos se via pensando no bom amigo e homem que ele havia sido no passado.
Ela gostaria de saber em que momento disso tudo ambos acabaram mudando tanto ao ponto de se tornarem quem são hoje.
Celine também se odiava por saber que haviam membros da ordem que estavam sendo mantidos em cativeiro neste exato momento unicamente por sua culpa.
Ela não sabia dizer se Dumbledore havia os dito, provavelmente não, para que nenhum deles deixasse escapar algo, mas, ela se pegava pensando a todo momento no que eles deveriam estar passando sendo feitos reféns pelos Comensais.
Celine havia visto e ouvido demais.
Ela ouviu muitos nomes — conhecidos e desconhecidos.
Ela escutou muitos planos e "esquemas", mesmo que não fossem para ser ouvidos.
E mesmo que Voldemort se achasse importante demais para tratar de Celine ele próprio em pessoa, não a enxergando como algo minimamente perigoso, mesmo nunca tendo se apresentado ou sequer se aproximado de Celine, ela sabia quem ele era.
Celine havia ido em muitas festas grotescas dos Comensais da Morte, sempre que eles haviam êxito em algo, os mesmos comemoravam e, foi em uma dessas festas que Celine o viu.
A grande maioria estava mascarada, mas lá, no meio da multidão, estava o único homem que não usava máscara alguma em seu rosto, como se não temesse a nada e a absolutamente ninguém.
Obviamente aquele era Voldemort.
Mesmo de longe, Celine conseguia sentir o mau ácido que emanava dele. Era quase palpável, flutuando ao seu redor e aonde quer que ele fosse.
Os "lacaios" de Voldemort eram quem escutavam os relatos de Celine e, eles sempre tentavam ser terríveis com ela, parecendo sempre quererem vê-la tremer diante deles, o que nunca acontecia, principalmente por que Regulus sempre acompanhava Celine para onde quer que ela fosse e o mesmo não tolerava que a tratassem mal ou que encostassem um dedo sequer nela.
Depois de capturarem alguns membros da Ordem, foi que Voldemort achou então que Celine finalmente era digna de conhecê-lo pessoalmente e também de se tornar um deles.
O lugar onde os pais de Regulus estavam era a mansão dos Lestrange, lugar onde a festa de hoje aconteceria, lugar onde eles mais uma vez celebrariam mais uma de suas vitórias e, ao que tudo os levava a acreditar, tudo estava próximo demais do fim e era óbvio que Voldemort ganharia.
Celine ganharia seu passe de entrada hoje a noite, entregue por ninguém menos do que o próprio Lorde das Trevas em pessoa.
Ele queria a conhecer e Celine não sabia como se sentir sobre aquilo.
Uma parte de si sentia medo, tremia da cabeça aos pés e quanto a outra, bom, essa parte queria muito usar uma das Maldições Imperdoáveis nele no exato momento em que o visse.
O acertaria em cheio e então, o Lorde das Trevas estaria morto.
É claro que ela morreria logo em seguida com a enorme quantidade de Comensais da Morte que estariam ao seu redor, mas ainda assim, parecia uma ideia tentadora.
Celine arrumou mais uma vez os cabelos longos demais para o seu gosto e finalmente se levantou da cama.
"Coragem, Celine!", ela disse para si mesma em pensamento enquanto caminhava em direção da escrivaninha que havia no quarto, ela parou em frente a cadeira que havia ali e observou o vestido longo e preto que ela havia posto ali mais cedo.
"Nada que chame muito a atenção", ela pensou.
Era um vestido longo na cor preta, gola alta e mangas longas. Nada mais. Simples e discreto.
Ela esperava que conseguisse passar despercebida vestida com aquilo.
Celine definitivamente não queria chamar a atenção para si.
A única coisa que se destacava em todo o conjunto, era um simples colar de pérolas adornando o pescoço da mesma, se destacando por cima das cores escuras.
Mais tarde, quando já estava pronta, Celine se via esperando na saleta no primeiro andar da casa.
Já vestida em seu vestido preto e com uma capa para que o frio da neve não a incomodasse, Celine tentava aparentar estar calma e tranquila, apesar de suas mãos tremerem um pouco enquanto a mesma tentava vestir as luvas em suas mãos.
Quando estava prestes a colocar a luva em sua mão esquerda, Celine se viu encarando a enorme esmeralda em seu anelar.
Era bonito, ela não podia mentir. O anel de noivado que havia recebido de Regulus era lindo, no entanto, não combinava nem um pouco com Celine.
Ele era brilhante demais, com pequenos diamantes ao redor da solitária pedra de esmeralda que jazia ao meio.
Brilhante e ostentoso.
Celine o achava grande demais.
Ela suspirou por estar pensando em trivialidades e com a mão direita, agarrou sua esquerda e fechou os olhos, tentando a fazer parar de tremer.
"Seja corajosa, seja corojosa", ela murmurava consigo mesma em pensamento.
— Você está linda.
Celine deu um sobressalto com a voz repentina de Regulus na pequena sala e agradeceu a Merlin por estar de costas para a porta de entrada, se não ele a teria visto de olhos fechados e em algo que se pareceria com uma reza silenciosa.
— Obrigada — ela respondeu, se virando e sorrindo, o encarando de cima a baixo. — Você também está bonito.
Vestido inteiramente de preto, assim como Celine, Regulus parecia tão pronto quanto a mesma.
— Não tanto quanto você, eu posso garantir — disse suavemente enquanto caminhava em direção de Celine. — Está nervosa? — ele perguntou quando chegou perto o suficiente e viu a mão ainda nua de Celine tremer por um pequeno instante, antes da mesma fecha-la em punho e levá-la em direção ao peito.
