Capítulo 19 - Lágrimas de um Herói
Só para avisar este capitulo tem cenas um pouco pesadas.....bastante pesadas e recomendo a que pessoas que tem gatilhos de leves a moderados não leiam.
— Hora de acordar — sussurrou uma voz dentro da cabeça de Bill.
Bill abriu os olhos, estava novamente a sonhar, mais propriamente a cair lentamente no vazio negro que era o seu sonho. Mas desta vez com Sirius a fazer-lhe companhia, acenando-lhe um pouco mais acima com uma das suas mãos de esqueleto.
— Será que só por uma vez não me podem deixar dormir tranquilo? — Resmungou Bill.
— Lamento, mas infelizmente temos muito trabalho a fazer, meu amo.
— Estou cansado.
— Estamos dentro do seu sonho. Não é possível ficar cansado aqui — contrapôs Sirius, mudando repetidamente de espaço, para uma colina muito alta com duas cadeiras brancas e uma mesa de centro, sob a sombra de uma bela árvore, e mais abaixo estendia-se a linda vista de uma cidade, carregada de vida e cores. Bill, que antes estava a flutuar tranquilamente, caiu no chão após a mudança de espaço.
Uma força invisível levantou-o do chão coberto de erva rasteira e moveu-o até uma das cadeiras, convidando-o a sentar-se. Sirius puxou uma cadeira para si, sem ao menos lhe tocar, e também ele se sentou a apreciar a bela vista que tinham à sua frente.
— Algo para beber? — Perguntou, quando uma das suas mãos desceu do céu com um bule de chá e duas chávenas numa bandeja que pousou em cima da mesa.
— Não sou grande apreciador de chá — disse, afastando a chávena que lhe foi estendida.
Sirius suspirou, olhou mais uma vez para a cidade e levou uma das chávenas aos lábios.
— Que sítio é este? — Perguntou Bill, interrompendo o silêncio entre ambos.
— Ellanor — Respondeu.
— Que cidade sossegada, onde fica?
— E eu a pensar que estarias cheio de perguntas, e deparo-me contigo a perguntar que lugar é este — Sirius deu um leve sorriso. — Mas antes de te responder, gostaria de te fazer uma pergunta.
— Força — Permitiu Bill, inclinando-se na cadeira e pondo os pés em cima da mesa.
— Achas mesmo que todos os familiares vêm de uma dimensão separada? — Questionou antes de pousar a chávena de chá na bandeja.
— Eu ainda sou um novato no que toca a familiares, portanto sim, quer dizer, suponho que sim.
— Em parte é verdade, mas e se eu te disser que nós já fomos humanos?
— Todos?! — Bill tirou os pés de cima da mesa e inclinou-se para Sirius.
— Não, nem todos, apenas alguns têm essa sorte. É verdade que a maioria vem de outra dimensão, mas há sempre exceções. Normalmente, mitos são criados à volta de alguns familiares.
— "Mitos?"
— A história do Crainer, por exemplo, é realmente a história da sua vida.
— Já me é difícil compreender as coisas simples sobre os familiares, agora explica-me como é possível humanos virarem familiares.
— Não é possível... Em algum momento das nossas vidas morremos e, seja qual for o motivo, fomos capazes de reencarnar como um familiar.
— Então humanos morrem e viram familiares? Isso é bastante estranho.
— Como eu já disse, nem todos têm essa sorte. Eu tenho mais de mil e quatrocentos anos, e além do Crainer, da Stella e do Runar, nunca soube de outro caso igual. Embora, nos meus últimos anos, tivesse a vida por um fio.
— Então esta é a tua cidade natal?
— Sim, a minha casa — confirmou tristemente.
— O que é feita dela agora?
— Ruínas... — O espaço voltou a mudar com um estalar de dedos e os céus ficaram cobertos de nuvens negras.
A chuva começou a cair de repente. A árvore que cobria a mesa perdeu a sua beleza; agora estava seca e morta. A relva rasteira estava coberta de ervas daninhas e a cidade abaixo estava completamente destruída. Pouco dela sobrava, tinha mais ar de ser um cemitério do que uma cidade, com casas enterradas na lama, cobertas de musgo e plantas selvagens. Nem uma flor enfeitava aquele campo de morte.
Bill foi subitamente transportado até ao meio da cidade. Sirius estava ao seu lado, caminhando um junto ao outro, visitando as ruínas da cidade que antes fora tão viva, e agora abatida por uma atmosfera deprimente.
— O que aconteceu aqui?
— O que já aconteceu em muitos sítios com o passar dos séculos — voltou a estalar os dedos. A cidade ainda estava intacta, mas os gritos denunciavam que algo de terrível estava prestes a acontecer.
Soldados com armaduras completas e bastante pesadas entravam nas casas, arrastando as pessoas para fora das suas moradias, partiam as janelas atirando o que podiam do seu interior para a rua — carroças, bancas, lojas. Pilhavam e destruíam tudo à sua passagem. Empunhavam enormes machados nas suas mãos, desmembrando quem se atrevia a levantar um dedo contra eles. E mesmo que fossem submissos, não escapavam da morte. Homens, mulheres, crianças, idosos e até animais, todos foram destruídos numa enorme sede sanguinária.
Bill assistia a aquele filme completamente em branco. Não era possível que estivessem homens debaixo das armaduras, só monstros teriam a crueldade de realizar tal chacina. Um miúdo muito jovem fugia desesperado de um dos soldados, quando tropeçou e caiu de barriga para baixo. Bill lançou-se à frente, substituindo o seu braço pela manopla.
O machado desceu sobre o menino, e Bill interveio como escudo, pronto para aparar o golpe. O machado atravessou-o como se fosse um fantasma, e uma mancha de sangue estendeu-se pelo chão. Era como se ele nem estivesse presente, como se fosse invisível a todos à sua volta.
— Isto é apenas uma memória, não podemos intervir em algo que já aconteceu — esclareceu Sirius, passando por cima do corpo fatiado com indiferença. — Só podemos observar.
— E não te incomoda nem um pouco?! — retrucou Bill, enervado com a falta de emoção na voz de Sirius.
— Agora? Nem um pouco — respondeu Sirius com o mesmo tom de indiferença.
— Por acaso perdeste o coração quando reencarnaste?
— Sim — Sirius exemplificou, abrindo um buraco no seu peito, mostrando que não havia nada no lugar do coração.
Bill não podia dizer que não estava chocado, mas também não se manteve indiferente. A frieza e a indiferença na voz de Sirius deixavam claro que ele não era alguém muito emotivo, mas Bill não podia adivinhar que isso se estendia ao ponto de Sirius não ter um coração.
— Neste dia, o meu coração foi-me arrancado — explicou Sirius.
— Metaforicamente ou literalmente?
— Das duas formas — confessou Sirius, enquanto um dos soldados era derrubado.
Um homem de óculos, coberto de feridas e rasgões vermelhos na roupa, na casa dos quarenta e poucos, empunhava uma alabarda ensanguentada. Dois soldados dirigiram-se para ele, mas, apesar de ferido, o homem desviou-se facilmente dos ataques pensados dos dois guardas. Enterrou a alabarda na viseira de um deles e, enquanto o outro levantava o seu pesado machado para voltar a atacar, o homem conjurou uma magia de fogo perto da viseira, queimando tudo o que estava dentro do elmo.
— Eras tu?
— Não... — respondeu tristemente Sirius. — Um dos meus melhores amigos, Gatrick Moyul, não hesitou por um segundo quando a nossa cidade foi atacada.
— E aqueles? — Bill perguntou, apontando para outros quatro homens e duas mulheres que lutavam bravamente contra os soldados inimigos.
— Majis Mafil, Hartos Grinds, Eliza Fytous, Grids Fers, Miltch Koal e Emola Baletrs. Os meus irmãos e irmãs de armas.
— O que lhes aconteceu? — perguntou Bill, inquieto.
— Aquilo — respondeu Sirius, apontando para um grande monstro que se aproximava.
O monstro, de homem não tinha nada, mas de gigante tinha muito. Com uma enorme marreta de ferro e uma armadura que seria impossível a um humano transportar, era este o monstro que aquele grupo enfraquecido teria de enfrentar.
— Um humano que trocou a sua humanidade por poder, amaldiçoado com a gula dos gigantes. Golias Artchil — apresentou Gatrick.
— Seu monstro! — gritou uma das mulheres, que com duas espadas investiu contra o gigante.
— Emola, não!!! — gritou Gatrick antes de correr atrás dela.
Os guardas não se moveram assim que Emola lançou-se para o ataque. Golias sorriu e levantou a mão, ordenando que nenhum deles se movesse. Ela era rápida e atacava de todos os ângulos, em busca de uma fraqueza na fortaleza andante, mas a armadura resistia muito bem aos seus ataques graças ao feitiço aplicado nela. Nem quando Gatrick se juntou à batalha conseguiram superar a defesa da armadura.
Golias desferiu um poderoso soco ao chão. Gatrick escapou por pouco, antes de se aperceber que estava na mira da marreta de Golias. Se não fosse por outro homem ter lançado uma esfera negra, desviando a marreta da sua tragédia, Gatrick teria sido esmagado.
— Obrigado, Sirius — agradeceu Gatrick.
— Aprende a ser mais cauteloso, seu idiota.
— A quem é que pensas que estás a chamar de idiota, seu rato de biblioteca? — retrucou Gatrick, esquivando-se a um dos golpes de Golias.
— Olha quem fala, seu tarado desmiolado que só sabe ser rejeitado por toda e qualquer mulher — insultou Sirius de volta.
— Eu não sou rejeitado, só não encontrei a mulher certa, e é melhor do que namorar com um monte de papel — respondeu Gatrick, enervado.
— Se já acabaram de namorar, vamos acabar com ele — rugiu Hartos, empunhando um martelo. — Estou com fome! — gritou quando se juntou à batalha.
— Os anões têm um temperamento terrível — comentou Eliza, já habituada ao comportamento do amigo, disparando três flechas ao mesmo tempo, atingindo o pescoço de Golias, protegido por uma leve renda de ferro, mas muito resistente.
Golias defendia-se dos ataques de Emola com a marreta, enquanto tentava agarrar o ferreiro com a mão livre. Emola interveio, arremessando duas facas diretas à cara de Golias, que, instintivamente, levou uma das mãos à cara para se proteger. Hartos não se conteve na hora do golpe, e desferiu uma marretada que fez o elmo de Golias estremecer. Irritado, Golias lançou um murro às cegas, e por um golpe de sorte acertou em Hartos, que foi lançado vários metros no ar.
Grids chamou o seu familiar, um homem planta que amparou a queda de Hartos, e logo depois, Miltch chamou o seu, uma espécie de lamparina com dois olhos de jade, que, com uma luz amarela, começou a curar Hartos.
— Matem-nos! — ordenou Golias aos guardas, que, de volta ao combate, concentravam as suas forças em Majis, que destruía os machados dos inimigos com os próprios punhos, assim como o seu familiar, uma espécie de homem de pedra com uma fita vermelha na cabeça e dois rubis a fazer de olhos.
— Parece que as forças estão bastante equilibradas — comentou Bill, observando o campo de batalha.
— Também fomos ingênuos até esse ponto... — Sirius, Emola e Gatrick atacaram simultaneamente. — Mas esquecemo-nos de quem estávamos a enfrentar. O problema é que não importa qual tática ou poder utilizamos contra eles... — Os ataques dos três colidiram contra a moca de Golias, que parecia começar a ceder. — ...o problema é que, quanto mais fortes se tornam, mais sujo é o trunfo que eles têm guardado.
Golias soltou um grito selvagem, e todos os que o ouviram, inclusive os próprios soldados, levaram as mãos aos ouvidos. Aproveitando a brecha no ataque do trio, ele ergueu a moca e, com um movimento brutal, arremessou os três para longe — exceto Emola, que se agarrou à perna dele, de cabeça para baixo.
Sirius lançou uma magia protetora antes mesmo do impacto, o que o poupou de alguns ossos quebrados, mas não de todos.
De repente, foram surpreendidos por um ataque mágico embutido no grito de Golias. Gatrick, firme com sua alabarda, levantou-se com dificuldade, apenas a tempo de perceber o olhar malicioso de Golias.
Com força descomunal, Golias apertou a perna de Emola até ouvir o som horrível dos ossos se partindo, seguido do grito dela. Ele sorriu, saboreando o sofrimento. Com um movimento rápido, soltou a moca e usou a mesma mão para agarrar a outra perna dela. Em um puxão feroz, arrancou-a. O grito de Emola fez a raiva explodir dentro de Majis, que, sozinho, derrubava todos os soldados ao seu redor com socos brutais, sem se importar com os ossos quebrados, com as feridas abertas, ou até com a morte iminente.
Um dos soldados atacou com um machado, mas Majis parou o golpe com as mãos, arrancando a arma e cravando-a na cabeça do guarda. Em seguida, lançou o machado contra Golias. Este, no entanto, não se incomodou em se defender; seu elmo resistiu facilmente à pancada. Golias avançou com os punhos cerrados, mas Majis foi atingido por um soco devastador. Para impedir qualquer interrupção, Golias pousou um pé pesado sobre ele, imobilizando-o, mas sem matá-lo, pois queria que ele visse o que aconteceria a seguir.
Golias arrancou a armadura de Emola com uma mão, deixando seu corpo nu à vista de todos. Ainda consciente, ela tentou se mover, mas ele passou a língua áspera e úmida pelo corpo dela, como uma cobra que se prepara para esmagar a presa. Ele levantou-a acima da cabeça e abriu a boca, deformando-a, até que se tornou uma enorme mandíbula capaz de engolir metade do corpo dela de uma vez.
— Bom apetite — Golias sorriu, antes de a engolir, começando a mastigar. Os gritos de Emola duraram um segundo, mas na mente de Majis, eles se prolongaram por toda a eternidade.
Majis ficou horrorizado quando a cabeça de Emola caiu da sua boca ainda petrificada pelo terror, olhando bem nos seus olhos Majis ainda conseguia ver o rosto de Emola a tremer devido aos espasmos musculares.
— É como comer camarões — Golias riu, com a boca cheia. — Arranca a cabeça e come o resto. Mas qual o problema de comer tudo? — Ele pegou a cabeça de Emola e a atirou para a boca, engolindo-a deliciado.
Enquanto Golias mastigava, pedaços de carne caíam sobre Majis, junto com gotas de sangue. Ele morreu por dentro ao ver o gigante devorar os restos mortais de Emola. Quando Golias colocou o resto do corpo na boca e esmagou as costelas de Majis, certificando-se de que ele estava imobilizado, os outros ficaram em choque, mas logo se recuperaram, determinados a não perder mais ninguém.
A sede de vingança de Gatrick refletia-se no brilho avermelhado da lâmina de sua alabarda, empalando os soldados que ousavam bloquear seu caminho. Eliza cobria os flancos, disparando flechas precisas e mortais. Hargos estava pronto para voltar à luta, ainda mais após a perda de uma camarada. O familiar de Grids cobria os inimigos com enormes trepadeiras, enquanto Hargos esmagava um soldado atrás do outro, abrindo um caminho através deles. Grids criava plantas gigantescas, levantando-as e esmagando os soldados. A energia de Miltch restaurava o poder de Grids assim que ele gastava suas forças.
Uma planta maior e mais espinhosa do que as outras surgiu do solo, lançando-se contra Golias. Ela chegou a escassos centímetros do gigante, antes de começar a se contorcer. Golias retirou uma proteção da mão, revelando uma lágrima de fogo, inserida em um anel sob sua armadura. Ele a colocou novamente, mas Hargos sabia o que fazer. Apenas mais alguns golpes e estaria perto o suficiente para atacar Golias.
O martelo de Hargos brilhou quando ele o cravou no chão. Estacas de pedra surgiram ao seu redor, perfurando todos os soldados que o impediam de chegar a Golias.
— Vem a mim, aquele que molda o aço e a vida — Hargos clamou aos céus.
Um enorme ser emergiu do chão, o familiar de Hargos. Ele era colossal, e o esforço de controlá-lo custava-lhe muito, mas a força que ele trazia era imensurável. O martelo de guerra do familiar fez o chão e os céus tremerem a cada golpe. Ele era maior que Golias, provavelmente mais forte, mas o combate ainda estava longe de terminar. Eliza disparou duas flechas congelantes, impedindo Golias de tentar escapar, e ainda atirou nas suas pernas para imobilizá-lo.
Sirius se levantou, seu corpo marcado pelo impacto da moca de Golias. Ele não poderia ficar parado enquanto seus amigos lutavam.
— Mestersmed, molda o aço e acaba com Golias — ordenou.
Hargos foi surpreendido por um dos soldados, que, mesmo gravemente ferido, conseguiu atacá-lo uma última vez antes de cair morto. O machado enterrou-se na clavícula de Hargos, causando-lhe dor, mas não o fazendo desistir. O choque entre a moca de Golias e o martelo de guerra de Mestersmed fez o gigante tremer. A onda de choque afastou Gatrick, mas não o suficiente para derrotá-lo.
Hargos, perdendo sangue rapidamente, não resistiu. Ele sussurrou uma última lamentação antes de deixar os companheiros.
Golias riu vitorioso, mas então percebeu que algo em sua armadura havia se partido. As plantas de Grids empurraram-no para frente, tirando-o de cima de Majis, que cuspia sangue pela boca.
Gatrick correu até seu amigo. Ele ainda estava vivo, mas por pouco tempo. Amarrou-lhe a mão e implorou para Miltch ajudá-lo. Miltch correu para eles, com várias poções de cura em mãos. Majis agarrou o colarinho de Gatrick, puxando-o com a pouca força que lhe restava.
— E... Emola... — Majis disse, entre soluços sangrentos, antes de deixar seu corpo pender.
— Sim... ela está à tua espera — Gatrick chorou.
— Apanha! — Gritou Miltch, atirando um frasco com líquido azul em direção a Majis, sem perceber que a moca de Golias voava em sua direção.
- Nem penses, não vou deixar! - Gritou Sirius, teleportando-se até à moca e, com as mãos cobertas de sombras, amarrou o cabo e parou-a em pleno ar.
- Atirou-a para os céus onde Eliza aguardava com o seu familiar, um espírito arqueiro. Juntas, lançaram um ataque combinado. O seu familiar lançou uma flecha carregada de energia mágica do trovão, enquanto ele executava um feitiço diferente, uma flecha de vento que se despedaçou no meio da trajetória, multiplicando-se em muitas outras flechas que envolveram o ataque do seu familiar. A moca partiu-se em duas partes e Golias ficou desarmado.
- E agora que estás desarmado, chegou a hora de acabar contigo - Ameaçou Sirius, com duas garras sombrias a substituir os seus braços.
-Não pensaste que seria assim tão fácil, pois não? - Interrompeu, após o cabo se despenhar a alguns metros de Golias.
O cabo voou magicamente para a sua mão e Golias sorriu para Sirius.
-Eliza, desvia... - Tentou avisar, mas não conseguiu.
Era tarde demais. Quando virou a cabeça, o resto da moca de Golias já se dirigia a grande velocidade em direção ao pedaço do cabo que Golias tinha nas mãos, levantando à frente Eliza, que se dividiu em duas quando o resto da arma se uniu ao cabo.
-Surpresa! - Disse Golias, sorrindo, antes de murchar as plantas de Grids com uma alma deprimente.
-Não pode ser, essa habilidade é da Emola! - Disse Gatrick, novamente surpreso com o método sujo com que Golias batalhava.
Uma habilidade exclusiva de assassinos - Disse, passando a língua pelos dentes. - Quanto mais raras as habilidades, mais deliciosa se torna a carne.
Gatrick bebeu a poção de Miltch, e o efeito foi instantâneo. As feridas fecharam-se e ele recuperou toda a sua magia.
Matar é uma coisa asquerosa - Sussurrou para si próprio. - Comer a carne de pessoas é algo completamente horroroso e desumano - Elevou o tom da voz - Mas aproveitaste-te das habilidades dos outros, as habilidades que levaram anos de esforço para serem alcançadas, apenas comendo a carne da pessoa. Não existem palavras que possam descrever um ato tão... tão... tão... -Uma figura surgiu por trás de Gatrick, um centauro de metal dourado com detalhes vermelhos por toda a armadura cintilante - .... tão... DEMONÍACO!!!
- E qual é o problema?
-Igazi, empunha a tua lança e vinga os nossos companheiros. Que a tua lança destrua qualquer escudo e perfure todas as armaduras, desde que arranques o coração dos meus inimigos - Ordenou, e fielmente, o seu familiar cavalgou com a enorme e imponente lança contra Golias.
A lança envolveu-se em chamas, fruto da ira de Gatrick pela perda dos amigos.Golias não mostrou outra reação senão um sorriso. Abriu a sua enorme boca, que voltou a deformar-se como quando engoliu Emola, e vomitou algo no chão. Coberta de uma gosma vermelha, ela voltou a aparecer, com o mesmo sorriso doce de todas as manhãs. O familiar parou de se mover, com a lâmina muito perto dos olhos de Golias.
- Impossível! - Gritou Grids. - É uma ilusão! - Avisou.
Por baixo dos pés de Gatrick surgiu uma nova criatura, toda deformada, com a pele negra como se tivesse sido queimada. As costelas estavam todas viradas para fora, trespassando a carne apodrecida, e no lugar da cabeça, uma enorme boca. Da terra surgiu o resto do corpo daquilo que só podia ser o familiar de Golias, uma enorme coluna humana que encaixava no corpo de Emola e a usava como fantoche.
Miltch pensou rápido e, antes que o familiar de Golias cravasse os dentes em Gatrick, conjurou um último feitiço.
- Mártir - Anunciou, quando os dentes da criatura se cravaram em Gatrick.
-Mas que...? - Interrogou-se, após não ter sentido dor alguma. - Eu não sabia que tinhas essa habilidade, Miltch, porque não a usaste mais cedo nos outros? - Exclamou, confuso.
A sua primeira ideia era que tinha ficado invulnerável, mas reparou que Miltch sofreu os ferimentos por ele, de modo que tinha a garganta arrancada quando caiu ao chão.
Como um abutre esfomeado, o familiar de Golias sentiu o cheiro a sangue e atirou-se rapidamente ao cadáver. Logo depois, Golias voltou a engolir Emola, sugando o familiar como se fosse um fio de massa e devorando Miltch logo a seguir.
Sirius lançou um enorme projétil sombrio de cinco pontas afiadas contra Golias, mas o seu ataque foi repelido pela sua moca. Engoliu o padre mesmo antes de ser perfurado pela lança de Igazi, que o atravessou de ponta a ponta, quando Gatrick caiu em si próprio. O familiar desapareceu após o ataque e Golias fez uso das suas novas habilidades para se recuperar dos danos.
-As habilidades de um padre realmente dão jeito - Disse, esfregando a barriga já sem armadura. - Realmente foi a melhor decisão vir a esta cidade, tantos sabores deliciosos - E esticou as mãos na direção dos restos mortais de Eliza. - Mesmo desfeita, ainda dá para apreciar o que restou - disse apanhando os restos mortais de Eliza do chão.
Tal como a sua lança, também o corpo de Gatrick ficou envolto numa aura vermelha. Do seu corpo surgiram chamas.
-Grids, prende-o! - Ordenou.
- Mas é a habilidade da Emola! - Contestou, preocupado.
-Eu trato disso - Acentuou Sirius. - A habilidade dela não afeta as minhas sombras.
Sem perder tempo, uma correnteza de plantas surgiu por baixo de Golias, que depois foram engolidas pelas sombras de Draven.
- Quero ver-te a escapar desta, vem a mim Deus do Fogo, usa a minha vida para queimar o meu inimigo - O céu ficou obscurecido e algo começou a descer dele. - Usa-me como combustível para as tuas chamas e queima este monstro até não restarem nem cinzas!
Uma luz vermelha desceu do céu e infiltrou-se no corpo de Gatrick.
-RESPONDE AO MEU CHAMADO, INDRA!!!!
- Isso até poderia acabar comigo, se o teu amigo não tivesse tocado na minha moca - anotou Golias com um sorriso vitorioso.
Sirius sentiu a pior dor que alguma vez imaginara na palma das suas mãos. O seu feitiço perdeu rapidamente o efeito e Golias fez uso da habilidade da assassina para se libertar das plantas de Grids, mas não antes de comer uma das plantas.
Gatrick ergueu as mãos para o céu e, atendendo ao seu pedido, Indra fez descer sobre ele um sol do tamanho de uma casa. Ao pousar nas suas mãos, Gatrick apontou o sol para Golias e uma explosão imensa erradicou Golias, juntamente com tudo o que estava atrás dele. Um quarto da cidade desapareceu; a única coisa que ficou foi a moca de Golias.
Gatrick estava em brasas, não no bom sentido. O seu corpo ficou completamente carbonizado por dentro e por fora. Uma das pernas partiu-se assim como um pedaço de lenha, depois de arder por muito tempo, e caiu sobre o corpo de Majis, que não tinha sido evaporado, ao contrário do de Hargos.
— Gatrick!! — Gritou Sirius, ainda a sofrer com a dor nas mãos.
Grids correu para a beira deles e analisou as mãos de Draven, que o empurrou violentamente com o corpo.
— Vai ver como está o Gatrick, rápido! — Gritou-lhe.
— Sabes tão bem como eu que não há maneira de trazer os mortos de volta à vida.
— Não sabes se ele está morto! — Gritou, desesperado, sem acreditar nas suas próprias palavras.
— Acorda para a vida, Sirius. Achas que um poder tão grande não tem consequências? Ele pediu o poder a uma divindade? — Salientou.
— Estão todos mortos... e eu não fiz nada! — Arrependeu-se, com as lágrimas a cair-lhe sobre as mãos.
— E até parece que eu fiz muito. Quem achas que vai ser lembrado: aqueles que deram a vida a combater, ou aqueles que estão vivos por mera sorte?
— Acho que todos vão ser esquecidos, eventualmente.
— Aposto que o Gatrick está, neste momento, a fazer pouco da tua cara — Comentou Grids, a olhar para o céu.
— Isso seria mesmo coisa dele — Concordou Sirius, com as lágrimas a escorrer.
— Ele sempre disse que, quando fosse para morrer, que fosse em grande. Se vaporizar a parte velha da cidade não é em grande, então não sei o que pode ser.
— AHHH! — Gritou Sirius ao sentir uma nova vaga de dor.
— O que se passa? — Perguntou Grids, preocupado, quando se agachou para ver como estava o amigo.
— As minhas mãos...
— Não sou como o Miltch, mas deixa... hã?
Grids cambaleou para trás. Tinha sangue a escorrer-lhe pelo nariz e, de repente, sentiu-se tonto. Os seus músculos contraíam e relaxavam sucessivamente, o coração batia cada vez mais rápido, sentia-se quente e frio ao mesmo tempo, e deixou de conseguir distinguir as coisas quando se deixou cair no chão.
Sentiu um espasmo, os músculos acalmaram-se de súbito, mas depois teve outro espasmo que lhe deu a volta ao estômago. À medida que os espasmos se tornavam mais frequentes, mais depressa se apercebia que toda a magia dentro dele estava descontrolada. Não tinha controle sobre a sua magia e, consequentemente, sobre os seus movimentos. Pensou que a sua cabeça ia estourar quando o sangue lhe subiu todo à cabeça de uma só vez, mas acabou por desmaiar.
— Grids! — Chamou Sirius, após ter encontrado uma posição menos dolorosa para as mãos, enquanto observava o estranho comportamento do amigo.
Grids não respondeu; tinha, de facto, apagado, porém o seu corpo ainda se mexia. De uma forma anormal e bastante duvidosa, mas mexia-se. E, assim como uma larva se transforma numa borboleta, o casulo que era Grids rompeu-se. Sirius ficou horrorizado com o que viu. Um corpo nu e branco arrastou-se para fora do corpo de Grids antes de começar a devorá-lo com uma fome voraz.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro