Capítulo 21 - A Vingança de Sirius: Do Passado à Morte
Bill dormia profundamente no seu quarto. Bell ainda não tinha acordado, e Doreán apenas entrava ali quando Trei estava ao seu lado, acompanhado por várias barreiras protetoras. Durante o sono, Bill sofria ataques de pânico. Às vezes, sem qualquer explicação, tentáculos negros emergiam do seu corpo, chicoteando violentamente o ar. Apenas Elliot permanecia ao seu lado, cortando qualquer tentáculo que se aproximasse demais. Talvez por isso tivessem parado de a atacar.
Bill movia a cabeça freneticamente de um lado para o outro, tremendo e suando frio, enquanto emitia sons de dor que mais pareciam grunhidos.
Elliot observava-o com atenção. Aquela cena trazia-lhe à mente as suas primeiras memórias com Doreán.
— Sinceramente... que idiota — pensou para si mesma.
A respiração de Bill começou a normalizar. Os seus músculos relaxaram. Ficou imóvel por alguns segundos antes de abrir os olhos de repente, engolindo uma golfada de ar, como se tivesse acabado de ser ressuscitado.
— Bill? — chamou Elliot, desconfiada, afastando-se um pouco com a mão no coldre da arma.
A pele de Bill tornou-se repentinamente branca. Do canto dos seus olhos até às extremidades do rosto, surgiram fissuras, como se fosse feito de vidro estilhaçado. E, como se há muito tempo esperasse aquele momento, abriu os olhos.
— Doreán? — chamou Elliot, recuando da cama.
Bill empurrou os lençóis para trás e sentou-se na cama. Antes de se levantar, olhou atentamente para as próprias mãos, fechando-as num punho. Só então ergueu o olhar para os presentes.
— Trei... — sussurrou Doreán.
Trei acenou com a cabeça e ergueu várias barreiras à volta de Bill.
Mas Bill apenas encostou as mãos à barreira e, como se ela nem estivesse ali, atravessou-a uma a uma.
— Elliot — disse, dirigindo-se a ela. — É bom voltar a ver-te, embora sob outra perspetiva.
— Tu não és o Bill que eu conheço.
— Não sou — admitiu, inclinando ligeiramente a cabeça. — Mas entristece-me ver que não reconheces um dos teus. Afinal, dizem que apenas os monstros se reconhecem uns aos outros.
— Tu!!! — Elliot disparou quatro vezes em apenas um segundo, mas Bill desapareceu antes que ela apertasse o gatilho.
— No telhado! — avisou Doreán, ao captar um som quase inaudível acima deles.
Elliot não perdeu tempo. Arrancou a arma do cinto e disparou várias vezes para o teto. Lançou-se em direção a Trei, que instintivamente formou um apoio com as mãos e atirou-a para cima. O telhado era de madeira, e os tiros haviam criado uma abertura perfeita para Elliot passar. Assim que emergiu pela passagem improvisada, caiu no telhado e apontou a arma para Bill. Ele, porém, estava distraído, observando o enorme edifício branco no meio da cidade, cercado por um muro tão alto que nenhum cidadão jamais poderia espreitar para dentro e testemunhar a vida de luxo que Golias levava.
— Sai do corpo dele! — ordenou Elliot.
Sirius ignorou-a por alguns segundos. O céu escurecia. Era quase noite... exatamente como no dia em que perdera os seus amigos. Depois de tantos anos, finalmente iria vingar-se. Assim como os seus camaradas haviam deixado o mundo sob as últimas luzes do dia, também Golias partiria quando o último raio de sol desaparecesse.
— E se não sair? O que vais fazer? Encher o corpo do teu amigo de buracos? — Sirius sorriu de lado. — Não me faças rir.
Apesar de ser Sirius quem controlava o corpo, aquele ainda era Bill.
— Sei de algumas maneiras de te arrancar daí à força — ameaçou Elliot, desta vez com uma aura estranha a pairar à sua volta.
Sirius ergueu uma sobrancelha.
— Hum... Não negaste que ele é teu amigo. Isso sim, é uma surpresa.
Mas agora não tinha tempo para provocações. Duas asas negras brotaram das costas de Bill, e, num único movimento, ele lançou-se ao céu, batendo as asas até ultrapassar as nuvens.
Havia tanto tempo que não se sentia assim... livre. Poder esticar os seus longos membros, poder ver o céu novamente, apreciar a insignificância do ser humano ao olhar a cidade lá em baixo. O mar de nuvens, banhado pelas últimas luzes do dia, trouxe-lhe à memória um velho conto do seu mestre: um lugar onde todas as almas eram acolhidas após a morte.
Sirius ainda acreditava que, um dia, poderia alcançar esse lugar... e talvez reencontrar os seus amigos.
Deixou-se cair, observando aquele céu afastar-se cada vez mais. A visão do horizonte ainda lhe provocou um sorriso antes de abrir as asas novamente, já quase junto ao chão.
Enquanto sobrevoava a cidade, sentiu a nostalgia percorrer-lhe o corpo. À medida que se aproximava da mansão de Golias, várias imagens passavam pela sua mente. Aquela sensação de paz, o bater rítmico das asas, trazia-lhe memórias que o comoviam. Lembrou-se da viagem que fizera pelo continente montado numa raia voadora.
— Saudades... — murmurou para si, antes de mergulhar na direção do seu alvo.
Aterrou junto ao portão imponente. Vários guardas, cobertos por armaduras pesadas, ergueram as alabardas contra ele, gritando para que se afastasse.
— Isto faz-me lembrar de algo... — murmurou, recordando uma cena distante.
Lembrou-se de quando ele e os seus amigos eram crianças e tentaram escalar o muro do vizinho para apanhar laranjas. Na época, aquele muro parecera-lhes enorme...
— Não haverá um segundo aviso! Afastem-se da entrada! — gritou um dos guardas, apontando a lança.
Sirius suspirou, divertindo-se com a ironia da situação.
— Como fomos de roubar laranjas... para roubar tesouros antigos de gente rica e estúpida?
Com um passo firme, avançou em direção aos guardas. Eles atacaram, baixando as alabardas, mas uma força invisível ao redor de Sirius repeliu os golpes com facilidade, atirando os soldados para trás.
— Não vou perder tempo com isto... — murmurou, ao ouvir o som das trancas do portão a fechar-se por dentro.
Era uma entrada colossal, suficientemente larga para um dirigível passar.
— Se bem me lembro... houve uma vez em que derrubámos o portão de um castelo usando anões como ariete.
E, com um sorriso, avançou para dentro.
Sirius aproximou-se do portão com um sorriso no rosto. Do outro lado, os guardas ficaram surpresos ao vê-lo derrubar a imponente estrutura com um único pontapé.
— Cheguei! — anunciou ele, atravessando o enorme buraco que agora substituía o portão, enquanto os destroços se cravavam na fachada impecável da mansão de Golias.
Enquanto os blocos de mármore desabavam da muralha, Sirius viu-se novamente imerso nas suas memórias. Lembrou-se de quando, já um pouco mais crescidos, mas ainda jovens, trancaram Majis dentro de casa como brincadeira. No entanto, ele acabou por arrombar a porta. Riram-se o dia inteiro e nunca deixaram que Majis esquecesse aquele momento. Afinal, se Gatrick não tivesse destrancado a porta no último segundo, tanto Majis como Emola teriam deixado passar ao lado o seu primeiro beijo.
Depois de tanto tempo, Sirius finalmente podia recordar essas memórias com carinho. Ria de felicidade à medida que essas imagens passavam pela sua mente — uma visão perturbadora para os guardas.
Mas ele não lhes deu atenção. Pela primeira vez em séculos, podia ouvir a sua própria voz, e não como uma gargalhada cínica ou malévola.
Os guardas precipitaram-se para cima dele, mas todos foram repelidos por uma força invisível, arremessados em direções aleatórias. Sirius continuou a avançar em direção à moradia de Golias. A construção, toda em puro mármore, era adornada com esculturas gigantescas do próprio Golias, representando um homem musculoso e de vasta cabeleira — um retrato que nada condizia com a realidade.
— "O ego faz promessas que o corpo não pode cumprir" — citou Sirius, recordando as palavras de Miltch, o mais próximo de um padre que tinham tido.
Aquelas tardes de domingo pareciam intermináveis. Todos se queixavam, alegando que jamais precisariam daquilo, mas, no fim, ninguém ficou de fora quando Miltch encontrou a capela abandonada. Nunca ninguém havia faltado a um único domingo.
Sirius arrombou a porta de entrada da mesma maneira que fizera com o portão. Sentia uma enorme satisfação ao destruir tudo o que Golias construíra ao longo dos anos em que ele próprio estivera aprisionado e esquecido. Das suas costas, emergiram vários tentáculos negros, fatiando tudo à sua volta — mobílias, paredes, teto, chão e os poucos guardas que ainda não tinham fugido.
Uma flecha perdida quase o atingiu no seu ponto cego. Felizmente, um de seus tentáculos agarrou-a antes que o ferisse.
O guarda que a disparara, à beira da morte, fazia questão de lembrá-lo da sua presença. Mas o seu estado lastimável não o permitiu sobreviver por muito tempo.
— "Não podes baixar a guarda" — repetiu para si mesmo. — "Os conselhos de uma arqueira nunca devem ser ignorados."
As palavras de Eliza ecoaram na sua mente, recordando-se da primeira missão que tiveram juntos.
— "Um bom arqueiro espera sempre a melhor chance para disparar."
Sirius sorriu.
— Pena que nem todos são como tu. Não me lembro de ninguém transformar um objeto tão sem graça numa visão tão poderosa...
Fechou os olhos por um momento e inspirou profundamente.
— Que saudades de comer com todos vocês...
Foi então que sentiu o cheiro de algo delicioso no ar.
— GOLIAS! — rugiu, derrubando a nona porta após procurar em várias salas.
— Mas que...? — balbuciou um homem atarracado, deitado numa enorme cama, cercado por várias mulheres acorrentadas aos pés do móvel gigantesco.
— Encontrei-te — murmurou Sirius, o riso nervoso e os olhos muito abertos. — Tiveste saudades?
— Quem és tu?! — perguntou Golias, confuso, enquanto uma das mulheres tentava fugir, saltando da cama. No entanto, a corrente presa ao seu calcanhar impediu-a de ir longe. Golias puxou-a de volta com brutalidade.
— Não mudaste nada — constatou Sirius, o sorriso sinistro deformando-lhe o rosto. — Continuas o mesmo gordo nojento... um lago de banha ambulante.
— Eu não sei do que falas, mas se prezas a vida destas mulheres, não vais fazer nada! — ameaçou Golias, levantando-se e agarrando a mulher que tentara fugir.
Sirius inclinou a cabeça ligeiramente, os olhos brilhando com diversão.
— Que mulheres?
Num piscar de olhos, todas haviam desaparecido. Só restavam ele e Golias naquela sala imensa.
Desesperado, Golias correu para apanhar a sua moca, mas, antes que pudesse alcançar a arma, os seus dedos foram decepados. Um dos longos tentáculos de Sirius — ou melhor, de Draven — cortara-os sem esforço e, em seguida, agarrou a moca.
— Estás em sérios sarilhos... — começou Golias, a voz embargada pela dor. — Quem toca nessa moca sem ser eu...
Antes que terminasse a frase, Sirius balançou a arma e desferiu-lhe um golpe brutal no rosto. Vários dentes de Golias voaram, e ele caiu ao chão, cuspindo sangue.
— Eu sei — respondeu Sirius com calma.
Do chão, várias mãos negras emergiram, prendendo firmemente os membros de Golias.
Sirius ergueu a moca novamente.
— Eu estava presente.
Sem hesitação, atacou repetidamente o braço esquerdo do homem. Quando teve certeza de que os ossos estavam completamente estilhaçados, continuou a golpeá-lo até arrancá-lo do corpo.
Golias gritou de dor, contorcendo-se.
— Não sabes com o que te estás a meter! — rugiu ele, a voz carregada de pânico. — Não me consegues matar!
Sirius riu baixinho.
— Eu sei...
Aproximou-se, segurando-o pelos cabelos, forçando-o a olhar diretamente para ele.
— Mas tu devias mesmo ter-me matado naquela noite... há quatrocentos anos atrás.
Golias arregalou os olhos, o medo finalmente dominando-o.
— Impossível... tu devias estar morto...
— Ah... então lembras-te de mim? Que surpresa agradável... — Sirius abriu ainda mais o sorriso, antes de desferir mais um golpe no coto sangrento do braço amputado. — Isso vai facilitar as coisas.
— Espera! Eu tenho dinheiro! Mulheres! Pede o que quiseres, eu arranjo! Eu... eu posso trazer os teus amigos de volta à vida!
Sirius congelou por um instante. Depois, os seus olhos se encheram de um ódio puro.
Com um único movimento, esmagou o pé esquerdo de Golias com a moca, enterrando-lhe as unhas na carne.
— Não manches a memória deles com essa tua boca imunda, seu monstro doentio - disse cuspindo na cada de Golias.
Agarrou Golias pelos cabelos e puxou sua cabeça para trás.
— "Aqueles que merecem o descanso eterno não devem ser perturbados."
— Então vá lá, mata-me, tortura-me, faz o que quiseres, eu já os comi e nunca mais os irás ver! — Riu-se Golias antes de se calar, pois Sirius sorria para ele.
— Não, não, não — repetiu rapidamente, como se tentasse confortar uma criança perdida. — Eu não vim aqui para te matar. Pelo contrário, vim conceder-te algo — disse com o seu ar mais sinistro.
Sirius segurou a cabeça de Golias.
— Diz "AAA" — brincou Sirius antes de lhe colocar a mão na boca e arrancar-lhe a língua.
O familiar de Golias, normalmente uma criatura repugnante, foi conjurado desta vez por um portal comum. Tinha o corpo de uma pessoa espetada na cauda do familiar, como um fantoche. Como poderia um ser tão monstruoso ter um dono e familiar tão parecidos? Sem qualquer problema, os tentáculos de Sirius prenderam-no, amassando-o e fazendo o seu esqueleto ranger.
— Então já sabes como todas as mulheres que estão contigo se sentem, seu porco. Espero que aguentes, porque estamos a chegar à melhor parte.
Sirius levantou a moca acima das suas cabeças e, com a ajuda dos tentáculos, partiu-a, desfazendo a maldição que a arma carregava.
— Tu amaldiçoaste-me por séculos, agora chegou a minha vez de te dar essa dádiva.
Sirius virou as costas a Golias e proferiu um encantamento numa voz rouca e abafada. Não demorou muito até que uma enorme porta preta se erguesse do chão, com uma melancolia tão intensa que dava para sentir a tristeza de todas as almas que já haviam passado por ela.
— Sabes, eu pensei muito no dia em que recuperaria toda a minha força, e consequentemente, no que faria quando te encontrasse.
Golias não estava a prestar atenção a Sirius, estava mais preocupado com a quantidade de sangue que saía da sua boca.
— Isso está a incomodar-te? Deixa que eu trato disso. — Com um estalar de dedos, a língua de Golias voltou ao seu devido lugar.
— O que estás a dizer?
— Assim que passares por aquela porta, obterás a imortalidade — disse Sirius, voltando-se para ele com um sorriso maléfico.
— Não percebo, por quê?
A porta por detrás de Sirius abriu-se, revelando um vórtice negro de onde vinham vários gritos atormentadores.
— Então, de que forma é que gostarias de ser comido pela eternidade? — disse Sirius amigavelmente, enquanto várias minhocas pretas com pequenos dentes saíam do portal.
— Não, por favor, não! Eu imploro-te! — suplicou Golias, enquanto as criaturas começaram a mover-se na sua direção.
— Não te preocupes, elas vão devorar a tua carne bem devagar. Algumas mais devagar que outras. Vais sentir a sensação de teres a tua carne arrancada dos ossos, cada segundo da tua recém-imortalidade. A tua carne voltará a crescer e os teus ossos a reconstruírem-se, para que tudo aconteça de novo, e de novo, e de novo, e de novo, E DENOVO!!!!
— Por favor, não podes fazer isto! — suplicou Golias.
— Ah, e para não perder a graça, de tempos em tempos a tua memória será apagada, para que voltes a sentir tudo como se fosse a primeira vez.
— Não te permito, não tens o direito de fazer isso.
— E tu não tinhas o direito de matar toda aquela gente. Achavas mesmo que, quatrocentos anos depois, seria o suficiente para escapares de mim? Nem que eu ficasse um milénio nas sombras, eu iria me esquecer do que fizeste.
— Não, não podes — argumentou Golias, em pânico.
— Passaste a vida a comer tudo e todos, agora chegou a tua vez de ser comido, de fora para dentro e de dentro para fora — hehehehehehehe...
Golias tentou levantar-se e correr, mas os tentáculos já o haviam apanhado. Estava a ser arrastado lentamente para o vórtice. Numa tentativa fútil de tentar sobreviver, amarrou-se aos pés de Sirius, que, com o maior prazer, livrou-se da mão dele e ficou a ouvi-lo gritar antes de fechar o portal, fazendo-o desaparecer.
— Luxúria e Gula, aproveita os teus pecados, pois dentro desse mundo vais sofrer muito mais do que eu disse. Vais sentir coisas que não devem ser mencionadas em nenhuma história ou mito.
— Já terminaste? — perguntou a voz de Bill na sua mente.
— Ainda falta fazer uma coisa, se não te importas — suplicou Sirius, caminhando para fora do antigo palácio de Golias.
— "Terras movidas a ódio não são abençoadas por quem carrega o sol, e as suas águas serão sempre mortais para a terra. As flores não desejam crescer em terras assim, e nem o ser humano pode crescer num meio parecido." — Recapitulou para si uma das passagens de Grids assim que saiu daquele sítio.
— É uma frase muito bonita — opinou Bill.
— Também acho, pena que eu nunca tive intenções de segui-la.
Grids tinha dito aquela frase pela primeira vez quando tanto Gatrick como Eliza se tinham chateado após beberem algumas canecas. Mesmo bêbado, ele sabia sempre o que dizer.
Sirius já se tinha afastado um pouco do muro, quando olhou para trás, levantou ambas as mãos e fez com que as suas mãos voadoras aparecessem. Recitando uma fórmula, a terra por baixo da mansão começou a mover-se. Todas as suas mãos rodearam a mansão e, à medida que Sirius se concentrava mais, a mansão de Golias foi projetada no ar, até ser arrancada da terra.
— "Ferreiros passam a vida inteira a moldar coisas, a criar armas ou utensílios, e nenhum deles deve ser esquecido." — disse, à medida que as peças de mármore se desfaziam e se encaixavam umas nas outras. — Era o que o Hargos passava a vida a dizer.
Bill estava maravilhado. Quanto mais Sirius gesticulava com as mãos, mais os blocos se moviam, até formarem uma enorme estátua com todos os seus antigos companheiros e os seus familiares esculpidos.
— Nesta cidade serão lembrados os corajosos que perderam a vida para libertar esta cidade de Golias — disse, embutindo os nomes de cada um dos seus amigos nas suas respectivas estátuas, numa placa de ouro, para que nunca ninguém se esquecesse deles.
-Não achas que falta alguém? – perguntou Bill, olhando ao redor, notando a ausência de Sirius.
Sirius permaneceu em silêncio por um momento, os olhos fixos no vazio. Um suspiro profundo escapou-lhe.
- Não, este momento é deles, Bill. E só deles. Eu... eu não sou mais do que uma sombra do que fui. Uma memória esquecida, perdida em rancor, ressentimento e ódio. Esse sou eu agora. Não quero que as pessoas se lembrem de mim como o monstro que sou hoje.
Bill olhou para ele, perplexo. Nunca o vira assim. A frieza de Sirius parecia ter se esfumado, deixando à vista algo mais profundo, uma dor latente, uma luta interna.
- Que altruísta da tua parte – disse Bill, surpreso, a voz tremendo um pouco. – Isso... isso não é algo característico de quem tem sentimentos?
Sirius olhou Bill diretamente nos olhos, a tensão no ar. Em seus olhos havia uma mistura de tristeza e arrependimento, mas também algo mais... algo que Bill não conseguia decifrar.
- Meu amo... – murmurou Sirius, a voz rouca, mais suave do que Bill jamais ouvira. – Nunca disse que não tinha sentimentos... Eu apenas... perdi o meu coração.
Nesse momento, lágrimas começaram a escorrer pela face de Bill, um pequeno gesto que ele não pode evitar. O impacto daquelas palavras... havia algo na dor de Sirius que parecia se refletir nele também, como se a perda que o outro sentia fosse, de alguma forma, compartilhada.
Bill tentou esconder a emoção, mas era inútil. Ele sabia que Sirius estava se condenando a uma solidão eterna, marcada por um fardo que ele mesmo se impôs.
-O seu corpo... – disse Sirius, de repente mais aflito. Ele se afastou de Bill e, com um gesto quase mecânico, fez o corpo de Bill retornar ao normal, como se nada tivesse acontecido.
-Então... além do poder de um familiar, agora tens o poder de quando eras humano também, é isso? – Bill perguntou, com um tom de incredulidade, quando Sirius se materializou à sua frente, mais uma vez.
Sirius olhou para ele, e, por um instante, parecia indeciso. Seu olhar ficou distante, como se buscasse as palavras certas, mas não as encontrasse.
-Sim... de uma forma simples, foi isso que aconteceu. Não é algo que eu goste de lembrar, mas é... a minha realidade agora.
Bill assentiu lentamente, a expressão em seu rosto refletindo compreensão, mas também uma grande preocupação. Ele sabia que Sirius não estava falando de qualquer poder. Havia algo mais por trás das palavras dele, algo mais pesado.
-Olha, o familiar de Golias também desapareceu... Isso é mau sinal? – Bill perguntou, tentando quebrar a tensão que pairava no ar. Ele não sabia o que esperar da situação, mas sentiu que algo ainda estava por acontecer.
-Deve ter desaparecido depois de eu exilar Golias. Não é nada preocupante. – Sirius disse, de forma mais firme agora. Ele abriu um portal negro, a escuridão diante deles quase palpável. – Este portal leva-nos de volta para a estalagem. Se não te importas, vou descansar um pouco. Preciso disso. – disse ele, com um leve sorriso no rosto, mas havia algo inexpressivo no gesto, como se não houvesse mais energia para qualquer outra coisa.
Bill olhou para ele por um momento, notando a exaustão que transparecia nas palavras e no comportamento de Sirius. O que havia acontecido com ele? Aquele homem que uma vez fora tão imponente agora parecia perdido, arrastando consigo um peso que nenhum ser humano deveria carregar.
Bill suspirou e, sem palavras, atravessou o portal. A viagem foi silenciosa, e ao chegar do outro lado, ele sentiu uma estranha sensação de que não só o cenário estava mudado, mas também ele. Algo em sua relação com Sirius havia se transformado. Aquela sensação de desconfiança desapareceu ao ver a história de Sirius de um ponto tão proximo.
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