— Sim — ela murmurou —, estou nervosa em conhecê-lo.
Regulus sorriu tentando passar conforto e então pegou a luva da mão de Celine, começando a ajudá-la naquela árdua missão.
— Não precisa ficar nervosa — disse ele enquanto calçava a mão dela com a luva de couro escuro. — Eu vou estar lá o tempo todo.
Celine apenas concordou com a cabeça, apesar daquilo não a ter confortado em absolutamente nada.
Quando ela viu que ele já parecia estar pronto para ir, Celine, em um ímpeto do qual ela se arrependeu logo depois, agarrou um dos braços de Regulus, mais precisamente o esquerdo.
Ele se virou e olhou surpreso para ela.
— Dói? — ela perguntou e ele continuou a olhá-la sem entender. — Dói? — ela perguntou mais uma vez, passando os dedos enluvados no antebraço dele, tocando em seu pulso esquerdo.
Regulus sorriu de lado e segurou a mão de Celine em um aperto firme.
— Eu vou estar lá o tempo todo.
Celine sorriu, porém, sentindo-se desapontada por dentro.
— Certo.
— Aqui — Regulus falou, pegando algo da mão de Monstro, o elfo doméstico, logo ao lado, que Celine nem ao menos havia reparado estar ali. — Fique com isso o tempo todo.
Ele levantou uma máscara detalhada, que Celine infelizmente já conhecia bem o bastante e a colocou no rosto de Celine, escondendo-a.
— Sempre pode ter um certo alguém observando, então nunca a retire a não ser que lhe seja pedido, certo? — Celine concordou com a cabeça. — Pronta?
— Pronta — ela respondeu entrelaçando seus dedos nos de Regulus.
Ele anuiu com a cabeça e entrou primeiro na lareira.
— Vou ir primeiro, estarei esperando por você lá — avisou e no segundo seguinte, lançou o pó prateado na lareira que criou chamas esverdeadas.
Regulus entrou nas chamas e disse o endereço, Celine o assistiu sumir por entre as chamas verdes.
Ela suspirou e levou uma das mãos ao peito, tentando se acalmar, depois mexeu no colar de um lado ao outro, em nervosismo.
Não querendo deixar Regulus a esperando por tempo demais, Celine pegou também um punhado do pó prateado e o jogou na lareira grande.
As chamas se formaram como antes e Celine se forçou a pensar no endereço que havia sido passado para ela mais cedo, quando finalmente entrou nas chamas, antes de desaparecer da casa dos Black, Celine podia jurar que escutou um baixo "Irá dar tudo certo", provavelmente sua própria cabeça tentando consolá-la.
Celine em um instante estava na casa dos Black e então, no tempo de um piscar de olhos, ela se viu em outra lareira e em outra casa totalmente diferente.
Essa lareira onde ela estava agora parecia maior e a saleta mais escura, pois as paredes, móveis e decoração eram todas em cores igualmente escuras.
Celine piscou olhando de um lado ao outro e, logo ao lado da lareira a sua espera, estava Regulus Black, que ergueu uma de suas mãos em direção dela num convite para que a mesma a segurasse. O mesmo já se encontrava também com sua máscara no rosto e, Celine apenas sabia quem estava ali mesmo por conta das roupas serem as mesmas do homem com a qual ela conversava mais cedo.
Assim que Celine aceitou a mão de Regulus e pisou para fora da enorme lareira, uma outra pessoa também inteiramente de preto e usando a máscara dos Comensais da Morte apareceu ali pela rede de Flu.
E outro e então mais outro... vários deles.
Celine segurou firmemente no braço de Regulus e ela o deixou guiá-la.
Regulus os tirou da saleta onde vários chegavam ao local e os levou porta a fora.
Conforme andavam, alguns cumprimentavam Regulus com um acenar de cabeça ou um balançar de mãos, parecendo reconhecê-lo mesmo vestido com sua máscara.
Muitos no enorme salão onde eles estavam agora se encontravam sem máscaras, como se não se importassem em nada com o perigo de serem pegos, como se aquilo nem ao menos fossem uma mera possibilidade.
Celine olhava para todos.
Gravando rostos e nomes que escutava aqui e ali.
Regulus parecia saber exatamente para onde estava indo naquela multidão de pessoas, ele parecia conhecer como a palma de sua mão a enorme mansão dos Lestrange e também já parecia saber onde os mesmos provavelmente se encontravam juntamente com seus pais.
Conforme caminhavam juntos, Celine ia olhando ao redor, para as pessoas mascaradas e as sem máscaras em seus rostos.
Todos conversavam em alto tom, rindo e bebendo.
Elfos domésticos iam e vinham de um lado ao outro, oferecendo bebidas a todos.
Celine também escutava gritos agoniados e quando olhou para o local de onde os gritos vinham, ela se deparou com a cena de Comensais rindo e se divertindo enquanto cometiam atrocidades com Trouxas.
Ela desviou o olhar e tentou manter a mente limpa de qualquer coisa, totalmente trancada.
Regulus os fez parar onde dois elfos domésticos estavam parados, próximos a uma sala que parecia cheia de casacos variados.
Eles retiraram seus casacos e luvas e os entregaram aos elfos que logo os aceitaram de bom grado e guardaram os mesmos na saleta.
Regulus colocou uma das mãos na base da coluna de Celine e os guiou mais a frente e, não muito distante dali, Celine conseguiu enxergar os pais de Regulus.
Walburga e Órion Black pareciam concentrados em algo que Lucius Malfoy falava.
Os três estavam sem máscaras, assim como Bellatrix mais ao lado e Celine supôs que o homem também sem máscara ao lado dela fosse ninguém menos que Rodolfo Lestrange, seu marido.
Ao lado de Lucius estava o que ela achava ser Narcisa, esposa de Lucius e irmã de Bellatrix. Mas ela não sabia dizer se era mesmo a mulher, pois a mesma trajava uma máscara em seu rosto.
Haviam também outros, mas todos mascarados.
O que chamou mesmo a atenção de Celine foi o homem mais ao meio de todos. Havia um homem alto ao lado dele que vestia sua máscara e do outro lado estava Bellatrix que falava entusiasmadamente com o homem do meio, que estava sem máscara alguma.
Pela postura do mesmo e como todos se portavam ao redor dele, Celine logo soube de quem se tratava.
Voldemort estava bem ali, na frente dela.
Ela sorriu por debaixo da máscara.
Ela não sabia se sorria de satisfação ou nervosismo, talvez uma mistura de ambos.
Quanto mais os dois se aproximavam, Celine sentia-se gelar por dentro. Ela logo tratou de afastar todos os seus pensamentos e trancar seus sentimentos dentro de si mesma, colocando em prática todas as aulas que Dumbledore havia lhe dado.
— Boa noite a todos — Regulus cumprimentou o grande grupo de pessoas afastada das demais no salão. — Milorde — ele cumprimentou Voldemort com educação, quase como se estivesse referindo-se a alguém da realeza.
Celine seguiu os passos de Regulus e também cumprimentou a todos.
Ela fez questão de se abaixar junto a Regulus quando se virou em direção de Voldemort para cumprimentá-lo.
Quando se ergueu novamente, mesmo por debaixo da máscara, Celine sentiu-se queimar sob o olhar de um dos homens mascarados atrás de Voldemort.
Ela o olhou por um segundo, estranhando, mas logo teve sua atenção voltada ao anfitrião da noite, quando o mesmo se aproximou com um sorriso no rosto, totalmente direcionado a Regulus logo ao lado.
Celine sabia que a família Black era parte importante em tudo aquilo, principalmente Regulus. Ele parecia bem ativo nas atividades dos Comensais da Morte, o que fazia Celine pensar que de algum jeito, ela apenas não sabia dizer qual exatamente, Voldemort parecia sempre orgulhoso de Regulus ou algo parecido.
Regulus retirou a máscara que vestia, assim como quase todos presentes ali se encontravam e sorriu cordialmente para o homem que vinha em sua direção.
— Bem a tempo, Regulus! — Voldemort exclamou com um sorriso de muitos dentes, enquanto tocava em um dos ombros de Regulus. — Estava agora mesmo citando seu nome, estávamos todos muito ansiosos para a sua ilustre presença.
Regulus sorriu e mais uma vez inclinou a cabeça em respeito e, então, Voldemort virou seu pescoço e olhou mais abaixo, para a figura mascarada e em preto ao lado de Regulus.
— Milorde — Celine cumprimentou baixinho, enquanto se inclinava, cumprimentando Voldemort como se o mesmo fosse a espécie de um rei.
Ela permaneceu de cabeça baixa, mas isso não durou muito, pois logo dedos muito gelados tocaram seu queixo, fazendo-a erguer a cabeça e se deparar novamente com o rosto de Voldemort.
Ele já parecia ter terminado seu rápido exame em Celine e agora olhava para a mesma diretamente nos olhos, mesmo por debaixo da máscara.
Como se pudesse ver muito além daquilo.
Celine sorriu, mesmo sabendo que o metal frio da máscara escondia aquilo e, no segundo seguinte, Voldemort retirava delicadamente a máscara do rosto de Celine.
O ar frio bateu no rosto sardento de Celine, o que a fez suspirar enquanto encarava sem piscar o rosto peculiar do Lorde das Trevas.
Ele inclinou o rosto de Celine de um lado ao outro até retornar com o mesmo em linha reta, olhos estranhamente escuros encarando os claros da mulher.
— Vejam só — ele falou em alto e bom tom —, o rosto de uma verdadeira bruxa puro-sangue.
Celine escutou burburinhos, mas não se atentou a eles de forma alguma.
O que ela fez foi sorrir amplamente e agradecer educadamente.
Ela não sabia dizer se Voldemort a estava elogiando ou não, mas de uma coisa ela sabia bem, Celine não podia dizer o mesmo sobre ele.
O homem era tão horrorosamente amedrontador por fora quanto por dentro.
Mas segundo Dumbledore, nem sempre o Lorde das Trevas havia sido daquele jeito.
Celine inclinou a cabeça e tentou imaginar como o mesmo teria sido antes e não conseguiu. De um jeito ou de outro, ela tinha certeza que lhe causaria apenas o mais puro asco.
— É um prazer finalmente conhecê-lo, meu senhor — ela murmurou olhando no fundo dos olhos escuros, mesmo querendo a todo tempo desviá-los desesperadamente.
Um sorriso do que pareceu satisfação adornou os lábios finos do Lorde das Trevas.
— Ora, senhorita Dorsey — ele falou em um tom que para Celine quase se fez soar como zombeteiro —, o prazer é todo meu em finalmente conhecer a bruxa da qual tanto ouvi falar.
Celine juntou as mãos à frente do corpo e tentou parecer o mais submissa possível.
— Acredite, Milorde, meu prazer nesse exato momento é imensurável. Eu sou uma mera partícula de pó diante do senhor. Sou facilmente descartável e confundível, enquanto ao senhor... — Celine olhou de forma contemplativa para Voldemort dos pés a cabeça. — O senhor é completamente único, Milorde.
Voldemort inclinou a cabeça, como se algo em Celine o deixasse intrigado.
Ao redor, podia ser ouvido as pessoas falando, os pais de Regulus murmurando e Bellatrix resmungando, mas em momento algum Celine retirou seus olhos lânguidos e brilhantes em uma falsa adoração do homem à sua frente.
Os dedos anormalmente frios do Lorde das Trevas finalmente deixaram o rosto de Celine.
— Estou quase arrependido de não ter lhe conhecido mais cedo, senhorita Dorsey, a senhorita é deveras intrigante.
Celine deu um grande sorriso.
— Minha mãe costumava dizer que nunca é tarde demais para os momentos importantes acontecerem, Milorde, e, como eu disse antes, sou apenas poeira como as outras. Nada de importante o suficiente para ocupar o tempo do senhor diante tudo isso.
Celine sentiu uma mão serpentear seu quadril e quando olhou brevemente ao lado, se deparou com Regulus.
— É aí que se engana, senhorita Dorsey — Voldemort disse e Celine voltou seus olhos a ele, que em momento algum pareceram deixá-la. — Apesar de jovem, a senhorita fez muito por aqui. Temos prisioneiros debaixo desse chão nesse exato momento por conta da senhorita e o ministro da magia parece igualmente desesperado — ele entregou a máscara nas mãos de Celine, chegando próximo, tão próximo que a mesma sentiu repulsa. Era como se ele tentasse farejar algo nela. — E maioria de tudo isso por conta da senhorita.
— Celine — ela disse e o mesmo não pareceu compreender. — Por favor, me chame de Celine — antes de terminar a frase ou escutar uma resposta, ela sentiu um apertão em um dos seus lados. Regulus a estava repreendendo ou tentando chamar sua atenção — ... Milorde — ela completou com um sorriso.
Ela ignorou completamente o aviso de Regulus ao lado ou como o mesmo parecia temer por algo logo ao lado, prendendo a respiração e olhando desacreditado para Celine.
Voldemort se inclinou para trás e olhou ao seu redor, para como todos murmuravam com olhos esbugalhados e, depois, olhou para a pequena bruxa à sua frente novamente.
Tão pequena, mas nem um pouco indefesa ou com algum rastro de medo.
Apenas os olhos brilhantes de uma criança que parecia admirar pela primeira vez as decorações de natal.
— Celine — ele finalmente falou e sorriu. — O que você, Celine, tem a me dizer sobre os últimos acontecimentos?
Celine se cansou dos apertões de Regulus em seu quadril e logo tratou de afastar a mão dele para longe dela.
— Se me pede pelas minhas mais sinceras palavras, meu senhor, eu digo que mais cedo ou mais tarde o Ministério cairia de qualquer forma. Cornélio Fudge é muitas coisas, mas nenhuma delas inclui inteligência ou poder. Mais cedo ou mais tarde o próprio acabaria se matando sem a ajuda de Dumbledore para tudo.
Houveram risadas ao fundo, enquanto outros pareciam incomodados com Celine citando Dumbledore ali.
— Você e sua família pareciam ser bastante próximos ao velho Dumbledore.
Celine negou com a cabeça enquanto suspirava.
— Meus pais? Sim. Eu? Não. Dumbledore é facilmente impressionável, ele sempre dizia ver algo em mim que o intrigava. Apenas isso, Milorde.
Voldemort olhou Celine dos pés à cabeça e deu risada.
— Eu consigo ver o que tanto o intrigava agora que finalmente conheci você, Celine — ele sorriu grande e colocou uma das mãos gélidas no ombro da mulher. — Espero que já esteja sentindo-se confortável aqui conosco — falou e deslizou o dedo ossudo até o pulso esquerdo de Celine —, mais tarde estará oficialmente na nossa família.
Celine sorriu e se inclinou.
— Me sinto verdadeiramente honrada, Milorde.
O dedo fez uma pequena pressão no braço de Celine, o que a fez levantar os olhos e olhar diretamente para o Lorde das Trevas à sua frente.
— Irá doer, mas não se preocupe, cada pequeno segundo será de imensa valia mais tarde — Voldemort soltou Celine e se voltou em direção de Regulus. — Uma grande pedra preciosa em um enorme mar de poeira — ele riu. — Nosso Regulus nunca nos desaponta!
Celine sorriu enquanto assistia Voldemort dar as costas e voltar para onde estava antes.
— Não deveria ter falado daquele jeito — Regulus sussurrou para ela, parecendo irritado.
— Que jeito? — ela perguntou com uma sobrancelha erguida.
— Daquele jeito! — exclamou contido, não querendo que mais ninguém ouvisse a conversa deles dois. — Completamente inapropriado e sem respeito algum. Ele é o Lorde das Trevas, Celine!
Celine deu de ombros e olhou ao redor, ela tocou o colar de pérolas em seu pescoço e depois olhou desafiadoramente de volta para Regulus Black.
— Se ele se sentiu ofendido, obviamente não demonstrou isso, não é? Eu sei muito bem que ele é o Lorde das Trevas, Regulus, e também sei que se ele não tivesse se contentado com minhas palavras de mais cedo, você muito provavelmente não estaria reclamando comigo agora.
Regulus franziu as sobrancelhas e olhou ainda mais sério para Celine.
— Pensei que estivesse nervosa mais cedo, mas agora já não me parece tão nervosa assim com a situação.
Celine sorriu e ajeitou a gravata escura na roupa elegante de Regulus.
— Você escutou ao nosso senhor, não é? Eu não tenho com o que me preocupar, cada pequeno segundo será de imensa valia mais tarde.
Ela terminou de arrumar a gravata e depois alisou rapidamente o tecido do casaco grosso no peito.
— Agora se me der licença, eu irei até o banheiro.
Quando estava prestes a se virar, Celine foi impedida por uma mão segurando seu braço.
— Eu acompanharei você até lá — Regulus disse enquanto olhava rapidamente ao redor, para as pessoas que ainda olhavam para Celine e murmuravam sobre sua conversa com Voldemort.
— Não há necessidade, eu já estou me sentindo confortável o suficiente entre a minha mais nova família — ela sorriu e deixou Regulus para trás, sem o dar tempo de responder qualquer coisa.
Os saltos mal podiam ser escutados diante o tamanho burburinho no enorme salão.
Haviam muitas pessoas conversando e rindo, elfos domésticos com bandejas de prata para todo lado e, mesmo ainda sentindo o desconforto de saber que alguém ainda a perseguia com os olhos, Celine ainda assim continuou andando até adentrar um corredor na enorme mansão.
Uma elfo doméstico passou apressado ao lado dela, a cumprimentando com respeito e ela estava prestes a perguntar onde ficava o banheiro, porém, quando se virou para o pequeno elfo, ela se deparou com o homem mascarado de mais cedo.
Ela o reconheceu pela roupa.
Uma grande capa escura por cima de mais camadas escuras de roupas que quase não mostravam pele alguma.
Era o homem que mais cedo estava ao lado de Voldemort e Bellatrix.
Celine franziu a testa e continuou andando pelo corredor tranquilamente, mesmo estando completamente perdida.
Ela virou um e depois mais outro corredor e mesmo que tentasse andar o mais descontraída possível, ela ainda assim conseguia escutar o barulho dos sapatos batendo contra o carpete no chão.
Não havia mais dúvidas agora, aquele homem estava a seguindo.
Celine olhou para trás bem a tempo de ver o homem virar no mesmo corredor que ela, ele acelerou os passos quando percebeu que ela havia o visto ali.
Os passos de Celine se tornaram mais rápidos, tentando manter-se bem afastada do homem esquisito e aparentemente perigoso. Quando virou por mais um corredor, Celine se deparou com uma parede que levava para lugar nenhum.
Ela amaldiçoou mentalmente aquele infortúnio e sacou sua varinha de dentro da manga esquerda de seu vestido, querendo estar preparada para o homem que se aproximava cada vez mais.
Assim que Celine girou em seus calcanhares, ela viu o homem mascarado finalmente aparecer no mesmo corredor sem saída em que ela estava.
Ela segurou firme sua varinha ao lado do corpo e olhou para o homem que se aproximava rapidamente, porém, totalmente desarmado, sem nenhum sinal de varinha nenhuma consigo mesmo.
Ou ele era muito estupido em pensar que chegaria nela a força antes que a mesma o matasse ou ele era completamente louco em persegui-la e agora estar andando despreocupado daquele jeito em direção dela como se a mesma não fosse capaz de matá-lo.
— Mais um passo e eu lhe prometo que ele será o seu último — ela avisou quando ele já estava a meio caminho de chegar até ela.
O homem pareceu não se importar com as palavras de Celine ou não levá-las a sério o suficiente, mas Celine estava bastante séria ali. Ela tinha uma missão para cumprir e não se importava com quem tivesse que desacordar pelo caminho.
Ela levantou a mão que segurava sua varinha e estava pronta para lançar o feitiço que estava em mente quando o rosto de Severus Snape se fez presente em sua frente.
A surpresa de Celine foi tanta quando o homem retirou a máscara que tudo em sua cabeça sumiu. Sua mão continuava erguida e pronta para lançar o feitiço, porém, nada saiu.
Severus andou rápido na direção de Celine Dorsey enquanto segurava sua máscara de Comensal da Morte em uma das mãos, uma máscara idêntica àquela que Celine também carregava consigo.
A feição no rosto de Severus Snape era de mais puro terror e medo, algo que se assemelhava às feições de Celine naquele momento também.
— Celine você precisa sair daqui — ele falou quando já estava próximo o suficiente, bem baixo, tão baixo que possivelmente nem mesmo Celine havia escutado. — Não sei o que está fazendo, mas definitivamente não pode continuar — Severus continuou, agarrando Celine pelos ombros e olhando em seus olhos. — No que estava pensando quando veio até aqui? Não pode continuar com isso, precisa mesmo sair logo daqui!
Severus parecia amedrontado e mais pálido do que geralmente já era, sua voz rouca e profunda estava falhando conforme o mesmo ia falando com a voz contida e baixa, ele parecia desesperado, mas Celine não conseguia prestar atenção em nada disso naquele momento.
Ela pensava em muitas coisas e todas elas envolviam os últimos meses e mesmo juntando tudo que havia visto e ouvido, ela não sabia explicar como ou quando Severus Snape havia chego até ali.
Celine sempre estava nas festas dadas pelos Comensais da Morte, juntamente com a família Black.
Ela via e escutava o máximo que podia, mas nunca viu ou ouviu sobre Severus Snape por ali.
Ela não sabia como aquilo havia acontecido e nem como explicar a presença do mesmo ali.
— Severus? — ela perguntou tocando o peito e então os ombros, até chegar ao rosto de Severus Snape, tocando tudo para checar se não estava alucinando ou talvez finalmente o medo a tivesse feito enlouquecer de uma vez por todas.
Por estar com uma das mãos trêmulas no pescoço do homem, ela pôde sentir quando o mesmo engoliu em seco e logo em seguida concordou com a cabeça.
— Sou eu — ele simplesmente confirmou. — Mas isso não importa, eu preciso tirar você daqui — falou enquanto olhava para todos os cantos no corredor em que estavam.
Celine o observou murmurar e olhar ao redor, ele parecia estar falando com ela, mas Celine estava ocupada demais em uma briga interna consigo mesma.
Uma parte dizia que aquilo era simplesmente impossível, que não tinha como Severus Snape estar de fato ali.
E a outra, ela dizia que aquilo não deveria ser tão surpreendente assim, que no fundo, ela já sabia, mas foi como sempre teimosa o suficiente para não aceitar mais essa realidade em sua vida.
Celine agarrou o braço esquerdo de Severus que ainda a segurava pelos ombros e sem hesitar, levantou a longa manga escura das vestes do homem.
— Por que? — ela perguntou em um murmúrio enquanto encarava o pulso esquerdo do homem.
— Isso não importa agora.
Celine tirou os olhos da imagem da tatuagem que todo Comensal da Morte carregava consigo e olhou para Severus, diretamente em seus olhos, e então, ela percebeu que havia perguntado aquilo em voz alta.
— Você sempre me surpreende e nunca é da maneira que eu espero — ela murmurou apertando os olhos, tentando manter as lágrimas afastadas.
Aquilo só podia ser um terrível pesadelo.
— Você sempre espera muito vindo de mim, mas eu nunca vou ser o suficiente para você, Celine — ele murmurou parecendo pesaroso. — Agora, por favor, eu imploro, me deixe te tirar daqui antes que algo terrível aconteça.
Celine olhou para o seu redor, vendo o corredor da mansão dos Lestrange, ela sentiu a varinha apertada em sua mão direita e então se lembrou de tudo o que passou nos últimos meses.
Da morte dos irmãos Prewett seguida da morte de Marlene.
Ela se lembrou de Regulus e também se lembrou de tudo que havia deixado para trás.
Sirius, Peter e Remus...
James, Lílian e o seu pequeno afilhado ou afilhada que nem ao menos havia nascido ainda.
Ela se lembrou da sua mãe e de seu pai e por fim, da conversa de mais cedo com Voldemort.
Do rosto do Lorde das Trevas.
Ela estava completamente sozinha ali, arriscando tudo e colocando a vida de outras pessoas em perigo também, tudo propositalmente para que as coisas pudessem melhorar.
Para que ninguém mais morresse ou sofresse.
Para prevenir que nada acontecesse com sua família e amigos, mas lá estava ele, Severus Snape, fazendo mais uma vez todas as barreiras de Celine desmoronarem.
Ela não aguentava mais aquilo.
— Suma da minha frente, Severus.
Snape piscou os olhos rapidamente, como se não tivesse entendido direito as palavras de Celine e, ela não deixou espaço para que ele entendesse o suficiente do que quisesse entender, pois logo voltou a dizer:
— Saia. Da. Minha. Frente — ela falou pausadamente e ele arregalou os olhos para o ódio contido em cada palavra. — Não sei o que você acha que sabe ou que entendeu e nem quero saber, eu só sei que quero que você suma da minha frente e não apareça nunca mais.
— Celine...-
Celine o interrompeu em um susto quando ergueu a mão que carregava sua varinha e a apontou diretamente na garganta de Severus Snape, apertando em um claro sinal de aviso.
— Não diga o meu nome como se fossemos amigos nunca mais, a partir de agora me chame apenas pelo segundo nome. Essa intimidade que você pensa ter comigo já não existe mais.
Severus soltou um profundo e trêmulo suspiro, olhando para Celine com olhos vermelhos, iguais aos dela naquele momento.
Se de choro ou raiva, Celine não sabia dizer.
Nem ela mesma sabia o que estava sentindo exatamente naquele momento.
— Tudo bem, tudo bem — ele murmurou baixo. — Apenas me deixe te tirar daqui, apenas isso.
Celine apertou ainda mais a varinha contra a garganta de Severus Snape e rangeu os dentes em direção a ele.
— Eu não preciso sair daqui, Severus Snape, eu estou exatamente onde quero estar, assim como você.
— Celi... — ele se refreou e balançou a cabeça rapidamente, olhando como se implorasse na direção de Celine. — Eles vão te matar quando descobrirem.
O maxilar de Celine ficou ainda mais duro com aquelas palavras.
— Por que me matariam, Snape? Eu estou aqui porque ajudei o Lorde das Trevas e sou noiva de um Comensal.
Severus negou mais uma vez com a cabeça e cerrou os pulsos ao lado do corpo.
— Eu te conheço, nós dois sabemos que isso não é verdade — ele murmurou baixo e empurrou mais a garganta contra a varinha de nogueira preta de Celine, se aproximando ainda mais dela. — Você não acha mesmo que todos eles acreditam fielmente em você, não é?
— Não sei, acho que irei ter que pagar para ver.
— Não — ele mais uma vez negou com a cabeça. — Isso é loucura! Você vai acabar morta, Celine! Eu sei que não existe noivado e muito menos a possibilidade de você estar aqui pelos motivos que você pensa que todos acham.
— Eu vou matar você.
— Tudo bem — ele respondeu erguendo as mãos. — Mas antes me deixe te tirar daqui, por favor, Celine, me deixe te tirar daqui.
Celine deixou escapar um pequeno riso.
— Você espera mesmo que eu acredite em você?
— Por favor, você precisa acreditar.
— Do mesmo jeito que você parece não acreditar em mim, eu acredito em você tampouco.
Severus abaixou as mãos e segurou o pulso de Celine que segurava firmemente a varinha contra sua garganta.
— Eu nunca faria mau a você, Celine. Eu jamais faria mau algum a você.
— Mentiroso — Celine sorriu e apertou ainda mais a varinha contra a garganta de Severus, vendo a pele avermelhar e o mesmo engolir em seco com a dor. — Você já me fez tanto mau que até perdi as contas. A única coisa que você faz é me fazer sentir mal, Severus Snape.
Severus fechou os olhos e mais uma vez engoliu com dificuldade, ele concordou com a cabeça e olhou para Celine com os próprios lábios trêmulos.
— Eu sei, eu sei... — ele repetiu em um murmuro trêmulo e baixo. — Me desculpe por isso. Eu sempre me vi menor que você, porque você é tão brilhantemente radiante que eu nunca pensei na mera possibilidade de você me enxergar. Mas você me enxergou desde nosso primeiro encontro no trem de Hogwarts e então mais tarde na Seleção e depois quando ninguém queria sentar ao meu lado nas aulas de poções...
Celine engoliu em seco e sentiu as lágrimas quentes rolarem por seu rosto.
— Cale a boca... — ela murmurou em resposta.
— Você sempre esteve ao lado do Potter e dos Black e quem sou eu perto disso? Eu sempre pensei que fosse alguma piada, que você talvez houvesse perdido alguma aposta e agora como punição tivesse que falar comigo, ou fingir que se importava.
"E mesmo mais tarde quando você ainda assim continuou ao meu lado, eu continuei a pensar que talvez você fizesse aquilo por pura generosidade. Afinal, você é boa demais para deixar que seus amigos tratassem alguém do jeito que me tratavam. Mas nunca pensei que você me olhava do jeito que sempre me olhou, Celine. Eu nunca pensei que qualquer pessoa jamais me olharia desse jeito, mas lá estava você no nosso último ano da escola me dizendo tudo aquilo corajosamente e eu mais uma vez não acreditei, mas mesmo assim deixei um pedaço vergonhoso de pergaminho nas suas coisas e mesmo assim insisti em te mandar cartas quando você não me respondia mais. Eu guardo todos os seus presentes e até mesmo suas cartas. Me perdoe, Celine, eu fui o pior com você e talvez não seja mesmo merecedor do seu perdão, mas por favor, eu te imploro, me deixe te tirar daqui... eu não quero que nada aconteça com você por que eu sinceramente me importo. Você é uma pessoa importante para mim também".
Ele falou tudo aquilo rápido demais e baixo, com pressa para que Celine acreditasse e confiasse nele.
Celine chorava enquanto suavizava o aperto de sua varinha na garganta de Severus Snape.
— Eu não posso ir embora, Severus...
— Pode sim — ele falou exasperado enquanto agarrava o rosto dela e a fazia olhar em sua direção. — Eu conheço o lugar, sei como te tirar daqui, vai ficar tudo bem, eu prometo.
Celine mais uma vez negou com a cabeça.
— Eu prefiro sair morta daqui do que ir sem fazer o que vim fazer.
Severus fechou os olhos e encostou a testa na de Celine, suspirando cada vez que sentia as lufadas de ar que saiam dela.
— Não diga isso, você não pode morrer. Você tem que sair daqui, viva e bem. Eu vou te tirar daqui — falou com uma certeza em sua voz.
— Severus... eu realmente não posso — Celine soluçou e no segundo seguinte seu soluço morreu em sua garganta.
Os lábios frios de Severus Snape encostaram nos de Celine, delicadamente e com cuidado.
Os dois ficaram de olhos fechados e as testas juntas uma à outra, sentindo apenas a respiração quente um do outro.
— Celine... — Severus parecia prestes a dizer algo, mas Celine foi mais rápida em juntar os lábios deles novamente.
As mãos trêmulas e geladas de Severus estavam de cada lado do rosto quente e vermelho de Celine, a segurando firmemente ali, enquanto a mesma segurava com força na nuca do homem, querendo se fundir ao mesmo, fazer daquele momento eterno.
Começou calmo e desengonçado, mas então os sentimentos de ambos falaram mais alto e tomaram o comando, tornando-se uma dança rápida e precisa entre lábios e língua.
Era quente, macio e molhado.
Celine agarrou os cabelos de Severus quando o sentiu passear com os dedos pelo pescoço quente da mesma, fazendo-a se arrepiar e soltar um pequeno gemido na boca quente, macia e confortável do homem que a segurava.
Nada mais parecia existir ao redor, até Severus se afastar o suficiente para olhar nos olhos semicerrados de Celine.
Ela estava ofegante e com o rosto lindamente corado, com a boca ainda aberta como se esperasse pela dele.
— Vamos sair daqui — ele disse em um tom sussurrante enquanto passeava com os dedos pelo rosto corado de Celine. — Vou te tirar daqui em segurança.
Celine piscou um bocado de vezes enquanto olhava para o rosto corado de Severus, ele parecia lindamente envergonhado.
Ela sorriu para aquilo.
— Eu não posso, Severus. Realmente não posso.
Severus franziu a testa em desespero e estava prestes a dizer algo mais, porém, um alto estrondo se fez presente, seguido de gritos altos que vinham todos do grande salão onde eles antes se encontravam.
Celine segurou o queixo de Severus, fazendo ele olhar novamente para ela.
Ele parecia assustado e desesperado.
— Vamos, Celine, não sei o que está acontecendo, mas você não pode ficar aqui!
Celine o deixou arrastá-la até um certo ponto do corredor, antes de segurá-lo pelo pulso e os fazer parar no meio da corrida.
— Vista sua máscara e saia daqui, Severus.
Ele estava prestes a voltar a dizer que precisava tirá-la dali, mas então, ele percebeu que ele realmente não sabia o que estava acontecendo, mas Celine parecia totalmente calma e indiferente.
— Nada vai acontecer comigo, eu prometo — Severus ficou parado encarando Celine, sem saber o que dizer.
Ela arrancou a máscara das mãos dele e colocou ela mesma no rosto do homem.
— Agora saque sua varinha e saia daqui.
Severus apertou a mão de Celine, como se não quisesse soltá-la, mas Celine se forçou para fora.
Ele se virou no corredor, mas antes de sair, voltou a olhar para Celine.
— Volte todo o corredor e passe pela cozinha, haverá uma porta mais ao fundo, quase imperceptível. Ela está trancada, mas acho que isso não vai ser um problema para você. Desça as escadas, eles estão lá.
Celine concordou com a cabeça.
— Você me prometeu ficar segura, Celine, por favor, não se esqueça disso — avisou e Celine concordou rapidamente com a cabeça.
Ele pareceu hesitante, mas no momento seguinte saiu pelo corredor a fora.
Celine fechou os olhos e suspirou.
Ela escutou o som de gritos e feitiços sendo lançados, havia até mesmo fumaça começando a aparecer no ar.
Ela não tardou em abrir os olhos e colocar novamente a máscara em seu rosto.
Celine saiu andando rápida e decididamente pelos corredores, voltando todo o trajeto que havia percorrido.
Quando chegou ao corredor que levava novamente ao grande salão, ela se deparou com uma enorme guerra entre Comensais da Morte e Aurores, diversos deles.
Celine tentou passar despercebida, desviando e bloqueando feitiços, correndo até o corredor do outro lado.
Quando finalmente chegou lá, ela se encontrou na cozinha, assim como Severus havia lhe dito. Ela procurou pela porta e quando chegou próxima a uma estante cheia dos mais diversos vidros de temperos, ela observou que no piso havia o que pareciam ser arranhões.
Ela segurou com força a estante e a arrastou para longe dali, apenas o suficiente para conseguir ver a porta que estava escondida ali.
Celine não perdeu seu tempo tentando rodar a maçaneta, ela logo sacou sua varinha e no segundo seguinte, a porta voava longe com um brilho forte e um grande estrondo.
Ela desceu o mais depressa possível pelo corredor escuro e com a ajuda de sua varinha que brilhava com uma luz azulada, iluminando o caminho a sua frente, Celine arrancou a máscara de sua cabeça e correu pelas escadas, não se preocupando em cair.
Quando ela finalmente pisou em chão plano, sem mais escadas, Celine iluminou o pulso e encarou o relógio que jazia ali. Ela viu que o tempo estava próximo e com um forte puxão, Celine arrancou o colar de pérolas que estava em seu pescoço enquanto ao mesmo tempo andava pelo vasto corredor e iluminava cela por cela que havia ali.
O cheiro ali era pútrido.
Haviam o que pareciam ser corpos sem vida em diversas daquelas celas.
Uns de pessoas que pareciam ter morrido a apenas algumas horas ou dias, enquanto outros, haviam apenas ossos espalhados pela cela.
Celine tentou não pensar sobre isso no momento e continuou sua busca desesperada pelas celas, quando ela finalmente reconheceu a voz no fim do longo e terrível corredor, Celine se apressou ainda mais.
Ela escutou o som de passos, muitos passos.
Ela não sabia dizer se vinham da guerra que se passava logo acima de sua cabeça ou se haviam pessoas descendo as escadas por onde ela havia acabado de passar.
— Olhe ela aí, minha Auror preferida.
Celine conseguiu sorrir mesmo em meio àquilo tudo quando ouviu a voz de Alastor Moody.
— Se afastem — ela avisou e no segundo seguinte, arremessou a grade de ferro que os prendia para longe com um feitiço, assim como havia feito com a porta minutos antes.
Ela se apressou em entrar na cela e iluminou todos ao seu redor.
Celine reconheceu Alastor apesar de sua aparência estar pior e mais debilitada que antes, ela também sabia que os outros dois que estavam ali faziam parte da Ordem, mas infelizmente não se lembrava de seus nomes.
— Segurem no colar — mandou enquanto estendia a mão com o colar de pérolas a sua frente.
Todos logo trataram de segurar em alguma parte do colar.
Celine segurava Alastor ao seu lado, já que o mesmo parecia não se aguentar por muito tempo em pé e, quando luzes e vozes se fizeram ouvidas no longo corredor de celas, Celine e os demais que seguravam o colar sumiram no ar antes que quem quer que fosse naquele corredor pudesse os encontrar.
Celine, Alastor e os outros dois homens aparecem no momento seguinte no meio de uma sala ampla, com diversos quadros e quinquilharias barulhentas.
Eles estavam em Hogwarts, mais exatamente na sala do diretor Dumbledore.
Na hora exata e minuto exato em que todos os feitiços ali postos por Dumbledore sumiram por pouquíssimo tempo, apenas o suficiente para que eles viajassem para ali com a ajuda de uma chave de portal que ativaria apenas naquele exato momento aproveitando a pequena brecha.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro